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Quando a cooperação falha: um estudo de caso sobre o fracasso de uma rede interorganizacional

When the cooperation fails: a case study about the failure of an interorganizational network

Cuándo la cooperación fracasa: un estudio de caso sobre el fracaso de una red interorganizacional

Resumos

Os benefícios da cooperação interorganizacional têm sido pesquisados extensivamente pelos teóricos organizacionais, mas poucos estudos focam casos de fracasso. Apesar do grande número de redes de empresas bem-sucedidas, muitas também enfrentam dificuldades na organização e na gestão da cooperação, encerrando suas atividades sem atingir os objetivos propostos. Este artigo apresenta um caso de fracasso de uma rede de empresas do segmento supermercadista, à luz de estudos de Park e Ungson (2001), Jarillo (1988), Khanna, Gulati e Nohria (1998) e Brouthers, Brouthers e Wilkinson (1995) sobre as dificuldades na cooperação empresarial. Por meio de entrevistas em profundidade com a diretoria da rede, com empresários participantes e com a consultora que apoiou a criação da rede, identificaram-se os principais fatores que contribuíram para que a rede fosse encerrada sem atingir os resultados esperados. Os fatores foram divididos em dois grupos: pré-formalização da rede, como o perfil e a escolha dos participantes, o número de participantes da rede e a definição do momento para lançamento da rede; e pós-formalização da rede, que inclui aspectos como o surgimento de desajustes estratégicos, a perda de apoio do programa público e a falta de maturidade do grupo, que enfrentou dificuldades para gerenciar o processo de cooperação sem apoio externo. Como implicação teórica, o estudo apresenta fatores pouco explorados pela literatura e que podem levar ao fracasso da cooperação, como o número reduzido de empresas, o momento inadequado de lançamento da rede e a imaturidade do grupo. O conjunto de elementos identificado também tem implicações gerenciais: empresários e gestores de redes devem analisar cuidadosamente o perfil e o alinhamento estratégico das empresas ao constituírem a rede, a fim de evitar que eventuais diferenças se tornem um problema depois que a rede já está constituída.

Relações interorganizacionais; Redes de empresas; Cooperação; Fracasso; Estratégia cooperativa


The benefits of interorganizational cooperation have been studied extensively by organizational theorists, but few studies focus on failure cases. Despite the large number of successful business networks, many also face difficulties in the organization and management of cooperation, closing their activities without achieving the proposed objectives. This paper presents a case of a failed business network in the supermarket sector. The work has been done in light of the studies of Park and Ungson (2001), Jarillo (1988), Khanna, Gulati and Nohria (1998) and Brouthers, Brouthers and Wilkinson (1995) concerning the difficulties in business cooperation. Through in-depth interviews with the network board directors, with entrepreneurs and with the consulting that supported the network creation, we identified the main factors that contributed to the network failure without reaching the expected results. The factors were divided into two groups: pre-formalization factors of the network, such as profile and selection of participants, the number of participants and the definition of the moment to launch the network; post-formalization factors of the network, including aspects such as the emergence of strategic misfits, the loss of support from the public program and the lack of maturity of the group, who struggled to manage the process of cooperation without external support. As a theoretical implication the study shows some factors little explored in the literature and that can lead to failure of cooperation, as the small number of firms, the wrong time to launch the business network and the group immaturity. The set of elements identified also have managerial implications: business managers and network managers should carefully analyze the profile and strategic alignment of firms setting up the network, avoiding any differences become a problem after the network is already established.

Interorganizational relationships; Business networks; Cooperation; Failure; Cooperative strategy


Los beneficios de la cooperación entre organizaciones han sido investigados en profundidad por los teóricos de las organizaciones, pero pocos estudios se centran en los casos de fracaso. A pesar del número de redes de empresas exitosas, muchas de ellas también enfrentan dificultades en organizar y administrar la cooperación, cerrando sus puertas, sin lograr los objetivos propuestos. Este artículo presenta un caso de falla de una red de empresas en el segmento de supermercados, llevando en consideración los estudios realizados por Park y Ungson (2001), Jarillo (1988), Khanna, Gulati y Nohria (1998) y Brouthers, Brouthers y Wilkinson (1995) sobre las dificultades en la cooperación empresarial. A través de entrevistas en profundidad con los directivos de la red, con las empresas participantes y el consultor que apoyó la creación de la red, fueron identificados los principales factores que contribuyeron con el cierre de la red sin alcanzar los resultados esperados. Los factores se dividieron en dos grupos: factores anteriores a la formalización de la red, tales como el perfil y la elección de los participantes, el número de participantes en la red y establecer el tiempo de despliegue de la red, y los factores posteriores a la formalización de la red, incluyendo aspectos tales como aparición de desequilibrios estratégicos, la pérdida de apoyo público para el programa y la falta de madurez del grupo, que ha luchado para gestionar el proceso de cooperación sin apoyo externo. Como implicaciones teóricas, el estudio presenta factores poco explorados en la literatura y que pueden llevar al fracaso de la cooperación, como el pequeño número de empresas, un mal momento para lanzar la red y la falta de madurez del grupo. El conjunto de elementos identificados también tiene implicaciones en la gestión: los gerentes y administradores de red deben revisar cuidadosamente el alineamiento y el perfil estratégico de las empresas para la creación de la red, evitando cualquier diferencia que pueda convertirse en un problema después de que la red haya sido establecida.

Relaciones interorganizacionales; Redes empresariales; Cooperación; Fracaso; Estrategia de cooperación


RECURSOS E DESENVOLVIMENTO EMPRESARIAL

Quando a cooperação falha: um estudo de caso sobre o fracasso de uma rede interorganizacional

When the cooperation fails: a case study about the failure of an interorganizational network

Cuándo la cooperación fracasa: un estudio de caso sobre el fracaso de una red interorganizacional

Douglas WegnerI; Antonio Domingos PadulaII

IDoutor em Administração pela Escola de Administração da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor do Departamento de Ciências Administrativas da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc). Avenida Independência, 2.293, sala 209, Universitário, Santa Cruz do Sul – RS – Brasil – CEP 96815-900. E-mail: dwegner@unisc.br

IIDoutor em Administração pela Ecole Supérieure des Affaires da Université des Sciences Sociales de Grenoble – Grenoble II (França). Professor do Departamento de Ciências Administrativas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Rua Washington Luis, 855, sala 418, Cidade Baixa, Porto Alegre – RS – Brasil – CEP 90010-460. E-mail: adpadula@ea.ufrgs.br

RESUMO

Os benefícios da cooperação interorganizacional têm sido pesquisados extensivamente pelos teóricos organizacionais, mas poucos estudos focam casos de fracasso. Apesar do grande número de redes de empresas bem-sucedidas, muitas também enfrentam dificuldades na organização e na gestão da cooperação, encerrando suas atividades sem atingir os objetivos propostos. Este artigo apresenta um caso de fracasso de uma rede de empresas do segmento supermercadista, à luz de estudos de Park e Ungson (2001), Jarillo (1988), Khanna, Gulati e Nohria (1998) e Brouthers, Brouthers e Wilkinson (1995) sobre as dificuldades na cooperação empresarial. Por meio de entrevistas em profundidade com a diretoria da rede, com empresários participantes e com a consultora que apoiou a criação da rede, identificaram-se os principais fatores que contribuíram para que a rede fosse encerrada sem atingir os resultados esperados. Os fatores foram divididos em dois grupos: pré-formalização da rede, como o perfil e a escolha dos participantes, o número de participantes da rede e a definição do momento para lançamento da rede; e pós-formalização da rede, que inclui aspectos como o surgimento de desajustes estratégicos, a perda de apoio do programa público e a falta de maturidade do grupo, que enfrentou dificuldades para gerenciar o processo de cooperação sem apoio externo. Como implicação teórica, o estudo apresenta fatores pouco explorados pela literatura e que podem levar ao fracasso da cooperação, como o número reduzido de empresas, o momento inadequado de lançamento da rede e a imaturidade do grupo. O conjunto de elementos identificado também tem implicações gerenciais: empresários e gestores de redes devem analisar cuidadosamente o perfil e o alinhamento estratégico das empresas ao constituírem a rede, a fim de evitar que eventuais diferenças se tornem um problema depois que a rede já está constituída.

