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ADMINISTRAÇÃO ECOLÓGICA: CONSTRUINDO UMA EMPRESA AMBIENTAL E SOCIALMENTE RESPONSÁVEL

ECOLOGICAL MANAGEMENT: BUILDING AN ENVIRONMENTAL AND SOCIALLY RESPONSIBLE FIRM

RESUMO

O processo de conscientização ambiental, iniciado nos anos 1970, fez que a Administração incluísse a proteção ambiental entre seus objetivos. Novos paradigmas surgiram e conceitos como o de ecologia profunda passaram a ser compreendidos. Surgiram novas formas de negócios, como o ecoturismo. A Venturas & Aventuras, empresa que ingressou nessa atividade, tornou-se pioneira em um destino procurado por pessoas do mundo inteiro, a Chapada Diamantina. Seus fundadores sempre se preocuparam com o meio ambiente, inserindo a comunidade local, constituída de ex-garimpeiros, em suas atividades. Para isso, desenvolveram ações, que resultaram em parceria benéfica para todos os envolvidos - empresa, moradores e clientes -, e que contribui para a preservação do ecossistema da Chapada. Este artigo descreve e analisa essa experiência, mostrando as dificuldades encontradas e as soluções adotadas. A análise mostra que a empresa passou por um processo de aprendizado e transformação, aderindo a vários princípios propostos pela ecologia profunda.

PALAVRAS-CHAVE
Ecologia profunda; Gerenciamento ecológico; Chapada Diamantina; Ecoturismo

ABSTRACT

The environmental awareness process that begun in the 1970’s led to the inclusion of environmental protection goals in Administration. Concepts such as that of deep ecology grew to be better understood; new businesses, such as ecotourism, sprang up. In this context, a Brazilian ecotourism firm, Venturas & Aventuras was founded and became a pioneer in the Chapada Diamantina, important ecological tourist center. Its founders have always been careful to respect the environment and to include the local community, mainly composed of poor ex-prospectors. They have developed actions that have led to a partnership, benefiting all those involved, contributing to the preservation of the Chapada ecosystems. The aim of this paper is to describe and analyze the firm’s experience, showing the difficulties encountered and solutions adopted. The current analysis shows that Venturas underwent a learning and transformation process in which it adhered to various principles contained in the deep ecology concept.

KEYWORDS
Deep ecology; Ecological management; Chapada Diamantina; Ecotourism

1 INTRODUÇÃO

Durante as décadas de 1970 e 1980, os danos provocados por desastres ambientais alertaram a população e foi então desencadeado um processo de conscientização ambiental. Nessa época, o conceito de Administração passou a incluir a proteção ambiental entre seus objetivos (BOGO, 1998BOGO, J. M. O sistema de gerenciamento ambiental segundo a ISO 14001 como inovação tecnológica na organização. 1998. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1998.). Autores da área de Administração, como Drucker e Kotler, começaram a enfatizar a necessidade de as empresas incorporarem aos seus objetivos aspectos relacionados ao bem-estar em longo prazo da sociedade, iniciando um movimento que, mais tarde, desembocaria nas noções, hoje amplamente difundidas, de responsabilidade social e ambiental (DRUCKER, 1973DRUCKER, P. The shame of marketing. In: KELLEY, W. T. (Ed.). New consumerism: selected readings. Grid, inc., cap. 15, p. 201-205, 1973-; KOTLER, 1972KOTLER, P. What consumerism means for marketers. Harvard Business Review, Boston: v. 50, n. 3, p. 48-57, May/Jun., 1972.).

Essa nova preocupação fez que a terminologia, introduzida na década de 1970, para distinguir duas formas de abordagem da questão ambiental - am-bientalismo superficial e ecologia profunda - passasse a ser mais bem compreendida (CALLENBACH et al., 1993CALLENBACH, E.; CAPRA, F.; GOLGMAN, L.; LUTS, R.; MARBURG, S. Gerenciamento ecológico: Guia do Instituto Elmwood de Auditoria Ecológica e Negócios Sustentáveis. São Paulo: Cultrix/ Amaná, 1993.).

Enquanto o ambientalismo superficial enxerga o mundo como partes separadas, cujos problemas podem ser tratados isoladamente, a ecologia profunda propõe tratar o mundo como um todo integrado; com essa visão, os problemas ecológicos do mundo não podem mais ser entendidos isoladamente (CALLEN-BACH et al., 1993CALLENBACH, E.; CAPRA, F.; GOLGMAN, L.; LUTS, R.; MARBURG, S. Gerenciamento ecológico: Guia do Instituto Elmwood de Auditoria Ecológica e Negócios Sustentáveis. São Paulo: Cultrix/ Amaná, 1993.).

Essa consciência ecológica fez também que a população se interessasse cada vez mais por atividades ecologicamente corretas; surgiram novas preocupações com a forma como eram produzidos os bens de consumo (o que desembocou nos chamados produtos verdes) e, também, novos interesses e formas de diversão, entre elas, o ecoturismo (WELFORD; YTTERHUS, 1999WELFORD, R.; YTTERHUS, B. Conditions for the transformation of ecotourism into sustainable tourism. European Environment, John Wiley & Sons, v. 8, n. 6, p. 193-201, 1999.).-

A Chapada Diamantina é, hoje, um importante pólo de turismo ecológico, conhecido mundialmente. Trata-se de uma região que ficou famosa depois do século XIX, quando foram descobertos seus diamantes. Com a diminuição dos diamantes e o descobrimento de outras jazidas, em áreas economicamente mais rentáveis, seus habitantes começaram a enfrentar dificuldades de sobrevivência. Para agravar a situação, em 1985 foi criado o Parque Nacional da Chapada Diamantina e o garimpo se tornou então uma atividade ilegal (http_2).

Com a criação do Parque Nacional, antigas trilhas, abertas pelos garimpeiros, começaram a ser usadas para o trekking (caminhadas feitas com o espírito de entrar em contato com a natureza).

Em 1992, um grupo de amigos organizou uma viagem para a Chapada Diamantina. Um dos participantes, maravilhado com a beleza natural da região, percebeu aí uma oportunidade de se criar uma empresa que oferecesse atividades de caminhada e travessia e criou a Venturas & Aventuras.

A Venturas & Aventuras, desde a sua criação, tinha uma cultura empresarial voltada para a ecologia. Uma de suas preocupações centrais era minimizar o impacto ambiental e social de suas atividades. Com o tempo, a empresa percebeu que o produto que oferecia, o ecoturismo, para ser viável e proporcionar aos seus clientes a qualidade que esperavam, demandava mais que isso: era preciso construir e manter uma interação ao mesmo tempo profunda e minimamente invasiva com o ambiente e com seus moradores. Ou seja, integrar-se a um sistema vivo e que existia antes dela.

O presente artigo tem por objetivo descrever e analisar a experiência da Venturas & Aventuras, de forma a mostrar as dificuldades encontradas e as soluções adotadas para superá-las. A análise mostra que a empresa passou por um processo de aprendizado e transformação, aderindo a vários princípios propostos pela ecologia profunda.

