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O conhecimento do consumidor sobre preços: um exame de produtos de oito categorias de bens duráveis

Consumer price knowledge: an examination in eight product categories of durable goods

Resumos

Este artigo trata de tema pouco abordado no âmbito acadêmico estrangeiro e, mais ainda, no brasileiro: o conhecimento do consumidor sobre preços. Os objetivos foram descrever o conhecimento do consumidor sobre preços de produtos de distintas categorias de bens duráveis e avaliar os fatores envolvimento com o produto, exposição à propaganda e o uso da relação preço-qualidade como seus potenciais determinantes. Num esquema descritivo, um levantamento com duzentos consumidores foi realizado. Aplicaram-se testes do qui-quadrado e análises de regressão múltipla. Os dados revelaram significativas variações no conhecimento do consumidor sobre preços de produtos de oito categorias. Apenas um terço dos consumidores forneceu estimativas de preço para os produtos com razoável precisão, demonstrando que tal conhecimento é limitado. Algumas das relações entre o conhecimento do consumidor sobre preços e seus potenciais determinantes se mostraram significantes, mas tênues no poder de explicação. A pesquisa traz interessantes implicações acadêmicas e direcionamentos para a prática de marketing.

Consumidor; Conhecimento de preço; Envolvimento; Propaganda; Preço-qualidade


This paper deals with subject that merits further academic investigation: the Consumer Price Knowledge. The purposes of this study were to describe the Consumer Price Knowledge variation amongst products of distinct categories and verify the relation between it and the determinants Involvement with the Product, Advertising Exposure and Use of Price-Quality. Based on a descriptive design, a survey with 200 hundreds consumers was conducted. Qui-square test and multiple regression analysis were performed. At first, the consumer price knowledge in eight products categories revealed significant variations. This analysis also showed that only one third of the consumers provided products price estimates accurately, indicating limited knowledge. In addition, the results pointed that although the relation between consumer price knowledge and its potential determinants appeared for some products, it is tenuous. This paper brings interesting academic implications and marketing practices directions.

Consumer; Price knowledge; Involvement; Advertising; Price-Quality relation


O conhecimento do consumidor sobre preços: um exame de produtos de oito categorias de bens duráveis

Consumer price knowledge: an examination in eight product categories of durable goods

Marco Antônio SilvaI; André Torres UrdanII

IMestre em Administração de Empresas pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (EAESP-FGV). Professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e da Escola Superior de Engenharia e Gestão (Eseg-Etapa). Rua Professora Carolina Ribeiro, 91, ap. 72, Vila Mariana – São Paulo – SP – CEP 04416-020 E-mail: marcothe@gvmail.br

IIDoutor em Administração pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP). Professor titular da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV). Rua Itapeva, 474, sala 907, Cerqueira César – São Paulo – SP – CEP 01332-000 E-mail: andre.urdan@fgv.br

RESUMO

Este artigo trata de tema pouco abordado no âmbito acadêmico estrangeiro e, mais ainda, no brasileiro: o conhecimento do consumidor sobre preços. Os objetivos foram descrever o conhecimento do consumidor sobre preços de produtos de distintas categorias de bens duráveis e avaliar os fatores envolvimento com o produto, exposição à propaganda e o uso da relação preço-qualidade como seus potenciais determinantes. Num esquema descritivo, um levantamento com duzentos consumidores foi realizado. Aplicaram-se testes do qui-quadrado e análises de regressão múltipla. Os dados revelaram significativas variações no conhecimento do consumidor sobre preços de produtos de oito categorias. Apenas um terço dos consumidores forneceu estimativas de preço para os produtos com razoável precisão, demonstrando que tal conhecimento é limitado. Algumas das relações entre o conhecimento do consumidor sobre preços e seus potenciais determinantes se mostraram significantes, mas tênues no poder de explicação. A pesquisa traz interessantes implicações acadêmicas e direcionamentos para a prática de marketing.

Palavras-chave: Consumidor; Conhecimento de preço; Envolvimento; Propaganda; Preço-qualidade.

ABSTRACT

This paper deals with subject that merits further academic investigation: the Consumer Price Knowledge. The purposes of this study were to describe the Consumer Price Knowledge variation amongst products of distinct categories and verify the relation between it and the determinants Involvement with the Product, Advertising Exposure and Use of Price-Quality. Based on a descriptive design, a survey with 200 hundreds consumers was conducted. Qui-square test and multiple regression analysis were performed. At first, the consumer price knowledge in eight products categories revealed significant variations. This analysis also showed that only one third of the consumers provided products price estimates accurately, indicating limited knowledge. In addition, the results pointed that although the relation between consumer price knowledge and its potential determinants appeared for some products, it is tenuous. This paper brings interesting academic implications and marketing practices directions.

Key words: Consumer; Price knowledge; Involvement; Advertising; Price-Quality relation.

1 INTRODUÇÃO

O preço é o único elemento do composto de marketing que produz receita: os demais produzem custos. O preço também informa ao mercado o posicionamento de valor pretendido pela empresa para seu produto ou marca. Para gerir o apreçamento com eficácia, é preciso entender a perspectiva do consumidor sobre preços e adotar uma abordagem sistemática de estabelecimento, adaptação e mudanças nessa esfera crítica para as empresas (DOLAN; SIMON, 1996).

