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O ARRANJO PRODUTIVO DE FRANCA (SP): UM ESTUDO SOBRE A PRODUTIVIDADE DA MÃO-DE-OBRA NAS EMPRESAS FABRICANTES DE CALÇADOS

THE SHOEMAKING INDUSTRY CLUSTER IN FRANCA (SP): A STUDY ON LABOUR PRODUCTIVITY

RESUMO

Este trabalho trata da análise do desempenho da produtividade da mão-deobra, individual e agregada, das empresas que compõem o Arranjo Produtivo de empresas fabricantes de calçados do município de Franca, Estado de São Paulo. A pesquisa realizada em 2002, de natureza exploratória, limitouse a uma amostra não probabilística composta de 16 empresas, sendo duas empresas de grande porte, sete empresas de médio porte e sete empresas de pequeno porte. Foram aplicadas as técnicas estatísticas descritiva e inferencial (o teste de correlação bivariada). O resultado revelou que não existe evidência da homogeneidade do desempenho da produtividade da mão-de-obra entre as empresas que compõem o Arranjo Produtivo Local (APL), uma vez que elas são díspares, não simétricas, mostrando que o setor calçadista do município de Franca está mais próximo de um ajuntamento de empresas similares do que de um APL. Isso mostra a necessidade de investimentos em projetos de capacitação gerencial que permitam o desenvolvimento do APL, resultando em vantagens competitivas coletivas e dinâmicas.

PALAVRAS-CHAVE
Produtividade; Competitividade; APL (Arranjo Produtivo Local); Município de Franca (SP)

ABSTRACT

This paper is concerned with analysis of labour productivity - both individual and agregate - in companies that integrate the shoemaking industry cluster in Franca, State of São Paulo, Brazil. It was an exploratory research limited to a non-statistical sample composed of 16 companies, two of them were large companies, seven were medium sized companies, and seven were small companies. Descriptive statistics and statistical inference techniques were applied (bivariate correlation test). The results showed that there is no evidence of homogeneity in labour performance productivity among companies that integrate the cluster, once they are unequal, non simetrical, showing that the shoemaking industry in Franca is closer to an assembly of similar companies than a cluster. This shows that there is a need for investment in management training in order to allow for the development of a cluster, which would in turn result in colective and dynamic competitive advantages.

KEYWORDS
Productivity; Competitivity; Shoemaking Industry Cluster; Franca (SP)

1 INTRODUÇÃO

As pequenas e médias empresas (PMEs) têm uma importância fundamental na economia mundial, representando uma parcela significativa do PIB nos países desenvolvidos e nos países em desenvolvimento. A sua importância cresce à medida que as grandes empresas desverticalizam os processos produtivos, rompendo com as cadeias integradas de origem fordista, criando espaço para as pequenas empresas, mesmo nos setores de tecnologia avançada (CASAROTTO FILHO e PIRES, 1999CASAROTTO Filho, Nelson; PIRES, Luis Henrique. Redes de pequenas e médias empresas e desenvolvimento local, estratégias para a conquista da competitividade global com base na experiência italiana. São Paulo: Atlas, 1999.:11). Isso contribui diretamente para a geração de empregos e para o desenvolvimento econômico local, merecendo, por isso, atenção especial dos órgãos governamentais de fomento ao desenvolvimento econômico e à distribuição de renda (SANTOS e VARVAKIS, 1999SANTOS, Luciano Costa; VARVAKIS, Gregório. Redes de pequenas e médias empresas: organizações virtuais vs. clusters. Foz do Iguaçu: EnANPAD (Encontro Nacional dos Programas de Pós Graduação em Administração), 1999.). Nos Estados Unidos as pequenas empresas respondem por cerca de 40% do Produto Interno Bruto (PIB) e empregam 53% da força de trabalho do setor privado. São responsáveis pela criação de aproximadamente 75% dos novos empregos, sendo que da totalidade do primeiro emprego dos jovens trabalhadores 67% são fornecidos pelos pequenos negócios (MORAIS, 2002MORAIS, José Mauro. EUA reservam 21% para pequenas empresas. Revista Sebrae, Brasília, n. 3, p. 114-124, mar.-abr. 2002.:114). No Brasil as micro, pequenas e médias empresas representam cerca de 98% do total de empresas, respondem por cerca de 60% dos empregos gerados e participam com 43% da renda total dos setores industrial, comercial e de serviços. Além disso, as micro e pequenas empresas respondem por cerca de 2% do total das exportações do País. Considerando que uma das prioridades da economia é o incremento das exportações, entidades governamentais, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES, têm-se colocado à disposição para a ampliação da base dessas empresas voltadas à exportação (BNDES, 2002BNDES. Disponível em: <http://www.bndes.gov.br/pme>. Acesso em: mar. 2003.
http://www.bndes.gov.br/pme...
).

Com a inserção do Brasil no mundo globalizado, as grandes empresas têm condições para dominar quase todas as etapas da cadeia de valor. O mesmo não ocorre com as pequenas e médias empresas, cuja sobrevivência é ameaçada, se não apresentam níveis de qualidade e de custos comparáveis aos das grandes empresas. Casarotto Filho et al. (1999:122)CASAROTTO Filho, Nelson; PIRES, Luis Henrique. Redes de pequenas e médias empresas e desenvolvimento local, estratégias para a conquista da competitividade global com base na experiência italiana. São Paulo: Atlas, 1999. argumentam que a solução para as PMEs está na formação de redes de cooperação, em que estas passam a dominar todas as etapas da cadeia de valor e cada empresa desempenha sua função de acordo com sua competência essencial. Em termos de organização interempresarial, citam os referidos autores que os dois principais tipos de redes de empresas são: a) rede top down, que consiste na formação de um grupo de fornecedores dependentes de uma empresa-mãe, normalmente competindo por liderança de custos (como exemplo, tem-se o arranjo estrutural da indústria automobilística), e b) rede flexível de pequenas empresas, que consiste na formação de consórcios. Esses consórcios, embora possam ser de menor porte do que uma grande empresa internacional, conseguem competitividade pela facilidade de obterem combinações de fatores de desempenho competitivo (trade-off´s) como flexibilidade e custo. A justificativa para a formação de redes é que as PMEs, atuando isoladamente, têm um baixo poder de barganha, além de disporem de menor confiança que as grandes empresas. Por intermédio das redes de cooperação as PMEs adquirem uma maior confiabilidade junto a seus clientes e ampliam o poder de negociação com as grandes empresas. Como exemplo, podem ser citados os consórcios da região italiana da Emilia Romagna (CASAROTTO FILHO e PIRES, 1999CASAROTTO Filho, Nelson; PIRES, Luis Henrique. Redes de pequenas e médias empresas e desenvolvimento local, estratégias para a conquista da competitividade global com base na experiência italiana. São Paulo: Atlas, 1999.:111).

