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INOVAÇÃO EM MERCADOS EMERGENTES: O PAPEL DA CAPACIDADE DE ABSORÇÃO E DA INSERÇÃO EM CADEIAS DE VALOR LOCAL E GLOBAL

RESUMO

Objetivo:

O objetivo deste estudo é identificar os efeitos da inserção em cadeias de valor local e global como um determinante para a inovação da firma em países emergentes, bem como a relação existente entre capacidade de absorção e inserção em cadeias de valor.

Originalidade/valor:

Este artigo combina contribuições de diferentes correntes de literatura para desenvolver uma estrutura mais abrangente sobre a análise da inovação em firmas de países emergentes. O estudo considera as relações entre os parceiros na cadeia de valor local e global, bem como a influência dos recursos internos como crucial para o acesso ao conhecimento externo.

Design/metodologia/abordagem:

As análises econométricas foram feitas usando modelos lineares generalizados. O período de análise compreende os anos de 1998 a 2011. As hipóteses de pesquisa foram testadas utilizando diferentes modelos para relacionar a capacidade de inovação das empresas à inserção em cadeias de valor local e global ou à posse de recursos internos e externos.

Resultados:

Os resultados deste estudo indicam que o relacionamento com todos os parceiros na cadeia de valor global contribui para aumentar os níveis de inovação das empresas pesquisadas. Os recursos internos tiveram influência positiva sobre a capacidade de inovação das empresas, sugerindo que os recursos internos são de importância crucial no acesso ao conhecimento externo, o que significa que a capacidade das empresas de utilizar esse conhecimento depende, fundamentalmente, de sua capacidade de absorção.

PALAVRAS-CHAVE
Inovação; Cadeia de valor; Capacidade de absorção; Cooperação; Modelos lineares generalizados

ABSTRACT

Objective:

The objective of this study is to identify the effects of the insertion in local and global value chains as a determinant of company innovation, identifying the main characteristics of the nature of the interactions that arise in the value chain, as well as the relationship between innovation, internal resources to the company and their insertion in value chains.

Originality/value:

This paper combines insights from different streams of literature to develop a more comprehensive framework for the analysis of firms’ innovation in emerging countries. We consider relationships among partners in the local and global value chain and the influence of the internal resources as crucially important for the access to external knowledge.

Design/methodology/approach:

Econometric analysis were performed using generalized linear models (GLM). The period of analysis covers the years 1998 to 2011. We investigate our hypotheses using different models to relate firms’ innovation capacity to local and global value chains and the ownership of internal and external resources.

Findings:

Using data from Brazilian firms from 1998 to 2011, we found that the relationship with all partners in global value chain contributed to the increase of the Brazilian firm’s innovation. The internal resources had a positive influence in firm’s innovation, suggesting that the firm’s internal resources are crucially important in the access to external knowledge, which means that the ability of firms to make use of this knowledge depends, in turn, on their absorptive capacity.

KEYWORDS
Innovation; Value chain; Absorptive capacity; Cooperation; Generalized linear models

1. INTRODUÇÃO

As mudanças tecnológicas impulsionam o crescimento (Romer, 1990Romer, P. (1990). Endogenous technological change. Journal of Political Economy, 98(5), S71-S102.). Pesquisa e desenvolvimento (P&D), resultando em novos conhecimentos, novos processos e novos produtos, são uma importante fonte de progresso técnico, de acordo com a teoria do crescimento endógeno baseado em P&D (Romer, 1990Romer, P. (1990). Endogenous technological change. Journal of Political Economy, 98(5), S71-S102.). Até onde sabemos, os países emergentes carecem de crescimento, uma vez que as empresas em seus mercados são retardatárias em relação à capacidade de inovação (Garrido, Parente, Gonçalo, & Vasconcellos, 2017Garrido, I. L., Parente, R. C., Gonçalo, C. R., & Vasconcellos, S. L. de. (2017). Remaining innovative: The role of past performance, absorptive capacity, and internationalization. Brazilian Business Review, 14(6), 559-574. doi:10. 15728/bbr.2017.14.6.1
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; Awate, Larsen, & Mudambi, 2012Awate, S., Larsen, M. M., & Mudambi, R. (2012). EMNE catch-up strategies in the wind turbine industry: Is there a trade-off between output and innovation capabilities? Global Strategy Journal, 2, 205-223. doi:10.1111/ j.2042-5805.2012.01034.x
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; Li, Chen, & Shapiro, 2010Li, J., Chen, D., & Shapiro, D. M. (2010). Product innovations in emerging economies: The role of foreign knowledge access channels and internal efforts in Chinese firms. Management & Organization Review, 6(2), 243-266. doi:10.1111/j.1740-8784.2009.00155.x
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).