A gestão do apreçamento depende muito de quanto o consumidor sabe sobre preços, o que toca diretamente ao profissional de marketing, em que pesem as várias disciplinas que interferem nas decisões pertinentes. Afinal, melhora a decisão do consumidor quando informações mais adequadas ele detém sobre os preços no mercado. Mas esse conhecimento é dinâmico. A economia brasileira, após o Plano Real (1994), tende à estabilização de preços após décadas de inflação alta. O país recuperou algum crescimento, e a perspectiva é de expansão do con-sumo, incluindo o de bens duráveis. Isso deve estar melhorando a memória do consumidor brasileiro sobre preços, mas não se dispõe de medidas sobre isso.

Faz algum tempo que o conhecimento do consumidor sobre preços tornouse objeto de pesquisa acadêmica no exterior (CONOVER, 1986; DICKSON; SAWYER, 1990; KRISHNA et al., 1991; TURLEY; CABANNISS, 1995; WAKEFIELD; INMANN, 1993). A maioria desses estudos revelou esse conhecimento como limitado. Estelami e Lehmann (2001) e Monroe e Lee (1999) mostraram que a maior parte dos consumidores não é capaz de estimar os preços de produtos adequadamente. Deficiência ainda maior se verifica com bens duráveis. Porém, de 279 estudos revistos por Estelami e Lehmann (2001), somente onze trataram de bens duráveis, o que indica uma lacuna a sanar. Também pouco se sabe acerca de como o conhecimento sobre preços varia entre categorias de produtos e seus fatores determinantes.

Na academia brasileira, há pesquisas sobre preço sob o enfoque de marketing (ÁVILA; LORDELLO, 2001; BARBOSA; MARQUES, 2001; BOTELHO; URDAN, 2003; HERNANDEZ, 2003). Todavia, no país não foi localizado trabalho no domínio deste artigo. Aqui os objetivos foram descrever o conhecimento do consumidor sobre preços de produtos de distintas categorias de bens duráveis e avaliar os fatores envolvimento com o produto, exposição à propaganda e uso da relação preço-qualidade como seus potenciais determinantes. A seguir, este artigo está estruturado em quatro seções: revisão da literatura, método empírico, resultados e conclusões, limitações e pesquisas futuras.

2 REVISÃO DA LITERATURA

A revisão da literatura aqui, formando o arcabouço teórico para a consecução dos objetivos, abrange preço e valor percebido, variação do conhecimento de preço entre categorias de produtos, efeito do envolvimento do consumidor e bens duráveis, propaganda e exposição a anúncios de preços, preço como indicador de qualidade.

2.1 Preço e valor percebido

Na perspectiva econômica, preço é o que se dá em troca de bens e serviços, refletindo como os agentes econômicos (produtores e consumidores) se comunicam e utilizam os recursos eficientemente (STIGLITZ, 1993). Ele decorre do conceito de utilidade, como a satisfação que o produto gera para os agentes (VASCONCELOS, 2004). Mas profissionais de outras áreas, que não a de economia, vêem no preço mais do que forças de oferta e demanda (STIGLITZ, 1993). E isso dependerá de como o preço é visto, se sob a ótica de custos ou do mercado (HANNA; DODGE, 1995). Na primeira, os gestores se preocupam em recuperar os custos do produto mais um retorno sobre o investimento, ignorando o mercado. Na segunda, preço representa uma expressão monetária de valor percebido para a qualidade ou os benefícios do produto (DOLAN; SIMON, 1996). O consumidor compara esse sacrifício na percepção de valor do produto.

Os consumidores têm pelo menos quatro diferentes definições de valor percebido (ZEITHAML, 1998): a) é preço baixo; b) é obter o que se espera de um produto; c) é a qualidade que se obtém pelo preço pago; d) é aquilo que se obtém por aquilo que se paga. Em geral, valor percebido representa para o consumidor a utilidade de um produto tendo como base as percepções dos benefícios líquidos recebidos e aquilo de que ele deve abrir mão (MORRIS; MORRIS, 1994).

Pagam-se preços mais elevados por produtos tomados como dotados de mais valor (KASH, 2002). Cada cliente, no ato da compra, determina que produto, em relação aos outros da categoria, atende melhor às suas necessidades e proporciona o melhor valor percebido. Preço e valor percebido são as bases de cada transação (DOLAN; SIMON, 1996). Em geral, um consumidor compra um produto se

o valor percebido, em termos monetários, é maior do que o preço. Entre várias alternativas, o consumidor prefere aquele que oferece o maior valor percebido líquido, ou seja, a maior diferença entre valor percebido e preço. Essas considerações ajudam a descrever a reação do consumidor a preços e suas mudanças. Já neste artigo cabe aprofundar o que ocorre com o conhecimento sobre preços entre categorias de produto.

2.2 A variação do conhecimento de preço entre categorias de produtos

O conhecimento do consumidor sobre bens ou serviços é a quantidade de experiência e informação detidas sobre eles (ALBA; HUTCHINSON, 1987). A exposição do consumidor a informações do mercado pode iniciar um processo cujo resultado é a armazenagem de informações na sua memória (JACOBY; OLSON, 1977; MONROE; LEE, 1999). Segundo Mowen e Minor (2003), o conhecimento de um indivíduo acerca do ambiente de consumo está retido na memória permanente. À medida que tem maiores informações sobre um produto, pode considerar mais aspectos e fazer distinções mais precisas entre produtos, marcas e preços.