Um outro tipo de solução para a competitividade das PMEs são as formações de aglomeração de empresas, clusters ou Arranjos Produtivos Locais (APLs). Segundo Porter (1998)______. Estratégia, a busca da vantagem competitiva. Rio de Janeiro: Campus, 1998., os APLs estimulam a formação de novos negócios, pois os novos empreendedores contam com baixo risco devido à existência de uma base concentrada de clientes. Também há uma maior facilidade de percepção de oportunidades de negócios pelos indivíduos que trabalham nos APLs, observando as lacunas que podem ser preenchidas por novos empreendimentos. Além disso, os novos negócios podem contar com toda estrutura já existente na rede, bem como com uma maior facilidade para obter financiamentos. No Estado de São Paulo, existem vários exemplos de Arranjos Produtivos Locais (APLs): o do setor coureiro-calçadista dos municípios de Franca, Birigui e Jaú; o da indústria têxtil do município de Americana e da indústria de cerâmica dos municípios de Santa Gertrudes, Mogi-Guaçu e Porto Ferreira. No Rio Grande do Sul pode ser citado o Arranjo Produtivo da indústria calçadista do Vale do Rio dos Sinos. No Estado de Santa Catarina, há os da indústria têxtil e de informática, ambos localizados em Blumenau. Também merece menção o Arranjo Produtivo de Biotecnologia, em Belo Horizonte (ADTP, 2003ADTP - Agência de Desenvolvimento Tietê Paraná. Disponível em: <http://www.adtp.org.br/regiao/r6_03.asp>. Acesso em: 22 jan. 2003.
http://www.adtp.org.br/regiao/r6_03.asp...
).

Diante dessas colocações, a questão básica estabelecida para a pesquisa que fundamenta este artigo foi a seguinte: existe compatibilidade no desempenho da produtividade da mão-de-obra entre as empresas que compõem o Arranjo Produtivo da indústria calçadista do município de Franca?

Esta pergunta justifica-se pelos seguintes fatos: (a) o gasto com a mão-deobra na fabricação de sapatos é de 25%, o segundo maior custo industrial, perdendo apenas para os materiais, que corresponde a 64,3% do custo total, e (b) os Arranjos Produtivos apresentam importância crescente, em especial do setor calçadista na geração de divisas, em dólares, e empregos para o Brasil.

Segundo dados da Associação Brasileira de Calçados - ABICALÇADOS, em 2001, o Brasil era responsável pela produção de aproximadamente 600 milhões de pares de calçados, dos quais 190 milhões de pares para exportação, para um contingente de 70 países, gerando uma receita de US$ 1,5 bilhão. Além disso, a indústria calçadista brasileira emprega um contingente estimado de 200 mil pessoas (ABICALÇADOS, 2001ABICALÇADOS. Disponível em: <http://www.abicalcados.com.br>. Acesso em: mar. 2003.
http://www.abicalcados.com.br...
).

O principal pólo de produção de calçados femininos de couro está localizado próximo à capital do estado do Rio Grande do Sul, numa região que abrange 26 municípios, conhecida como o Vale dos Sinos, responsável por cerca de 40% da produção nacional.

O município de Franca, objeto deste estudo, é o segundo maior pólo de produção de calçados no País, concentrando 6% da produção de calçados, equivalente a 29 milhões de pares/ano. O destaque da produção de Franca são os calçados de couro voltados para o público masculino.

Segundo dados do Sindicato da Indústria de Calçados de Franca (SINDFRAN, 2002SINDFRAN. Informações gerais sobre o setor calçadista. Recebido por e-mail, junho de 2002.), o Arranjo Produtivo de calçados do município de Franca, em 2001, era constituído de 360 fabricantes de calçados, de estrutura familiar, sendo que 70% eram micro e pequenas empresas; 20% empresas de médio porte e 10% correspondiam a empresas de grande porte. Juntavam-se a esse universo cerca de 200 fornecedores de insumos especializados, 20 fabricantes de equipamentos, oito agentes exportadores e 2 mil prestadores de serviços (FIESP, 2002FIESP. Disponível em: <http://www.fiesp.org.br/foco/clusters/projeto.htm>. Acesso em: mar. 2003.
http://www.fiesp.org.br/foco/clusters/pr...
). Foram gerados cerca de 18,7 mil empregos, com piso salarial mensal de R$ 248,00. A produção foi de 32,5 milhões de pares de calçados, utilizando-se de 87% da capacidade instalada de um total de 37,2 milhões de pares. A exportação de calçados nos anos de 1999, 2000 e 2001 foi de 70,7, 99,1 e 94,9 milhões de dólares, respectivamente (SINDFRAN, 2002SINDFRAN. Informações gerais sobre o setor calçadista. Recebido por e-mail, junho de 2002.).