2 METODOLOGIA

O estudo, de caráter exploratório, baseou-se numa revisão da literatura relativa ao gerenciamento ecológico de empresas e ao ecoturismo e em um estudo de caso que teve por objeto a empresa Venturas & Aventuras. Como recomenda Yin (2001)YIN, R. Estudo de caso: planejamento e métodos. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2001., buscou-se reunir evidências de diferentes fontes. Para isso, recorreu-se às seguintes técnicas: pesquisa documental sobre a empresa e a região na qual iniciou e ainda concentra grande parte de suas atividades (Chapada Diamantina); entrevista em profundidade com um dos sócios-fundadores, atualmente responsável pela gerência administrativa do negócio; e um trabalho de campo, com duração de quinze dias, na Chapada Diamantina, que viabilizou a observação e a realização de entrevistas espontâneas em dois dos roteiros turísticos oferecidos pela empresa.

3 NOVO PARADIGMA: ECOLOGIA PROFUNDA - UM MODELO DE GERENCIAMENTO ECOLÓGICO

Durante muito tempo, os objetivos da Administração focalizaram essencialmente os resultados econômicos das organizações. Depois da Segunda Guerra, principalmente na Europa, eles passaram a incorporar uma dimensão social (proteção de emprego e condições humanas de trabalho, entre outros) (CALLENBACH et al., 1993CALLENBACH, E.; CAPRA, F.; GOLGMAN, L.; LUTS, R.; MARBURG, S. Gerenciamento ecológico: Guia do Instituto Elmwood de Auditoria Ecológica e Negócios Sustentáveis. São Paulo: Cultrix/ Amaná, 1993.).

Durante as décadas de 1970 e 1980, ocorreram desastres ambientais (Seveso, Bhopal, Chernobyl e Valdez, entre outros), que fizeram que a população começasse a se preocupar com o meio ambiente, iniciando, assim, um processo de conscientização ambiental. O conceito de Administração foi ampliado e passou a incluir a proteção ambiental entre seus objetivos (BOGO, 1998BOGO, J. M. O sistema de gerenciamento ambiental segundo a ISO 14001 como inovação tecnológica na organização. 1998. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) - Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 1998.). Foi nessa época que começou a se difundir, inicialmente na Alemanha, a terminologia introduzida pelo filósofo norueguês Arne Ness, na década de 1970, para distinguir duas formas de preocupação ambiental: ambientalismo superficial e ecologia profunda.

O ambientalismo superficial ou administração ambiental baseia-se em um paradigma mecanicista, no qual o mundo é visto como uma máquina com partes separadas entre si, e, conseqüentemente, seus problemas podem ser tratados de forma isolada. Esse paradigma considera que a natureza possui somente valor de uso. Aceita a ideologia do crescimento econômico, em que questões ambientais são abordadas de forma essencialmente defensiva e reativa (CALLENBACH et al., 1993CALLENBACH, E.; CAPRA, F.; GOLGMAN, L.; LUTS, R.; MARBURG, S. Gerenciamento ecológico: Guia do Instituto Elmwood de Auditoria Ecológica e Negócios Sustentáveis. São Paulo: Cultrix/ Amaná, 1993.).

A gestão ecológica ou ecologia profunda (também conhecida como administração ecológica ou gerenciamento ecológico) é um novo paradigma que pode ser descrito como sistêmico, em referência ao seu embasamento na chamada teoria dos sistemas. Essa abordagem trata o mundo de forma holística, isto é, como um todo integrado; os problemas ecológicos não podem mais ser entendidos isoladamente, pois são, na verdade, problemas sistêmicos - interligados e interdependentes.

A ecologia profunda tem por objetivo minimizar o impacto ambiental e social das empresas, tornando todas as suas operações tão ecologicamente corretas quanto possível. Envolve mudanças básicas na cultura empresarial: todas as operações devem ser revistas sob o seu ponto de vista (CALLENBACH et al., 1993CALLENBACH, E.; CAPRA, F.; GOLGMAN, L.; LUTS, R.; MARBURG, S. Gerenciamento ecológico: Guia do Instituto Elmwood de Auditoria Ecológica e Negócios Sustentáveis. São Paulo: Cultrix/ Amaná, 1993.).

3.1 ECOLOGIA PROFUNDA E AS ORGANIZAÇÕES

Nesse novo paradigma, as organizações devem ser vistas como um macros-sistema aberto, formado por partes em constante interação e com uma relação de interdependência com o ambiente. Nesse contexto, uma organização pode ser entendida como um processo que procura transformar recursos em produtos, bens e serviços, mas sempre em consonância com seu modelo de gestão, missão, crenças e valores corporativos (KINLAW, 1997KINLAW, D. C. Empresa competitiva e ecológica. São Paulo: Makron Books, 1997.; ANDRADE; TACHIZAWA; CARVALHO, 2002ANDRADE, R. O. B; TACHIZAWA, T.; CARVALHO, N. B. Gestão ambiental: enfoque estratégico ao desenvolvimento sustentável. 2. ed. São Paulo: Makron Books/Pearson Education, 2002.).

A consciência ecológica por parte das organizações alterou o conceito de qualidade de produto, que passou a ter de ser ecologicamente viável, isto é, as empresas passaram a adotar novas práticas de negócios por meio da criação de produtos verdes (SOUZA, 1993SOUZA, M. T. S. Rumo à prática empresarial sustentável. Revista de Administração de Empresas, EAESP/FGV, São Paulo, jul./ago. 1993.).

Não foram apenas as organizações que adquiriram uma consciência ambiental; as pessoas também se conscientizaram do valor da natureza e começaram a se interessar por atividades ecologicamente corretas. Surgiram novos interesses, novas formas de diversão e, naturalmente, novas formas de se viajar a turismo. Surgiu o conceito de turismo verde ou ecoturismo.

4 A CHAPADA DIAMANTINA

A Chapada Diamantina é uma área montanhosa, de aproximadamente 38 mil quilômetros quadrados, com uma diversidade de ecossistemas como cerrado, caatinga, florestas, cavernas, rios, cachoeiras, grutas e formações rochosas (http_1).

Na região serrana da Chapada, nascem vários rios, que cavaram cânions profundos, geraram enormes cachoeiras, como a Cachoeira da Fumaça (a mais alta do Brasil, com 400 metros), e formaram cavernas, como a Caverna de Iraguara e o Poço Encantado (http_2) (http_3).

Em 1985, por meio de um decreto federal, foi fundado o Parque Nacional da Chapada Diamantina, que passou a ser administrado pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). Um dos mais bonitos parques brasileiros, ocupa uma área de 1.520 quilômetros quadrados, localizada na região central do Estado da Bahia, pertencendo aos municípios de Lençóis, Andaraí, Palmeiras, Mucugê e Ibicoar.

Com esse cenário, a Chapada rapidamente se tornou um importante pólo de turismo ecológico. Antigas trilhas, abertas pelos garimpeiros, são usadas hoje para o trekking, atraindo pessoas de todo o mundo (http_5).

4.1 GARIMPO NA CHAPADA

Antes do século XVIII, a Chapada era habitada somente pelos índios das tribos maracás e cariris. O seu solo, por ser muito ácido, não favorecia a agricultura de subsistência e a presença de diamantes na região era pouco conhecida; os brancos apenas ouviam dos índios sobre a existência de diamantes.

Por volta de 1710, foi descoberto ouro no sul da Chapada, mas a região só começou a ficar conhecida por volta de 1750, quando os primeiros bandeirantes chegaram ao local e descobriram seus diamantes.

No século XVIII, a produção de ouro era tão alta que a Coroa portuguesa restringiu sua exploração ao Distrito Diamantífero de Minas Gerais, contendo, assim, o êxodo da população para a Chapada. Dessa forma, a região permaneceu desocupada até início do século XIX (http_7).