Palavras-chave: Relações interorganizacionais; Redes de empresas; Cooperação; Fracasso; Estratégia cooperativa.

ABSTRACT

The benefits of interorganizational cooperation have been studied extensively by organizational theorists, but few studies focus on failure cases. Despite the large number of successful business networks, many also face difficulties in the organization and management of cooperation, closing their activities without achieving the proposed objectives. This paper presents a case of a failed business network in the supermarket sector. The work has been done in light of the studies of Park and Ungson (2001), Jarillo (1988), Khanna, Gulati and Nohria (1998) and Brouthers, Brouthers and Wilkinson (1995) concerning the difficulties in business cooperation. Through in-depth interviews with the network board directors, with entrepreneurs and with the consulting that supported the network creation, we identified the main factors that contributed to the network failure without reaching the expected results. The factors were divided into two groups: pre-formalization factors of the network, such as profile and selection of participants, the number of participants and the definition of the moment to launch the network; post-formalization factors of the network, including aspects such as the emergence of strategic misfits, the loss of support from the public program and the lack of maturity of the group, who struggled to manage the process of cooperation without external support. As a theoretical implication the study shows some factors little explored in the literature and that can lead to failure of cooperation, as the small number of firms, the wrong time to launch the business network and the group immaturity. The set of elements identified also have managerial implications: business managers and network managers should carefully analyze the profile and strategic alignment of firms setting up the network, avoiding any differences become a problem after the network is already established.

Keywords: Interorganizational relationships; Business networks; Cooperation; Failure; Cooperative strategy.

RESUMEN

Los beneficios de la cooperación entre organizaciones han sido investigados en profundidad por los teóricos de las organizaciones, pero pocos estudios se centran en los casos de fracaso. A pesar del número de redes de empresas exitosas, muchas de ellas también enfrentan dificultades en organizar y administrar la cooperación, cerrando sus puertas, sin lograr los objetivos propuestos. Este artículo presenta un caso de falla de una red de empresas en el segmento de supermercados, llevando en consideración los estudios realizados por Park y Ungson (2001), Jarillo (1988), Khanna, Gulati y Nohria (1998) y Brouthers, Brouthers y Wilkinson (1995) sobre las dificultades en la cooperación empresarial. A través de entrevistas en profundidad con los directivos de la red, con las empresas participantes y el consultor que apoyó la creación de la red, fueron identificados los principales factores que contribuyeron con el cierre de la red sin alcanzar los resultados esperados. Los factores se dividieron en dos grupos: factores anteriores a la formalización de la red, tales como el perfil y la elección de los participantes, el número de participantes en la red y establecer el tiempo de despliegue de la red, y los factores posteriores a la formalización de la red, incluyendo aspectos tales como aparición de desequilibrios estratégicos, la pérdida de apoyo público para el programa y la falta de madurez del grupo, que ha luchado para gestionar el proceso de cooperación sin apoyo externo. Como implicaciones teóricas, el estudio presenta factores poco explorados en la literatura y que pueden llevar al fracaso de la cooperación, como el pequeño número de empresas, un mal momento para lanzar la red y la falta de madurez del grupo. El conjunto de elementos identificados también tiene implicaciones en la gestión: los gerentes y administradores de red deben revisar cuidadosamente el alineamiento y el perfil estratégico de las empresas para la creación de la red, evitando cualquier diferencia que pueda convertirse en un problema después de que la red haya sido establecida.

Palabras clave: Relaciones interorganizacionales; Redes empresariales; Cooperación; Fracaso; Estrategia de cooperación.

1 INTRODUÇÃO

Em grande medida, os estudos organizacionais concentram-se na descrição e análise de casos de sucesso, procurando compreender os fatores que contribuíram para o alcance de resultados positivos. Pouca atenção é dada aos empreendimentos fracassados, nos quais os objetivos estabelecidos não foram alcançados. Em relação à cooperação interorganizacional não é diferente: a pesquisa acadêmica tem sido proeminente em analisar o sucesso de arranjos cooperativos, mas há poucos estudos preocupados em compreender os motivos que levaram muitos desses arranjos ao fracasso, como se observa nos metaestudos de Oliver e Ebers (1998) e Balestrin, Verschoore e Reyes (2010). Na prática, a cooperação envolve custos e gera problemas que exigem atenção, trazendo consigo dificuldades que são o outro lado dos potenciais benefícios que oferecem. Mesmo assim, há uma falta de estudos sobre problemas ou dificuldades em relacionamentos interorganizacionais.

Diversos tipos de arranjos organizacionais se caracterizam pela colaboração entre firmas e, em alguns casos, pela coopetição – em que cooperação e competição ocorrem simultaneamente. De acordo com aspectos como o grau de formalização do arranjo ou o número de empresas envolvidas, tais arranjos são caracterizados como parcerias, alianças, acordos cooperativos, joint ventures ou redes interorganizacionais, também denominadas redes de empresas. Segundo Verschoore (2004, p. 25), "rede interorganizacional pode ser definida como a organização composta por um grupo de empresas com objetivos comuns, formalmente relacionadas, com prazo ilimitado de existência". Mesmo ao cooperar com outras empresas, cada membro mantém sua individualidade, participando das decisões da rede e dividindo os benefícios e os resultados que são alcançados por meio das atividades conjuntas.

O número de casos de sucesso de redes de micro e pequenas empresas no estado do Rio Grande do Sul é considerável (SECRETARIA DO DESENVOLVIMENTO E DOS ASSUNTOS INTERNACIONAIS, 2005). Isso se deve, em grande parte, à implementação de um programa público, por parte do governo estadual, em parceria com universidades regionais, para desenvolver e implementar novas redes de empresas. Além disso, os resultados do programa serviram de estímulo para a criação de redes a partir do próprio movimento de empresários interessados em cooperar. Dados de 2007 indicam que desde o início da década surgiram no Estado aproximadamente 225 redes formadas por micro e pequenas empresas, sem considerar aquelas que iniciaram suas atividades e se desenvolveram sem o apoio do poder público (HUNDERTMARKER, 2007).

Dentre as redes estabelecidas, muitas obtêm resultados significativos para seus participantes, como demonstram estudos de Ende (2004), Wegner, Wittmann e Dotto (2006) e Wittmann, Dotto e Wegner (2008). Isso reforça a ideia de que a cooperação é uma estratégia possível para pequenos empreendimentos que buscam ampliar suas capacidades e tornar-se aptos a enfrentar concorrentes maiores e mais bem estruturados. Todavia, também é importante reconhecer que muitas iniciativas de cooperação empresarial não atingem plenamente seus objetivos ou são encerradas prematuramente. Conforme Pereira e Pedrozo (2004), a maioria dos estudos tenta demonstrar que organizações inseridas em redes interorganizacionais têm maior probabilidade de obter vantagens competitivas sustentáveis. No entanto, nem todas as empresas optam pela estratégia de cooperação justamente porque o processo de gestão das redes é complexo e insuficientemente compreendido.