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 O CONCEITO DE ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS (APLS)

O Arranjo Produtivo Local (APLs) pode ser entendido como a concentração geográfica de empresas e instituições inter-relacionadas num setor específico. Ele engloba uma variedade de empresas importantes para a competição, incluindo fornecedores de insumos, maquinários, serviços, infra-estrutura especializada, órgãos governamentais de financiamento e instituições de ensino, associações de classe e outros (CORRÊA, 2001CORRÊA, Abidack Raposo. O complexo coureiro-calçadista brasileiro. BNDES Setorial, n. 14, p. 65-92, set. 2001.). De maneira geral, nos APLs há o predomínio das pequenas e médias empresas, caracterizadas pela especialização da produção entre firmas diferentes, divisão vertical da cadeia produtiva, flexibilidade para a produção de diferentes modelos de produtos ou tamanhos de lotes de fabricação, subcontratações, ausência de proteção para novos entrantes e acesso a redes de informação e serviços. A caracterização de um APL na prática não é uma tarefa fácil (AMATO NETO, 2000AMATO NETO, João. Redes de cooperação produtiva e clusters regionais. São Paulo: Atlas, 2000.:54), pois os sistemas produtivos nem sempre podem ser claramente separados nas categorias dispersas ou nos aglomerados. Os limites entre essas categorias nem sempre são nítidos e em alguns casos pode haver uma combinação dessas duas formas de organização. A concentração geográfica e setorial de PMEs é o sinal evidente da formação de um conglomerado ou de Arranjos Produtivos Locais (APLs). A simples formação de aglomerados de pequenas e médias empresas, contudo, não é condição suficiente para gerar benefícios diretos para todos os seus membros, os quais somente podem ser obtidos via um conjunto de fatores facilitadores, que, segundo Humphrey e Schmitz (apud AMATO NETO, 2000AMATO NETO, João. Redes de cooperação produtiva e clusters regionais. São Paulo: Atlas, 2000.:54), são os seguintes: a) divisão do trabalho e da especialização entre produtores; b) estipulação da especialidade de cada produtor; c) surgimento de fornecedores de matéria-prima e de máquinas; d) surgimento de agentes que vendam para mercados distantes; e) surgimento de empresas especialistas em serviços tecnológicos, financeiros e contábeis; f) surgimento de uma classe de trabalhadores assalariados com qualificações e habilidades específicas e g) surgimento de associações para a realização de lobby e de tarefas específicas para o conjunto de seus membros. Esses fatores facilitadores, de certo modo, corroboram com o argumento de Porter (1999:178)PORTER, Michael E. Competição. Estratégias competitivas essenciais. Rio de Janeiro: Campus, 1999. de que a conquista da vantagem competitiva pode ser comparada à lapidação de um diamante. O diamante pode ser representado por um diagrama composto por quatro forças determinantes: a) condições dos fatores de produção; b) condições da demanda; c) setores correlatos e de apoio e d) estratégias, estrutura e rivalidade das empresas. Cada um desses fatores define um ponto no “diamante” da vantagem competitiva nacional. Mas os pontos do “diamante” também se reforçam mutuamente. Eles compõem um sistema. A rivalidade doméstica e a concentração geográfica são poderosas em especial para transformar o diamante num sistema. De forma geral, todos esses fatores representam o conceito de eficiência coletiva. Embora um conglomerado possa ser coletivamente eficiente, dentro dele, algumas empresas crescem, enquanto outras decaem. A ação conjunta entre as empresas viabiliza a solução de problemas específicos, tais como provisão de serviços, infra-estrutura e treinamento, não eliminando a sua competitividade, mas tornando o mercado mais transparente por meio do incentivo à rivalidade e concorrência entre seus membros. O fato de que os Arranjos Produtivos combinam concentração setorial e geográfica pode levar determinada cidade ou região a um estado de certa vulnerabilidade, em face das mudanças de paradigmas nos produtos e nas tecnologias empregadas. Esse é o principal argumento contra a concentração na forma de Arranjo Produtivo (AMATO NETO, 2000AMATO NETO, João. Redes de cooperação produtiva e clusters regionais. São Paulo: Atlas, 2000.:55). Contudo, o que se observa é que os APLs têm maior capacidade de sobreviver aos choques e à instabilidade do meio ambiente do que empresas isoladas, em virtude da ação em conjunto e de sua alta capacidade de auto-reestruturação, capacidades intrínsecas à própria organização em rede. Eles podem responder a crises e oportunidades de forma mais dinâmica, uma vez que suas especialidades podem ser reorganizadas em novos processos. Dessa forma, os APLs freqüentemente se tornam repositórios de habilidades específicas da indústria. Com o tempo, os conhecimentos acumulam-se e as habilidades são repassadas de pessoa a pessoa, de modo que esses conhecimentos passam a tornar-se comuns a todos os seus integrantes.

Os APLs podem não ser, necessariamente, formados por apenas um tipo de indústria; contudo, geralmente, concentram somente um ramo industrial, sendo por isso alvo de críticas relativas a sua vulnerabilidade na economia regional, tendo em vista os desafios impostos pela necessidade de permanente atualização em face das constantes inovações tecnológicas, fenômeno não característico de regiões mais diversificadas. Outro aspecto a destacar refere-se ao fato de que os APLs regionais são, em muitos casos, nichos atrativos para investimentos dos setores privado, público ou como instrumento de reativação de atividades econômicas (TORRES et al., 2004TORRES, Ana C. Moura; OLIVEIRA, Carlos L. Gonçalves; SILVA, Eduardo R. Ferreira. O cluster como instrumento de reativação de uma atividade econômica tradicional: o caso da extração de cristais e pedras na cidade de Cristalina-GO. Curitiba: EnANPAD (Encontro Nacional dos Programas de Pós Graduação em Administração), 2004.). Esses investimentos podem surgir de vários modos, inclusive com base na integração das universidades locais com eles, de tal modo que as empresas participantes absorvem o contingente de mão-de-obra fornecido pela universidade.

É comum também encontrar APLs nos quais as empresas participantes inovam de modo tão intenso que se tornam um novo paradigma a ser seguido. Isso ocorre em alguns casos em que alta tecnologia está associada com eficiência da empresa, incitando a competitividade dos produtos no mercado interno. Essa competitividade doméstica, como qualquer rivalidade, cria as pressões necessárias para as empresas inovarem e melhorarem seus desempenhos nas áreas de finanças, técnicas ou operacionais (PORTER, 1998______. Estratégia, a busca da vantagem competitiva. Rio de Janeiro: Campus, 1998.:161).