Dada tal compreensão de que as novas tecnologias são fundamentais para o desenvolvimento do país, a atenção para entender os motores que geram a inovação tecnológica vem aumentando na academia com estudos discutindo os modos de inovação e o papel das fontes de conhecimento em inovação (Lundvall, 1992Lundvall, B. A. (1992). National systems of innovation: Towards a theory of innovation and interactive learning. London: Pinter.; Jensen, Johnson, Lorenz, & Lundvall, 2007Jensen, M. B., Johnson, B., Lorenz, E., & Lundvall, B. A. (2007). Forms of knowledge and modes of innovation. Research Policy, 36(5), 680-693. doi:10.1016/j.respol.2007.01.006
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), e confirmações de que a mudança técnica é facilitada pela confiança na cooperação interempresa entre as indústrias (Opper & Nee, 2015Opper, S., & Nee, V. (2015). Network effects, cooperation and entrepreneurial innovation. Asian Business & Management, 14(4), 283-302.).

Neste artigo, abordamos duas correntes diferentes de literatura para desenvolver uma estrutura mais abrangente para analisar a inovação em países emergentes, ligando as empresas à inovação, à cooperação em nível de cadeia local e global e ao papel dos recursos internos de uma empresa para acessar conhecimento externo (Cohen & Levinthal, 1989Cohen, W., & Levinthal, D. (1989). Innovation and learning: The two faces of R&D. Economic Journal, 99(1), 569-596. , 1990Cohen, W., & Levinthal, D. (1990). Absorptive capacity: A new perspective on learning and innovation. Administrative Science Quarterly, 35, 128-152.). A literatura carece de conhecimento sobre os efeitos conjuntos das redes de relacionamento e do recurso interno da empresa sobre a inovação (Schøtt & Jensen, 2016Schøtt, T., & Jensen, K. W. (2016). Firms’ innovation benefiting from networking and institutional support: A global analysis of national and firm effects. Research Policy, 45, 1233-1246. doi:10.1016/j.respol.2016. 03.006
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). Então, com esta pesquisa buscamos compreender como a inovação da empresa é afetada por sua cooperação na cadeia de valor e como recebe a influência de seus próprios recursos.

Do ponto de vista analítico, implica a necessidade do estudo das atividades que ocorrem fora das empresas e, em particular, compreende o papel estratégico da relação com os principais atores externos (Pietrobelli & Saliola, 2008Pietrobelli, C., & Saliola, F. (2008). Power relationships along the value chain: Multinational firms, global buyers and performance of local suppliers. Cambridge Journal of Economics, 32, 947-962. doi:10.1093/cje/ben016.
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). No entanto, temos que reconhecer o papel dos recursos internos de uma empresa como crucialmente importante no acesso ao conhecimento externo (Cohen & Levinthal, 1989Cohen, W., & Levinthal, D. (1989). Innovation and learning: The two faces of R&D. Economic Journal, 99(1), 569-596. , 1990Cohen, W., & Levinthal, D. (1990). Absorptive capacity: A new perspective on learning and innovation. Administrative Science Quarterly, 35, 128-152.) e combinar ambos, explorando recursos de diferentes fontes. Essa capacidade de integrar conhecimento dentro e fora dos limites da empresa é uma capacidade organizacional distintiva que se desenvolve em uma organização ao longo do tempo (Lorenzoni & Lipparini, 1999Lorenzoni, G., & Lipparini, A. (1999). The leveraging of inter-firm rela­tionships as a distinctive organizational capability: A longitudinal study. Strategic Management Journal, 20, 317-338. ; Phene & Almeida, 2008Phene, A., & Almeida, P. (2008). Innovation in multinational subsidiaries: The role of knowledge assimilation and subsidiary capabilities. Journal of International Business Studies, 39(5), 901-919.).

A literatura organizacional sugere que para entender de onde vêm as inovações é importante ir além do estudo do empreendedor e da firma para especificar os efeitos da rede de relacionamentos na atividade de inovação. A importância de arranjos organizacionais como as trocas não mercadológicas e os efeitos de rede (aprendizagem social, influência normativa e externalidades de rede) na facilitação de P&D é inquestionável (Opper & Nee, 2015Opper, S., & Nee, V. (2015). Network effects, cooperation and entrepreneurial innovation. Asian Business & Management, 14(4), 283-302.). Com efeito, consideramos que os recursos externos, por si sós, não garantem o acesso e a exploração pelas empresas. Os recursos internos são, portanto, motores de acesso, exploração e combinação de conhecimento externo (Powell, Koput, & Smith-Doerr, 1996Powell, W. W., Koput, K. W., & Smith-Doerr, L. (1996). Interorganizational collaboration and the locus of innovation: Networks of learning in biotechnology, Administrative Science Quarterly, 41(1), 116-145. doi:10.2307/ 2393988
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; Zaheer & Bell, 2005Zaheer, A., & Bell, G. G. (2005). Benefiting from network positions: Firm capabilities, structural holes, and performance. Strategic Management Journal, 26, 809-825.). Em seguida, exploramos essa relação entre recursos internos e externos no modelo proposto nesta pesquisa. Além disso, analisamos diferentes situações em que as relações de cooperação são estabelecidas entre parceiros domésticos e globais na cadeia de valor ao longo do tempo.