Além das dificuldades de gestão inerentes a um arranjo interorganizacional composto por diversas empresas, várias correntes teóricas apontam fatores que podem contribuir para o insucesso da cooperação. A falta de confiança entre os participantes ou um ambiente relacional desfavorável, por exemplo, podem dificultar o desenvolvimento da cooperação (SYDOW, 1998; BACHMANN, 2001; LOCKE, 2001; KRISHNAN; MARTIN; NOORDERHAVEN, 2006). Desalinhamento estratégico das empresas (BROUTHERS; BROUTHERS; WILKINSON, 1995), dificuldades em definir objetivos comuns ou mesmo ações oportunistas de alguns participantes são fatores limitadores da ação coletiva e podem levar ao fracasso do empreendimento. Benefícios da cooperação inferiores aos custos ou participantes que não conseguem atingir os objetivos esperados (PARK; UNGSON, 2001; JARILLO, 1988) são também motivos para a perda de interesse na estratégia coletiva e a finalização das atividades coletivas.

Em vez de estudar casos de sucesso, este trabalho tem como objetivo analisar os fatores que levaram uma rede de empresas ao fracasso e ao encerramento de suas atividades. A pesquisa contribui para ampliar a compreensão acerca das redes interorganizacionais e das dificuldades para sua constituição e consolidação, especialmente nos estágios iniciais de desenvolvimento. A análise dos motivos que levaram as empresas a desistir da cooperação oferece indicações para teóricos e gestores sobre as dificuldades inerentes à formação de redes de empresas e permite refletir sobre como minimizar as possibilidades de fracasso. Além desta introdução, o artigo apresenta uma revisão teórica sobre fracasso na cooperação e o processo de desenvolvimento de redes de empresas, a metodologia de pesquisa utilizada, a descrição do estudo de caso, a discussão dos resultados e as considerações finais e sugestões para estudos futuros.

2 ESTRATÉGIAS DE COOPETIÇÃO: COOPERAR PARA COMPETIR

Nas últimas décadas, os estudos sobre competitividade e estratégia organizacional se concentraram em duas perspectivas opostas: de um lado, os estudos de Porter (1986) focam a competitividade da indústria e o posicionamento adequado das empresas para alcançar vantagens competitivas; de outro lado, os teóricos da visão baseada em recursos defendem que as vantagens competitivas da firma resultam dos recursos e das capacidades distintivos que ela possui e controla (WERNERFELT, 1984; BARNEY, 1991). Entretanto, com o avanço das estratégias de cooperação interorganizacional, torna-se possível falar em uma visão relacional para entender como as empresas podem obter vantagens a partir dos seus relacionamentos com outras empresas (DYER; SINGH, 1998). Essa perspectiva vai além das anteriores ao afirmar que a obtenção de resultados extraordinários pode estar na capacidade de relacionamento da empresa com outros atores do ambiente.

Retornos relacionais são aqueles gerados em uma relação de troca interorganizacional, os quais não podem ser gerados por alguma das firmas individualmente e somente podem ser criados por meio das contribuições idiossincráticas dos parceiros de uma aliança (DYER; SINGH, 1998). A essência da relação cooperativa reside na possibilidade concreta de que a união dos parceiros (e os recursos distintivos que eles trazem à relação) seja capaz de gerar uma sinergia tal que, em isolamento, não poderia ser obtida. Quando isso não é possível e os custos da cooperação superam a sinergia resultante, é provável que a situação anterior à relação seja restabelecida. A análise das expectativas e dos resultados da cooperação, em comparação com os recursos despendidos, indica a viabilidade e continuidade da parceria.

Dyer e Singh (1998) destacam ainda que os ganhos relacionais são possíveis quando os parceiros da aliança combinam ou trocam ativos, conhecimentos e recursos idiossincráticos ou investem nestes, empregam mecanismos efetivos de governança que reduzem os custos de transação e permitem a realização de ganhos por meio da combinação sinergística de ativos, conhecimentos ou capabilidades. Das e Teng (2000) argumentam que as alianças surgem quando as firmas desejam acessar recursos valiosos de outras firmas, especialmente quando ambas estão em condições vulneráveis de competição ou quando possuem recursos para compartilhar. O sucesso da cooperação depende da complementaridade de recursos e da coordenação desses recursos, para que haja ganhos para os participantes.

A visão relacional tem implicações para as estratégias das firmas. De acordo com a visão baseada em recursos, uma firma deveria se preocupar em proteger seu conhecimento valioso, e não compartilhá-lo, visto que isso poderia erodir sua vantagem competitiva (WERNERFELT, 1984; BARNEY, 1991). No entanto, segundo a visão relacional, compartilhar os conhecimentos valiosos com os parceiros é uma estratégia efetiva, pois simultaneamente lhe permitirá acessar também os recursos e as competências desses parceiros. Essa estratégia fará sentido se os ganhos provenientes da sinergia forem percebidos como maiores do que a erosão das vantagens competitivas das firmas individuais por compartilharem seus recursos (DYER; SINGH, 1998). Somente aquelas firmas que controlam recursos ou conhecimentos valiosos serão bem-sucedidas em localizar parceiros dispostos a cooperar.

Lado, Boyd e Hanlon (1997) referem-se ao equilíbrio entre competição e colaboração como um comportamento sincrético de busca de ganhos. Ao competirem, as firmas podem alavancar suas vantagens competitivas no mercado utilizando seus recursos raros, valiosos e imperfeitamente imitáveis em contextos competitivos. Ao cooperarem, elas podem adquirir vantagens colaborativas localizando parceiros que sejam efetivamente confiáveis, bem como identificando oportunidades estratégicas para ganhos comuns. A cooperação não exclui a competição; pelo contrário, as duas ocorrem simultaneamente e fortalecem a empresa.

Para fazer referência à estratégia que envolve competição e cooperação, Zineldin (2004) utiliza o termo coopetição, uma situação em que partes independentes cooperam umas com as outras e coordenam suas atividades para alcançar objetivos comuns, mas ao mesmo tempo competem entre si tanto quanto com outras firmas. Os relacionamentos de coopetição bem-sucedidos são parcerias que atendem a diversos critérios. Um deles é a existência de fortes motivações por parte dos parceiros para aderir à relação, mas também ajuste estratégico e a contribuição de cada um com vantagens competitivas claramente identificáveis. Além disso, é necessário que os parceiros tenham ativos e habilidades complementares e possuam forte ajuste cultural. Finalmente, a definição de responsabilidades claras e mecanismos de solução de conflitos também contribuem para os resultados.

A coopetição oferece recursos para as firmas com fortes limitações e representa um veículo para a entrada em mercados que, de outra maneira, a firma não estaria apta a acessar. Entretanto, Zineldin (2004) lembra que firmas de pequeno porte podem ter pouco a trazer para um relacionamento baseado na coopetição. Suas competências centrais possivelmente estão no estágio de desenvolvimento, e a aprendizagem nessas firmas pode não estar tão organizada ou sistematizada quanto em grandes empresas.

2.1 FRACASSO NA COOPERAÇÃO EMPRESARIAL: APONTAMENTOS TEÓRICOS

Afirmar que uma rede de empresas tenha fracassado em sua estratégia de cooperação exige que se utilizem medidas para análise. Segundo Zineldin e Dodourova (2005), os estudos sobre cooperação falham em usar indicadores claros para distinguir sucesso e fracasso em alianças estratégicas. Park e Ungson (2001), ao referirem-se a alianças estratégicas entre duas empresas, afirmam que, apesar da proliferação de medidas para avaliar os resultados da cooperação, há uma preferência por utilizar a dissolução da aliança como uma medida de fracasso. No caso das redes de empresas, constituídas sem um período de duração definido (VERSCHOORE, 2004), a dissolução pode ser um sinal inequívoco de que ela não alcançou os resultados esperados ou que eles foram inferiores ao mínimo necessário para que a cooperação se mantivesse viável.

