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Adoção de RFID no Brasil: um estudo exploratório

RFID adoption in Brazil: an exploratory study

Resumos

A identificação por rádio frequência (RFID - Radio Frequency Identification) tem sido um assunto amplamente abordado nos últimos anos, nas empresas, no meio acadêmico e na mídia. Diversas empresas vêm desenvolvendo iniciativas de RFID com o intuito de identificar as potenciais aplicações dessa tecnologia e mapear os benefícios decorrentes de sua utilização. Este trabalho apresenta um quadro de referência para a adoção dessa tecnologia pelas empresas considerando seus motivadores, inibidores, aplicações e benefícios esperados. O quadro de referência serviu como base para uma pesquisa realizada com 114 empresas no Brasil. Entre os principais resultados destacam-se a importância da área de tecnologia da informação como agente da adoção da inovação e a pouca relação dos benefícios esperados e dificuldades enfrentadas com o atual grau de adoção da tecnologia.

Identificação por rádio frequência; RFID; Tecnologia da informação; Inovação; Gestão da cadeia de suprimentos


Radio frequency identification (RFID) has been a relevant topic addressed by companies, academics and media. Many companies have been developing RFID initiatives in order to identify the potential applications and map the benefits associated with their implementation. This work presents a framework for RFID technology adoption, considering its business drivers, inhibitors, applications and expected benefits. This framework provided a conceptual basis for analyzing a research conducted in 114 companies in Brazil. Among other conclusions, we highlight the importance of companies' information technology area as an enabler for innovation and the weak association between expected benefits and business challenges with the current level of technology adoption.

Radio frequency identification; RFID; Information technology; Innovation; Supply chain management


Adoção de RFID no Brasil: um estudo exploratório1 1 Os autores agradecem à empresa IBM do Brasil o apoio dado para o desenvolvimento da presente pesquisa.

RFID adoption in Brazil: an exploratory study

Marcelo Caldeira PedrosoI; Ronaldo ZwickerII; Cesar Alexandre de SouzaIII

IDoutor em Engenharia de Produção pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). Professor doutor do Mestrado Profissional em Administração da Fundação Instituto de Administração (FIA). Rua José Alves da Cunha Lima, 172, Butantã - São Paulo - SP - CEP 05360-050 E-mail:marceloc@fia.com.br

IIDoutor em Administração pela Universidade de São Paulo (USP). Professor doutor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP). Avenida Prof. Luciano Gualberto, 908, sala G121, Cidade Universitária - São Paulo - SP - CEP 05508-900 E-mail:rzwicker@usp.br

IIIDoutor em Administração pela Universidade de São Paulo (USP). Professor doutor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP). Avenida Prof. Luciano Gualberto, 908, sala G107, Cidade Universitária - São Paulo - SP - CEP 05508-900 E-mail:calesou@usp.br

RESUMO

A identificação por rádio frequência (RFID - Radio Frequency Identification) tem sido um assunto amplamente abordado nos últimos anos, nas empresas, no meio acadêmico e na mídia. Diversas empresas vêm desenvolvendo iniciativas de RFID com o intuito de identificar as potenciais aplicações dessa tecnologia e mapear os benefícios decorrentes de sua utilização. Este trabalho apresenta um quadro de referência para a adoção dessa tecnologia pelas empresas considerando seus motivadores, inibidores, aplicações e benefícios esperados. O quadro de referência serviu como base para uma pesquisa realizada com 114 empresas no Brasil. Entre os principais resultados destacam-se a importância da área de tecnologia da informação como agente da adoção da inovação e a pouca relação dos benefícios esperados e dificuldades enfrentadas com o atual grau de adoção da tecnologia.

Palavras-chave: Identificação por rádio frequência; RFID; Tecnologia da informação; Inovação; Gestão da cadeia de suprimentos.

ABSTRACT

Radio frequency identification (RFID) has been a relevant topic addressed by companies, academics and media. Many companies have been developing RFID initiatives in order to identify the potential applications and map the benefits associated with their implementation. This work presents a framework for RFID technology adoption, considering its business drivers, inhibitors, applications and expected benefits. This framework provided a conceptual basis for analyzing a research conducted in 114 companies in Brazil. Among other conclusions, we highlight the importance of companies' information technology area as an enabler for innovation and the weak association between expected benefits and business challenges with the current level of technology adoption.

Keywords: Radio frequency identification; RFID; Information technology; Innovation; Supply chain management.

1 INTRODUÇÃO

A identificação por rádio frequência (RFID - Radio Frequency Identification) tem sido um assunto amplamente abordado nos últimos anos, nas empresas, no meio acadêmico e na mídia. Uma das razões desse interesse é o possível valor estratégico dessa tecnologia. Nesse sentido Cavinato (2005), ao analisar as implicações das pesquisas sobre iniciativas de gestão da cadeia de suprimentos, posiciona a tecnologia RFID como a mais estratégica e de maior impacto aos negócios comparativamente às demais iniciativas analisadas, segundo entrevistas conduzidas entre 2003 e 2004.