No século XIX, quando as lavras em Minas começaram a diminuir, a mineração na Chapada foi liberada. Nessa ocasião, em Mucugê, foi descoberta uma grande quantidade de diamantes, que, divulgada em 1844, começou a tornar a Chapada famosa. Essa descoberta fez que, em 1850, fosse iniciada uma corrida do diamante. Pessoas de todos os lugares, entre elas muitos garimpeiros, fugindo de regiões em crise em razão do fim do ciclo do ouro, mudaram-se para a Chapada e começaram a povoar a região (http_4).

Durante cerca de três décadas no século XIX, a Chapada se viu povoada por mais de 25 mil pessoas, a maioria garimpeiros, vivendo precariamente em tendas e locas. Esse período passou a ser conhecido como ciclo do diamante. Foram nascendo as primeiras vilas, povoados e cidades: Mucugê, Andaraí e Lençóis, que se tornou a capital do diamante. O nome Lençóis tem origem na própria maneira de ser dos garimpeiros, que armavam suas barracas de toldo, parecendo lençóis estendidos, às margens dos rios mais ricos em diamantes (http_5).

A região da Chapada tornou-se tão importante que o governo da província cogitou transferir para lá a capital do Estado e o governo francês chegou a abrir um vice-consulado em Lençóis. Suas jazidas se mostraram tão ricas que, durante o ciclo do diamante, o Brasil se tornou o primeiro produtor mundial desse mineral. O nome da região data dessa época.

A fase áurea do ciclo do diamante durou até 1870. Depois, os minerais começaram a se esgotar e a produção diamantífera entrou em crise. Para agravar a situação, em 1865 foram descobertas jazidas de diamantes na África do Sul, mais próximo da Europa e, portanto, de exploração mais viável, diminuindo ainda mais o interesse pela Chapada.

O colapso da Chapada só não foi completo porque, nessa região, também eram encontrados depósitos de carbonates, um pedregulho preto ignorado até o ano de 1871, mas que passou a ser valorizado com a Revolução Industrial (http_ 7). Na primeira década do século XX, os carbonatos perderam sua importância, o que, juntamente com a diminuição da produção de minérios, fez que a busca por diamantes na Chapada deixasse de ser lucrativa, resultando na queda drástica da atividade econômica e na decadência das cidades.

Para agravar a situação, a Chapada, já empobrecida, começou a ser disputada por coronéis. Após a Revolução de 1930, a região, que já se encontrava sem liderança política, teve o pouco que restava de sua economia destroçada e entrou num período de estagnação, marcado pela evasão dos moradores. Apesar desse êxodo, várias famílias de garimpeiros permaneceram e continuaram suas atividades de garimpo, que, em razão do número reduzido de remanescentes, se tornaram uma fonte de subsistência razoável (http_7).

Por fim, o governo brasileiro estabeleceu, em 1985, o Parque Nacional da Chapada Diamantina, proibindo o garimpo para assegurar sua preservação.

4.2 CONSEQÜÊNCIAS DA CRIAÇÃO DO PARQUE NACIONAL DA CHAPADA DIAMANTINA

Com a criação do Parque e a proibição do garimpo, teve início um processo de exclusão das comunidades que viviam na Chapada. Essas comunidades, que sempre tinham vivido do garimpo, viram-se, repentinamente, privadas do usufruto da terra, embora não tivessem sido expropriadas, nem indenizadas. Até hoje não foram tomadas medidas efetivas para regularizar a situação e desenvolver ações que viabilizassem a sobrevivência da população local (http_5).

Desde o ciclo do diamante, os garimpeiros passaram suas vidas minerando e ensinando aos seus filhos essa atividade; não sabem sobreviver de outra forma. A maioria mal sabe ler e escrever. Assim, ainda hoje, mesmo que ilegalmente, muitos continuam garimpando. Em geral, vivem isolados em morros e, ocasionalmente, encontram uma pequena pedra, valiosa o suficiente para comprar um pouco de alimento (http_2).

Por sua vez, a criação do Parque Nacional começou a atrair um novo tipo de população: turistas motivados por uma consciência ecológica e pelo desejo de conhecer suas riquezas naturais. Estava então criado um cenário propício para uma nova atividade que poderia também trazer benefícios para os ex-garimpeiros e suas famílias. Faltava só alguém com uma visão de negócio para tirar partido dessa oportunidade.

5 O ECOTURISMO

Ao longo das transformações econômicas e culturais ocorridas entre os anos 1960 e 1990, as questões ambientais foram adquirindo uma importância cada vez maior. A proteção e a preservação do ambiente tornaram-se valores cada vez mais fundamentais, tanto para os indivíduos quanto para as organizações (WELFORD; YTTERHUS, 1999WELFORD, R.; YTTERHUS, B. Conditions for the transformation of ecotourism into sustainable tourism. European Environment, John Wiley & Sons, v. 8, n. 6, p. 193-201, 1999.).

A noção de desenvolvimento sustentável deixou de girar apenas em torno de aspectos como o controle da poluição e passou a se referir a um controle integrado das práticas e dos processos produtivos das organizações (ANDRADE et al., 2002ANDRADE, R. O. B; TACHIZAWA, T.; CARVALHO, N. B. Gestão ambiental: enfoque estratégico ao desenvolvimento sustentável. 2. ed. São Paulo: Makron Books/Pearson Education, 2002.). Com grande rapidez, a preservação do meio ambiente tornou-se, na década de 1990, um dos maiores fatores de influência nos mercados. Empresas começaram a apresentar soluções para fomentar o desenvolvimento sustentável e, ao mesmo tempo, aumentar a lucratividade de seus negócios (LEMOS, 2002LEMOS, A. D. C. Green procurement activities: some environmental indicators and practical actions taken by industry and tourism. International Journal of Environment and Sustainable Development, v. 1, n. 1, p. 59-72, 2002.).

Essa conscientização abriu caminho para o desenvolvimento de novos produtos, novas oportunidades de negócios e novos mercados de trabalho, não só no setor industrial, como também no setor de serviços, como o ecoturismo. Na década de 1980, o turismo em áreas naturais representava 2% de todo o turismo; já no início deste século, estima-se que esse porcentual tenha chegado aos 20% (MOORE; SMITH; NEWSOME, 2003MOORE, S. A.; SMITH, A. J.; NEWSOME, D. Environmental performance reporting for natural area tourism: contributions by visitor impact management frameworks and their indicators. Journal of Sustainable Tourism, v. II, n. 4, p. 348-375, 2003.).

O ecoturismo tem a capacidade de contribuir para o desenvolvimento socio-econômico e cultural de um país, gerando novos empregos e tornando-se fonte de renda. Além disso, trata-se de uma atividade que vem atraindo, no mundo, um número crescente de adeptos: cada vez mais, as pessoas querem fugir das grandes cidades e conhecer lugares onde possam entrar em contato com a natureza. Essas pessoas podem levar riquezas aos moradores dessas áreas, geralmente isoladas e economicamente pouco ativas (RUSCHMANN, 2002RUSCHMANN, D. Turismo e planejamento sustentável. 9. ed. Campinas: Papirus, 2002.).

Algumas áreas, mesmo que protegidas por lei, como o Parque Nacional da Chapada Diamantina, se tornaram lugares atraentes para os turistas. Assim, se devidamente gerenciado, esse tipo de turismo pode se tornar uma excelente oportunidade de negócio, benéfica não só para os empreendedores, como também para os moradores dessas áreas.