Considerando as diferentes correntes na literatura, abordamos as lacunas de pesquisa ao vincularmos a inovação das empresas à existência de cooperação ao nível da cadeia nacional e global em um determinado país. Isso é ainda mais relevante em um país em desenvolvimento, como é o caso do Brasil, um país com forte histórico relacionado ao processo de substituição de importações e presença bem estabelecida de investidores estrangeiros diretos em seus setores industriais, realizando mudanças significativas no que se refere ao apoio à geração de inovações (Warwick, 2013Warwick, K. (2013). Beyond industrial policy: Emerging issues and new trends. OECD Science, Technology and Industry Policy Papers, (2). doi:10.17 87/5k4869clw0xp-en
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).

O artigo aborda algumas das questões mais relevantes nesse campo de pesquisa, tais como:

  • Existem diferenças entre a inserção na cadeia de valor local (CVL) e na cadeia de valor global (CVG) como um fator determinante para a inovação das empresas?

  • Quais são as principais características da natureza das interações que surgem na cadeia de valor, lideradas por fornecedores/compradores nacionais ou globais?

  • Existe uma correlação positiva entre a inovação das empresas, seu relacionamento em uma cadeia de valor e o recurso interno da empresa?

A análise empírica é baseada em dados agregados da Pesquisa de Inovação Tecnólogica (Pintec) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), complementados com dados anuais de investimento estrangeiro direto (IDE) por setor, obtidos no Banco Central do Brasil (BCB). Para analisar o comportamento das inovações das empresas ao longo do tempo, utilizamos todos os dados disponíveis das pesquisas da Pintec, correspondentes ao período 1998-2011.

O artigo está organizado em quatro seções, além deste texto introdutório. Com base na literatura sobre inovação, CVL, CVG e capacidade de absorção, a seção 2 estabelece alguns parâmetros conceituais e delineia as hipóteses para a análise. Os aspectos metodológicos são descritos na seção 3. Adotando essa metodologia, a seção 4 resume os principais resultados encontrados neste estudo e a seção 5 apresenta as principais conclusões.

2. TEORIA E HIPÓTESES

A abordagem que examina as relações entre cooperação e inovação tem estado presente na literatura econômica e de gestão há algumas décadas, atraindo muita atenção de pesquisadores, uma vez que a importância da inovação foi reconhecida como fundamental à construção de vantagem competitiva das empresas e, consequentemente, dos países. Sabemos que apoiar as cadeias de valor representa aproveitar seu potencial para aumentar a produtividade e o crescimento econômico, especialmente nas economias emergentes, em que é possível gerar economias de escala, acessar novas tecnologias e informações, bem como fortalecer suas empresas (Barrientos, Gary, & Rossi, 2011Barrientos, S., Gary, G., & Rossi, A. (2011). Economic and social upgrading in global production networks: a new paradigm for a changing world. International Labour Review, 150(3-4), 299-319.).

Pesquisas sobre relacionamentos na cadeia de valor (local e global) têm sido exploradas, identificando tipos de governança existentes, que diferem de acordo com uma trilogia de atributos (Gereffi, Humphrey, & Sturgeon, 2005Gereffi, G., Humphrey, J., & Sturgeon, T. (2005). The governance of global value chains. Review of International Political Economy, 12(1), 78-104. doi:10. 1080/09692290500049805
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); identificando os fatores que determinam o comportamento dos participantes da cadeia e as relações que se estabelecem entre eles, em conjunto com as regras ambientais em que operam (Singh & Gaur, 2013Singh, D. A., & Gaur, A. S. (2013). Governance structure, innovation and internationalization: Evidence from India. Journal of International Management, 19(3), 300-309.).

A literatura existente é muito extensa, e muito da análise organizacional das estratégias de cooperação em P&D baseia-se em atividades de pesquisa em economias industriais avançadas (Powell et al., 1996Powell, W. W., Koput, K. W., & Smith-Doerr, L. (1996). Interorganizational collaboration and the locus of innovation: Networks of learning in biotechnology, Administrative Science Quarterly, 41(1), 116-145. doi:10.2307/ 2393988
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; Opper & Nee, 2015Opper, S., & Nee, V. (2015). Network effects, cooperation and entrepreneurial innovation. Asian Business & Management, 14(4), 283-302.). Nas economias desenvolvidas, além da facilidade de engajar-se em acordos de inovação de alto nível local e global, há direitos de propriedade bem especificados, bem como interferência de políticas públicas no mercado, o que faz com que as abordagens de análise e pesquisa variem muito entre economias em desenvolvimento. Apesar de os achados da maioria dos estudos geralmente confirmarem as relações positivas entre inovação e cooperação, outros aspectos precisam ser considerados e, portanto, justificam a realização do presente estudo.

2.1 A atividade inovadora das empresas, os encadeamentos na cadeia de valor e a capacidade de absorção

Uma revisão de estudos sobre as relações entre inovação e cooperação identificou os benefícios significativos relacionados à inovação decorrentes de redes interorganizacionais. Quando uma empresa começa a colaborar, ela desenvolve experiência em cooperação e reputação. Com o tempo, as empresas desenvolvem capacidades para interagir com outras empresas (Powell et al., 1996Powell, W. W., Koput, K. W., & Smith-Doerr, L. (1996). Interorganizational collaboration and the locus of innovation: Networks of learning in biotechnology, Administrative Science Quarterly, 41(1), 116-145. doi:10.2307/ 2393988
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).