Diversas empresas vêm desenvolvendo iniciativas com o intuito de pesquisar as potenciais aplicações dessa tecnologia e mapear os possíveis benefícios decorrentes de sua utilização. Algumas empresas se encontram em estágios mais avançados de implantação. É fato que alguns dos principais varejistas do mundo e o Departamento de Defesa Americano vêm induzindo a adoção de RFID em seus fornecedores. Por exemplo, as cadeias varejistas Metro (COLLINS, 2004a) e Tesco (RFID JOURNAL, 2003a) adotaram uma postura colaborativa, incitando o desenvolvimento das competências em RFID por parte dos seus fornecedores. Outras empresas do segmento de varejo, dentre elas o Wal-Mart (RFID JOURNAL, 2003b), a Target (RFID JOURNAL, 2004), a cadeia Albertsons (COLLINS, 2004b) e a Best Buy (ROBERTI, 2004a), adotaram uma política mais incisiva. Essas empresas definiram mandatos, instrumentos contratuais que determinam regras e critérios de fornecimento de produtos cujo processo de entrega deve ser baseado em tecnologia RFID. Por exemplo, em 2005 o Wal-Mart já havia instalado sistemas RFID em mais de cem lojas, 35 Sam's Clubs e três centros de distribuição, além de ter solicitado que os seus cem maiores fornecedores utilizassem etiquetas RFID nos pallets e caixas dos produtos entregues em alguns dos seus centros de distribuição (IDTECHEX, 2005).

O Departamento de Defesa Americano também adotou a política de mandatos (ROBERTI, 2004b). Esses podem ser instrumentos efetivos de indução de melhorias por parte dos fornecedores quando os clientes apresentam um alto poder de barganha. É o caso do Departamento de Defesa Americano com orçamento de US$ 84 bilhões alocados apenas para suprimentos (U.S. GOVERNMENT, 2006). Assim, a definição de mandatos pode ser um motivador relevante para a disseminação da tecnologia RFID.

No Brasil algumas empresas também vêm desenvolvendo iniciativas de RFID. Por exemplo, a Unilever desenvolveu um projeto piloto na divisão de produtos domésticos e pessoais que considerou a utilização de RFID para o monitoramento do fluxo de produtos entre a planta de Indaiatuba e o centro de distribuição de Louveira (FERNANDES, 2004; TERZIAN, 2004a). Em setembro de 2004, o Pão de Açúcar e a Procter&Gamble iniciaram um projeto piloto para o monitoramento do fluxo de produtos entre os seus centros de distribuição (LABAN NETO, 2004; TERZIAN, 2004b). Em agosto de 2004, a Klabin realizou um projeto piloto para monitorar o fluxo produtivo das chapas de papelão em uma de suas linhas de produção da fábrica de Jundiaí (TERZIAN, 2004c). A Daimler Chrysler utilizava RFID para monitoramento das etapas de montagem dos seus modelos de carro Classe A, quando esses eram produzidos na sua planta de Juiz de Fora (MALINVERNI, 2004).

O presente trabalho relata os resultados de uma pesquisa sobre iniciativas recentes de RFID no Brasil que teve por objetivo analisar as aplicações, os benefícios, os motivadores, as barreiras e outros aspectos que intervêm na adoção dessa tecnologia. No texto que segue são inicialmente apresentados os conceitos relacionados aos sistemas RFID e desenvolvido um modelo de referência para a análise de iniciativas envolvendo a tecnologia. A seguir o modelo é usado para analisar os resultados de uma pesquisa de campo conduzida com 114 empresas. A análise dos resultados foi realizada utilizando-se a modelagem de equações estruturais com a técnica PLS (Partial Least Squares).

2 SISTEMAS RFID

A tecnologia RFID é baseada na utilização de ondas eletromagnéticas (de rádio frequência) como meio para comunicar os dados de identificação de algum elemento, tais como produtos, componentes, caixas, pallets, containers, veículos, pessoas, ativos, máquinas e serviços. A Figura 1 ilustra o funcionamento de sistemas RFID conforme a breve explanação que segue. Especificações mais detalhadas podem ser obtidas em Glover e Bhatt (2006), Lahiri (2005), Kleist et al. (2005) e Jones et al. (2006).


Conforme a Figura 1, as informações sobre a identificação de um objeto (incluindo outras possíveis informações passíveis de monitoramento por sensores, tais como temperatura, pressão etc.) são gravadas nas etiquetas RFID (1). Essas etiquetas são anexadas em itens (caixas, pallets, containers, veículos, pessoas, ativos ou máquinas) que se movimentam ou estão dispostos ao longo da cadeia de suprimentos. As informações contidas nas etiquetas são lidas por um conjunto de sensores (antenas (2) e leitores (3)) por meio de rádio frequência. Os sensores geralmente estão distribuídos em diferentes estágios e várias posições na cadeia de suprimentos (docas de recebimento, docas de expedição e pontos de controle em centros de distribuição e armazéns; pontos de controle em processos de fabricação e linhas de montagem; pontos de controle em rodovias, ferrovias, portarias, operações de pesagem etc.).

Essa combinação de informação relacionada às identificações, itens, localidades e mensurações ao longo do tempo, gera um nível de complexidade informacional que necessita gerenciamento específico. O gerenciamento do grande volume de informações distribuídas ao longo da cadeia de suprimentos é realizado por meio de um conjunto de sistemas conhecidos como "RFID middleware" (4). Esse componente gerencia o fluxo de informações entre os diferentes componentes de hardware de RFID (antenas, leitores, sensores, impressoras de RFID), identifica os eventos associados a essas informações (por exemplo, um pallet que passou por uma doca de recebimento pode disparar uma atividade de atualização de estoques) e realiza a integração com os sistemas gerenciais da empresa (5).