O ecoturismo se propõe a ser um conjunto de bens e serviços que promova o desenvolvimento das comunidades locais, gerando benefícios à educação, à saúde e à segurança dessas comunidades (RUSCHMANN, 2002RUSCHMANN, D. Turismo e planejamento sustentável. 9. ed. Campinas: Papirus, 2002.; DIAS, 2003DIAS, R. Turismo sustentável e meio ambiente. São Paulo: Atlas, 2003.).

Essa modalidade de turismo não deve ser conduzida com um enfoque puramente econômico; deve procurar integrar o desenvolvimento urbano e rural, criando um centro de crescimento com investimentos na diversificação econômica regional, fazendo parte de um plano de desenvolvimento sustentável. O desenvolvimento precisa ser planejado de modo a assegurar a preservação do ambiente, o respeito às culturas locais e, ainda, a educação de moradores e turistas. O planejamento deve levar em conta as características biológicas, físicas, econômicas e sociais que os empreendimentos turísticos envolvem a fim de evitar um desequilíbrio ecológico, uma desagregação social e uma perda de valores culturais das comunidades anfitriãs (LEMOS, 2002LEMOS, A. D. C. Green procurement activities: some environmental indicators and practical actions taken by industry and tourism. International Journal of Environment and Sustainable Development, v. 1, n. 1, p. 59-72, 2002.).

5.1 ECOTURISMO NO BRASIL

As atividades turísticas no Brasil têm se intensificado nos últimos anos. Anualmente, cerca de 5,5 milhões de estrangeiros visitam o Brasil, e mais de 30 milhões de brasileiros realizam viagens domésticas, considerando somente as chegadas registradas nos aeroportos (BLAMEY, 1997BLAMEY, R. K. Ecotourism: the search for an operational definition. Journal of Sustainable Tourism, v. 5, n. 2, p. 109-130(22), 1997.).

O Brasil possui um potencial enorme para o ecoturismo: é um país de natureza privilegiada e de grandes proporções, com uma área de 8.547.403 quilômetros quadrados; é o quarto maior país do mundo, sendo menor apenas que o Canadá, a China e os Estados Unidos. Além disso, possui um clima favorável durante grande parte do ano e é um dos países de natureza mais rica e de maior biodiversidade do planeta, com uma grande variedade de culturas e etnias. Possui as maiores reservas de água doce e um terço das florestas tropicais ainda preservado.

Apesar desse enorme potencial e da intensificação da atividade, o ecoturis-mo no Brasil ainda é incipiente; o turismo, no país, tem se concentrado nas áreas urbanas, onde em geral encontram-se as principais atrações (http_6).

6 VENTURAS & AVENTURAS:

PIONEIRISMO NO ECOTURISMO NA CHAPADA

Por volta de 2000, muitas empresas perceberam que esse tipo de turismo poderia ser um negócio promissor; surgiram serviços voltados para temas ecológicos e várias operadoras tradicionais começaram a pintar de verde os seus roteiros, mas com o espírito do turismo convencional, tipicamente urbano, e sem uma visão sistêmica desse novo tipo de atuação. Tal opção, além de acarretar experiências decepcionantes para os clientes, deixa a questão ambiental em segundo plano (http_6).

A ecologia profunda propõe que as organizações passem a adotar uma visão sistêmica a fim de poderem visualizar as inter-relações entre recursos captados e valores por elas obtidos. Esse enfoque pressupõe que as organizações analisem o meio ambiente, definindo o cenário provável, de longo prazo, a partir do qual os objetivos institucionais e estratégicos devem ser delineados, sendo depois identificados os processos fundamentais necessários para dar apoio ao delineamento estratégico (CALLENBACH et al., 1993CALLENBACH, E.; CAPRA, F.; GOLGMAN, L.; LUTS, R.; MARBURG, S. Gerenciamento ecológico: Guia do Instituto Elmwood de Auditoria Ecológica e Negócios Sustentáveis. São Paulo: Cultrix/ Amaná, 1993.).

A idéia da criação da Venturas surgiu de um grupo de amigos que, por terem um interesse comum em fazer caminhadas, costumavam organizar viagens. Um dos participantes percebeu na Chapada uma oportunidade; um cenário no qual seria possível criar um produto verde, ecologicamente viável, capaz de atrair turistas oferecendo atividades de caminhada e travessia. Assim, a empresa Venturas & Aventuras, com sede em São Paulo, foi fundada no dia 11 de abril de 1992 e, em julho desse ano, organizou sua primeira viagem comercial, em um ônibus partindo da capital paulista para a Chapada.

A idéia dos fundadores era que o principal benefício para os turistas seria a exposição a situações inusitadas e singulares, que levassem a reflexões sobre a natureza, a vida e descobertas sobre si mesmos, capazes de contribuir para uma melhora do bem-estar e da auto-estima (MARINCEK, 2003MARINCEK, J. Entrevista com o proprietário da Venturas & Aventuras, em 7 dez. 2003.).

Além disso, os fundadores da empresa tinham preocupações ecológicas e uma consciência da necessidade de tratar o meio ambiente de forma responsável. Assim, a empresa iniciou suas atividades e foi, aos poucos, estruturando suas operações e construindo sua cultura, buscando simplesmente fazer o que lhe parecia correto (MARINCEK, 2004_________. Entrevista com o proprietário da Venturas & Aventuras, em 8 maio 2004.).

O MODELO DO NEPAL

Em 1993, um dos donos da Venturas fez um trekking no Nepal e percebeu que o sistema utilizado naquela região poderia, com algumas adaptações, ser trazido para a Chapada. Por ser o país que abriga o sistema de cordilheiras do Himalaia, onde se encontram as montanhas mais altas do mundo, incluindo o Monte Everest, o Nepal é o local mais cobiçado por alpinistas e andarilhos de todo o planeta; nesse país, o turismo conta com o apoio da população local (sherpas), cujo conhecimento é indispensável para percorrer a região. Os sherpas atuam como anfitriões e guias dos turistas e boa parte deles vive dessas atividades. O sócio da Venturas teve a idéia de começar a fazer o mesmo na Chapada. Assim, gradativamente, a empresa começou a inserir a comunidade local no processo de desenvolvimento turístico, o que muito contribuiu para o seu sucesso (MARINCEK, 2004_________. Entrevista com o proprietário da Venturas & Aventuras, em 8 maio 2004.).

Por ser o sonho de todo aventureiro, o turista que decide ir ao Himalaia vai independentemente de qualquer condição oferecida. Na verdade, no Himalaia, são os clientes que se adaptam às condições locais. Eles se acostumam à alimentação asiática e a dormir em instalações coletivas destituídas de qualquer conforto e privacidade (MILLEVILLE; MAJUPURIA, 1991MILLEVILLE, R.; MAJUPURIA, T. C. Magnificent Nepal Himalaya. Tailândia: Tec Press Service LP, 1991.). O mesmo não podia ser feito com os turistas interessados em descobrir as riquezas naturais da Chapada. Assim, ao se adotar o esquema visto no Nepal, foi necessário fazer várias adaptações. Em especial, era preciso proporcionar aos visitantes um mínimo de bem-estar e conforto. Porém, o único conhecimento que os moradores da Chapada possuíam era voltado para o garimpo; então, foi preciso capacitá-los para que adquirissem condições de exercer novas atividades voltadas para o turismo, como guiar, cozinhar, hospedar.