As empresas também minimizam e compartilham as incertezas inerentes à P&D, especialmente em indústrias de alta tecnologia, nas quais o conhecimento técnico necessário para o desenvolvimento de inovações está nas fronteiras de diferentes áreas científicas e envolve complexidades que nenhuma empresa pode internalizar em seu departamento de P&D (Olleros & MacDonald, 1988Olleros, F., & MacDonald, R. J. (1988). Strategic alliances: Managing complementarity to capitalize on emerging technologies. Technovation, 7, 155-176.). Outro benefício da cooperação é que as empresas podem exercer controle sobre a entrada no mercado, obter acesso a novos mercados para seus produtos e reduzir o tempo necessário para inovações (Opper & Nee, 2015Opper, S., & Nee, V. (2015). Network effects, cooperation and entrepreneurial innovation. Asian Business & Management, 14(4), 283-302.; Lewandowska, Szymura-Tyc, & Gołębiowski, 2016Lewandowska, M. S., Szymura-Tyc, M., & Gołębiowski, T. (2016). Innovation complementarity, cooperation partners, and new product export: evidence from Poland. Jornal of Business Research, 69(9), 3673-3681.).

As evidências mostram como as empresas podem se beneficiar, no processo de inovação, da colaboração com diversos parceiros da cadeia de valor, como clientes, fornecedores, distribuidores e até concorrentes. Parece haver diferenças para diferentes tipos de parceiros (Schøtt & Jensen, 2016Schøtt, T., & Jensen, K. W. (2016). Firms’ innovation benefiting from networking and institutional support: A global analysis of national and firm effects. Research Policy, 45, 1233-1246. doi:10.1016/j.respol.2016. 03.006
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; Beers & Zand, 2014Beers, V., & Zand, F. (2014). R&D cooperation, partner diversity, and innovation performance: an empirical analysis. Journal of Productive Innovation Management, 31(2), 292-312.), ou seja, as interações com diferentes tipos de parceiros tendem a facilitar vários estágios do processo de inovação e variam em benefícios para inovação de produto e de processo (Schøtt & Jensen, 2016Schøtt, T., & Jensen, K. W. (2016). Firms’ innovation benefiting from networking and institutional support: A global analysis of national and firm effects. Research Policy, 45, 1233-1246. doi:10.1016/j.respol.2016. 03.006
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).

Nossa análise está preocupada com a potencial cooperação que resultaria da exploração de complementaridades entre atores situados em diferentes partes da cadeia de valor (clientes, fornecedores e concorrentes) e em diferentes localizações geográficas (domésticas e estrangeiras). Chamamos de cadeia de valor local (CVL) ou cadeia de valor no país de origem quando ela inclui relacionamentos com clientes, fornecedores e concorrentes de empresas fisicamente localizadas no mercado doméstico da empresa focal (Prashantham & Birkinshaw, 2015Prashantham, S., & Birkinshaw, J. (2015). Choose your friends carefully: Home-country ties and new venture internationalization. Management International Review, 55(1), 207-234.), enquanto denominamos cadeia de valor global (CVG) aquela na qual uma firma doméstica estabelece relacionamento com filiais de empresas multinacionais, bem como atores localizados em um país estrangeiro.

Tradicionalmente, os teóricos têm discutido como um forte grupo local composto por atores concorrentes e complementares intensifica a competitividade de uma empresa, acelera o processo de inovação e estimula o processo de formação de novos negócios, aumentando a força geral do cluster (Marshall, 1920Marshall, A. (1920). Principles of economics. London: Macmillan.; Porter, 1990Porter, M. (1990). New global strategies for competitive advantage. Planning Review, 18(3), 4-14.).

Em termos de construção de capacidades, é geralmente aceito que as fortes relações que se estabelecem no país de origem têm o potencial de aumentar a competitividade e a produtividade das empresas locais (Porter, 1990Porter, M. (1990). New global strategies for competitive advantage. Planning Review, 18(3), 4-14.), mas somente quando há um aglomerado dinâmico de empresas inovadoras operando em estreita proximidade física (Prashantham & Birkinshaw, 2015Prashantham, S., & Birkinshaw, J. (2015). Choose your friends carefully: Home-country ties and new venture internationalization. Management International Review, 55(1), 207-234.). Beers e Zand (2014)Beers, V., & Zand, F. (2014). R&D cooperation, partner diversity, and innovation performance: an empirical analysis. Journal of Productive Innovation Management, 31(2), 292-312. explicam que os fornecedores podem proporcionar conhecimento tecnológico sobre os processos de produção da empresa, enquanto os clientes e as universidades são fontes de conhecimento de mercado, respectivamente (Belderbos, Carree, & Lokshin, 2004Belderbos, R., Carree, M., & Lokshin, B. (2004). Cooperative R&D and firm performance. Research Policy, 33, 1477-1492.). As empresas compartilham os custos e os lucros conjuntos com seus fornecedores no desenvolvimento de novos produtos, e os fornecedores podem encontrar novas oportunidades para reduzir os custos de fabricação, desenvolvendo projetos econômicos e aumentando suas receitas, bem como melhorando a adaptabilidade mercadológica de suas peças e módulos padronizados (Chung & Kim, 2003Chung, S., & Kim, G. M. (2003). Performance effects of partnership between manufacturers and suppliers for new product development: The supplier’s standpoint. Research Policy, 32(1), 587-603.).