Esse fluxo de informação é bidirecional, ou seja, ele ocorre dos sistemas gerenciais para as etiquetas (fluxo de gravação) e dessas para os sistemas gerenciais (fluxo de leitura). Isso possibilita uma integração entre as informações eletrônicas e os sistemas gerenciais. Dessa forma, esse conjunto de sistemas possibilita a gestão do fluxo de informações dos objetos distribuídos ao longo da cadeia de suprimentos, o gerenciamento dos eventos relacionados a esses objetos e a atualização das informações relevantes nos sistemas gerenciais.

2.1 APLICAÇÕES

Os sistemas RFID podem ser utilizados para dar suporte aos diversos processos de negócios das empresas. Angeles (2005), por exemplo, afirma que a tecnologia RFID pode reduzir algumas lacunas de informação na cadeia de suprimentos, especialmente no varejo e na logística. Ela considera que RFID pode proporcionar uma maior "liberdade" aos processos de negócios e prover visibilidade em tempo real à cadeia de suprimentos. McFarlane e Sheffi (2003) consideram que a adoção de RFID na gestão da cadeia de suprimentos pode criar oportunidades de melhorias no monitoramento e rastreabilidade de itens, no controle de processos e na gestão dos estoques. Especificamente em logística, os autores citam aplicações nos processos internos das empresas e nos processos entre empresas, tais como expedição, transporte e recebimento.

A utilização de RFID no varejo pode alterar radicalmente os métodos de operação de suas cadeias de suprimentos (PRATER et al., 2005). Por exemplo, Karkkainen (2003) pesquisou a aplicação de RFID para monitoramento de itens perecíveis na cadeia varejista e concluiu que a utilização de RFID em containers recicláveis pode trazer benefícios operacionais e amortizar rapidamente os investimentos. Também há potenciais aplicações de RFID em outros processos, tais como identificação de animais (ALÙ et al., 2006), gestão de ativos (LAMPE; STRASSNER, 2003), marketing ao consumidor e serviços pós-venda (CURTIN et al., 2007). No Brasil, um exemplo típico de controle de acesso considera a utilização de etiquetas RFID em veículos, para automatizar o pagamento de pedágios e o controle de acesso a estacionamentos. A pesquisa de campo deste trabalho analisa aplicações de RFID em cinco processos empresariais: operações internas, cadeia estendida de suprimentos, gestão de ativos, identificação e controle de acesso, e relacionamento com os consumidores (Figura 2).


2.2 BENEFÍCIOS

A implantação de soluções do tipo RFID pode auferir benefícios de natureza estratégica, tática ou operacional às empresas. Conforme citado anteriormente, algumas organizações (dentre elas o Departamento de Defesa Americano, o Wal-Mart, a Target, a Best Buy e a cadeia Albertsons) adotaram a política de mandatos de RFID. Nesse caso, a aderência aos mandatos pode ser considerada como um fator competitivo qualificador para os fornecedores dessas organizações. Por exemplo, os fabricantes que comercializam produtos para essas organizações devem possuir um conjunto mínimo de competências tecnológicas e organizacionais (tais como a competência para entregar produtos com RFID em pallets ou caixas) e apresentar um desempenho adequado (por exemplo, prover uma confiabilidade de leitura superior a 99%) visando atender os requisitos dos mandatos. Nesse contexto, a adoção de RFID por parte desses fabricantes pode ser considerada uma iniciativa estratégica, caso esses considerem as organizações que impuseram os mandatos como essenciais aos seus negócios.

Outras implantações de RFID podem ser tratadas no nível tático. Por exemplo, a utilização de RFID para monitorar os estoques ao longo de uma rede de suprimentos pode prover visibilidade às empresas. Essa, por sua vez, pode trazer um conjunto importante de benefícios, tais como uma maior precisão sobre os níveis de estoques e maior transparência na informação sobre a demanda real na cadeia de suprimentos. Em última instância, esses fatores podem contribuir para uma maior eficiência nas operações das empresas, além de melhorias na confiabilidade de entrega, velocidade de atendimento e disponibilidade dos produtos.

Ainda, determinadas implantações de RFID podem ser focadas em melhorias operacionais. Por exemplo, a utilização de RFID para a identificação de ativos importantes (exemplo: válvulas de segurança) pode contribuir para incrementar a segurança das empresas, bem como aumentar a eficiência dos seus processos de manutenção.

A literatura apresenta vários benefícios associados às iniciativas de RFID, e eles claramente dependem do tipo de aplicação e do segmento de indústria. Por exemplo, Lee e Ozer (2007) acreditam que RFID é uma tecnologia promissora para monitorar produtos ao longo da cadeia de suprimentos, com a capacidade de proporcionar um grau de visibilidade sem precedente aos seus participantes. Essa visibilidade pode trazer benefícios de redução dos custos de mão-de-obra, melhorias na coordenação na cadeia de suprimentos, redução de estoques e aumento na disponibilidade de produtos. Lee et al. (2004) desenvolveram um modelo de simulação para analisar a utilização de RFID no relacionamento entre fabricantes e varejistas, e verificaram que essa tecnologia pode trazer benefícios potenciais de redução dos estoques e melhorias nos níveis de serviço.