A constante exposição a informações de preço auxilia o consumidor a criar conhecimento sobrepreços(NAGLE;HOLDEN, 2002).Noentanto,pesquisasapontam que esse conhecimento é geralmente muito limitado (CONOVER, 1986; DICKSON; SAWYER, 1990; ESTELAMI, 1998; KRISHNA et al., 1991; TURLEY; CABANNISS, 1995; WAKEFIELD; INMANN, 1993). Alguns pesquisadores estimam que metade dos consumidores não tem consciência dos preços dos produtos que compram freqüentemente (HARREL; HUTT; ALLEN, 1976; HELGESON; BEATTY, 1987; LE BOUTILLIER; LE BOUTILLIER; NESLIN, 1994).

Gabor e Granger (1961), num dos primeiros estudos sobre o tema, evidenciaram a dispersão de consciência de preço entre diferentes produtos. De quinze produtos de mercearia adquiridos nos últimos sete dias, a porcentagem de consumidores que disseram lembrar-se do preço fora de: a) 93% para chá e ovos; b) 70% para cereais de café da manhã; c) 63% para farinha. Quando, para sete produtos, os preços estimados foram comparados aos preços reais, as respostas corretas variaram consideravelmente, de 79% para chá a 30% para cereal de café da manhã. Para Livesey (1978), esses resultados sugerem a viabilidade de obter dados importantes mediante pesquisa elementar junto ao mercado. Porém, os dados estão atrelados ao tempo, e, em especial, a utilidade destes em condições inflacionárias não seria expressiva.

Livesey (1978) relata também levantamento de 1974 com 496 donas de casa no Reino Unido. Somente 15% afirmavam conhecer o preço indicado para a maioria dos bens que compraram, 23% não sabiam o preço indicado para a maioria dos bens e outros 12%, que não responderam, talvez tivessem um baixo nível de percepção de preço. As reduções temporárias de preço foram uma explicação, mas é razoável supor que a inflação, de 15% ao ano na época, tenha também influído.

Estelami e De Maeyer (2004), analisando 51 categorias de bens duráveis, verificaram que, na média, 39% dos entrevistados forneceram estimativas de preço dentro de um erro de 25% do preço real. Entre as categorias de produtos, a porcentagem de respostas para esse desvio variou de 7% a 74%. Alguns produtos (como fogão, lavadora de roupas, cama e sofá) tiveram alta porcentagem de respostas com boa precisão de conhecimento. Já produtos como equipamento de golfe, máquina de costura e relógio de parede surgiram com baixo conhecimento de preços. Segundo esses autores, os produtos com os maiores níveis de precisão são geralmente possuídos por grande parte dos consumidores ou anunciados freqüentemente na mídia de massa.

A falta de compreensão científica sobre o conhecimento do consumidor acerca do preço de bens duráveis e os fatores que o determinam tem preocupado pesquisadores. A maior parte das investigações focou produtos de mercearia (ESTELAMI; DE MAEYER, 2004). E a literatura revela acentuadas variações no conhecimento dos consumidores sobre preço entre categorias de produtos. Tal variabilidade decorre da diferenciação e qualidade percebidas dos produtos (ESTELAMI, 1998), numa área aberta à verificação empírica (WAKEFIELD; INMANN, 1993). Isso também é essencial no Brasil, donde surge a questão a pesquisar: Qual é o impacto da categoria de produto no conhecimento do consumidor sobre preços de bens duráveis no contexto brasileiro?

Em acréscimo, o conhecimento do consumidor sobre preço poderia variar entre categorias de produto conforme o envolvimento com a categoria, a propaganda e o uso da relação preço-qualidade (ESTELAMI; DE MAEYER, 2004). O consumidor seria capaz de desenvolver uma boa memória para preço com base nesses potenciais determinantes. Deles tratam, um a um, as seções a seguir.

2.3 Efeito do envolvimento do consumidor e bens duráveis

Os produtos comprados com freqüência são geralmente essenciais, com repetitiva alocação orçamentária pelos consumidores (NAGLE; HOLDEN, 2002).

Eis um forte estímulo para eles conhecerem os preços (MONROE, 2003). Apesar de algumas evidências de que conhecimento sobre preços do consumidor se relaciona com categorias de produtos freqüentemente comprados (ESTELAMI; DE MAEYER, 2004), outras vezes essa relação emerge ambígua e até insignificante (DICKSON; SAWYER, 1990; ESTELAMI; LEHMANN, 2001; KRISHNA et al., 1991; WAKEFIELD; INMANN, 1993). Talvez a razão seja o fato de as pesquisas tratarem de bens não-duráveis e de baixo envolvimento (como pão, leite). Produtos de baixos envolvimento e preço costumam ter níveis próximos de freqüência de compra, o que é capaz de impedir a manifestação do vínculo entre freqüência de compra e conhecimento sobre preço.

O envolvimento com a categoria de produto pode afetar a precisão do conhecimento do consumidor sobre preço (HELGESON; BEATTY, 1987). Com base em seus valores e interesses, o consumidor decide que produto comprar (ZAICHKOWSKY, 1985). Aí a atenção, a profundidade do processamento e a resposta cognitiva a um estímulo de preço tendem a ser maiores para produtos de maior importância percebida (PETTY; CACIOPPO; SCHUMANN, 1983). Maior envolvimento provoca uma avaliação mais minuciosa do estímulo de preço. Cada indivíduo pode processar ou lembrar uma informação diferentemente, de acordo com o envolvimento com os produtos. Isso determinaria padrões distintos na precisão do conhecimento sobre preço (HELGESON; BEATTY, 1987). Com bens duráveis, espera-se que haja maior diferenciação, preços mais altos e maior importância deste na decisão de compra (MONROE, 2003). Se a compra de bens duráveis estiver associada a maior envolvimento, gerará mais atenção a informações de preço (NAGLE; HOLDEN, 2002).