A cooperação com fornecedores ou clientes tem como objetivo agrupar recursos complementares e acessar mais informações de mercado, já a cooperação com instituições públicas envolve firmas que se aproximam fortemente de fontes externas de P&D e têm um impacto positivo sobre patentes, enquanto a cooperação vertical somente impacta a introdução de novos produtos no mercado. A cooperação com rivais parece ser usada principalmente para compartilhar custos de P&D em setores de alta tecnologia (Miotti & Sachwald, 2003Miotti, L., & Sachwald, F. (2003). Cooperative R&D: Why and with whom? An integrated framework of analysis. Research Policy, 32, 1481-1499.). No entanto, observamos que as empresas de um mesmo cluster podem se beneficiar da observação direta dos concorrentes. O estudo desenvolvido por Nieto e Santamaria (2007)Nieto, M. J., & Santamaria, L. (2007). The importance of diverse collaborative networks for the novelty of product innovation. Technovation, 27(6-7), 367-377. identificou que a colaboração com fornecedores, colaboradores e institutos de pesquisa não só beneficiou a inovação, mas também descobriu relação negativa para a colaboração com os concorrentes.

Considerando os principais resultados relativos ao papel das relações de cooperação com diferentes parceiros na cadeia de valor, desenvolvemos as seguintes hipóteses de pesquisa:

  • H1a: A cooperação para inovar com o fornecedor local aumenta positivamente a probabilidade e a intensidade de desenvolvimento da inovação na empresa.

  • H1b: A cooperação para inovar com o cliente local aumenta positivamente a probabilidade e a intensidade de desenvolvimento da inovação na empresa.

  • H1c: A cooperação para inovar com concorrentes locais aumenta positivamente a probabilidade e a intensidade de desenvolvimento da inovação na empresa.

A integração do conhecimento interno de uma empresa com conhe­cimento externo, acessível por meio da cooperação entre empresas, afeta fortemente o desempenho da inovação (Zaheer & Bell, 2005Zaheer, A., & Bell, G. G. (2005). Benefiting from network positions: Firm capabilities, structural holes, and performance. Strategic Management Journal, 26, 809-825.). A localização doméstica ou estrangeira dos parceiros de cooperação também influencia as atividades de inovação das empresas, no entanto os parceiros no exterior estão inseridos em sistemas de inovação nacionais distintos dos parceiros no mercado doméstico e, portanto, têm acesso a recursos específicos do país (Miotti & Sachwald, 2003Miotti, L., & Sachwald, F. (2003). Cooperative R&D: Why and with whom? An integrated framework of analysis. Research Policy, 32, 1481-1499.).

O debate sobre a adequação de dois tipos de fontes externas de conhecimento - doméstica (país de origem) e estrangeira (país anfitrião) - produz resultados mistos, embora a maioria das discussões esteja relacionada à internalização da empresa (Lewandowska et al., 2016Lewandowska, M. S., Szymura-Tyc, M., & Gołębiowski, T. (2016). Innovation complementarity, cooperation partners, and new product export: evidence from Poland. Jornal of Business Research, 69(9), 3673-3681.). Diversos estudos demonstram que os relacionamentos com parceiros estrangeiros fornecem informações e contatos necessários para expansão adicional e que esses relacionamentos apoiam o desenvolvimento de capacidades e ativos relacionais (Yu, Gilbert, & Oviatt, 2011Yu, J., Gilbert, B. A., & Oviatt, B. M. (2011). Effects of alliances, time, and network cohesion on the initiation of foreign sales by new ventures. Strategic Management Journal, 32(1), 424-446.). Por sua vez, alguns autores destacam a adequação dos laços do país de origem (Yu et al., 2011Yu, J., Gilbert, B. A., & Oviatt, B. M. (2011). Effects of alliances, time, and network cohesion on the initiation of foreign sales by new ventures. Strategic Management Journal, 32(1), 424-446.) para o acesso ao mercado externo, especialmente se o país de origem fortalece a competitividade das empresas locais e cria oportunidades para cooperação em inovação.

A colaboração em P&D com um parceiro estrangeiro pode ser explicada por questões de demanda e oferta, explica Narula (2003)Narula, R. (2003). Globalization and technology: Interdependence, innovation systems and industrial policy. Cambridge, UK: Polity Press.. Para o autor, as questões de demanda lidam com clientes e estão relacionadas à pesquisa adaptativa em resposta a condições específicas do mercado (devido a diferenças nas preferências dos clientes ou restrições legais). As questões de suprimento estão relacionadas a empresas que buscam utilizar ativos imobilizados que sejam específicos da firma ou do local. Por exemplo, empresas parceiras podem fazer parte de clusters nacionais ou estrangeiros específicos, onde podem se beneficiar do fornecimento feito por fornecedores especializados, bem como das vantagens decorrentes da disponibilidade de mão de obra especializada.