A McKinsey (2003) considera que a utilização de RFID no varejo pode proporcionar várias melhorias, e cita oportunidades de aumento no faturamento (por meio de menores rupturas nas gôndolas e melhor planejamento de promoções), menores custos de distribuição (na forma de redução dos custos logísticos e das perdas) e menores custos de operação de loja. As empresas nesse segmento estimam poder melhorar as suas margens operacionais entre 22% e 74% com base na implantação de RFID. Jones et al. (2005) acreditam que a adoção de RFID pode contribuir para aumentar a concentração no setor de varejo, além de poder causar um alto impacto nas operações de loja e na experiência de compra por parte dos consumidores. A pesquisa de campo deste trabalho analisa os seguintes benefícios decorrentes da utilização de RFID: melhoria na gestão dos estoques, redução de perdas, maior eficiência nas operações, melhoria na gestão da demanda, melhoria na qualidade do produto e integração na cadeia de suprimentos (Figura 2).

2.3 MOTIVADORES DA ADOÇÃO

A literatura apresenta diferentes abordagens para o desenvolvimento da inovação e, em particular, para a adoção de novas tecnologias. Por exemplo, Davila et al. (2006) adotam uma abordagem estratégica, onde eles consideram que a inovação é um ingrediente necessário para negócios sustentáveis, uma vez que ela protege os ativos tangíveis e intangíveis de uma empresa. Nesse âmbito, a inovação é algo inerente aos negócios da empresa e não um elemento complementar. Segundo essa óptica, a inovação contempla não somente a adoção de novas tecnologias, como também o desenvolvimento de novos modelos de negócios e estratégias.

A inovação e a introdução de novas tecnologias, entretanto, demandam ou são estimuladas por mudanças organizacionais nas empresas. Nesse contexto, alguns autores analisam as mudanças associadas à inovação e à introdução de novas tecnologias segundo uma abordagem institucional. Essa abordagem, também denominada "teoria institucional", considera que as organizações apresentam duas dimensões principais: a técnica e a institucional. Segundo Machado-da-Silva et al. (1999), a dimensão técnica caracteriza-se pela troca de bens e serviços, enquanto a dimensão institucional direciona o estabelecimento e a difusão das normas de atuação que são necessárias à legitimidade das organizações. Nesse contexto, as organizações são submetidas tanto às pressões do ambiente técnico quanto do ambiente institucional.

Outros pesquisadores analisam a decisão referente à adoção de novas tecnologias relacionando-as aos denominados "pontos de origem" (GEHANI, 1995) ou "forças motivacionais para inovações tecnológicas" (MUNRO; NOORI, 1988), que são as bases de dois tipos extremos de abordagem: a estimulada pela tecnologia (ou technological-push) e a direcionada pelo mercado (ou marketing-pull). A abordagem estimulada pela tecnologia se origina no reconhecimento de como uma nova tecnologia pode prover uma melhoria no desempenho da empresa (MUNRO; NOORI, 1988). Essa abordagem foca o fornecedor de tecnologia como ponto de origem na adoção de novas tecnologias. Já na abordagem estimulada pelo mercado as necessidades dos clientes e consumidores são os pontos de origem (GEHANI, 1995). Essas necessidades podem ser originadas na identificação de deficiências no desempenho da empresa ou na percepção de novas oportunidades, que podem ser exploradas a partir da implantação de novas tecnologias (MUNRO; NOORI, 1988).

Este trabalho considera a abordagem estimulada pela tecnologia e desdobra a abordagem estimulada pelo mercado em duas outras: a induzida pelos clientes e a baseada em benefícios de negócios (Figura 2). A abordagem induzida pelos clientes está relacionada ao fato dos clientes induzirem o desenvolvimento de sistemas RFID de maneira colaborativa (como a iniciativa Future Store da Metro) ou de maneira mais incisiva (como os mandatos). A abordagem baseada em benefícios de negócios está associada ao fato das empresas identificarem, de maneira pró-ativa, pontos de melhoria em seus negócios e buscarem opções para explorá-los. Nesse caso os sistemas RFID são considerados uma das alternativas de melhoria. A abordagem estimulada pela tecnologia está relacionada às empresas que decidem experimentar os sistemas RFID - por exemplo, estimulados pelos fornecedores ou para conhecer a tecnologia - e num segundo momento passam a analisar os custos e benefícios decorrentes de sua implantação.

Dessa forma, o trabalho coloca uma ênfase nas dimensões estratégica e técnica como elementos motivadores à adoção de novas tecnologias. No entanto, os autores sugerem que os potenciais desdobramentos deste trabalho considerem dimensões adicionais, tais como os elementos associados à teoria institucional como uma forma mais holística de se estudar o processo de adaptação organizacional.

2.4 PORTE DA EMPRESA E BARREIRAS À ADOÇÃO

Diversos fatores devem ser considerados para as empresas obterem resultados positivos por meio da inovação habilitada por sistemas RFID. Certamente os aspectos financeiros são um dos mais importantes. Tidd et al. (2005) consideram que, em inovação, importa o tamanho das empresas. Ou seja, as empresas de grande porte geralmente apresentam uma maior disponibilidade de recursos, que ocorre por meio de uma maior capacidade financeira para investimentos, além da disponibilidade de recursos humanos qualificados e do conhecimento da organização. A dimensão porte da empresa é analisada na pesquisa de campo conforme a Figura 2.

Andrew et al. (2006) são ainda mais enfáticos ao afirmar que a única inovação que vale a pena é a "inovação lucrativa". Esses autores apresentam o conceito de curva financeira da inovação (ou cash curve) e discutem os fatores que afetam o retorno sobre o investimento em inovação (custos de lançamento, velocidade para se chegar ao mercado, escala e custos de suporte). Eles ressaltam a importância do alinhamento estratégico e da liderança como elementos importantes para se obter o máximo de retorno sobre os investimentos em inovação.