Disso tudo decorre a proposição P1: O conhecimento do consumidor sobre preço em uma categoria de produto é relacionado positivamente ao seu envolvimento com ela.

2.4 Propaganda e exposição a anúncios de preços

A propaganda é básica na comunicação de produtos a consumidores potenciais (O'GUINN; ALLEN; SEMENIK, 1998). Com exceção do preço exposto no ponto-de-venda, a propaganda é a ferramenta principal de passagem de informações de preço e das condições de um produto (WELL; BURNETT; MORIARTY, 2000). Os anunciantes de bens de consumo são os que mais se valem da propaganda em quantidade, qualidade e freqüência, geralmente focada no consumidor final (SAMPAIO, 2003). Para bens não-duráveis de impulso, a propaganda exerce efeito quase simultâneo à veiculação, motivando reações imediatas dos consumidores (MONROE, 2003). Já para bens duráveis, de compra mais racional e cautelosa, seus efeitos se dão mais na construção de uma boa imagem e motivação de um desejo latente de consumo (NAGLE; HOLDEN, 2002).

A teoria do nível de adaptação (HELSON, 1964) mostra que os consumidores se adaptam a estímulos. O nível de adaptação representa os efeitos de todas as estimulações passadas e presentes, com as quais o consumidor se acostumou. O processo ocorre em relação às informações armazenadas na memória (HELGESON; BEATTY, 1987). A estrutura de conhecimento existente serve como padrão de referência internalizado para a codificação do estímulo recebido (CRAIK; LOCKHART, 1972). Assim, a adaptação do consumidor a um estímulo tem conseqüências para a gestão de produto, promoção e preço.

Analogamente, pela teoria da armazenagem múltipla da memória (SHIFFRIN; ATKINSON, 1969), a repetição da informação de preço aumentaria a capacidade de o consumidor codificá-lo. A repetição constante causaria o exame e a elaboração da informação de preço, facilitando a transferência da informação da memória de trabalho para a permanente. Exposições a informações de categorias de produtos formariam uma memória implícita, baseada nas categorias apresentadas, utilizável em decisões subseqüentes (WINER, 1986). O preço vinculado à propaganda contribuiria para o conhecimento sobre aquele (ESTELAMI; DE MAEYER, 2004).

Disso tudo decorre a proposição P2: O conhecimento do consumidor sobre preço em uma categoria é relacionado positivamente à exposição a anúncios de preços.

2.5 Preço como indicador de qualidade

O preço tem potencial para influenciar a escolha de produto pelo consumidor como indicador de custo para ele e de qualidade (GABOR; GRANGER, 1961). A teoria da demanda fundamenta-se na primeira dessas funções, enquanto a segunda tende a ser por ela tratada como fenômeno excepcional e de menor importância. Nessa vertente, é de conveniência ignorar o preço como indicador de qualidade, evitando dificuldades analíticas. Logo, a teoria da demanda considera o consumidor como tendo completas e corretas informações sobre os preços de todos os produtos.

Gabor e Granger (1966), entretanto, apontam que o consumidor alicerça a intenção de compra em dois limites de preço: a) um superior, além do qual o objeto é julgado muito caro; b) um inferior, abaixo do qual a qualidade é suspeita. Fora dos limites, o preço atua como indicador de qualidade. Na faixa interior o limite é menos definido. O preço pode servir como indicador de qualidade especialmente se o consumidor não tem experiência anterior com uma marca ou um produto. Toma-se como imperfeito o conhecimento do consumidor sobre preço, o que é mais consistente com as situações reais.

Para Scitovszky (1945), a utilização do preço como indicador de qualidade não é irracional. Haveria uma ordem "natural" de produtos concorrentes em uma escala de preços, resultando em relação positiva entre preço e qualidade do produto. Dada a crença de que preço e qualidade estão relacionados, é natural que os consumidores utilizem o preço como indicador de qualidade.

Segundo Monroe (2003), os primeiros estudos sobre a relação preço-qualidade percebida consideraram o preço como o único diferencial de informação, apontando a percepção de qualidade como função do preço. Nas categorias de produtos em que essa associação é forte, preços altos podem significar maior qualidade (SIVAKUMAR; RAJ, 1997). A relação é ainda mais robusta para bens duráveis, se tecnicamente mais complexos do que bens não-duráveis e com qualidade mais difícil de determinar (MONROE, 2003). Os consumidores tendem a considerar produtos mais caros como de melhor qualidade se: a) o preço é a única informação disponível; b) a qualidade das marcas no mercado varia bastante; c) a diferença de preços entre os produtos oferecidos no mercado é considerável (MONROE, 1973).

Quando os consumidores não têm informações sobre um produto, fazem inferências a partir dos atributos de outros produtos (AJZEN; FISHBEIN, 1980; TROUTMAN; SHANTEAU, 1976). Produtos, informações ou visual da loja também são sugestões utilizadas pelos consumidores, quando confiáveis, como dicas ou pistas preditivas de qualidade (MONROE, 2003). Essas dicas podem ser extrínsecas ou intrínsecas ao produto. As extrínsecas são atributos como preço ou marca, não constituindo parte do produto. As pistas intrínsecas não podem ser modificadas sem se alterarem as propriedades físicas do produto, como componentes e especificações.