O uso de fontes externas de conhecimento de parceiros estrangeiros não somente aumenta o potencial combinatório, mas também permite adequar os produtos aos requisitos do cliente. Da mesma forma, as redes ajudam a superar os desafios na comercialização de um novo produto de um pequeno negócio (Schøtt & Jensen, 2016Schøtt, T., & Jensen, K. W. (2016). Firms’ innovation benefiting from networking and institutional support: A global analysis of national and firm effects. Research Policy, 45, 1233-1246. doi:10.1016/j.respol.2016. 03.006
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). Esperamos que a colaboração com clientes estrangeiros leve a inovações de novos produtos por causa da adaptação de produtos às preferências dos clientes estrangeiros, bem como à melhoria no acesso a novas tecnologias e recursos que possam estimular a inovação (Gulati & Singh, 1998Gulati, R., & Singh, H. (1998). The architecture of cooperation: Managing coordination costs and appropriation concerns in strategic alliances. Administrative Science Quarterly, 43, 781-814. ).

Assim, observamos que as expectativas são ligeiramente diferentes no que diz respeito aos laços com empresas estrangeiras, uma vez que elas usual­mente possuem capacidades adicionais quando comparadas às firmas domésticas. No entanto, esse processo de aprendizagem é improvável de ocorrer de forma imediata (Prashantham & Birkinshaw, 2015Prashantham, S., & Birkinshaw, J. (2015). Choose your friends carefully: Home-country ties and new venture internationalization. Management International Review, 55(1), 207-234.). Habilidades inovadoras superiores não são transferidas automaticamente da empresa parceira para a empresa receptora. Por exemplo, Zaheer e Bell (2005)Zaheer, A., & Bell, G. G. (2005). Benefiting from network positions: Firm capabilities, structural holes, and performance. Strategic Management Journal, 26, 809-825. inesperadamente descobriram, em um estudo transversal, que não há nenhum efeito de desempenho direto para empresas de fundos mútuos que trabalhavam com os parceiros mais inovadores.

Em relação a outros relacionamentos interfirmas, as alianças tecnológicas inovadoras são mais difíceis de ser gerenciadas por causa da complexi­dade dos componentes tecnológicos, da incerteza associada ao ritmo e da direção do desenvolvimento tecnológico e do possível conflito de interesses entre empresas parceiras (Pisano, 1989Pisano, G. (1989). Using equity participation to support exchange: Evidence from the biotechnology industry. Journal of Law Economics and Organization, 5(1), 109-126.). A transferência de conhecimento de tecnologia por meio dos limites organizacionais requer novas rotinas, códigos e convenções para superar as barreiras em prol de uma colaboração eficaz. Assim, a experiência é importante nessas alianças, e os benefícios das relações com parceiros tecnológicos superiores só podem se manifestar com o tempo (Yu et al., 2011Yu, J., Gilbert, B. A., & Oviatt, B. M. (2011). Effects of alliances, time, and network cohesion on the initiation of foreign sales by new ventures. Strategic Management Journal, 32(1), 424-446.).

Economias emergentes e em transição, no entanto, não oferecem um ambiente de negócios tão atraente, o que pode resultar em cooperação limitada com parceiros domésticos. Alguns estudos indicam que, nas economias emergentes, fortes laços em parcerias com pequenas e médias empresas domésticas, bem como com empresas jovens, poderão ser prejudiciais à expansão internacional se os parceiros domésticos estiverem focados no mercado doméstico e tiverem experiência internacional limitada (Prashantham & Birkinshaw, 2015Prashantham, S., & Birkinshaw, J. (2015). Choose your friends carefully: Home-country ties and new venture internationalization. Management International Review, 55(1), 207-234.).

Embora a escolha de parceiros nacionais ou estrangeiros dependa de sua adequação à cooperação - definida em termos de uma base de recursos, experiência em negócios internacionais, inovatividade e abertura colaborativa (Lewandowska et al., 2016Lewandowska, M. S., Szymura-Tyc, M., & Gołębiowski, T. (2016). Innovation complementarity, cooperation partners, and new product export: evidence from Poland. Jornal of Business Research, 69(9), 3673-3681.) -, resultados de pesquisas mostram que a colaboração com agentes estrangeiros, por causa das tendências de globalização, é mais propícia à inovação do que a colaboração com parceiros domésticos (Fitjar & Rodríguez-Pose, 2013Fitjar, R. D., & Rodríguez-Pose, A. (2013). The geographical dimension of innovation collaboration: Networking and innovation in Norway. Urban Studies, 51, 2572-2595.), pois também ajuda a maximizar a inovação combinando o conhecimento extraído de diferentes fontes de conhecimento externo. Nessa perspectiva, concluímos desenvolvendo as seguintes hipóteses:

  • H2a: A cooperação para inovar com fornecedores estrangeiros aumenta fortemente a probabilidade e a intensidade de inovação das empresas.

  • H2b: A cooperação para inovar com clientes estrangeiros aumenta fortemente a probabilidade e a intensidade de inovação das empresas.

