Daqui se vê muito água e céu, constelações de árvores e cipoais intransponíveis. Paisagens, como deveriam ser, sem fim, letárgicas como o tempo que flui entre um mergulho e um assobio.
O suave toque das mãos-moças de sorriso aberto enfeitiçam os botos, nos enchem de doces, e nos levam para o fundo do rio, sem volta.
Céu-chão enorme, alívio nos pés de santería, cascudos da lembrança do Círio.
Dia 1, caminho nas águas, troncos e barro, a chuva se antevê ainda fraca, se cair desaba o céu e viro peixe.
O segundo dia passou, foi do mergulho no Rio, da castanha do macaco e do boto, que surgiu tímido e distante.
As moças estão em sangue, guarde a distancia, disse o caboclo.
O dia 3 começou escuro, chuva e a marca do metro preto da água que já desceu – e ainda é cheia. Cocó-pilão e arara azul, garça é o que não falta.
Meus olhos começam a ver o que a selva, na mata esconde.
Dia 4, os cachorros caminham n´água; a galinha resiste brava na mão firme, mas é um corte só, inevitável circuncisão do rio. O choro se estanca na tradição (banquete da cozinheira do dente da frente que falta).
Égua maninho, que rio bonito.
Dia 5: Contava minha avó Virginia, que nunca veio ao Amazonas, nem tinha internet ou TV, da flor da Rainha Vitória, que pousaram nela um bebê (para fotografar), veio um jacaré e numa só bocada levou o pequeno para o fundo do Rio.
Plantei meu pé na superfície rugosa de verde ardido, esperei, esperei, esperei.
Dia 6: o último banho foi de chuveiro, mas a água é a mesma de beber, de banhar, de cozinhar, de limpar, de ver o dia passar.
Busquei o molho de chaves perdido na roupa amarrotada da vinda.
Datas de Publicação
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Publicação nesta coleção
Jul-Dec 2012