2.2 O CONCEITO DA PRODUTIVIDADE DA MÃO-DE-OBRA

A medida da produtividade da mão-de-obra

O alto nível de competitividade encontrado na maioria dos mercados provocou uma nova ênfase na medição do desempenho, não somente em termos absolutos, mas também em termos relativos à concorrência (CHRISTOPHER, 1997CHRISTOPHER, Martin. Logística e gerenciamento da cadeia de suprimentos, estratégia para a redução de custos e melhoria dos serviços. São Paulo: Pioneira, 1997.:85). No passado julgava-se que bastava simplesmente medir o desempenho interno. Em outras palavras, o enfoque era sobre medidas como a produtividade, qualidade, absenteísmo, custos e assim por diante. Conquanto ainda seja importante que esses parâmetros continuem sendo medidos e controlados, deve-se reconhecer que tais medidas somente têm sentido quando comparadas com um padrão de referência. Em verdade, existem várias dimensões para o problema da medição. O primeiro ponto-chave é que o cliente deve ser a referência básica para a medição, uma vez que o mais importante são suas observações em relação ao desempenho. Em segundo lugar, não é suficiente apenas comparar o desempenho da empresa em análise com o do concorrente imediato. Deve-se também comparar com o “melhor da classe”. Em terceiro lugar, não são apenas os produtos que devem ser medidos e comparados, mas também os processos que os produzem. Essas três idéias estão na essência daquilo que se chama de benchmarking competitivo. As medidas de desempenho são importantes para a gestão empresarial, como já foi observado nas citações de Kaplan e Norton (1997:21)KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. A estratégia em ação - Balanced ScoreCard. Rio de Janeiro: Campus, 1997. e Schröeder (1981)SCHRÖEDER, Roger. Operations management: decision making in the operations function. USA: McGraw-Hill, 1981.: “if you can´t measure it, you can´t manage it”. Muitas empresas já trabalham com sistemas de medição de desempenho que incorporam medidas financeiras e não financeiras (KAPLAN e NORTON, 1997KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. A estratégia em ação - Balanced ScoreCard. Rio de Janeiro: Campus, 1997.). Entre as várias medições de desempenho existentes, umas das mais importante do benchmarking competitivo é a produtividade da mão-de-obra porque ela está associada como um indicador de eficiência de uma empresa e de riqueza para uma Nação (FAMÁ, 1986FAMÁ, Rubens. Análise do desempenho operacional das empresas com a utilização de números índices: um estudo num conglomerado empresarial. São Paulo: FEA/USP, 1986.). A medição da produtividade em um sistema produtivo é definida como a relação entre a quantidade de bens ou serviços gerados (saídas) e a quantidade de recursos consumidos para gerá-los (entradas) num mesmo período de tempo (t) (HEIZER e HENDER, 2001HEIZER, Jay; RENDER, Barry. Administração de operações, bens e serviços. Rio de Janeiro: LTC, 2001.). Ela pode ser representada pela seguinte equação básica:

PRODUTIVIDADE = Sa í das Entradas t

A representação gráfica da definição da produtividade é mostrada no Desenho 1.

DESENHO 1
AS ENTRADAS E SAÍDAS DE UM SISTEMA PRODUTIVO

Dada a definição da produtividade, representada no Desenho 1, observa-se que ela mede quão bem são convertidas as entradas em saídas, ou seja, a utilização dos recursos físicos na produção de bens ou serviços. De modo geral, as medidas da produtividade devem ser vistas como instrumentos auxiliares na detecção de problemas e no acompanhamento do desempenho dos sistemas produtivos a que se referem (MOREIRA, 1991MOREIRA, Daniel Augusto. Medida da produtividade na empresa moderna. São Paulo: Pioneira, 1991.:33). Uma unidade de negócios ou uma empresa pode atingir aumento de produtividade quando a quantidade de bens e serviços gerados cresce a uma taxa maior que a quantidade dos recursos consumidos (HEIZER e RENDER, 2001HEIZER, Jay; RENDER, Barry. Administração de operações, bens e serviços. Rio de Janeiro: LTC, 2001.). Além disso, para fazer sentido, segundo Davis et al (2001:123)DAVIS, Mark M.; AQUILANO, Nicholas J.; CHASE, Richard B. Fundamentos da administração da produção. Porto Alegre: Bookman, 2001., a medida da produtividade precisa ser comparada: a) com operações similares de outras empresas do mesmo mercado e b) ao longo do tempo na mesma operação, isto é, a medida da produtividade em um dado período de tempo com os períodos anteriores e seguintes.

Historicamente, a produtividade da mão-de-obra tem sido o mais popular dos índices há várias décadas, de maneira que é considerada praticamente um sinônimo da palavra produtividade (MOREIRA, 1991MOREIRA, Daniel Augusto. Medida da produtividade na empresa moderna. São Paulo: Pioneira, 1991.:5).

A produtividade da mão-de-obra, neste estudo, será definida de duas maneiras:

1) como produtividade de custos, dada pela relação:

PRODUTIVIDADE DE CUSTOS = Pares / dia Funcion á rio t

Trata-se de uma medida de eficiência da mão-de-obra. Incorpora efeitos da substituição da mão-de-obra por outros meios de produção como a introdução de equipamentos automatizados, adoção de novos materiais, mudanças de processos produtivos, reorganização administrativa, treinamentos de capacitação operacional ou gerencial (MOREIRA, 1991MOREIRA, Daniel Augusto. Medida da produtividade na empresa moderna. São Paulo: Pioneira, 1991.).

2) como produtividade da receita, dada pela relação:

PRODUTIVIDADE DA RECEITA = Receita Funcion á rio t

Trata-se de uma medida para identificar a tendência de mudanças para produtos e serviços de maior valor agregado (KAPLAN e NORTON, 1997KAPLAN, Robert S.; NORTON, David P. A estratégia em ação - Balanced ScoreCard. Rio de Janeiro: Campus, 1997.:58).