  • H2c: A cooperação para inovar com concorrentes estrangeiros aumenta fortemente a probabilidade e a intensidade de inovação das empresas.

A literatura sobre inovação e transferência de tecnologia afirma que o acesso ao conhecimento não é suficiente para a aprendizagem a partir de fontes externas de conhecimento, sendo a capacidade absortiva adequada um complemento necessário (Cohen & Levinthal, 1989Cohen, W., & Levinthal, D. (1989). Innovation and learning: The two faces of R&D. Economic Journal, 99(1), 569-596. ), e capacidades absortivas dependem de investimento específico, incluindo a existência de um departamento de P&D e pessoal suficientemente qualificado (Miotti & Sachwald, 2003Miotti, L., & Sachwald, F. (2003). Cooperative R&D: Why and with whom? An integrated framework of analysis. Research Policy, 32, 1481-1499.). Portanto, consideramos que o papel dos recursos internos de uma empresa é crucialmente importante no acesso ao conhecimento externo. A habilidade das firmas em fazer uso desse conhecimento depende, por sua vez, de sua própria base de conhecimento instalada (Cohen & Levinthal, 1990Cohen, W., & Levinthal, D. (1990). Absorptive capacity: A new perspective on learning and innovation. Administrative Science Quarterly, 35, 128-152.). Sem investimento prévio na criação de conhecimento em uma área específica, as empresas não constroem as capacidades que lhes permitem reconhecer o valor do conhecimento gerado externamente a fim de absorver os transbordamentos criados por outras empresas (Hervas-Oliver & Albors-Garrigos, 2009Hervas-Oliver, J. L., & Albors-Garrigos, J. (2009). The role of the firm’s internal and relational capabilities in clusters: When distance and embeddedness are not enough to explain innovation. Journal of Economic Geography, 9(2), 263-283. doi:10.1093/jeg/lbn033
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).

A literatura sobre os efeitos de transbordamentos sustenta a premissa de que nem todas as economias anfitriãs têm a capacidade de explorar as vantagens da propriedade do IDE, porque elas simplesmente não têm capacidade de absorção (Cohen & Levinthal, 1990Cohen, W., & Levinthal, D. (1990). Absorptive capacity: A new perspective on learning and innovation. Administrative Science Quarterly, 35, 128-152.). Para Cohen e Levinthal (1990)Cohen, W., & Levinthal, D. (1990). Absorptive capacity: A new perspective on learning and innovation. Administrative Science Quarterly, 35, 128-152., a capacidade de absorção das empresas representa a capacidade de reconhecer o valor de um novo conhecimento, a capacidade de assimilá-lo e aplicá-lo, com base em propósitos comerciais. A capacidade de absorção depende, em grande parte, das capacidades tecnológicas das empresas locais, e sua capacidade técnica aumenta a probabilidade de transbordamentos positivos, portanto uma lacuna tecnológica menor entre firmas domésticas e estrangeiras resultaria em maiores ganhos de produtividade.

Neste artigo, apoiamos a ideia de que a capacidade absortiva é crucial para a exploração efetiva do know-how externo, bem como para obter bene­fícios da complementaridade entre recursos internos e externos (Hervas-Oliver & Albors-Garrigos, 2009Hervas-Oliver, J. L., & Albors-Garrigos, J. (2009). The role of the firm’s internal and relational capabilities in clusters: When distance and embeddedness are not enough to explain innovation. Journal of Economic Geography, 9(2), 263-283. doi:10.1093/jeg/lbn033
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). No entanto, a colaboração com agentes estrangeiros é mais propícia à inovação do que a colaboração local, uma vez que também ajuda a maximizar a inovação, combinando conhecimento extraído de diferentes fontes externas de conhecimento (Fitjar & Rodríguez-Pose, 2013Fitjar, R. D., & Rodríguez-Pose, A. (2013). The geographical dimension of innovation collaboration: Networking and innovation in Norway. Urban Studies, 51, 2572-2595.). Portanto, afirmamos o seguinte:

  • H3a: Os recursos internos das empresas (despesas em P&D) aumentam a probabilidade de inovação delas.

  • H3b: Os recursos externos das empresas (grupos locais e estrangeiros) aumentam a probabilidade de inovação delas.

  • H3c: A interação de recursos de cooperação internos e externos possuídos por grupos locais aumenta a probabilidade de inovação das empresas.

  • H3d: A interação de recursos de cooperação internos e externos pos­suídos por grupos estrangeiros aumenta a probabilidade de inovação das empresas.

3. METODOLOGIA

3.1 Amostra

Para testar as hipóteses, foi realizada uma análise empírica utilizando dados agregados da Pintec, complementados com dados anuais de IDE por setor do BCB. Para analisar o comportamento da inovação das empresas ao longo do tempo, usamos os dados disponíveis dos levantamentos da Pintec correspondentes aos períodos de 1998 a 2000, 2001 a 2003, 2003 a 2005, 2005 a 2008 e 2009 a 2011.