A VENTURAS E OS MORADORES DA CHAPADA

A Chapada possui grande diversidade de belezas naturais, com inúmeras possibilidades de atrações. Logo se constatou que a região poderia atrair clientes com perfis e expectativas bem variados. Assim, a Venturas foi aos poucos oferecendo uma variedade de roteiros distintos pela Chapada, de acordo com o perfil do cliente, como Chapada Básica, Travessia do Vale do Pati e Travessia da Fumaça, entre outros.

Em alguns roteiros, como na Travessia do Pati, os turistas passam o dia cruzando matas desertas e, no fim de cada dia, se hospedam em casas de moradores. Essas casas são muito simples, sem luz elétrica, sem forro no teto, com chão batido... As famílias cuidam da estada dos grupos de turistas, assumindo desde o fornecimento de roupas de cama, toalhas, alimentação, até a responsabilidade de guiar o grupo em alguns trechos e transportar seus pertences (em burros ou jegues de sua propriedade). Apesar de toda a simplicidade, os moradores locais adquiriram uma noção de como se deve receber um turista. Por exemplo, em algumas casas, o turista encontra a cama feita, com uma toalha limpa dobrada e um sabonete em cima (FERREIRA; CHAUVEL, 2004FERREIRA, S. B. L.; CHAUVEL, M. A. Gerenciamento ecológico: do garimpo ao empreendedoris-mo ambiental e socialmente responsável. In: EnAMPAD, 28., 2004, Curitiba. Proceedings... Curitiba, 2004.).

Já em outros roteiros, como na Chapada Básica, os turistas pernoitam em pousadas convencionais; mas esses roteiros eventualmente oferecem atividades de apenas um dia em propriedades de famílias locais, como é o caso do passeio no Poço do Roncador, descoberto em um terreno de moradores da Chapada. Nesses trechos, as famílias oferecem o almoço e seus membros são contratados como guias para as atividades nas propriedades, como o mergulho pelo poço.

A Venturas vem realizando esse tipo de ação junto às famílias de ex-garimpeiros desde a sua fundação. De acordo com um dos proprietários, essa capacitação não ocorreu apenas por uma questão de gestão ambiental e social, mas porque era preciso prestar um serviço com um padrão que atendesse às necessidades dos clientes. Por exemplo, oferecer instalações sanitárias básicas, mosquiteiros, adaptar a comida típica. Uma peça fundamental do processo de capacitação foi o sócio José Orestes de Macedo Moura, conhecido por Terra, que conduziu in loco muitas ações junto à comunidade (MARINCEK, 2004_________. Entrevista com o proprietário da Venturas & Aventuras, em 8 maio 2004.).

Com essa iniciativa, os fundadores da Venturas começaram a estabelecer um relacionamento mais estreito com os moradores. Ao levarem pessoas para a Chapada, abriram novas oportunidades para os ex-garimpeiros, proporcionando-lhes a chance de exercer atividades não-ilícitas. Hoje, as atividades da empresa fornecem trabalho a um total de cinco famílias no Vale do Pati. Além disso, vários nativos são contratados como guias e suporte.

A orientação às famílias que recebem os clientes passou a ser constante; receber turistas tornou-se uma rotina nas suas vidas, uma vez que o serviço oferecido pela empresa é semanal. Segundo um dos proprietários, “o Estado não poderia fazer algo semelhante, pois se trata de uma tarefa que demanda um trabalho contínuo e um contato constante com os moradores e que só se tornou viável pelo fato de este ser o negócio da empresa” (MARINCEK, 2003MARINCEK, J. Entrevista com o proprietário da Venturas & Aventuras, em 7 dez. 2003.).

O conceito de ecoturismo incorpora a idéia desse tipo de ação. Uma vez comprovado ser economicamente viável e sustentável, esse tipo de turismo passou a ser orientado para o desenvolvimento da comunidade, incorporando os valores da cultura local. Além de ajudar na proteção de algumas áreas verdes, o ecoturismo bem planejado regulariza o desenvolvimento econômico e o uso de recursos naturais (http_6).

6.1 ESTRATÉGIA: ESPECIALIZAÇÃO

Na ocasião da criação da Venturas & Aventuras, a empresa levava cerca de cinqüenta pessoas por ano. Nessa fase, seus criadores começaram a identificar os processos-chave que delineariam sua estratégia, criando as condições para estabelecer a configuração organizacional da empresa e os recursos necessários para o alcance de seus objetivos estratégicos (ANDRADE; TACHIZAWA; CARVALHO, 2002ANDRADE, R. O. B; TACHIZAWA, T.; CARVALHO, N. B. Gestão ambiental: enfoque estratégico ao desenvolvimento sustentável. 2. ed. São Paulo: Makron Books/Pearson Education, 2002.).

Aos poucos, o empreendimento foi sendo ampliado. Seus fundadores procuraram transformar os recursos naturais da Chapada da Diamantina em pro-dutos, bens e serviços, mas sempre em consonância com seu modelo de gestão, missão, crenças e valores corporativos.

Hoje, decorridos doze anos, a empresa passou a ser reconhecida como uma companhia que oferece produtos diferenciados, inovadores, elaborados e seguros. Até o ano de 2003, já tinha transportado mais de sete mil pessoas para conhecer lugares diferentes e, na maioria das vezes, poucos visitados (com uma média anual de 1.100 passageiros nos últimos três anos). Além disso, as atividades também foram diversificadas e passaram a incluir o enduro a pé, a expedição simulada, o arvorismo, o rapel, a tirolesa, o canyoning e o rafting (http_1).

Os consumidores finais, cada vez mais orientados para a ecologia e conscientes dos danos que as empresas e seus produtos podem causar ao ambiente, passaram a demandar da Venturas uma postura diferenciada. Uma empresa cujo produto consiste de roteiros ecológicos deve ser altamente especializada, pois é preciso conhecer profundamente o ambiente para poder oferecer aos clientes uma experiência ao mesmo tempo valiosa, diferente, emocionante e segura. Isso sem deixar de lado um mínimo de conforto. A Venturas rapidamente percebeu que, quanto mais elaborado o nível de especialização dos produtos oferecidos, mais difícil seria para a concorrência imitá-la. Em vez de tentar explorar diversos lugares, criando uma variedade de destinos, resolveu focar em um número reduzido de locais para operar, optando por conhecer a fundo esses locais de forma a proporcionar um serviço diferenciado. No decorrer dos anos, outros parques nacionais, localizados em vários Estados, foram incluídos, mas a Chapada ainda é o carro-chefe da empresa.

Em todos os destinos, porém, as parcerias foram fundamentais (MARINCEK, 2003MARINCEK, J. Entrevista com o proprietário da Venturas & Aventuras, em 7 dez. 2003.). A Venturas sempre procurou selecionar guias locais e os treinou, visando priorizar o cliente para poder oferecer um atendimento exclusivo. Junto com esses guias, a equipe da Venturas conseguiu desvendar muitas trilhas, hoje também utilizadas por outras empresas.

A especialização e as parcerias tornaram a Venturas uma empresa peculiar, cujo diferencial aparece em pequenos detalhes e na postura da equipe. Um dos sócios cita o exemplo do guia de uma empresa de turismo convencional, que, ao perceber a iminência de uma chuva, propõe um programa alternativo, como voltar à cidade para tomar uma cerveja. Já o guia da Venturas, por ter sido criado na região, conhece o ambiente; ele sabe que a chuva logo passará; também sabe onde se abrigar, podendo levar o grupo para uma toca. A chuva passa, vem o arco-íris e todos podem admirá-lo, em vez de se contentar com o programa tipicamente urbano e não muito original proposto pelo concorrente (MARIN-CEK, 2003).