Do ponto de vista econômico, "uma aliança está apta a sustentar sua estrutura e permanecer como um mecanismo eficiente para transações interfirmas enquanto os benefícios econômicos dos parceiros se sobrepuserem aos custos potenciais de gerenciar a aliança" (PARK; UNGSON, 2001, p. 47). Os autores reforçam que, em geral, a cooperação termina quando alguma das partes percebe tratamento injusto ou resultados incompatíveis com sua contribuição. A esse respeito, Amaldoss et al. (2000) complementam que, quando os parceiros dividem os benefícios igualmente, o comprometimento aumenta mais rapidamente. O contrário também é verdadeiro: quando parceiros da rede percebem que outros usufruem de maiores benefícios, é natural que se sintam menos compelidos a cooperar e seu comprometimento seja afetado.

Jarillo (1988) acredita que a continuidade de uma rede somente é viável quando os ganhos provenientes da cooperação são superiores, no longo prazo, aos lucros que podem ser obtidos fora da rede. Duas condições são essenciais: o pertencimento à rede deve prover desempenho superior (há resultados maiores a dividir, em função da eficiência da rede), e os mecanismos de divisão dos resultados são justos. Para o autor, se essas duas condições forem satisfeitas – desempenho superior e divisão justa –, a rede será considerada bem-sucedida. Do contrário, os participantes que consideram os resultados da rede insatisfatórios ou a divisão dos benefícios injusta tendem a desistir da cooperação, permanecendo somente aqueles que percebem resultados positivos ou, até mesmo, levando ao encerramento da rede.

De fato, não existe uma perspectiva teórica integrada que seja capaz de explicar o fracasso em alianças estratégicas: os estudos estão dispersos em diversas lentes teóricas, como a economia dos custos de transação, teoria do comportamento estratégico, teoria dos jogos, teoria da agência, visão baseada em recursos e teoria de aprendizagem (PARK; UNGSON, 2001). No entanto, os autores sugerem que essas múltiplas perspectivas são complementares e podem ser aproximadas em duas dimensões para o fracasso de alianças: rivalidade entre parceiros e complexidade gerencial (Figura 1).


A rivalidade entre os participantes da aliança (representada no primeiro eixo da Figura 1) aumenta o risco de oportunismo e a incerteza, e passa a ser necessário criar regras adicionais de governança, gerando custos de transação. Ainda assim, os benefícios da cooperação são incertos e orientados para o futuro, ao passo que as ações oportunistas oferecem possibilidades de ganhos presentes. Um exemplo concreto, nas redes de empresas, é a situação em que um ou mais parceiros decidem quebrar acordos de compra conjunta para obter descontos particulares maiores de outro fornecedor, imediatamente. Essa atitude oportunista, motivada pela possibilidade de ganhos presentes em detrimento de ganhos futuros, impacta na confiança do grupo e aumenta a dificuldade de coordenação e a incerteza.

Mesmo a inexistência de rivalidade e a forte complementaridade estrutural e estratégica dos participantes não garantem o sucesso da cooperação. O fracasso também acontece porque a cooperação demanda grandes esforços de coordenação, gerando complexidade gerencial e incerteza (representada no segundo eixo da Figura 1). Em redes formadas por diversas empresas, é natural que haja desajustes culturais e gerenciais entre os participantes. Cada empresa traz consigo uma cultura e práticas de gestão próprias que, certamente, são diferentes dos demais parceiros. É no processo de cooperação que essas diferenças se tornam latentes e precisam ser ajustadas ou aceitas para que a rede tenha sucesso. Nesse mesmo sentido, Verschoore (2004, p. 37) acrescenta que a gestão das redes de empresas é de suma importância e traz consigo dificuldades relacionadas principalmente à heterogeneidade dos envolvidos: "A organização criada para sustentar a formação e o crescimento das redes deve ser capaz de lidar com um conjunto amplo de expectativas, objetivos e estilos de administração dos associados".

Embora não haja consenso quanto aos motivos que levam ao fracasso de alianças estratégicas, os fatores que conduzem ao sucesso podem oferecer importantes indicativos. Brouthers, Brouthers e Wilkinson (1995) afirmam que o sucesso de uma aliança depende muito de que haja habilidades complementares, culturas cooperativas, objetivos compatíveis e níveis de riscos mensuráveis. A ausência dessas características pode gerar problemas para o sucesso da cooperação empresarial.

Khanna, Gulati e Nohria (1998) destacam que uma importante razão para o desapontamento de muitas firmas com alianças estratégicas se deve à falta de compreensão sobre a dinâmica dos relacionamentos. As empresas falham em reconhecer a existência de assimetria de incentivos em investir na relação, a qual inevitavelmente surge à medida que a aliança evolui. Objetivos que antes eram comuns podem, com o passar do tempo, perder parte do sentido e consequentemente reduzir o interesse de um ou outro participante em cooperar. Monitorar as expectativas e o quanto continuam alinhadas, à medida que a rede avança, é importante para manter o interesse de colaboração de todas as partes e estimular a continuidade do processo de aprendizagem.

3 O PROCESSO DE FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DAS REDES INTERORGANIZACIONAIS

A constituição de uma rede interorganizacional é marcada por várias etapas. Ceglie e Dini (1999) fazem referência a cinco etapas: promoção do empreendimento e motivação dos potenciais participantes, planejamento estratégico das atividades do grupo, realização de projetos piloto, desenvolvimento de projetos estratégicos e autogestão da rede. O grupo passa por um processo de maturação ao longo da constituição da rede, culminando com a autogestão, quando os agentes externos, que em muitos casos apoiam a rede, deixam de ter papel central nas atividades.

Child (2001) também argumenta que uma aliança cooperativa se desenvolve ao longo do tempo. Sua evolução pode ser comparada à noção de ciclo de vida, movendo-se de um estágio de contatos iniciais, por meio de negociações e lançamento da ideia, para uma fase de cooperação gerenciada. A extensão e o aprofundamento da cooperação, parcialmente baseados na aprendizagem sobre como trabalhar em conjunto e adquirir sinergias por meio de competências complementares, podem levar ao estabelecimento de uma entidade com gestão independente e identidade própria.

No Rio Grande do Sul, a criação de um programa público foi fator decisivo para o desenvolvimento de um grande número de redes de empresas. A metodologia utilizada pelo programa envolve uma fase de contatos iniciais, em que as empresas são convidadas a conhecer a proposta e integrar o grupo em estruturação. A etapa de formatação envolve o estabelecimento de mecanismos legais e regulamentos que possam mediar contratualmente a relação cooperativa. Nesse momento, passam a ocorrer as primeiras atividades conjuntas. O desenvolvimento do grupo como rede de empresas caracteriza-se pela criação de equipes de trabalho e elaboração de planejamento estratégico, como guia de ações e fortalecimento da cooperação. Quando a rede atinge maturidade e capacidade de autogestão (etapa de consolidação), ela já realiza diversas ações colaborativas e está estruturada para ampliar o número de participantes (SECRETARIA DO DESENVOLVIMENTO E DOS ASSUNTOS INTERNACIONAIS, 2004).

A Figura 2 representa as etapas gerais de formação de uma rede interorganizacional, com destaque para a participação do agente externo (consultor designado pelo programa público) nas atividades da rede. As etapas anteriores ao lançamento da rede recebem um acompanhamento mais intensivo por parte do agente externo, em especial no convite aos interessados em aderir ao projeto e na formalização jurídica do grupo. O lançamento caracteriza-se como um evento que marca a apresentação da rede para clientes, fornecedores, parceiros e comunidade em geral. Ocorre após a formalização da rede e indica que diversas etapas anteriores foram superadas com sucesso.