Em ambos casos, a produtividade da mão-de-obra (de custos e da receita) não será utilizada como sinônimo de bom ou mau desempenho, uma vez que se trata de medidas controversas, exigindo do analista o uso de bom senso. Entretanto, ele deve atentar mais para as tendências do que para as variações, para identificar as variáveis ou os fatores que a estão influenciando na obtenção dos resultados obtidos (MOREIRA, 1991MOREIRA, Daniel Augusto. Medida da produtividade na empresa moderna. São Paulo: Pioneira, 1991.). Observa-se que na definição da produtividade foi utilizada apenas um recurso, a mão-de-obra. Neste caso, ela é conhecida como produtividade parcial ou de fator único. Uma visão mais ampla da produtividade, denominada de produtividade total, é aquela que inclui todas variáveis ou recursos utilizados na produção dos bens ou serviços (HEIZER e RENDER, 2001HEIZER, Jay; RENDER, Barry. Administração de operações, bens e serviços. Rio de Janeiro: LTC, 2001.; MOREIRA, 1991MOREIRA, Daniel Augusto. Medida da produtividade na empresa moderna. São Paulo: Pioneira, 1991.).

Fatores que influenciam a produtividade da mão-de-obra

Para Heizer e Render (2001:14)HEIZER, Jay; RENDER, Barry. Administração de operações, bens e serviços. Rio de Janeiro: LTC, 2001. a produtividade da mão-de-obra é influenciada por três variáveis: a) o trabalho, constituído de uma força de trabalho bem instruída e motivada; b) o capital, constituído dos investimentos de capital e os compromissos de trade-offs entre capital e trabalho, e c) a administração, ou gerenciamento, constituída da responsabilidade para garantir que o trabalho e o capital sejam utilizados com eficácia. Inclui também as melhorias obtidas por meio da aplicação da tecnologia e da utilização do conhecimento. Para Monks (1987:6)MONKS, Joseph G. Administração da produção. São Paulo: McGraw-Hill, 1987. as variáveis que influenciam a produtividade são: a) relação entre capital e trabalho; b) escassez de recursos; c) mudanças na força de trabalho; d) inovação e tecnologia e e) qualidade do ambiente de trabalho. Embora citadas em épocas diferentes, observa-se que as variáveis que influenciam a produtividade de Heizer e Render (2001)HEIZER, Jay; RENDER, Barry. Administração de operações, bens e serviços. Rio de Janeiro: LTC, 2001. e de Monks (1987)MONKS, Joseph G. Administração da produção. São Paulo: McGraw-Hill, 1987. não são diferentes. Entre as inúmeras variáveis que influenciam a produtividade da mão-de-obra, ainda podem ser consideradas:

  • a) Idade da empresa. Uma força de trabalho ou uma base de capital em envelhecimento podem modificar o custo relativo das atividades que agregam valor. Equipamentos de produção antigos exigem maior número de horas de manutenção e um maior valor de seguro. Além disso, uma força de trabalho mais antiga normalmente tem salários e custos de benefícios mais altos (PORTER, 1996______. Vantagem competitiva - criando e sustentando um desempenho superior. Rio de Janeiro: Campus, 1996.:88). Portanto, o envelhecimento de uma empresa pode reduzir a produtividade da mão-de-obra.

  • b) Terceirização. Entende-se como terceirização o ato pelo qual a empresa fabricante de calçados, mediante contrato, entrega a outra empresa certa atividade ou serviços, para que esta a realize habitualmente. O objetivo da terceirização é permitir a concentração de esforços na atividade final da empresa, aquela ligada diretamente ao núcleo da atividade empresarial, à finalidade precípua da empresa. São exemplos típicos de terceirização os serviços de segurança, de limpeza e conservação, serviços de preparo e fornecimento de refeições em restaurantes internos da empresa, serviços de contabilidade e de auditorias e outros. Com a terceirização a empresa pode reduzir novos investimentos voltados para a produção, minimizando certos riscos considerados inevitáveis (QUINN et al., 1998QUINN, James Brian; DOORLEY, Thomas L; PAQUETTE, Penny C. Além dos produtos: a estratégia baseada em serviços. Rio de Janeiro: Campus, 1998.:328). Portanto, de forma contrária ao envelhecimento da empresa, a terceirização pode aumentar a produtividade da mão-de-obra.

Assim, para este estudo, para a medição da produtividade e dos fatores que a influenciam, serão considerados:

  • a) na medição da produtividade da mão-de-obra, duas medidas físicas:

    • a produtividade de custos, dada pela relação [produção diária/funcionário];

    • a produtividade da receita, dada pela relação [receita/funcionário].

  • b) nos fatores que influenciam a produtividade da mão-de-obra, duas variáveis quantitativas:

    • a idade (em anos) da empresa;

    • o índice de terceirização.

A adoção desses dois fatores se deveu às seguintes razões: a) pela facilidade da sua coleta de dados; b) por serem representativos na análise da produtividade, pois parece ser senso comum ouvir “empresas antigas tem baixa produtividade” ou “a terceirização aumenta a produtividade” e c) porque a idade (em anos) da empresa e a terceirização envolvem as variáveis citadas tanto por Heizer e Render (2001)HEIZER, Jay; RENDER, Barry. Administração de operações, bens e serviços. Rio de Janeiro: LTC, 2001. como as de Monks (1987)MONKS, Joseph G. Administração da produção. São Paulo: McGraw-Hill, 1987..

Alguns exemplos de medidas da produtividade da mão-de-obra (de custos e da receita)

Como exemplo da produtividade de custos, dada pela relação [no de itens produzidos/funcionário], Silva (2001)SILVA, Cleide. Montadora baiana exporta modelo de produção. O Estado de São Paulo, São Paulo, 23 jul. 2001, Caderno de Economia, p. B7. cita que na indústria automobilística, segundo o critério medido pelo instituto americano Habour Associated, a Mitsubishi produz 147 [automóveis/funcionário]. No Brasil, na fábrica da General Motors na cidade de Gravataí, RS, a relação é de 100 [carros/funcionário]. Na região do ABC paulista, a unidade da Ford em São Bernardo do Campo produz 37,2 [veículos/funcionário].

Como exemplo da produtividade da receita, dada pela relação [receita anual/ no de funcionários], Magnavita (1998)MAGNAVITA, Mônica. Estudo revela baixa eficiência da Petrobrás. O Estado de São Paulo, São Paulo, 16 fev. 1998, Caderno de Economia, p. B1. cita que a empresa norte americana de petróleo Mobil, em 1996, obteve a relação [receita anual/no funcionários] igual a 1,90 bilhões de dólares, enquanto a brasileira Petrobrás, no mesmo ano, obteve a relação [receita anual/no de funcionários] igual a 0,62 bilhão de dólares.