7 CULTURA DE UMA EMPRESA ORIENTADA À ECOLOGIA PROFUNDA

O processo de ampliar e redefinir a cultura empresarial, de forma que ela reflita o paradigma da ecologia profunda, é complexo e ultrapassa o escopo do presente artigo; a Venturas & Aventuras foi escolhida para ser objeto do presente estudo por apresentar, desde a sua criação, diversas características e desenvolver uma série de ações que são elementos-chave para essa mudança. Na realidade, a Venturas & Aventuras pode ser considerada um exemplo de organização que já foi criada com uma cultura ecologicamente consciente, orientada às práticas da ecologia profunda.

7.1 CULTURA DE UMA EMPRESA

Uma cultura empresarial ecologicamente consciente tem a perspectiva de que todos os problemas são interligados e interdependentes, e, portanto, devem ser tratados de forma sistêmica. Essa cultura precisa ser orientada por determinados valores (CALLENBACH et al., 1993CALLENBACH, E.; CAPRA, F.; GOLGMAN, L.; LUTS, R.; MARBURG, S. Gerenciamento ecológico: Guia do Instituto Elmwood de Auditoria Ecológica e Negócios Sustentáveis. São Paulo: Cultrix/ Amaná, 1993.). O Quadro 1 apresenta os valores que orientam uma cultura empresarial ecologicamente consciente.

QUADRO 1
VALORES DE UMA CULTURA EMPRESARIAL ECOLOGICAMENTE CONSCIENTE

7.2. TORNANDO-SE UMA EMPRESA ORIENTADA À ECOLOGIA PROFUNDA

MUDANÇAS DE OBJETOS PARA RELAÇÕES

As empresas que desejam conduzir seus negócios com uma orientação à ecologia profunda devem ter consciência de que, para isso, é preciso mudar sua visão, passando de uma abordagem mecanicista a um pensamento sistêmico. O mundo e as organizações devem deixar de ser vistos como máquinas, que podem ser dominadas e controladas, e passar a ser tratados como sistemas vivos, que devem então ser “cultivados”, isto é, devem ser considerados como uma teia inseparável de relações e não mais como uma reunião de objetos separados. Como sistema vivo, uma organização não pode ser rigidamente controlada por meio de intervenção direta, mas pode ser influenciada pela transmissão de orientações e emissão de impulsos; esse novo estilo de administração é conhecido como administração sistêmica (CAL-LENBACH et al. 1993; ANDRADE; TACHIZAWA; CARVALHO, 2002ANDRADE, R. O. B; TACHIZAWA, T.; CARVALHO, N. B. Gestão ambiental: enfoque estratégico ao desenvolvimento sustentável. 2. ed. São Paulo: Makron Books/Pearson Education, 2002.).

A forma como a Venturas conduz seus negócios revela que se trata de uma empresa com consciência de que o mundo é um sistema vivo com relações interligadas. Isso pode ser percebido ao longo dos roteiros oferecidos, que incluem a hospedagem em casa de moradores.

Preparar ex-garimpeiros, acostumados a explorar a terra sem nenhum critério ou cuidado, a adquirir essa consciência, foi um desafio para a empresa. Por exemplo,

se o barqueiro contratado amassava o maço de cigarros e o jogava no rio, era importante que ele passasse a perceber que, com essa atitude, estava comprometendo o serviço prestado pela empresa e, portanto, além da questão de consciência ambiental, a empresa passaria a ter problemas de qualidade nos serviços prestados. Na verdade, tudo está relacionado a atitudes e comportamentos (MA-RINCEK, 2003).

Para viabilizar esse processo de conscientização, no início das atividades na Chapada, os donos da empresa acompanhavam todos os grupos. Então, promoveu-se o treinamento tanto da pessoa que futuramente assumiria a responsabilidade pelas atividades na Chapada como dos fornecedores de serviços.

Por exemplo, no início, quando era necessário levar um lanche de trilha no roteiro da Chapada Básica, os próprios donos da empresa, que, na época, atuavam como guias, precisavam levar mantimentos de São Paulo e depois acordar às cinco horas da manhã para preparar os kits dos clientes. Posteriormente, a Venturas percebeu que poderia ensinar aos empregados que trabalhavam nas pousadas onde os clientes ficavam hospedados como esses lanches deveriam ser preparados, tornando o trabalho dos guias menos cansativo. Com isso, passou a envolver e orientar pessoas que participavam do processo, mas que eram, até então, peças secundárias no seu funcionamento, tornando-as parte de um sistema, integrando-as à teia de relações que precisava ser criada e cultivada para assegurar o êxito do empreendimento.

De uma maneira popular, pode-se dizer que esse processo foi e ainda é um “trabalho de formiguinha”, feito aos poucos e com participação de todos. Vale destacar também que a empresa usava - e ainda usa - como referência para esse trabalho as avaliações dos clientes, coletadas ao longo dos anos. É mais uma indicação de que as relações, inclusive as com os clientes, devem ser tratadas de forma sistêmica e interligada (MARINCEK, 2003MARINCEK, J. Entrevista com o proprietário da Venturas & Aventuras, em 7 dez. 2003.).

MUDANÇAS DE IDEOLOGIA DO CRESCIMENTO PARA A SUSTENTABILIDADE ECOLÓGICA

O gerenciamento ecológico não questiona a ideologia do crescimento econômico, principal força motriz das atuais políticas econômicas. Ele implica o reconhecimento de que o crescimento econômico ilimitado em um planeta finito só pode levar a um desastre, introduzindo assim a sustentabilidade ecológica como critério fundamental de todas as atividades de negócios (ANDRADE; TACHIZA-WA; CARVALHO, 2002ANDRADE, R. O. B; TACHIZAWA, T.; CARVALHO, N. B. Gestão ambiental: enfoque estratégico ao desenvolvimento sustentável. 2. ed. São Paulo: Makron Books/Pearson Education, 2002.).

Muitas vezes, desenvolvimento é confundido com crescimento econômico. O crescimento econômico é o crescimento contínuo do produto nacional em termos globais ao longo do tempo; depende do consumo crescente de energia e de recursos naturais. Tende a ser insustentável, pois leva ao esgotamento dos recursos naturais (http_6). Já o desenvolvimento econômico representa não apenas o crescimento da produção nacional, mas também a forma como essa é distribuída social e setorialmente (ANDRADE; TACHIZAWA; CARVALHO, 2002ANDRADE, R. O. B; TACHIZAWA, T.; CARVALHO, N. B. Gestão ambiental: enfoque estratégico ao desenvolvimento sustentável. 2. ed. São Paulo: Makron Books/Pearson Education, 2002.).

O desenvolvimento sustentável é capaz de suprir as necessidades da geração atual sem comprometer a capacidade de atender às necessidades das futuras gerações, isto é, sem esgotar os recursos para o futuro. Para ser alcançado, depende de planejamento e do reconhecimento de que os recursos naturais são finitos (LEMOS, 2002LEMOS, A. D. C. Green procurement activities: some environmental indicators and practical actions taken by industry and tourism. International Journal of Environment and Sustainable Development, v. 1, n. 1, p. 59-72, 2002.; http_6).