Além da questão financeira, outros fatores também são importantes nas decisões de investimentos na tecnologia RFID. Fernie (1994) discute as barreiras para a adoção de novas tecnologias. Ele as classifica em dois tipos: barreiras de adoção e barreiras de implantação. As barreiras de adoção são a falta de um motivo crítico, o tamanho do esforço requerido, a não-justificativa de custo-benefício e os riscos envolvidos. As barreiras de implantação são as práticas de negócios inadequadas, a falta de recursos internos, a falta de parceiros dispostos a cooperar e as incertezas quanto ao sucesso da implantação.

Assim, as decisões quanto à implantação de sistemas RFID devem ser tomadas segundo os conceitos de gestão de inovação, uma vez que se trata de uma mudança tecnológica radical para as empresas. Na prática, os investimentos em RFID competem com outras iniciativas pelos recursos das empresas, e cabe a estas últimas decidirem a prioridade e o momento de alocação destes investimentos. Nesse sentido, devem-se considerar algumas barreiras importantes que são inerentes à adoção dessa tecnologia. Este trabalho considera seis barreiras principais: 1) os impactos estratégicos dos sistemas RFID nos negócios da empresa; 2) a justificativa financeira para os investimentos em RFID; 3) o grau de maturidade tecnológica dos sistemas RFID; 4) a adequação dos processos e sistemas da empresa; 5) a adequação das pessoas e da organização; e 6) a adequação dos seus processos de relacionamento com os parceiros de negócios (fornecedores, canais de distribuição, operadores logísticos e clientes) (Figura 2).

3 PESQUISA DE CAMPO

3.1 MODELO DE REFERÊNCIA E METODOLOGIA

O modelo de referência para a pesquisa de campo está apresentado na Figura 2 e foi elaborado a partir dos aspectos discutidos no item 2. O modelo apresenta as dimensões "motivadores", "porte das empresas", "barreiras", "benefícios" e "aplicações", conforme exposto anteriormente. O modelo também inclui a dimensão "organização", que analisa os aspectos relacionados à forma como as iniciativas de RFID são conduzidas nas empresas. O questionário para a pesquisa de campo foi elaborado com base no modelo de referência da Figura 2. O Quadro 1 apresenta um resumo das dimensões do modelo, dos indicadores associados a cada dimensão, e os nomes das variáveis correspondentes utilizadas na análise estatística apresentada mais adiante. Em razão da sua extensão o questionário completo não foi incluído neste texto, mas pode ser obtido por solicitação aos autores.


O questionário foi enviado por e-mail, entre novembro de 2004 e março de 2005, para 485 empresas da lista de contatos da IBM do Brasil e de um dos autores. Ele foi endereçado aos gestores das áreas de tecnologia da informação, gestão da cadeia de suprimentos e aos responsáveis diretos pelas iniciativas de RFID nas empresas. A pesquisa obteve um total de 114 questionários respondidos, perfazendo um índice de 23,5% de empresas respondentes. Esse total inclui empresas que informaram não possuir iniciativa de RFID em andamento ou planejada (57 empresas) e empresas que têm iniciativa em andamento ou já planejada (outras 57 empresas). As empresas que informaram possuir iniciativa em andamento ou planejada responderam a questões relativas à: 1. presença de barreiras à adoção de RFID e benefícios obtidos ou esperados em cada um dos grupos apresentados na Figura 2; 2. quais aplicações de RFID estão sendo ou serão adotadas; e 3. quais os motivadores da adoção ("empurrado pela tecnologia", "puxado pela demanda" ou "puxado pelos benefícios"). Também responderam questões a respeito de: a. como as iniciativas são conduzidas, isto é, se são conduzidas a partir da liderança da equipe de TI ou dos usuários, se existe política formal de RFID na empresa, e se as iniciativas de RFID são conduzidas em alinhamento a outras iniciativas de sincronização eletrônica de dados; e b. aspectos gerenciais ou "organização" das iniciativas de RFID na empresa. As 57 empresas que informaram não possuir iniciativa em andamento ou planejada responderam apenas questões sobre o motivo da não utilização do RFID: motivos financeiros, tecnológicos, de não-alinhamento à estratégia e desconhecimento da tecnologia.

Para avaliar o status das iniciativas de RFID, perguntou-se às empresas a respeito das iniciativas atuais, ou se havia alguma iniciativa planejada para iniciar em 2005, se estava prevista para iniciar entre 2006 e 2008, se estava prevista para iniciar depois de 2008, ou se não havia iniciativa em andamento ou prevista.

3.2 ASPECTOS DESCRITIVOS DA AMOSTRA

Nas figuras 3 e 4 estão resumidas as principais características da amostra obtida. Na Figura 3 as empresas estão agrupadas por porte (com base no faturamento). Segundo a figura, 35% das empresas da amostra apresentam faturamento superior a US$ 1 bilhão anuais, enquanto apenas 8% têm faturamento inferior a US$ 100 milhões (uma das 114 empresas não informou o porte). O gráfico também permite verificar a porcentagem de empresas que possuem iniciativa em andamento ou planejada. As empresas com faturamento abaixo de 100 milhões destacam-se das demais, com apenas 20% de empresas (duas empresas) com iniciativas em andamento ou previstas, o que sugere que a adoção de RFID possivelmente tem origem em empresas de maior porte. A correlação entre o porte da empresa e o status das iniciativas não é estatisticamente significativa no nível de 5% (correlação de Spearman, p = 0,067), embora o seja no nível de 10%. Isso aponta para a existência de possível relação entre o porte e o status da iniciativa, indicando que as empresas maiores iniciaram primeiramente a implantação da tecnologia RFID.