Outros exemplos que mostram a importância da medida da produtividade da mão-de-obra são aqueles publicados anualmente pelos Sindicatos ou Associações representativos de grandes grupos empresariais, conforme mostra a Tabela 1.

TABELA 1
MEDIDAS DA PRODUTIVIDADE DA MÃO-DE-OBRA

Evidentemente, como já foi mencionado anteriormente, as medidas da produtividade, mostradas na Tabela 1 não podem ser interpretadas diretamente. A sua análise deve incluir os fatores que a influenciaram, como idade (em anos) da empresa, índice de terceirização, taxa de inflação, grau de inovação tecnológica, disponibilidade de recursos e outros.

3 METODOLOGIA DA PESQUISA: OBJETIVOS, AMOSTRA E TRATAMENTO DOS DADOS

3.1 OBJETIVOS

Esta pesquisa de natureza exploratória do tipo quantitativo descritivo teve como objetivo principal analisar o desempenho da produtividade da mão-de-obra individual e agregada das empresas que compõem o Arranjo Produtivo de fabricantes de calçados do município de Franca (SP).

Como objetivo específico, procurou-se identificar se havia correlações entre as produtividades (de custos e da receita): (a) com a terceirização e (b) com a idade da empresa. A terceirização e a idade da empresa foram consideradas, neste estudo, como fatores influenciadores da produtividade da mão-de-obra.

Deve-se destacar que o pressuposto básico do estudo foi o de que as empresas que compõem o Arranjo Produtivo de calçados do município de Franca tivessem um desempenho de produtividade individual compatível com o desempenho da produtividade na forma agregada dos membros integrantes do Arranjo Produtivo. Quanto mais homogêneos forem os índices observados, menor a dispersão e conseqüentemente maior a consistência do Arranjo Produtivo, facilitando a atração de investimentos públicos e privados. Quanto mais disperso for o resultado obtido, menor a consistência do Arranjo Produtivo, aumentando o risco do retorno dos investimentos, que acabam voltando-se para atender as necessidades individuais de cada empresa.

3.2 AMOSTRA E COLETA DOS DADOS

A amostra inicial, escolhida por conveniência, constou de 25 empresas, sendo 20 do ramo calçadista, dois curtumes (os maiores da região), um frigorífico (quarto maior exportador de carne bovina do Brasil) e dois bancos (os mais ativos da região). As empresas que participaram da pesquisa tinham um histórico muito similar, o da estrutura familiar, motivo pelo qual se julgou adequado o tamanho da amostra para análise. A amostra correspondente às empresas fabricantes de calçados representou 44% da produção total do município de Franca.

Para a análise dos dados, a amostra inicial de 20 empresas pertencentes ao ramo calçadista foi reduzida para 16 empresas, sendo excluídas as microempresas, cujas atividades eram quase artesanais e com peculiaridades quer fugiam às características das demais indústrias. A classificação do porte das empresas seguiu o critério da receita operacional bruta anual, adotado até agosto de 2002 pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES (2000)BNDES. Disponível em: <http://www.bndes.gov.br/pme>. Acesso em: mar. 2003.
http://www.bndes.gov.br/pme...
:

  • Microempresa: até 900 mil

  • P Pequeno Porte: entre R$ 900 mil e R$ 7,875 milhões

  • M Médio porte: entre R$ 7,875 milhões e R$ 45 milhões

  • G Grande porte: acima de 45 milhões

A amostra foi constituída de 8 empresas de pequeno porte, 6 de médio porte e 2 empresas de grande porte. Em termos porcentuais, corresponderam a 50,0%, 37,5% e 12,5% do total da amostra para as empresas de pequeno, médio e grande porte, respectivamente. A coleta de dados se deu no primeiro semestre de 2002, mediante um acordo estabelecido entre a Faculdade de Ciências Econômicas de Franca - FACEF -, a Associação Comercial das Indústrias de Franca - ACIF - e o Sindicato da Indústria de Calçados de Franca - SINDFRAN. Para tanto utilizou-se de um questionário composto de questões fechadas, constituído de assuntos referentes à indústria calçadista, como faturamento, número de empregados, produção diária e outros. Após a coleta, os dados foram classificados e reagrupados em categorias representadas pelo porte da empresa e tratados mediante a utilização de a) estatística descritiva para tratar e resumir os dados coletados por meio de freqüências, porcentagens e coeficiente de variação como uma medida de dispersão em torno da média - foram considerados como guia para a análise dos dados e resultados coeficientes de variação (cv) inferiores a 0,15, uma vez que os valores usuais são: (cv ≤ 0,15) para baixa dispersão; (0,15 < cv < 0,30) para média dispersão e (cv ≥ 0,30) para alta dispersão (FONSECA; MARTINS, 1996FONSECA, Jairo Simon; MARTINS, Gilberto de Andrade. Curso de estatística. São Paulo: Atlas, 1996.:148) -, e b) de estatística indutiva ou inferencial para analisar as correlações existentes entre a produtividade da mão-de-obra com a terceirização e a idade da empresa. A correlação utilizada foi a de Pearson, também conhecida como correlação simples, correlação bivariada ou simplesmente coeficiente de correlação (MALHOTRA, 1999MALHOTRA, Naresh K. Pesquisa de marketing, uma orientação aplicada. Porto Alegre: Bookman, 1999.:455).

4 TRATAMENTO E ANÁLISE DOS DADOS

4.1 ESTATÍSTICA DESCRITIVA - CARACTERIZAÇÃO DOS RESPONDENTES

As 16 entrevistas que compuseram a amostra do Arranjo Produtivo de fabricantes de calçados do município de Franca, direcionadas ao principal executivo das empresas, apresentaram algumas características consideradas importantes para posterior análise dos resultados: (1) 62,5% das empresas tinham como executivo principal o dono da empresa ou um parente próximo, como filho, esposa ou irmão. No restante, ou seja, 37,5% das empresas, os cargos principais eram exercidos por funcionários cujo atributo de maior destaque era a confiança baseada no tempo de permanência na empresa; (2) 87,5% dos executivos entrevistados estudaram em Franca; (3) 62,5% dos executivos adquiriram experiência na própria empresa; (4) 25% vieram de outras empresas, pertencentes ao Arranjo Produtivo de Franca; (5) 12,5% dos executivos tiveram experiência em outros setores da economia e (6) 68,7% dos respondentes tinham curso superior e 31,7% não tinham curso superior.