O desenvolvimento sustentável é caracterizado por qualidade em vez de quantidade, e deve ser acompanhado de uma redução do uso de matérias-primas e produtos e do aumento da reutilização e da reciclagem. Em parques nacionais, algumas medidas podem ser tomadas para estimular o desenvolvimento sustentável, como cobrar taxas de utilizaçao e utilizar o valor arrecadado para a manutenção dos parques e a capacitação de pessoas para orientar os visitantes (BARNTHOUSE; STAHL, 2002BARNTHOUSE, L. W.; STAHL Jr., R. G. Quantifying natural resource injuries and ecological service reductions: challenges and opportunities. International Journal of Environmental Management, Springer-Verlag, Nova York, v. 30, n. 1, p. 1-12, 2002.; STAGL, 2001STAGL, S. Preferences, needs and sustainability. International Journal of Sustainable Development, v. 4, n. 1, 2001.).

Apesar de ter sido estabelecido em 1985, o Parque Nacional da Chapada ainda não está totalmente regularizado e, portanto, a cobrança oficial pelo acesso é quase inexistente. No entanto, atualmente já existem diversas contribuições voluntárias, por parte de pessoas físicas e de operadoras. A Venturas & Aventuras é uma operadora que faz questão de contribuir o máximo possível. Ao viajar para a Chapada Diamantina com a Venturas, o cliente assume, para com a empresa, a responsabilidade de contribuir para a preservação ambiental, social e cultural do “Coração da Bahia (http_1). Cada passageiro que vai até a Chapada permite que a Venturas contribua com uma doação de R$ 2,50 para o Grupo Ambientalista de Palmeiras (GAP), R$ 2,50 para a Associação Grãos de Luz, R$ 1,00 para a Associação de Moradores do Remanso, R$ 1,00 para a Associação de Condutores de Visitantes do Vale do Capão e R$ 1,00 para a Associação de Guias de Ecoturismo da Chapada Diamantina (MARINCEK, 2003MARINCEK, J. Entrevista com o proprietário da Venturas & Aventuras, em 7 dez. 2003.).

Mas só a cobrança de taxas não traz sustentabilidade. Com o treinamento dado pela Venturas, os moradores locais estão começando a se conscientizar de que devem administrar bem seus recursos, financeiros e naturais, para garantir seu sustento e o de seus descendentes. As famílias estão descobrindo novas formas de ganhar dinheiro sem recorrer a recursos naturais esgotáveis, como ocorria nos tempos do garimpo. A transformação de suas residências em uma opção de hospedagem representa uma alternativa significativa num ambiente em que as fontes de renda são escassas: a remuneração oferecida pela Venturas é de R$ 30/dia por passageiro, pela hospedagem dentro das casas com café-da-manhã e jantar. A Venturas paga essa quantia, superior à praticada pelo mercado local, justamente para poder exigir um serviço de ótima qualidade e assegurar às famílias uma melhor qualidade de vida, que, evidentemente, se reflete na qualidade da hospedagem.

As famílias têm autonomia para receber hóspedes que viajam por conta própria e cobrar-lhes os valores que julgarem adequados. Também podem cobrar valores menores para quem desejar montar uma barraca no terreno de suas casas. Esse trabalho tem outros reflexos: as crianças da nova geração de patizeiros estão constantemente recolhendo o lixo, que, infelizmente, ainda é deixado por alguns turistas...

MUDANÇAS DE PARTES PARA O TODO

Os sistemas vivos, organismos, sistemas sociais, organizações e ecossistemas constituem conjuntos integrados inseridos em conjuntos maiores, dos quais dependem. A natureza de todo sistema vivo deriva das relações entre seus componentes e das relações do sistema com o meio ambiente. O sistema deve ser sempre visto como um todo, pois as propriedades sistêmicas são destruídas quando um sistema é desmembrado em subsistemas isolados (CALLENBACH et al., 1993CALLENBACH, E.; CAPRA, F.; GOLGMAN, L.; LUTS, R.; MARBURG, S. Gerenciamento ecológico: Guia do Instituto Elmwood de Auditoria Ecológica e Negócios Sustentáveis. São Paulo: Cultrix/ Amaná, 1993.).

A Venturas começou a atuar de forma quase independente, trazendo turistas de fora, guiando-os com seus próprios recursos e conhecimentos, alimentando-os com produtos “importados” da cidade. Aos poucos, passou a se integrar a um sistema já existente: o da Chapada com seus recursos naturais, suas características culturais e ambientais e seus moradores. Com essa postura, todos acabaram se beneficiando: as famílias, que conseguiram se estruturar para ter uma melhor qualidade de vida; a empresa, que foi melhorando a eficiência de suas operações e a qualidade de seus serviços; e os turistas, que passaram a ter uma interação maior e mais rica com a região e seus moradores.

MUDANÇAS DA DOMINAÇÃO PARA PARCERIA

Uma empresa precisa compreender que um sistema vivo é muito mais bem-sucedido e compreendido quando abordado por meio da cooperação e da parceria; na natureza, a competição está intrinsecamente ligada à cooperação (CAL-LENBACH et al., 1993).

No início dos roteiros que prevêem hospedagem em casas de moradores, como na Travessia do Pati, a Venturas pagava para as famílias o valor que se paga para uma pousada em Lençóis e, naturalmente, a empresa solicitava que essas famílias oferecessem uma série de serviços, como roupa de cama, toalha limpa, sabonete... Mas as famílias não conseguiam administrar o valor recebido e depois tinham de recorrer à empresa. Como os moradores não se preocupavam com a gestão de seus recursos, a empresa foi, aos poucos, pagando mais para resolver seus problemas.

Com isso, a relação entre a Venturas & Aventuras e a população local foi se tornando cada vez mais paternalista. A empresa percebeu, então, que era preciso fazer algo para resolver a situação. Afinal, tratava-se de uma relação comercial, de um negócio no qual ambas as partes estavam interessadas. A Venturas resolveu mudar de atitude: começou a cobrar das famílias uma responsabilidade maior, mostrando-lhes a importância de administrar bem os seus recursos. Passou a demandar uma postura de parceria, deixando claro que se não fosse possível estabelecer relações recíprocas de responsabilidade e cooperação, procuraria outras soluções. Algumas pessoas estranharam e começaram a insinuar que a empresa estava querendo explorar os patizeiros. Mas logo as famílias envolvidas perceberam que, se conseguissem administrar bem seus recursos, a parceria com a empresa lhes seria benéfica (MARINCEK, 2003MARINCEK, J. Entrevista com o proprietário da Venturas & Aventuras, em 7 dez. 2003.).

MUDANÇAS DE ESTRUTURAS PARA PROCESSOS

Como toda estrutura é uma manifestação dos processos que a fundamenta, ao se ter um pensamento sistêmico, deve-se ter um pensamento orientado para processos. É importante lembrar que em um sistema os relacionamentos são dinâmicos e as oscilações desempenham um importante papel; o sistema atinge a estabilidade por meio de um equilíbrio dinâmico, caracterizado pelas constantes oscilações interdependentes de todas as variáveis (CALLENBACH et al., 1993CALLENBACH, E.; CAPRA, F.; GOLGMAN, L.; LUTS, R.; MARBURG, S. Gerenciamento ecológico: Guia do Instituto Elmwood de Auditoria Ecológica e Negócios Sustentáveis. São Paulo: Cultrix/ Amaná, 1993.).