Se a qualidade de um produto não é claramente perceptível por meio de sugestões diferentes do preço, este é usado como indicador de qualidade (DODDS; MONROE; GREWAL, 1991; GABOR; GRANGER, 1966; SCITOVSZKY, 1945). O mesmo fato ocorre quando compradores potenciais não podem descobrir a qualidade objetiva de um produto antes da compra e faltam outras pistas, como nome da marca, origem ou uma recomendação confiável (NAGLE; HOLDEN, 2002). Embora a associação entre preço e qualidade possa refletir variações na percepção de qualidade (LINCHTENSTEIN; BURTON, 1989), isso também é conseqüência da incapacidade dos consumidores de determinar a qualidade do produto via outra fonte de informação, fora o preço (GABOR; GRANGER, 1966; MONROE, 2003). Aí é possível que a informação de preço seja um indicador de qualidade do produto, além de um determinante de gasto monetário (ESTELAMI; DE MAEYER, 2004). Aumenta-se a importância de informações de preços e motivam-se os consumidores a desenvolverem uma memória sobre eles.

Disso tudo decorre a proposição P3: O conhecimento do consumidor sobre preço em uma categoria é relacionado positivamente à utilização da relação preço-qualidade.

3 MÉTODO EMPÍRICO

Recapitulando, a questão deste artigo é concernente ao impacto da categoria de produto no conhecimento do consumidor sobre preços de bens duráveis, no contexto brasileiro. Além disso, três proposições ligam o conhecimento do consumidor sobre preços aos possíveis determinantes envolvimento com o produto, exposição à propaganda e utilização da relação preço-qualidade. Tais conceitos e relações exigem um exame empírico, cujo método é delineado nesta seção.

Pela natureza do problema de pesquisa, optou-se por uma investigação descritiva. Essa modalidade não evidencia nexos de causa e efeito, mas possibilita determinar e descrever relações entre variáveis do fenômeno de interesse (AAKER; KUMAR; DAY, 2001). O universo foram os consumidores da cidade de São Paulo com dezoito ou mais anos de idade. Utilizou-se uma amostra de duzentos elementos, obtida por conveniência em pontos de fluxo para o comércio dessa cidade nas zonas: a) sul (Largo de Santo Amaro); b) oeste (Largo de Pinheiros e Avenida Brigadeiro Faria Lima); c) leste (Praça Silvio Romero e Metrô Tatuapé); d) norte (Avenida Voluntários da Pátria). Essa amostragem por julgamento foi inevitável para alcançar os objetivos traçados com os recursos financeiros disponíveis.

Os produtos foram selecionados aleatoriamente entre os bens duráveis comercializados e anunciados pelas empresas Casas Bahia, Lojas Cem, Casas Pernambucanas e Ponto Frio. Estas vendem grande variedade de produtos, realizam propaganda intensa e muitas vezes operam em parceria com fabricantes. A propaganda é veiculada, com freqüência, no horário nobre em canais de televisão aberta e por assinatura, e em revistas de grande circulação nacional (como a Veja). Logo, as mensagens sobre os produtos anunciados chegam aos consumidores de diferentes classes socioeconômicas. Na determinação do preço real dos produtos, tomou-se o preço deles nessas lojas em julho de 2005.

A coleta de dados tomou forma com entrevista pessoal. Apresentaram-se a cada respondente os oito produtos da Tabela 1, um após o outro. Mostrando-se uma fotografia, pedia-se estimativa do preço de varejo de cada item. A coleta dos dados sucedeu de 23 a 26 de agosto de 2005. O conhecimento de preço do consumidor foi medido comparando-se o preço real e o preço estimado pelo respondente para cada produto, com um desvio absoluto porcentual (DAP):

Essa fórmula é consistente com estudos sobre o tema (DICKSON; SAWYER, 1990; ESTELAMI; DE MAEYER, 2004; MAZUMBAR; MONROE, 1992; WAKEFIELD; INMANN, 1993; ZEITHAML, 1982). Um desvio porcentual próximo de zero significa estimativa de preço mais precisa, refletindo bom conhecimento do consumidor sobre preço. Quanto maior for o desvio porcentual, menor será o seu conhecimento sobre preço.

O conhecimento sobre preços do consumidor foi ainda avaliado pela proporção de respondentes, em cada categoria de produto, com desvio absoluto porcentual (DAP) dentro de mais ou menos: 10% e 25%. Dentro desses limites, considerou-se o respondente com bom conhecimento de preço (ESTELAMI; DE MAEYER, 2004).

Para avaliar as variações de conhecimento sobre preços (proporções de respondentes estimando preços dentro dos desvios de 10% e 25%) entre os produtos, aplicou-se o teste de qui-quadrado. Essa estatística é baseada nas diferenças entre freqüências observadas e freqüências esperadas, supondo-se não haver associação entre as variáveis (MALHOTRA, 1999). É pré-requisito para o uso da técnica: uma população multinomial (apenas uma população para três ou mais categorias de resultados) e freqüência esperada para cada célula maior ou igual a cinco (MCCLAVE; BENSON; SINCICH, 2005). A força da associação é representada pelo coeficiente de contingência (C), com sua estatística qui-quadrado. O coeficiente varia de 0 a 1; quanto mais próximo de zero ele for, menor será a associação entre as variáveis (MALHOTRA, 1999).