Na Figura 4 a mesma análise é realizada por segmento de mercado das empresas. As iniciativas estão distribuídas igualmente entre os diversos setores de mercado, com exceção do setor de serviços. Mais uma vez a diferença entre os diversos setores não é estatisticamente significativa no nível de 5% (teste Qui Quadrado, p = 0,607). Apesar disso, como pode ser observado no gráfico, o setor de serviços apresentou um grau menor de desenvolvimento das iniciativas de RFID em relação aos demais. O tamanho da amostra de empresas nesse segmento (n = 12) não permitiu aprofundar a análise dos motivos dessa constatação.

Também foi realizada uma análise com o total de empresas da amostra considerando as variáveis em comum, respondidas por todas as empresas, ligadas às dificuldades para implantação da tecnologia RFID. Seis empresas (5,3%) que responderam desconhecer essa tecnologia foram retiradas da análise, totalizando 108 empresas. Na Figura 5 estão apresentadas as percentagens de empresas que apontaram a existência de cada uma das categorias de dificuldades: estratégica, técnica e financeira (múltiplas respostas foram admitidas). O gráfico apresenta, para as três categorias, um padrão semelhante, com a percentagem de empresas que citam as dificuldades aumentando com a proximidade do momento do início da implementação da iniciativa, e diminuindo após esse momento (o teste ANOVA apontou diferenças estatisticamente significativas no nível de 5%, nas categorias estratégica e técnica para as iniciativas planejadas para o próximo ano, e não apontou diferenças na categoria financeira).


Uma possível explicação para esse padrão pode ser o fato de que as empresas começam a realmente perceber as dificuldades apenas a partir do momento em que elas incorporam em sua agenda a necessidade de implantação da tecnologia. Ou seja, quanto mais próximo o momento da implantação, mais as dificuldades são percebidas pelas empresas. Com o início dos trabalhos de implantação as dificuldades de alguma maneira precisam ser contornadas, o que pode corresponder ao declínio no gráfico. Percebe-se que as dificuldades estratégicas e técnicas apresentam relações significantes, enquanto as dificuldades financeiras não. As dificuldades financeiras estão apenas diretamente ligadas ao custo da tecnologia, semelhante entre todas as empresas. Percebe-se também que o aumento da preocupação com as dificuldades estratégicas (em síntese, aspectos ligados ao suporte da alta-direção) acontece numa etapa anterior ao crescimento das dificuldades técnicas e financeiras. A obtenção desse apoio claramente ocorre em etapas anteriores à implantação.

O exame da frequência de respostas pertinentes aos motivadores da implantação de RFID pode ser feito com base na Figura 6. Ela mostra, para as empresas que declararam possuir iniciativas de RFID, o percentual de empresas que assinalaram cada um dos motivadores. Como pode ser observado, o principal motivador é melhorar o desempenho atual por meio da redução de custos (84,2% - variável pull-bencus na Figura 7) e melhorar o desempenho por meio de melhores níveis de serviço aos clientes (54,4% - variável pull-bencli). A motivação com base na experimentação da tecnologia aparece apenas em quinto lugar (variável push), observando que a mensuração da relação desse motivador com as iniciativas conduz a outro resultado conforme relatado no item seguinte.



3.3 ANÁLISE DO MODELO DE REFERÊNCIA

Para realizar a análise dos dados com base no modelo de referência, apresentado na Figura 2, empregou-se a Modelagem de Equações Estruturais (SEM) utilizando como método de estimação o PLS (Partial Least Squares). Essa escolha foi determinada pelos seguintes aspectos: 1. os construtos ou variáveis latentes (as dimensões apresentadas na Figura 2) foram definidos a partir de indicadores formativos (CHIN, 1998); 2. os indicadores (variáveis observadas representadas pelas respostas às questões do questionário) são variáveis binárias (do tipo sim ou não) que, apesar de métricas, não possuem distribuição normal, uma exigência para a utilização do SEM com estimação baseada na matriz de covariâncias. No PLS essa suposição não é assumida (CHIN, 1995). Por conta dessas características do modelo testado a utilização do PLS mostra-se em princípio mais adequada. Outro aspecto a ser considerado na seleção do método é o tamanho da amostra constituída apenas pelas 57 empresas que informaram estar implantando ou planejando alguma iniciativa de RFID. Esse tamanho de amostra torna inviável a utilização do SEM com estimação ML (Maximum-Likelihood). Embora haja discussão sobre o tamanho mínimo de amostra no caso do PLS (MARCOULIDES; SAUNDERS, 2006), "regras de bolso" sugerem como tamanho aceitável dez casos por indicador que atinge a variável latente com maior número de indicadores (CHIN, 1998).