Após o lançamento da rede, os integrantes são estimulados a desenvolver as atividades com maior independência do agente externo, embora este continue assessorando a rede em atividades de organização, planejamento e expansão. Deve-se destacar também a existência de períodos de parada do programa público e de suspensão das atividades desenvolvidas pelas universidades conveniadas. Como consequência, as redes deixam de ser assessoradas e precisam desenvolver suas atividades sozinhas, independentemente do estágio de desenvolvimento em que se encontrem no momento.

4 ASPECTOS METODOLÓGICOS

Dado o limitado número de pesquisas sobre casos de fracasso em arranjos cooperativos, especialmente em redes horizontais de empresas, o presente estudo caracteriza-se como exploratório. A pesquisa foi realizada por meio do método de estudo de caso, caracterizado pela pesquisa aprofundada de um ou poucos objetos de estudo, visando conhecê-lo detalhadamente (YIN, 2001). Embora não permita generalizações, o método é adequado aos objetivos de estudos exploratórios, à medida que permite identificar aspectos relevantes de uma situação ou objeto selecionado.

Como objeto de estudo, selecionou-se uma rede de minimercados formada no município de Santa Cruz do Sul (RS), no ano de 2004, com o apoio de consultores empresariais vinculados ao programa público Redes de Cooperação, desenvolvido no estado do Rio Grande do Sul. O caso foi escolhido de maneira deliberada para atender aos objetivos do estudo, já que a referida rede passou pelas etapas de contatos iniciais, formatação e desenvolvimento, mas encerrou suas atividades em 2006. A disposição da diretoria da rede, dos empresários e da consultora em participar da entrevista e revelar os problemas enfrentados também foi um fator relevante para a escolha dessa rede como objeto de estudo.

Para garantir a triangulação de informações, a coleta dos dados foi realizada por meio de entrevistas com a diretoria da rede, com empresários que participavam da rede na época do seu lançamento e com a consultora que apoiou a constituição do grupo. Optou-se por um roteiro de entrevista flexível que permite ao entrevistador repetir ou esclarecer perguntas, especificar significados, com a garantia de que é compreendido (LAKATOS; MARCONI, 2001). A estrutura que guiou a constituição do questionário foi composta pelas seguintes variáveis, selecionadas à luz dos estudos sobre fracasso na cooperação interorganizacional: existência de oportunismo e rivalidade entre as firmas, retornos assimétricos, complexidade gerencial e desajuste estratégico (PARK; UNGSON, 2001), desempenho inferior e divisão injusta dos resultados (JARILLO, 1988), assimetria de incentivos (KHANNA; GULATI; NOHRIA, 1998) e incompatibilidade de objetivos (BROUTHERS; BROUTHERS; WILKINSON, 1995).

Durante as entrevistas, procurou-se não apenas verificar a influência das referidas variáveis para o fracasso da rede, mas também relacioná-las à etapa de formação da rede de empresas. As entrevistas realizadas com a diretoria, com a totalidade dos empresários da rede e com a consultora foram fundamentais para a compreensão das dificuldades enfrentadas pela rede e dos motivos que levaram ao insucesso da iniciativa. Além dos questionamentos sobre as variáveis apresentadas pela literatura, surgiram, no decorrer das entrevistas, outras variáveis para o fracasso da rede e que refletem as particularidades do caso em questão. Na etapa final do estudo, transcreveram-se as entrevistas, e as informações relatadas foram categorizadas de acordo com a semelhança nas respostas. A criação de categorias facilitou a identificação dos principais motivos que levaram ao insucesso da rede e permitiu a comparação dos dados coletados na pesquisa de campo com a base teórica sobre fracasso na cooperação interorganizacional.

Os resultados são apresentados e discutidos nas seções seguintes do trabalho, trazendo importantes achados de campo sobre os motivos que influenciam no fracasso de iniciativas de cooperação interorganizacional.

5 PARANDO NO MEIO DO CAMINHO: UM CASO DE FRACASSO NA COOPERAÇÃO INTERORGANIZACIONAL

No início de 2004, a equipe de consultores do Programa Redes de Cooperação encarregada das atividades nos vales do Rio Pardo e Taquari, região central do Rio Grande do Sul, apoiou a criação de uma rede de pequenos supermercados. O segmento foi apoiado pela existência de diversos casos de sucesso de redes supermercadistas no Estado, em especial pela possibilidade de ganhos de escala e marketing compartilhado que a união de pequenas empresas desse ramo pode proporcionar. A partir de bancos de dados e listas públicas, foram convidados estabelecimentos de toda a região para as reuniões de sensibilização, realizadas na cidade de Santa Cruz do Sul (RS).

Inicialmente, um grande número de empresas de diversos municípios mostrou-se interessado em acompanhar as atividades. Reuniões informativas e de sensibilização chegaram a contar com a participação de aproximadamente 30 empresários. Ao longo de todo o ano, foram realizadas as etapas sugeridas pelo programa público para a constituição e formalização da rede, cujo lançamento oficial ocorreu no mês de novembro de 2004, contando, naquele momento, com oito estabelecimentos supermercadistas, todos de Santa Cruz do Sul.

Na época do lançamento, os participantes providenciaram faixas com o logotipo e o nome da rede, afixadas na fachada das lojas para indicar o surgimento da rede e a filiação daquele estabelecimento ao grupo. Todos os empresários entrevistados citaram a possibilidade de negociação de compras e marketing compartilhado como as principais expectativas em relação à rede. Esperavam que a cooperação pudesse proporcionar melhores condições de competição, acesso a novas oportunidades e melhores resultados. Dentre os oito participantes da rede, quatro estabelecimentos estavam localizados em bairros centrais da cidade de Santa Cruz do Sul, três deles em bairros da periferia e um estabelecimento localizava-se na zona rural do município.

O apoio do Programa Redes de Cooperação, com a participação de um consultor nas reuniões da rede, continuou até março de 2005. Depois dessa data, o programa foi interrompido e os empresários passaram a coordenar as ações da rede por conta própria. Ainda em 2005, alguns participantes solicitaram seu desligamento da rede – um dos estabelecimentos encerrou as atividades –, e, em 2006, haviam restado três empresas do grupo original. A rede foi encerrada oficialmente em novembro de 2006, dois anos após o lançamento.

Em termos de perfil de faturamento dos participantes, havia relativa disparidade dentro do grupo: três mercados faturavam entre R$ 60 mil e R$ 120 mil ao ano, quatro mercados faturavam entre R$ 120 mil e R$ 240 mil, e somente um mercado faturava entre R$ 240 mil e R$ 360 mil anuais. Quanto à escolaridade do responsável da empresa, quatro possuem ensino fundamental, três possuem ensino médio e apenas um tem curso superior. Em média, 3,6 pessoas – incluindo familiares – trabalham nos mercados que participaram da pesquisa. A maioria dos empresários possui mais de dez anos de experiência no segmento supermercadista. Em seis mercados, existe somente um caixa de atendimento, e, em outros dois mercados, há dois caixas.

As subseções seguintes sintetizam as entrevistas com os empresários participantes da rede na época do lançamento e a consultora empresarial, refletindo os principais motivos que levaram ao encerramento das atividades da rede.

5.1 O PERFIL E A ESCOLHA DAS EMPRESAS PARTICIPANTES

A teoria aponta o desequilíbrio entre competição e colaboração como um aspecto determinante para o fracasso de relações interorganizacionais (LADO; BOYD; HANLON, 1997), e a rivalidade das firmas seria um limitador para a cooperação (PARK; UNGSON, 2001). Embora todos os estabelecimentos da rede pesquisada estivessem localizados na mesma cidade, os empresários consideram que não havia rivalidade dentro do grupo, de maneira que este não foi um fator preponderante para o encerramento da rede. Como destacou um dos entrevistados: "Não havia percepção de concorrência dentro do grupo, até em função da localização geográfica suficientemente distante das lojas. Não houve problemas de oportunismo ou busca de vantagens próprias".