Usou-se regressão linear múltipla para avaliar a relação entre os desvios porcentuais absoluto em cada produto (variável dependente) e os potenciais determinantes do conhecimento: envolvimento com o produto, exposição à propaganda e uso da relação preço-qualidade (variáveis independentes). Essa técnica destina-se ao exame do relacionamento entre uma variável dependente e duas ou mais variáveis independentes, consistindo numa combinação linear de variáveis independentes que melhor predizem a variável dependente (HAIR et al., 2005). Os seus pressupostos englobam: 1. relação linear entre variável dependente e variáveis independentes; 2. variância do termo do erro constante para todos os valores que predizem a variável dependente; 3. independência do termo do erro; 4. termo do erro como variável aleatória normalmente distribuída (AAKER; KUMAR; DAY, 2001).

Para as variáveis independentes, utilizaram-se as escalas mencionadas por Beatty e Talpade (1994), Lumpkin (1985) e Linchtenstein, Ridgway e Netemeyer (1993), em detrimento das sugeridas por Estelami e De Maeyer (2004). Estas não apresentam o número mínimo de quatro itens para bem mensurar um conceito e garantir a sua confiabilidade (HAIR et al., 2005). Para o envolvimento com o produto, aplicou-se uma escala de quatro itens de classificação somados do tipo Likert, indo de (1) discordo totalmente a (7) concordo totalmente. Conforme Bruner et al. (2001), Beatty e Talpade (1994) empregaram essa escala em dois estudos de decisão de compra de bem durável para adolescentes e famílias. No tocante à confiabilidade, Beatty e Talpade (1994) reportaram alfas de Cronbach de 0,80 e 0,74, respectivamente. Flynn, Goldsmith e Eastman (1996) também a utilizaram para averiguar a validade nomológica de escalas relacionadas a envolvimento, liderança e busca de opinião. Relataram um alfa de Cronbach de 0,93 (alta confiabilidade).

Para a exposição à propaganda, usou-se uma escala de quatro itens de classificação somados do tipo Likert, indo de (1) discordo totalmente a (7) concordo totalmente. Ela mede o interesse de uma pessoa e sua atenção a anúncios para vendas (LUMPKIN, 1985). Na confiabilidade, Lumpkin (1985) relata coeficiente alfa de Cronbach de 0,83, que é satisfatório. Quanto à validade, esta foi conferida por Lumpkin (1985) por meio de análise fatorial, com bom resultado.

Já para o uso da relação preço-qualidade, utilizou-se uma escala de quatro itens também de classificação somados do tipo Likert, indo de (1) discordo totalmente a (7) concordo totalmente. Esta foi adotada por Linchtenstein, Ridgway e Netemeyer (1993) para medir a crença do consumidor de que existe uma relação positiva entre o preço e a qualidade de um produto. Eles reportaram alfa de Cronbach de 0,78, satisfatório (BRUNER et al., 1996). Quanto à validade, Linchtenstein, Ridgway e Netemeyer (1993) a detectaram com uma análise fatorial confirmatória.

4 RESULTADOS

No levantamento, os duzentos respondentes estimaram o preço para cada um dos oito produtos, perfazendo duzentas respostas por produto e 1.600 respostas no todo. Encontraram-se: a) 188 respostas dentro do desvio de 10% do preço real, representando 11,7% (188/1.600) do total; e b) 526 respostas dentro do desvio de 25% do preço real, representando 32,8% (526/1.600) do total. Esses achados corroboram resultados de pesquisas anteriores (ESTELAMI, 1998; ESTELAMI; DE MAEYER, 2004), apontando que o conhecimento do consumidor sobre preços é limitado. A Tabela 2 traz a proporção de respondentes com estimativas dentro de 10% e 25% do preço real por produto. As variações desse conhecimento vão de 4,5% a 21,5% para os desvios de 10%, de 12,5% a 57% para os desvios de 25%. Neste último, televisor, DVD e micro-system tiveram conhecimento de preço mais elevado. Já relógio e refrigerador apresentaram níveis mais baixos. A variabilidade entre categorias aqui mostradas pode estar relacionada com a importância percebida pelo comprador em cada uma delas (PETTY; CACIOPPO; SCHUMANN, 1983).

Dois testes de qui-quadrado foram realizados, com nível de significância de 5%. No primeiro, tomando-se o desvio de 10%, rejeitou-se a hipótese de que o conhecimento do consumidor sobre preços não está associado à categoria de produto (X2 = 18,0, p = 0,012). No segundo teste, tendo-se o desvio de 25%, repetiu-se a rejeição da mesma hipótese (X2 = 47,0, p = 0,000). Mas a força dessa associação revelou-se: 1. pequena para o desvio de 10% (coeficiente de contingência C = 0,29) e 2. moderada para o desvio de 25% (C = 0,44). De qualquer modo, a relação entre esse conhecimento e os produtos aqui analisados manifestou-se empiricamente.

A existência da relação linear entre o conhecimento sobre preços (variável dependente) e envolvimento com a categoria de produto, exposição à propaganda e uso da relação preço-qualidade (variáveis independentes) foi avaliada para cada produto, num total de oito regressões. A variável dependente foi o índice do desvio de cada produto: a) televisor (notação Ind_Desv_TV); b) relógio (Ind_ Desv_Relóg); c) micro-system (Ind_Desv_Micro); d) DVD (Ind_Desv_DVD); e) fogão (Ind_Desv_Fogão); f) câmera fotográfica (Ind_Desv_Foto); g) refrigerador (Ind_Desv_Refrig); h) lavadora (Ind_Desv_Lav).