A opção pelo PLS traz, entretanto, consequências para a avaliação e interpretação do modelo, uma vez que o PLS não possui medidas para avaliar o ajuste geral da solução aos dados. O PLS considera apenas o R2 de cada construto, não sendo possível testar modelos alternativos, mas apenas avaliar a capacidade preditiva de cada variável latente independente em relação à variável latente dependente (CHIN, 1998). Como a proposta deste trabalho é identificar a relação entre diversos aspectos ligados à inovação tecnológica e à adoção de RFID, essa limitação tem menor importância. No caso não serão testados modelos alternativos sem que compareçam relações de causa e efeito entre diversas variáveis em cadeia, visando ao teste e à comprovação de teorias. O objetivo será apenas de verificar a relação entre os diversos construtos preditores com a adoção da tecnologia RFID nas empresas estudadas. O modelo proposto foi testado com o uso do software Smart PLS versão 2.0 M3 (disponível em www.smartpls.de). As significâncias estatísticas dos coeficientes do modelo foram testadas utilizando-se a técnica bootstrapping disponível no Smart PLS, com 300 amostras geradas a partir da amostra original, com reposição, e com o mesmo tamanho da amostra original (TENEHAUS et al., 2005).

Para a análise do modelo de referência foi utilizada a amostra parcial de 57 empresas que já iniciaram ou já planejaram as iniciativas de RFID. Os resultados da análise do modelo são apresentados na Figura 7 que mostra os valores t dos coeficientes calculados pelo procedimento de bootstrapping. A Figura 8 mostra os valores dos coeficientes padronizados. Os dois diagramas foram gerados pelo software Smart PLS. As figuras representam as relações originalmente propostas entre os construtos (dimensões na Figura 2) e que no Smart PLS são variáveis latentes (VL) representadas pelas ovais cinzas. Os retângulos são as variáveis observadas (perguntas do questionário) associadas a cada uma das dimensões. Notar que as variáveis porte e iniciativas foram modeladas como VL por exigência do software, embora possuam apenas um indicador cada. A variável inic_bin, indicadora da VL "iniciativas", foi elaborada considerando-se valor 1 para as empresas que já têm iniciativa em andamento e 0 para aquelas que têm iniciativa planejada, independente do prazo previsto.


Na Figura 7 os valores sobre as setas representam a estatística t calculada com base nas 300 amostras geradas pelo procedimento de bootstrapping. Valores de t maiores do que 1,96 representam caminhos estatisticamente significantes no nível de 5% (valor limite para t com 300 -1 = 299 graus de liberdade, considerando teste bi-caudal). Os caminhos significantes estão assinalados na figura em negrito para os valores da estatística t.

Na Figura 8 o diagrama apresenta os coeficientes de regressão padronizados, além do R2 da regressão no interior das ovais. Note que apenas o R2 da VL "iniciativas" é apresentado (R2 = 0,485), uma vez que, com a utilização de indicadores reflexivos, somente são calculados os valores de R2 para os constructos endógenos (VL que recebem setas de outras variáveis latentes). A Tabela 1 apresenta um resumo com os valores t e seu grau de significância estatística.

Como pode ser observado na Figura 7, apenas os construtos "organização" e "motivadores" mostraram ser preditores significativos das iniciativas de RFID. Isso pode apontar para o fato de que uma vez encetadas as iniciativas (que é o caso das 57 empresas consideradas), tanto os benefícios visualizados como as dificuldades intrínsecas ao esforço já foram considerados e incorporados pela empresa. O fato de o coeficiente estrutural que liga as VL "dificuldades" e "iniciativas" ter sinal negativo também corrobora essa suposição, além disso, a discussão relativa à Figura 5 aponta na mesma direção.

Também a quantidade de aplicações nas quais a empresa já está implantando ou pretende implantar o RFID não é significante para prever se a empresa pertence ao grupo "mais adiantado" que já está implementando, ou ao grupo que já planejou a implementação mais ainda não a iniciou. Isso pode apontar para o fato de que as empresas encetam iniciativas de maneira bastante focada em poucas aplicações, com retorno diretamente ligado aos seus processos operacionais, não havendo assim um uso disseminado em diversas áreas da empresa. As empresas da amostra implantaram ou pretendem implantar uma média de 2,25 iniciativas.

No construto "motivadores" apenas o indicador "push" (inovação dirigida pela área de TI) mostrou-se significante, apesar de os motivadores "pull-bencus" e "pull-bencli" terem sido os mais citados pelas empresas na amostra parcial de 57 empresas (conforme discussão da Figura 6). Isso aponta para a importância, ainda hoje, da área de TI como impulsionadora da inovação em aplicações de tecnologia. Apesar de, em princípio, as áreas usuárias e de planejamento estratégico das empresas estarem cada vez mais envolvidas no processo de prospecção tecnológica, o papel da área de TI ainda aparenta ser muito importante. Observar que no construto "organização", o indicador "tiresp" (área de TI responsável pela implantação) não é significante, enquanto que "scmresp" (áreas de logística responsáveis pela implantação) é significante. Apesar da aparente contradição com a afirmação anterior, de que a área de TI é fundamental na inovação, a diferenciação das etapas da inovação provê uma possível explanação. É possível que na etapa de prospecção a TI tenha um papel mais fundamental no caso da adoção do RFID, enquanto na etapa de implantação, a liderança de áreas ligadas diretamente ao emprego da tecnologia (no caso as áreas usuárias de logística) seja determinante.