No entanto, se a distância entre as empresas foi positiva porque evitou a competição pelos mesmos clientes, o fato de os mercados se localizarem em regiões com perfis de público diferentes foi decisivo: "O público de um lugar para outro é diferente. Isso influenciou muito. Alguns dos bairros, um no interior do município, outros do centro". Um empresário ressaltou que

[...] a escolha dos participantes influenciou [o fracasso da rede]. Seria preciso fazer uma pesquisa mais aprofundada e as empresas precisam ser mais parecidas. Havia união, as pessoas se davam bem, mas algumas coisas não fechavam, como compra de produtos e propaganda.

Mesmo que as empresas fossem do mesmo segmento de atuação, a incompatibilidade dos perfis passou a ser percebida somente com o início das atividades conjuntas. Segundo um entrevistado, "havia diferenças no tipo de produto que cada mercado precisava. Na hora de decidir o que comprar e anunciar, havia divisão, porque os produtos eram diferentes. Então, alguém sempre saía descontente". A falta de ajuste dos perfis das empresas, percebida com o avanço da rede, teve grande impacto para o andamento das atividades. A consequência foi que "não conseguíamos comprar nada em grande quantidade. Um vendedor vinha com uma ótima promoção, mas o que era interessante para alguns não era para outros. Então, a cada produto que comprávamos, o grupo ficava dividido".

As diferenças também ficaram claras quando o grupo iniciou atividades compartilhadas de marketing: "Chegamos a fazer anúncios em jornal, todos os sábados. Era a mesma mídia para todo o grupo, mas isso também foi uma questão que nos dividiu". Alguns queriam mídias que atingissem mais o seu público, mas que eram desinteressantes para outros empresários. O tamanho da rede impossibilitava a realização de ações simultâneas para atender a todos os interesses. Esse desajuste também foi citado por outro empresário: "havia discordância sobre a mídia. Começou a divisão em função disso: alguns queriam jornal, outros rádio, carro de som. Isso gerou divisão dentro do grupo".

Uma vez que o perfil dos participantes foi destacado como fator relevante para o insucesso da rede, fica reforçada a importância do processo de escolha dos integrantes, tanto em termos de porte quanto de público-alvo:

Um dos problemas maiores foi a forma como a universidade garimpou os varejistas. Ela estendeu o convite para todas as empresas, mas não foi medido o potencial de cada um, em termos de volume de compras. Havia disparidade dentro do grupo.

5.2 NÚMERO DE PARTICIPANTES

Os principais objetivos que levaram os entrevistados a participar da rede – negociações, compra conjunta e mídia compartilhada – dependiam significativamente da escala (volume de compras) que o grupo podia gerar. Questionado sobre os impactos do pequeno número de participantes para o insucesso da rede, um entrevistado respondeu que "a maior dificuldade foi o tamanho do grupo. Com oito integrantes não há volume de compras suficiente para obter ganhos na negociação; falta poder de compra ao pequeno varejista". Outro empresário argumentou que "o número de participantes não foi o suficiente. Com seis [depois que dois estabelecimentos desistiram] não tínhamos mais credibilidade".

Uma empresária argumentou que, além do pequeno número de participantes da rede, os ganhos de escala ficaram ainda mais limitados por causa das diferenças de perfil dos estabelecimentos: "Havia um desequilíbrio, então na verdade não estávamos entre oito, mas sim entre quatro". Um problema complementar destacado em várias entrevistas foi quanto ao real potencial de compras dos estabelecimentos: "No início os participantes diziam que tinham um volume de compras tal, mas, na hora de realmente fazer as compras, o volume era muito menor, o que inviabilizava boas negociações". Um integrante da equipe de negociações acredita que o volume de compras informado pelos participantes durante o processo de formação da rede nem sempre era realista.

O real potencial de compras do grupo foi confirmado somente à medida que as primeiras negociações foram realizadas: "Então acho que no início deveríamos ter medido o volume de compras para saber se era viável montar o grupo". Outro empresário confirma:

[...] diziam que tinham certo volume de compras, mas, na hora de comprar, o volume era bem menor. Talvez se soubéssemos desde o início o volume de compras, poderia ter dado certo. Não sabíamos o poder de compra do grupo, prometíamos um volume para o fornecedor e depois não conseguíamos cumprir.

Mesmo que não fosse garantia de sucesso para a rede, o conhecimento prévio do potencial de compras poderia indicar a necessidade de ampliar o número de participantes antes de formalizar a rede.

5.3 LANÇAMENTO DA REDE

Embora não haja consenso sobre esse aspecto, a decisão pelo lançamento da rede foi considerada inadequada por vários empresários. Um deles afirmou que "houve precipitação no lançamento da rede; não houve tempo para conseguir mais interessados antes de fechar o grupo". Outro empresário utilizou termos semelhantes:

Havia pressão para o lançamento e não estávamos amadurecidos o suficiente. O processo foi atropelado, não sei de que lado veio a pressão. Não tínhamos nem decidido o foco [das atividades da rede] e já estávamos na parte burocrática do processo [de formalização].

As consequências do lançamento prematuro foram destacadas por uma empresária: "para o lançamento deveríamos ter reunido um número maior de mercados. Acho que foi precipitado. O número era muito reduzido. Depois do lançamento não conseguimos novos associados". O lançamento significou a apresentação da rede para o mercado. A pressão por resultados passou a ser maior, uma vez que os participantes já haviam assumido a imagem pública de rede. Empresas convidadas a ingressar na rede acreditavam que poderiam usufruir imediatamente dos benefícios da cooperação, mas desistiam quando descobriam que a rede ainda não gerava resultados: "Queríamos ampliar depois do lançamento, mas as pessoas tinham medo de entrar em um grupo sem saber se haveria resultados. Não conseguíamos mostrar na prática o que dava para ganhar e então era difícil atrair novos participantes".

5.4 O APOIO DO PROGRAMA PÚBLICO E A MATURIDADE DO GRUPO

O suporte oferecido pelo Programa Redes de Cooperação foi considerado fundamental pelos empresários para que a rede fosse constituída. No entanto, a interrupção das atividades do programa e da parceria com a universidade local deixou o grupo sem apoio externo quatro meses após o evento de lançamento. Esse foi considerado um fator de grande impacto para o grupo: de um lado, houve desmotivação e redução no comprometimento dos participantes; de outro, as dificuldades para expandir o grupo aumentaram sem o apoio técnico e logístico da consultora destinada pelo programa à rede. As observações dos empresários apontam também para a questão da maturidade do grupo, incapaz de gerenciar o projeto sozinho, sem o apoio oferecido pelo programa público.

A redução do comprometimento fica clara na fala de um empresário:

O programa ajuda muito para o apoio da rede, e talvez a parada tenha nos desmotivado. Se tivesse continuado o apoio, talvez até tivéssemos ido mais longe. O pessoal não estava maduro ainda para andar sozinho; recém tínhamos começado a negociar.

Um empresário que permaneceu no grupo até o encerramento da rede ressaltou que, "para muitos, a parada do programa foi um problema, ficaram com medo de não conseguir levar a rede adiante". Além disso, "a saída do programa impactou porque o pessoal se sentia no dever de dar um retorno enquanto tinha o acompanhamento. Quando isso parou, cada um puxou para seu lado e não teve mais como segurar, no fim ficamos entre três". Isto é, percebe-se que o comprometimento resultava de um compromisso moral com as instituições (governo estadual e universidade local) que apoiavam a rede.