Todas as pessoas envolvidas nos roteiros da Venturas têm consciência de que o estado de equilíbrio é dinâmico, sujeito a oscilações, e que o sistema deve ser flexível. Como o turismo ecológico é um empreendimento que depende fundamentalmente da natureza e de suas manifestações, eventualmente ocorrem fenômenos naturais que podem interferir em todo o planejamento de um roteiro. Assim, todos os processos que fundamentam o negócio devem ser orientados para rapidamente se adaptarem às oscilações da natureza de forma a não comprometerem o empreendimento.

O sistema Chapada Diamantina consiste em uma área montanhosa cercada por florestas, pastos, cavernas, rios, cachoeiras, lagos, grutas e formações rochosas (http_3). A Venturas procura escolher guias que conhecem bem a natureza local, de preferência nativos, que melhor podem orientar os processos envolvidos em uma travessia. Por exemplo, em um determinado dia, o céu estava tão claro que não indicava a proximidade de chuva, mas o guia, graças à sua experiência, intuiu que o tempo poderia mudar. Durante a noite, a chuva foi tão intensa que fez que as nascentes escondidas nas encostas da Chapada transbordassem, aparecendo o fenômeno da pororoca.

Com a pororoca, rios novos temporários, mas muito fortes, surgiram e longos pedaços de trilhas ficaram inacessíveis. Como o guia já tinha uma previsão de que isso aconteceria, tomou as medidas necessárias. O grupo passou o dia no terreno do morador, atividades alternativas foram realizadas e, rapidamente, foi providenciado um pernoite em uma casa alternativa, pois, com o atraso da travessia, não foi possível chegar à hospedagem prevista. Esse episódio mostra também como a experiência é um fator decisivo para a segurança; em roteiros que prevêem que as pessoas durmam em barracas, como o da Fumaça, o desconhecimento de uma possibilidade de pororoca poderia ter colocado em risco a vida de todos (FERREIRA; CHAUVEL, 2004FERREIRA, S. B. L.; CHAUVEL, M. A. Gerenciamento ecológico: do garimpo ao empreendedoris-mo ambiental e socialmente responsável. In: EnAMPAD, 28., 2004, Curitiba. Proceedings... Curitiba, 2004.).

MUDANÇAS DA AUTO-AFIRMAÇÃO PARA INTEGRAÇÃO

Um equilíbrio dinâmico e saudável nos sistemas vivos inclui o equilíbrio entre auto-afirmação e integração. Como conjuntos integrais, os sistemas vivos precisam afirmar-se em sua individualidade; como parte de um conjunto, precisam integrar-se em padrões maiores. Para uma cultura ecologicamente consciente é necessário enfatizar a auto-afirmação e valorizar mais a integração (CALLENBACH et al., 1993CALLENBACH, E.; CAPRA, F.; GOLGMAN, L.; LUTS, R.; MARBURG, S. Gerenciamento ecológico: Guia do Instituto Elmwood de Auditoria Ecológica e Negócios Sustentáveis. São Paulo: Cultrix/ Amaná, 1993.).

Em turismo ecológico, a integração dos indivíduos e a cooperação são fundamentais. No exemplo da pororoca, quando o rio temporário diminuiu de força, o grupo pôde cruzá-lo. A travessia do rio só foi concluída com êxito graças ao trabalho integrado e à cooperação de absolutamente todos os envolvidos no passeio: guia, clientes, os próprios donos da casa, condutores dos burros que transportam os pertences dos turistas. As pessoas tiveram de se dar as mãos, apoiando-se umas nas outras a fim de manter o equilíbrio e a força necessária para vencer o rio que, apesar de bem mais fraco, ainda tinha certa intensidade. Uma pessoa sozinha não conseguiria; foi preciso uma verdadeira corrente humana (FERREIRA; CHAUVEL, 2004FERREIRA, S. B. L.; CHAUVEL, M. A. Gerenciamento ecológico: do garimpo ao empreendedoris-mo ambiental e socialmente responsável. In: EnAMPAD, 28., 2004, Curitiba. Proceedings... Curitiba, 2004.).

A Venturas acredita que o turismo ecológico é uma experiência única que sensibiliza muito seus praticantes. Episódios como o da pororoca fazem que cada turista se sinta uma peça importante e perceba que cada pessoa é responsável pelo sucesso do grupo como um todo. Também fazem que todos os integrantes, guias, moradores e turistas, estabeleçam relações de cooperação e se juntem em prol da satisfação de todos.

8 CONCLUSÕES

O processo de conscientização ambiental iniciado nas décadas de 1970 e 1980 fez que as pessoas despertassem para a necessidade de preservar melhor o ambiente por meio de práticas de negócios ecologicamente corretas. O conceito de administração foi ampliado e passou a incluir a proteção ambiental entre seus objetivos; surgiu, assim, um novo paradigma: o da ecologia profunda.

A ecologia profunda tem por objetivo minimizar o impacto ambiental e social das empresas, tornando todas as suas operações tão ecologicamente corretas quanto possível. Para isso, elas precisam tratar o mundo e seus problemas de forma sistêmica, mudando sua filosofia, reconhecendo o valor intrínseco de todos os seres vivos e a existência de relações complexas entre esses e o meio ambiente.

A Venturas & Aventuras é uma empresa que iniciou suas atividades com idéias, interesses, aspirações e preocupações “ecológicas”. Desse ideal à prática, teve, porém, de rever uma série de orientações e práticas e examinar com mais profundidade os diversos desdobramentos de suas ações.

Criada em 1992, a empresa começou a atuar em um mercado já tomado por empresas tradicionais e bem conhecidas. Para ter sucesso, ela precisava oferecer um produto diferenciado. Para isso, buscou conhecer profundamente o ambien-te no qual atuava e optou por se especializar, focando um número reduzido de destinos e oferecendo roteiros genuinamente ecológicos.

Desde a sua criação, seus proprietários tiveram uma preocupação constante com a inserção da comunidade local no processo de desenvolvimento turístico.

A concepção da Venturas, baseada no modelo adotado no Nepal, prevê o uso da mão-de-obra local para suas atividades. Os moradores da Chapada durante séculos dedicaram-se apenas ao garimpo, atividade que se tornou ilegal com a criação do Parque Nacional da Chapada. Com o incentivo e o apoio da Venturas, tornaram-se guias e suas casas foram transformadas em meios de hospedagem. Para capacitá-los, foi necessário um programa que os preparasse para exercer essas novas atividades.

Essa capacitação não ocorreu apenas por uma questão de gestão ambiental e social, mas para permitir que a empresa prestasse um serviço com um padrão capaz de atender às expectativas de seus clientes.

Com essa iniciativa, seus fundadores começaram a ter uma forte responsabilidade para com os moradores da região e tiveram de estabelecer com eles relações de parceria, fundamentadas na cooperação e no compartilhamento de interesses.

As atividades desenvolvidas pela Venturas, além de ajudarem na proteção de áreas verdes, auxiliam a regularização do desenvolvimento econômico e o uso de recursos naturais, e podem vir a servir de modelo para a prática dessa atividade em áreas importantes ainda não protegidas pela legislação. O modelo de desenvolvimento adotado pela empresa demanda, porém, algo que nem todas as empresas possuem: uma cultura flexível e com visão holística de seu negócio e do ambiente no qual ele se desenvolve.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Out 2020
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2006

Histórico

  • Recebido
    13 Set 2005
  • Aceito
    15 Jun 2006
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