Os índices das variáveis independentes foram computados como o somatório de suas respectivas variáveis. Numa série, estão os índices de envolvimento com: a) televisor (notação Ind_Envolv_TV); b) relógio (Ind_Envolv_Relóg); c) micro-system (Ind_Envolv_Micro); d) DVD (Ind_Envolv_DVD); e) fogão (Ind_Envolv_ Fogão); f) câmera fotográfica (Ind_Envolv_Foto); g) refrigerador (Ind_Envolv_ Refrig); h) lavadora (Ind_Envolv_Lav). Tem-se, ainda, o índice da exposição à propaganda (Ind_Exp_Prop) e o índice do uso da relação preço-qualidade (Ind_ Preço_Qual). Das oitos regressões, só duas se mostraram significantes: aquelas dos produtos televisor e refrigerador, detalhadas a seguir.

Na Tabela 3, o modelo de regressão para o produto televisor é significativo (F = 3,726, p < 0,05), porém não explica muito da variável dependente. O coeficiente de determinação limitou-se a 5,4%. Na Tabela 4, os coeficientes de regressão padronizados (beta) indicam que, dentre as variáveis independentes, os Ind_Envolv_TV e Ind_Preço_Qual têm relações negativas com o Ind_Desv_TV, sendo eles -0,131 (p < 0,05) e -0,155 (p < 0,10), respectivamente. Já o Ind_Exp_ Prop mostra uma relação positiva, de 0,133 (p < 0,10).

A Tabela 5 denota que o modelo de regressão para o produto refrigerador é significante (F = 3,973, p < 0,05), porém explica muito pouco da variável dependente. O coeficiente de determinação limitou-se a 5,7%. Na Tabela 6, com os coeficientes betas padronizados, o Ind_Envolv_Refrig tem relação negativa com o Ind_Desv_Refrig (-0,205, valor-p < 0,05), ao passo que o Ind_Exp_Prop apresenta relação positiva (0,184, p < 0,10).

5 CONCLUSÕES, LIMITAÇÕES E PESQUISAS FUTURAS

Algumas conclusões relevantes derivam dos resultados empíricos. O conhecimento do consumidor sobre preços, nos oito produtos avaliados, despontou como bom apenas em 12% e 33% dos consumidores, considerando-se os desvios de 10% e 25%, respectivamente. No geral, não mais do que um terço dos respondentes teve boa acurácia. Isso confirma, num contexto brasileiro, achados de estudos estrangeiros: a maior parte dos consumidores não é capaz de estimar preços com precisão (ESTELAMI; LEHMANN, 2001; MONROE; LEE, 1999). O produto, de uma categoria ou de outra, mostrou-se aqui com impacto nesse conhecimento. Há maior conhecimento sobre preços de televisor, micro-system e DVD. Existe menor conhecimento sobre preços de relógio e câmera fotográfica.

Refrigerador, apesar de presente em 90% dos domicílios brasileiros (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE PESQUISA, 2003), apresentou baixo conhecimento de preço (18%). É plausível que isso resulte da diferenciação e qualidade percebidas pelos consumidores nessa categoria. Nela a faixa de preços praticados no varejo é muito ampla. Ademais, um produto específico (como refrigerador de uma porta LM Máster CRP 38 Cônsul) pode ser a referência do consumidor para uma categoria, subcategoria, modelo e/ou marca de produto. Então, ao se indagar sobre um outro modelo, a estimativa de preço para ele pode ser bastante errada. Com a variedade dos itens na categoria, a estimativa de preço de um certo produto torna-se bem mais complicada se o consumidor não o tem como objeto de referência, desejo ou preferência (ESTELAMI, 1998).

Na análise produto a produto, apenas os modelos de regressão para televisor e refrigerador se mostraram significantes. Para televisor, sustenta-se a proposição P1:. O conhecimento do consumidor sobre preço em uma categoria de produto é relacionado positivamente ao seu envolvimento com ela. No entanto, não se sustenta a proposição P2, sendo ilógica a relação negativa entre conhecimento do consumidor sobre preços e exposição à propaganda. Logo, a exposição à informação de preço não se confirma como determinante desse conhecimento. Por fim, sustenta-se a proposição P3: O conhecimento do consumidor sobre preço em uma categoria é relacionado positivamente à utilização da relação preço-qualidade. Essa relação pode ter ocorrido por ser o televisor um produto tecnicamente mais complexo, com os consumidores tomando o preço como indicador de qualidade (MONROE, 2003). Muitas mudanças tecnológicas têm surgido na categoria, como os aparelhos de plasma e LCD.

Para refrigerador, sustenta-se a proposição P1: O conhecimento do consumidor sobre preço em uma categoria de produto é relacionado positivamente ao seu envolvimento com ela. Presente em 90% dos domicílios brasileiros (ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS DE PESQUISA, 2003), novamente aqui se faz referência à importância percebida do refrigerador para o consumidor (ZAICHKOWSKY, 1985). Novamente não se sustenta a proposição P2, sendo ilógica a relação negativa entre conhecimento do consumidor sobre preços e exposição à propaganda. Mas agora ainda não se sustenta a proposição P3, inexistindo uma relação significante entre o conhecimento do consumidor sobre preços e o uso da relação preço-qualidade. Esse fato pode ser explicado pela familiaridade dos consumidores com o produto. A qualidade do produto pode ser perceptível por meio de dicas diferentes do preço (DODDS; MONROE; GREWAL, 1991). Bem menos têm evoluído os refrigeradores aos olhos do consumidor ao longo dos últimos anos.