4.2 ESTATÍSTICA DESCRITIVA - CARACTERIZAÇÃO DO ARRANJO PRODUTIVO

A estatística descritiva do Arranjo Produtivo de fabricação de calçados do município de Franca foi feita com base nas seguintes variáveis:

  • Empresa: identificação da empresa

  • Porte: classificação da empresa em termos da receita operacional bruta adotada pelo BNDES

  • Receita R$ (106): Receita Operacional Bruta Anual

  • Idade (anos): tempo de atuação da empresa

  • Funcionários (no): número ou quantidade de empregados

  • Pares/dia: produção diária efetiva

  • Pares/dia/funcionário: produtividade de custo

  • Receita/funcionário: produtividade da receita

  • Terceirização: porcentagem do custo total devido à terceirização

Definidas as variáveis, os dados foram coletados na forma quantitativa, podendo-se, assim, calcular os valores de média, desvio padrão, máximo, mínimo e coeficiente de variação, que são medidas usuais da estatística paramétrica. O cálculo dessas estatísticas permitiu, obter as características de cada empresa da amostra. O resultado é mostrado na Tabela 2.

TABELA 2
CARACTERÍSTICAS DO ARRANJO PRODUTIVO
  • 1) quanto à produtividade de custos, dada pela relação [pares/dia/funcionário]: a) variou entre um valor mínimo de 3,80 e um valor máximo de 14. A média obtida foi de 9,10 pares/dia/funcionário, com um desvio padrão e coeficiente de variação de 2,90 e 0,32 respectivamente; b) uma empresa classificada como de grande porte, identificada com o número 1, foi a que possuiu a menor produtividade com valor igual a 3,80; c) duas empresas, sendo uma de pequeno porte e outra de médio porte, foram as que tiveram a maior produtividade com os mesmos valores, iguais a 12,50, e d) em média as melhores produtividades foram apresentadas em primeiro, segundo e terceiro lugar pelas empresas de pequeno, médio e grande porte com valores iguais a 10,60; 8,60 e 5,50, respectivamente;

  • 2) quanto à produtividade da receita, dada pela relação [receita/funcionário]: a) variou entre um valor mínimo de 0,030 ($ x 106) e um valor máximo de 0,144 ($ x 106). A média obtida foi de 0,074 ($ x 106)/funcionário, com um desvio padrão e coeficiente de variação de 0,450 ($ x 106) e 6,080 ($ x 106) respectivamente; b) uma empresa classificada como de grande porte, identificada com o número 1, foi a que possuiu a menor produtividade com valor igual a 0,025 ($ x 106). Essa empresa, também, obteve a menor produtividade de custo; c) em média, as melhores produtividades foram apresentadas em primeiro, segundo e terceiro lugar pelas empresas de médio, pequeno e grande porte com valores iguais a 0,089; 0,067 e 0,043 ($ x 106), respectivamente;

  • 3) as empresas de grande porte, em média, evidenciaram as menores produtividades, tanto de custos como da receita.

Em suma, os resultados obtidos mostrados na Tabela 2 parecem evidenciar que as empresas de pequeno e médio porte possuem melhores produtividades da mão-de-obra (de custos e da receita) do que as empresas de grande porte. No entanto, os coeficientes de variação (cv) indicaram alta dispersão (cv ≥ 0,3) em torno do valor médio.

4.3 ESTATÍSTICA INFERENCIAL - ANÁLISE DE CORRELAÇÃO

Para entender melhor o comportamento dos índices da produtividade, buscou-se verificar a existência de correlação entre as variáveis como o índice de terceirização e a idade da empresa. Evidentemente as variáveis como receita, número de empregados e [pares/dia] já estão sendo consideradas nas medidas das produtividades. A correlação mede a força ou o grau de relacionamento entre duas variáveis, possuindo a propriedade de oscilar entre +1 e -1. É importante observar que uma correlação elevada não necessariamente implica uma relação de causalidade. A alta correlação obtida pode ser obra do mero acaso ou então representa a influência oculta de uma terceira variável, não determinada, que provou o efeito observado. A Tabela 3 apresenta o resultado dos cálculos da correlação entre a produtividade da mão-de-obra (a de custos e da receita) com a idade da empresa (ou envelhecimento) e a terceirização.

TABELA 3
MATRIZ DE CORRELAÇÃO PARA AS EMPRESAS CALÇADISTAS

As correlações mais importantes que se observam na Tabela 3 são: a) a correlação negativa e significante entre a produtividade de custo e da receita com a idade (em anos) da empresa em nível de significância de 99% e 95% respectivamente. Esse resultado evidencia que a produtividade da mão-de-obra, em relação ao custo e à receita, decresce à medida que as empresas tornam-se mais velhas; b) em níveis de significâncias iguais a 95% e 99% não houve evidências de que a produtividade da mão obra é correlacionada com o índice de terceirização.

Para verificar se o resultado obtido teve a influência das empresas de grande porte, uma nova matriz de correlação foi elaborada, constituída, assim, de empresas de pequeno e médio porte, conforme mostra a Tabela 4.

TABELA 4
MATRIZ DE CORRELAÇÃO PARA AS EMPRESAS DE PEQUENO E MÉDIO PORTE

Excluindo as empresas de grande porte da análise de correlação, verifica-se que apenas a produtividade da mão-de-obra relativa ao custo evidencia a correlação com a idade (em anos) da empresa.

Em suma, nas pequenas e médias empresas do Arranjo Produtivo de fabricantes de calçados do município de Franca, a produtividade da mão-de-obra, identificada como produtividade de custos, evidenciou correlação com a idade (em anos) da empresa. Isso significa que, quanto mais envelhecida a empresa, menor é a eficiência da mão-de-obra. Esse fato mostra a consistência com a teoria, comentada no item 2.2. Quanto à terceirização, não houve evidência de correlação com a produtividade da mão-de-obra, ao menos em nível de significância de 95%.