Quanto ao segundo aspecto – dificuldades na expansão –, um membro da diretoria entende que o apoio do programa seria essencial para que novos associados pudessem ser arregimentados.

Um ponto-chave, negativo, foi a parada do programa. Teríamos tido condições de continuar e ampliar a rede se não houvesse essa parada. Havia uma grande dependência em relação à consultora [...] o grupo era leigo, não estava preparado para gerir a rede, em especial a expansão. Tornou-se difícil demais para os integrantes, principiantes na lógica da rede, conseguir buscar a expansão.

Outro empresário reforça:

[...] estávamos com dificuldade para buscar novos associados, e com a parada do programa não havia condições de conseguir essa expansão. Já não tínhamos ganhos com a rede e nem podíamos sair de nossas empresas para visitar outros potenciais participantes. Como cada um tem seu negócio, não conseguíamos o tempo necessário para isso e também não estávamos preparados para isso.

A participação da universidade e do programa também era vista como um fator legitimador do grupo diante de potenciais novos associados: "Deveríamos ter começado com um grupo maior. Mesmo assim, a participação da universidade é fundamental para conseguir novos associados, porque é uma entidade que dá respaldo".

5.5 OBJETIVOS COMPARTILHADOS E IMEDIATISMO

A existência de objetivos distintos dentro do grupo que formou a rede não foi apontada como fator-chave para o fracasso da iniciativa. Entretanto, o andamento das atividades acabou levando à divisão do grupo e ao surgimento de objetivos conflitantes. Mesmo que inicialmente todos concordassem com os objetivos estabelecidos, a pressão por resultados imediatos contribuiu para que alguns ficassem desmotivados e tivessem suas expectativas frustradas. Um entrevistado ressaltou o seguinte: "inicialmente os objetivos eram os mesmos, mas uns esperavam resultado imediato. Esse foi o ponto-chave, achar que a rede imediatamente resolveria os problemas em seu negócio. Isso só vem com muito trabalho".

O pequeno número de empresas que compuseram a rede também foi atribuído à busca de resultados imediatos. De acordo com um ex-presidente da rede:

[...] houve reuniões com 20 a 30 participantes, no início. Não sei onde foi a falha para que tão poucas empresas tenham aderido. Nós deduzimos que a grande maioria pensou em compras imediatas, a partir das primeiras reuniões. Na terceira reunião, os empresários já estavam fazendo levantamento de volume de compras, sem ter nada definido em termos de organização da rede. A ideia do lucro imediato.

Outro entrevistado complementou:

[...] houve muita falta de vontade de alguns integrantes, expectativas de ganhos imediatos, de comprar mais barato de um dia para o outro. Então alguns começaram a sair, a falar mal da rede. Acho que não entenderam bem a ideia que estava sendo proposta.

À medida que as dificuldades apareceram, especialmente as diferenças de perfil dos mercados e a impossibilidade de gerar volume de compras para obter vantagens, a divisão do grupo ficou mais clara e os objetivos tornaram-se diferentes. O seguinte comentário foi feito por um dos primeiros empresários que desistiram da rede:

Foram duas ou três negociações, aí já puxaram meu tapete e eu saí fora. "Nós" estávamos entre três e "eles" entre cinco. Ficar discutindo não adiantava e a reunião não fluía. Havia muita divisão entre os três que negociavam [pela rede] e os outros. Decidi ficar um pouco mais na retaguarda, mas não dava mais minha opinião.

A utilização dos termos "nós" e "eles" demonstra claramente a divisão do grupo, consequência das divergências internas geradas na rede.

Com o passar do tempo, as diferenças ficaram mais visíveis e o impacto na motivação dos participantes era evidente.

Naquela reunião, eu vi que outra empresária estava colocando a opinião dela e tinha opinião forte. Eles tinham uma convivência maior com a consultora, então a palavra deles tinha mais peso, mas não prevalecia a razão. Ela tinha objetivos diferentes, queria trabalhar com outros tipos de mercadorias.

As consequências foram o esvaziamento da rede e a diminuição da participação dos associados. Como ressaltou um empresário que participava da equipe de negociação: "precisávamos das reuniões para tomar as decisões e alguns acabavam não vindo. Então eram tomadas decisões sobre compras e mídia e depois os que não tinham vindo achavam ruim e criticavam as decisões".

Uma situação em particular foi citada por diversos entrevistados e demonstra a situação da rede poucos meses após o lançamento, quando alguns objetivos estabelecidos já haviam sido frustrados:

Uma dessas pessoas que nunca vinha nas reuniões, quando veio, causou um grande estrago. Justamente naquele dia tínhamos dois candidatos para entrar na rede. Na reunião em que eles vieram para aderir à rede, esse comerciante anunciou que iria sair do grupo, porque não estava valendo a pena participar.

Os comentários demonstram que, embora possa haver objetivos comuns no início, ocorrem mudanças à medida que os relacionamentos avançam. Como destacaram Khanna, Gulati e Nohria (1998), é natural que haja assimetria de incentivos para investir na relação. O rumo e o resultado das atividades podem gerar desapontamentos que influenciam na motivação e na participação.

5.6 UM OLHAR EXTERNO: A VISÃO DA CONSULTORA

A entrevista com a consultora que ofereceu suporte para a criação e o desenvolvimento da rede foi realizada com o objetivo de confirmar as observações da diretoria e dos empresários e obter um olhar externo sobre a questão. Dentre os aspectos-chave para o insucesso da rede, apontaram-se a interrupção do programa público de apoio, as diferenças de perfil das empresas participantes, o número reduzido de empresas que formava a rede e o próprio perfil dos empresários, que dificultou a gestão autônoma da rede.

De acordo com a consultora, "um dos principais motivos foi a falta de suporte do programa. Eles não tinham capacitação para gerenciar [a rede]. Quando o programa parou, eles perderam o chão. Eles não conseguiam se organizar sozinhos". A expansão, que já era difícil mesmo com o apoio do programa, tornou-se inviável para o grupo atuando sozinho. A diferença de ideias também foi importante: "Eles não conseguiam pensar em grupo. Eles continuavam pensando de forma individual. [...] Só se envolviam na tarefa quando interessava para eles". Além disso,

[...] vendiam para públicos diferentes. Esse foi um fator que dificultou bastante. Mas, na hora de procurar as pessoas e formar o grupo, não conseguimos antecipar esse tipo de situação. Para nós, parecia que o perfil era parecido, pelo porte, e depois vimos que não, em função da região, do tipo de clientes e até dos empresários.

Sobre o lançamento, a consultora argumenta: "foi no momento em que eles estavam no auge da motivação. Hoje avalio que deveriam ter buscado mais parceiros para o lançamento, para se inserirem com mais força no mercado, e não aquele grupo pequeno". Entretanto, segundo a consultora, o grupo já trabalhava havia seis meses, e retardar o lançamento poderia gerar desmotivação e frustração. As tentativas de agregar mais interessados retardavam o avanço dos trabalhos, e muitos que participaram das reuniões iniciais desistiram porque desejavam resultados imediatos: "tinham a expectativa de que iriam entrar hoje e amanhã já estariam ganhando, comprando em conjunto".

Tanto o baixo número de participantes como as diferenças de perfil das empresas faziam que o poder de barganha fosse baixo, sem atratividade para os fornecedores: "Somente em alguns poucos casos conseguiam uma margem melhor na rede do que conseguiriam sozinhos". Um aspecto adicional é trazido pela consultora: a falta de preparação do grupo e de lideranças para conduzir o trabalho. Embora houvesse boa vontade, não havia ninguém no grupo com perfil de líder para motivar e coordenar os trabalhos. Isto é, mesmo que não houvesse competição interna e inicialmente todos estivessem focados para os mesmos objetivos, a falta de preparação dos empresários e a inexistência de líderes para coordenar o grupo tiveram peso significativo, na opinião da consultora.