O porte da empresa, que havia aparecido como significante ao nível de 10% na análise da Figura 3, não se mostrou significante na análise com a amostra de empresas com iniciativa em andamento ou planejada. Aparentemente, o porte diferencia a intenção inicial de adoção ou não, mas, uma vez decidida pela adoção, as empresas de menor porte não se diferenciam das demais nos diversos aspectos do modelo. Note que para a análise da significância por meio do bootstrapping, a variável "pull-dem" ("puxados pela demanda") precisou ser retirada do modelo. Isso ocorreu pelo fato de haver um grande número de respostas 0 no caso de pull-dem (apenas 7% responderam sim) e, portanto, no procedimento de bootstrapping havia grande possibilidade de geração de variáveis com variância zero (todas as respostas iguais), o que impede o cálculo do PLS. No entanto, a análise qualitativa dessa variável mostra que ela é pouco relevante (3,5% para a amostra parcial de 57 empresas). Essa conclusão é aderente à realidade brasileira, na qual poucas empresas vêm sentindo os efeitos dos mandatos colocados por alguns dos grandes varejistas e pelo Departamento de Defesa americano, conforme discutido no item 1.

4 CONCLUSÕES

O trabalho permitiu a análise de aspectos ligados à implementação da tecnologia RFID, uma tecnologia bastante recente e que se encontra nos estágios iniciais de utilização nas empresas. É uma tecnologia cujas possibilidades estão sendo exploradas e que, na medida em que essas possibilidades são estabelecidas, pode interpor desafios de cunho tecnológico e de gestão às empresas. Geralmente as aplicações de RFID nas empresas exigem o desenvolvimento de interfaces tecnológicas específicas e o redesenho de processos de negócios e de gestão. Apesar de seu apelo de simplificação e controle de procedimentos, a adoção dessa nova tecnologia não é simples e nem imediata.

A partir da análise das 57 empresas da amostra que já possuem iniciativa de RFID em andamento ou planejada alguns aspectos relacionados à adoção puderam ser analisados. A pesquisa evidenciou a importância da área de TI como impulsionadora inicial do processo de adoção, fato que a princípio não era esperado. Possivelmente isso guarda relação com o grande envolvimento da área TI na gestão de processos industriais e de negócios nas empresas. Mas também há de considerar os próprios fornecedores de tecnologia RFID, em geral vinculados com TI e com as áreas de TI das empresas. Conclui-se que a área de TI tem participação relevante no processo de introdução da tecnologia RFID nas organizações e que, possivelmente, desempenha papel importante na decisão por sua adoção. Por sua vez, a relação das iniciativas com a adoção estimulada pelo mercado (tanto a induzida pelos clientes quanto a baseada em benefícios de negócios) não ficou claramente evidenciada, possivelmente em razão da tecnologia ainda não ter criado corpo no contexto nacional.

Apesar da importância da área de TI como possível motivadora da adoção, a análise também mostrou que o envolvimento e o comprometimento das áreas usuárias da tecnologia RFID são significativos. Possivelmente a contribuição das áreas usuárias se consolida no transcurso das iniciativas e a pesquisa sugere que as áreas serão as definitivas detentoras da tecnologia na empresa. Também fica evidente que iniciativas de RFID estão associadas com ações e esforços declarados da empresa no sentido da experimentação e uso da tecnologia. Já as dificuldades de implantação de RFID aparentemente não são determinantes na adoção da tecnologia e essas dificuldades são percebidas como mais expressivas em momento próximo à implantação. Da mesma forma, para a amostra considerada, as perspectivas de aplicação e os benefícios esperados da tecnologia não constituem determinantes significativos das iniciativas de RFID.

De modo geral, o modelo de iniciativas de RFID verificado na pesquisa sugere que as empresas estão adquirindo conhecimento, entendendo as possibilidades para o seu caso de uso e prospectando estratégias de adoção. Atualmente apenas uma parcela do modelo originalmente proposto mostra relação causal com a adoção de RFID, mas é de supor que ao longo do tempo os outros aspectos considerados no modelo também passem a ser significativos. A tecnologia RFID constitui uma promessa e, nesse sentido, a análise de suas possibilidades, o entendimento mais detalhado de estratégias para sua implementação e a busca de melhores práticas são elementos que justificam as pesquisas como a ora relatada.

Por fim, consideramos que esta pesquisa pode gerar alguns desdobramentos. Destacamos a continuidade da pesquisa visando analisar o grau de avanço das iniciativas de RFID ao longo do tempo. Pesquisas futuras podem incorporar algumas questões que não foram consideradas de maneira explícita, tais como a influência das diretrizes advindas das matrizes das organizações multinacionais. Essas podem atuar tanto como elementos motivadores quanto como barreiras às iniciativas de RFID no Brasil por meio, por exemplo, da liberação ou veto aos investimentos necessários. Adicionalmente, outras dimensões de análise podem ser incorporadas, tais como aquelas relacionadas à teoria institucional. Outrossim, algumas dimensões utilizadas nesta pesquisa podem servir como base ao desenvolvimento de modelos de maturidade que avaliam o desenvolvimento das competências em RFID nas empresas.

Submissão: 1º ago. 2007.

Aceitação: 23 ago. 2008.

Sistema de avaliação: às cegas dupla (double blind review).

UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE. Walter Bataglia (Ed.), p. 12-36.

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  • 1
    Os autores agradecem à empresa IBM do Brasil o apoio dado para o desenvolvimento da presente pesquisa.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      22 Fev 2011
    • Data do Fascículo
      Fev 2009

    Histórico

    • Recebido
      01 Ago 2007
    • Aceito
      23 Ago 2008
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