5 ANÁLISE DOS RESULTADOS

Com relação ao objetivo principal deste estudo, que foi o de analisar o desempenho da produtividade da mão-de-obra individual e agregada das empresas que compõem o Arranjo Produtivo de fabricação de calçados do município de Franca, a amostra de empresas revelou que:

  • a) quanto à produtividade da mão-de-obra relativa ao custo, dada pela relação [pares/dia/funcionário]

    • 1) Individualmente, as produtividades foram díspares e assimétricas, variando de 3,8 a 14.

    • 2) Por porte de empresa, as grandes empresas foram as que apresentaram menores variações, entre 3,8 e 7,2. Em seguida, as empresas de pequeno porte variaram de 7,7 a 12,5. Por último as empresas de médio porte apresentaram as maiores variações, entre 5,5 e 12,5.

    • 3) Na forma agregada, levando-se em consideração o coeficiente de variação (cv), que foi de 0,32, os resultados obtidos mostram uma alta dispersão em torno da média obtida. Essas variações podem evidenciar uma baixa cooperação ou articulação entre as empresas constituintes do Arranjo Produtivo, o que compromete a competitividade do setor calçadista, como já havia sido detectado por Vecchio (2000)VECCHIO, Rafael Augusto. Autonomia para a competitividade: o futuro da indústria coureio-calçadista do Rio Grande do Sul. REAd - Revista Eletrônica de Administração, UFRGS/EA/PPGA, Porto Alegre, ed. 16, v. 6, n. 4, nov. 2000. Disponível em: <http://read.adm.ufrgs.br/read16/read16.htm>. Acesso em: 20 fev. 2001.
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      em seu estudo sobre o setor calçadista do Rio Grande do Sul. Como sugestão para homogeneizar a competitividade, pode-se considerar a formação de consórcio como o que se faz na região do norte da Itália, conforme citam Casarotto Filho e Pires (1999)CASAROTTO Filho, Nelson; PIRES, Luis Henrique. Redes de pequenas e médias empresas e desenvolvimento local, estratégias para a conquista da competitividade global com base na experiência italiana. São Paulo: Atlas, 1999..

  • b) quanto à receita, dada pela relação [receita/funcionário], os resultados foram parecidos com a produtividade relativa aos custos, exceto na forma agregada, em que o coeficiente de variação (cv) obtido foi pior, reforçando a não homogeneidade das produtividades.

Com relação aos objetivos específicos, em que se procurou identificar se havia correlações da produtividades mão-de-obra, verificou-se que:

  • a) com relação à terceirização, não houve evidências de correlação;

  • b) com relação à idade ou envelhecimento da empresa, houve evidência de correlação negativa para as empresas de pequeno e médio porte. Isso significa que quanto mais envelhecida a empresa é, menos produtiva ela se torna.

6 CONCLUSÕES E SUGESTÕES PARA PROSSEGUIMENTO

Conclui-se da análise dos resultados que não existem evidências da existência de um Arranjo Produtivo de fabricantes de calçados do município de Franca (SP), nos moldes teóricos abordados por Porter (1998)______. Estratégia, a busca da vantagem competitiva. Rio de Janeiro: Campus, 1998. e outros autores mencionados. O pressuposto básico, conforme citado no item 3.1 (objetivos), foi de que as produtividades individuais da amostra de empresas deveriam ser compatíveis com o desempenho das produtividades na forma agregada, isto é, quanto mais homogêneos forem os índices observados, menor será a dispersão e conseqüentemente maior a consistência do Arranjo Produtivo, facilitando a atração de investimentos públicos e privados, resultando em vantagens competitivas coletivas e dinâmicas para as empresas integrantes do Arranjo Produtivo.

As evidências numéricas da não existência de um Arranjo Produtivo de fabricantes de calçados no município de Franca aparecem, basicamente, (a) nas disparidades das medidas obtidas para as produtividades de custos e da receita e (b) na não existência de uma correlação positiva com o índice de terceirização.

Portanto, pode-se considerar que o setor calçadista do município de Franca está mais próximo de um ajuntamento de empresas similares do que de um Arranjo Produtivo Local (APL), mostrando a necessidade de investimentos em projetos de capacitação gerencial que permitam o desenvolvimento do Arranjo Produtivo. Observa-se, no entanto, que esta pesquisa foi considerada de natureza exploratória, tendo adotado uma amostra por conveniência, correspondente a 44% da produção das empresas fabricantes de calçados do município de Franca, assim, as inferências extraídas da amostra devem ser encaradas com ressalvadas, em função das limitações desse tipo de abordagem (KERLINGER, 1980KERLINGER, Fred N. Metodologia da pesquisa em ciências sociais: um tratamento conceitual. São Paulo: EPU, 1980.).

Por outro lado, os resultados obtidos permitem sugerir, mesmo em caráter genérico, algumas ações para se obter uma melhor produtividade, bem como um desempenho homogêneo: (a) utilizar as medidas da produtividade como uma ferramenta gerencial; (b) atentar para as relações de causa-efeito entre a produtividade e as variáveis que a influenciam, como treinamento da mão-deobra, aquisição de novos equipamentos e capacitação gerencial; (c) atentar para a viabilidade e custo de coleta e armazenagem dos dados de forma a não criar sistemas de medição impraticáveis ou concorrentes com os dados financeiros ou operacionais.

Por fim, sugere-se ainda o prosseguimento desta pesquisa, no sentido de: (a) ampliar a amostra para desenvolver um estudo comparativo da produtividade da mão-de-obra entre outros arranjos produtivos como o do Vale dos Sinos, no Rio Grande do Sul; (b) identificar outros indicadores de produtividade, que envolvam treinamento, tecnologia e investimento de capital, buscando a maximização do Arranjo Produtivo; (c) comparar os indicadores de produtividade ao longo do tempo na mesma empresa ou com empresas consideradas benchmark do mercado.

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    » http://read.adm.ufrgs.br/read16/read16.htm

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    17 Set 2021
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2005

Histórico

  • Recebido
    01 Set 2004
  • Aceito
    08 Jun 2005
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