6 DISCUSSÃO: CONTRIBUIÇÕES PARA A TEORIA E A PRÁTICA ORGANIZACIONAL

O sucesso ou o fracasso de uma organização complexa, como é o caso de uma rede de empresas, não pode ser atribuído a fatores isolados, sob pena de incorrer em simplificações. No entanto, com base nas entrevistas em profundidade com empresários e a consultora da rede, é possível analisar os aspectos mais relevantes para o fracasso da iniciativa e confrontar esses resultados com as abordagens teóricas. Com base no modelo integrativo de fracasso em alianças, proposto por Park e Ungson (2001), observa-se, no caso pesquisado, que a existência de rivalidade entre as firmas não foi um fator preponderante para o insucesso. Em nenhum momento, os empresários fizeram referência a esse fator para o fracasso da cooperação. Notadamente, os principais motivos para que a rede tenha fracassado estão relacionados ao segundo eixo do modelo proposto pelos autores, apresentado anteriormente na Figura 1.

A complexidade gerencial, aliada às dificuldades de coordenação e ao desajuste estratégico, levou à redução no comprometimento, à baixa eficiência e, por fim, ao fracasso da rede. Como previsto por Park e Ungson (2001) e Jarillo (1988), a parceria foi desfeita quando os participantes compreenderam que ela não seria capaz de gerar benefícios econômicos em volume suficiente para superar os custos potenciais de gerenciar a aliança. Os resultados da pesquisa de campo, no entanto, destacaram fatores não contemplados pela abordagem teórica utilizada, principalmente em função das particularidades das redes locais.

A Figura 3 sintetiza os fatores destacados pelos empresários nas entrevistas, relacionando-os com os momentos do processo de constituição da rede em que tiveram maior impacto. Os fatores foram divididos em duas categorias, as quais tiveram impacto diferente para o fracasso da rede e merecem atenção distinta por parte de teóricos e gestores de redes interorganizacionais: pré-lançamento e pós-lançamento da rede de empresas.


Como fatores pré-lançamento da rede que contribuíram para o fracasso da iniciativa, estão o perfil dos participantes selecionados, o número de empresas que efetivamente fizeram parte do grupo e o momento de lançamento da rede. As diferenças de perfil entre as empresas (localização, público-alvo, volume de compras) eram anteriores à formalização da rede, mas tornaram-se nítidas somente quando as ações de cooperação iniciaram efetivamente e o grupo já estava constituído. No momento de convite e seleção das empresas, essas diferenças não foram percebidas e consideradas.

Os outros dois fatores pré-lançamento – número reduzido de participantes e lançamento da rede – estão relacionados: uma vez realizado o lançamento com apenas oito empresas, tornou-se mais difícil atrair novos associados. Interessados em aderir à rede sentiram insegurança em fazer parte de uma rede com poucos integrantes e que ainda não apresentava resultados, mesmo já tendo sido lançada no mercado. O retardo do lançamento, com o propósito de agregar um número maior de empresas, poderia ter sido um fator importante para contornar a limitação relacionada ao volume de compras. No entanto, os custos envolvidos com a participação nas atividades da rede e o imediatismo de muitos empresários (as reuniões iniciais contavam com mais de 30 participantes) impediram que um grupo maior fosse formado antes do lançamento.

Quanto aos fatores pós-lançamento que influenciaram para que a rede fracassasse, destacam-se o desajuste estratégico, a perda de apoio do programa público e a maturidade do grupo. O desajuste estratégico (PARK; UNGSON, 2001) – ou incompatibilidade de objetivos (BROUTHERS; BROUTHERS; WILKINSON, 1995) – ficou claro quando o perfil das empresas integrantes mostrou-se diferente. Realizar compras conjuntas e mídia compartilhada era inviável e o grupo ficou dividido. As ações conjuntas não geravam resultados equilibrados para todos os participantes (JARILLO, 1988; AMALDOSS et al., 2000). Como consequência, houve desmotivação dos empresários e redução na participação/assimetria de incentivos (KHANNA; GULATI; NOHRIA, 1998).

Paralelo a isso, a perda de apoio do programa público também impactou no comprometimento dos empresários e na legitimidade da rede para buscar novos associados. Sem o trabalho da consultora, a expansão ficou inviabilizada, e a impossibilidade de ampliar o pequeno número de integrantes foi decisiva. A falta de maturidade do grupo para gerenciar o processo e buscar soluções, independentemente do apoio público, também contribuiu para o insucesso. A complexidade gerencial das redes (PARK; UNGSON, 2001) mostrou-se um fator relevante para o insucesso.

Finalmente, é importante recuperar o argumento de Zineldin (2004), segundo o qual firmas de pequeno porte podem ter pouco a trazer para um relacionamento – seja em termos de recursos, conhecimentos ou vantagens competitivas. Isolado, esse já é um fator de grande importância a ser considerado por gestores e teóricos organizacionais envolvidos com o tema redes de empresas. No caso da rede pesquisada, os recursos agregados pelos parceiros não foram suficientes para gerar vantagens capazes de viabilizar a rede. Como afirmam Dyer e Singh (1998), os ganhos relacionais somente são possíveis quando os parceiros combinam ativos, conhecimentos e recursos idiossincráticos, e os mecanismos de governança utilizados reduzem os custos de transação e geram ganhos.

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo partiu de duas verificações: 1. os estudos sobre redes interorganizacionais privilegiam os casos de sucesso e a compreensão de benefícios e resultados positivos gerados; 2. apesar do grande número de redes interorganizacionais que alcançam o sucesso, há diversos casos de redes que não atingem seus objetivos e encerram suas atividades. Nesse sentido, optou-se por realizar um estudo de caso com uma rede de pequenas empresas supermercadistas que fracassou. Por meio de entrevistas em profundidade com a diretoria, os empresários da rede e a consultora que apoiou seu desenvolvimento, identificaram-se os principais fatores que levaram ao insucesso da iniciativa.

Os fatores mais significativos, identificados no contato com os entrevistados, foram classificados em duas categorias. Uma delas foi denominada fatores pré-lançamento da rede, na qual se incluem o perfil e a escolha dos participantes, o número de participantes da rede e a escolha do momento para lançamento da rede. A segunda categoria, denominada fatores pós-lançamento da rede, inclui aspectos como o surgimento de desajustes estratégicos, a perda de apoio do programa público – que havia participado ativamente da constituição da rede – e a falta de maturidade do grupo, que enfrentou dificuldades para gerenciar o processo de cooperação sem apoio externo.

Embora a coleta de dados tenha sido realizada em fontes distintas e que permitiram a triangulação de informações, a principal limitação do artigo refere-se ao fato de ter sido estudado um único caso, por causa das dificuldades em pesquisar redes de empresas que fracassaram. Os resultados de um estudo de caso único dizem respeito somente à situação específica pesquisada e não permitem generalizações. Podem, no máximo, gerar indicações para outros estudos ou situações. Dado que, neste estudo, foi pesquisada somente uma rede, com suas peculiaridades e características, sugere-se que sejam realizadas pesquisas complementares com redes que não tiveram êxito nas atividades de cooperação, em outros segmentos de atuação. A realização de novos estudos permitirá comparações e confrontações com os resultados apresentados, contribuindo para a consolidação de um corpo teórico sobre o tema.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Mar 2012
  • Data do Fascículo
    Fev 2012
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