No geral, os achados deste artigo descortinam uma realidade de relações muito pouco generalizadas. Uma relação procede para um produto, não para outros. Uma relação é significante para um produto, mas o sentido é o oposto daquele apontado pela lógica e pelas pesquisas prévias. Tais fatos reclamam mais pesquisas sobre o tema, de modo a aprofundar o entendimento sobre os fenômenos. Mais ainda porque outras variáveis, aqui não estudadas, como escolaridade e hábitos de uso de mídia do consumidor, têm potencial de influir na questão e nas proposições trabalhadas. Especificidades brasileiras exigem atenção científica.

Não obstante, os resultados relatados podem ser úteis para a prática de marketing. Embasados no quanto o consumidor sabe sobre preços de produtos, profissionais podem trabalhar estratégias específicas de comunicação. Categorias em que os consumidores têm conhecimento limitado do preço abrem espaço para maiores margens de lucro (refrigerador, relógio e câmera fotográfica). Naquelas em que o consumidor mostra conhecimento mais preciso, decresce a flexibilidade para estabelecer preço (televisor, micro-system e DVD). Aí se impõe ressaltar atributos e benefícios do produto fora o preço (como confiabilidade e garantia). A finalidade é reduzir a importância do preço para o comprador na escolha do produto.

Fundamentados no grau de conhecimento sobre preços dos consumidores, a indústria e o varejo têm boas condições de segmentar seus mercados. Os profissionais de marketing formulam estratégias de apreçamento a partir de análises da percepção de valor e da sensibilidade a preços (NAGLE; HOLDEN, 2002). Tais avaliações quase sempre revelam nítidos segmentos. Os consumidores podem ou não ter ciência dos produtos e de seus substitutos no mercado. Podem reconhecer uma marca como exclusiva ou considerá-la indiferente. Podem pagar o preço total do produto ou parte dele, sendo a outra paga por um terceiro (como cônjuge e filhos). Nesse processo, incorpora-se também o conhecimento sobre preços dos consumidores que afeta o modo e o grau em que as informações de preço e valor percebidos interferem nas decisões de compra. Entender tais diferenças no mercado é a chave para conceber estratégias e táticas de mais efetivas.

Sob outro prisma, ações empresariais usando o quanto os consumidores sabem sobre preços carregam implicações éticas e legais sérias. É importante ponderá-las antes de qualquer implementação. Práticas de apreçamento baseadas na imprecisão do conhecimento do consumidor sobre preços não raro colidem com o Código de Defesa do Consumidor. Além disso, eventuais abusos, se detectados, trazem o risco de percepção negativa da empresa por parte dos consumidores e da sociedade, acarretando prejuízos financeiros e a mácula de irresponsabilidade social.

Algumas limitações deste artigo precisam ser assinaladas e espera-se que venham a ser superadas em pesquisas subseqüentes. A revisão bibliográfica cobriu autores estrangeiros. Não foi encontrado, na literatura brasileira de , estudo sobre o tema, o que impediu a comparação de concepções e resultados. O caráter não-probabilístico da amostragem, embora predominante na pesquisa em , impede a generalização dos resultados e exige cautela no aproveitamento das análises estatísticas processadas. Os respondentes, quando fornecem estimativas de preço, dão aproximações de informações armazenadas na memória permanente. Elas podem referir-se não especificamente aos produtos examinados, mas a preços de produtos similares (JACOBY; OLSON, 1977). O modo como elas são armazenadas na memória pode depender de objetivos, interesses e percepções do comprador, além do tempo de exposição às informações (MAZUMBAR; MONROE, 1992).

Olhando para frente, é premente que novos estudos sobre a matéria sejam desenvolvidos, ensejando comparações e consubstanciando um corpo de conhecimento acadêmico e profissional brasileiro articulado com o estrangeiro. Urge examinar uma gama maior de produtos e atributos relacionadas às suas categorias (como sofisticação tecnológica e estágio do ciclo de vida do produto) na tentativa de identificar o leque de determinantes do conhecimento sobre preços do consumidor de bens duráveis. Averiguar a interferência, nessas relações, das características demográficas dos consumidores é uma vereda a ser trilhada.

Não menos interessante seria dimensionar a variabilidade do conhecimento sobre preços do consumidor entre marcas líderes de mercado e seguidoras, o que também seria adequado para o exame, mais ainda no âmbito brasileiro, do conhecimento do consumidor sobre preços além dos bens duráveis. Por exemplo, identificar no setor serviços fatores influentes sobre tal conhecimento e como o processo de busca e aquisição de informações pode impactá-lo. Basta lembrar-se das características distintivas de serviços (intangibilidade, perecibilidade, heterogeneidade, inseparabilidade).

Em suma, mais luzes precisam ser lançadas sobre a esfera do conhecimento sobre preço do consumidor no Brasil e também no exterior. Esforços científicos de maior monta são fundamentais para melhorar a compreensão acadêmica, a capacidade de gestão das empresas e o discernimento dos próprios consumidores sobre o que sabem, podem e devem saber sobre preços.

Recebido em 4/6/2007

Aprovado em 25/8/2007

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Jun 2012
  • Data do Fascículo
    Abr 2008

Histórico

  • Aceito
    25 Ago 2007
  • Recebido
    04 Jun 2007
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