A referência conceitual e metodológica da Pintec baseia-se no Manual de Oslo (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, 2005) e no Workshop sobre Estatísticas da Comunidade Europeia (Statistical Office of the European Communities - Eurostat) da Comunidade de Pesquisa sobre Inovação (Community Innovation Survey - CIS). Seguindo essas re­ferências, as informações da Pintec estão concentradas em inovações de produtos e processos, e estão inseridas em seu escopo as inovações organizacionais e o marketing. A análise quantitativa é baseada em microdados anônimos em nível de empresa.

A pesquisa apresenta duas referências temporais: a maioria das variáveis qualitativas (inovações de produto e/ou processo se relacionam com aquelas implementadas nestes três anos), refere-se a um período de três anos consecutivos, ou seja, 2009-2011; enquanto as variáveis quantitativas (despesas e pessoal ocupado em P&D, gastos em outras atividades inovativas, impacto da inovação de produtos nas vendas e exportações etc.) referem-se ao último ano do período de referência da pesquisa, ou seja, 2011.

As informações do BCB e da Pintec foram combinadas para desenvolver nossa análise. Embora o levantamento da Pintec e a referência do Censo do BCB sejam a classificação nacional de atividades econômicas (Cnae 2.0), o número de setores diverge entre o conjunto de dados. Como o número de setores no Censo do BCB é mais agregado do que a Pintec, temos que reduzir o número de setores nesses períodos para combinar dados e conduzir nossas análises, com base nos setores do BCB.

A amostra foi dada pelo número de empresas brasileiras nas pesquisas do referido período por setor. A amostra total da Pintec era de 70.567 empresas (11.044, em 1998-2000; 11.337, em 2001-2003; 12.283, em 2003-2005; 16.371, em 2006-2008; e 17.479, em 2009-2011). A Pintec divulga resultados estimados para a população total. A Figura 3.1.1 fornece as informações resumidas do tamanho da amostra para todos os períodos utilizados no estudo.

Figura 3.1.1
AMOSTRA, SETORES E PERÍODOS

A pesquisa, aplicada a empresas com mais de dez funcionários, inclui questões para caracterizar as estratégias de inovação tecnológica, como a importância das atividades de inovação, fontes de informação para ino­vação e cooperação, bem como a localização dessas fontes de informação e cooperação para inovar, o que significa a participação ativa em projetos e atividades conjuntos de P&D (a contratação está, portanto, excluída). Existem no questionário sete variáveis para refletir a importância das ativi­dades de inovação, 14 para refletir a importância das fontes de informação e oito fontes de cooperação. Ainda, o banco de dados apresenta 12 variáveis referentes à localização das fontes de informação e oito referentes às fontes de cooperação.

Assim, seguimos Araújo e Salermo (2015)Araújo, B. C., & Salerno, M. S. (2015). Technological strategies and learning-by-exporting: The case of Brazilian manufacturing firms, 2006-2008. International Business Review, 24(1), 725-738. que buscaram abreviar essas variáveis ​​a fim de: 1. facilitar a caracterização e a interpretação de diferentes estratégias tecnológicas como construtos latentes, tais como “inovação orientada para P&D”, “fontes formais de inovação” e outros; 2. reduzir o número de variáveis no modelo econométrico, mesmo porque muitas delas ​​têm baixas frequências na amostra - por exemplo, poucas empresas cooperam com agentes no exterior, e essa frequência é ainda menor quando dividimos essa cooperação no exterior por tipo de agente. As empresas pesquisadas atuam nas seguintes indústrias de extração e manufatura: 1. indústria extrativa; 2. produtos alimentícios; 3. bebidas; 4. tabaco; 5. produtos têxteis; 6. madeira; 7. papel e celulose; 8. impressão e reprodução de gravações; 9. coque e biocombustível (álcool e outros); 10. produtos petroquímicos; 11. produtos químicos; 12. produtos farmacêuticos; 13. borracha e plástico; 14. produtos minerais não metálicos; 15. produtos de ferro e aço; 16. metalurgia; 17. tecnologia da informação; 18. máquinas e equipamentos elétricos; 19. máquinas e equipamentos; 20. veículo automotor, reboque, carroceria automotiva; 21. outros equipamentos de transporte; 22. fabricação de diversos produtos; 23. equipamentos de telecomunicações e mídia; 24. serviço de tecnologia da informação; 25. atividades de P&D.

3.2 Modelo empírico e operacionalização das variáveis

Na investigação de nossas hipóteses, usamos quatro modelos para re- lacionar: inovação das empresas na CVL e duas variáveis de controle; inovação das empresas na cadeia de valor global e duas variáveis de controle; inovação das empresas decorrentes de recursos internos e externos e duas variáveis de controle.

3.2.1 Variável dependente de inovação das empresas

Nesta pesquisa, a variável dependente mede o desempenho de inovação das empresas brasileiras. Escolhemos, entre as variáveis ​​disponíveis da Pintec, uma variável contínua, ou seja, o número total de inovações das empresas que identifica se uma empresa desenvolveu uma inovação de produto e processo no período. Essa variável considera se houve implementação de novos produtos (bens ou serviços) ou novos processos, ou melhorias substanciais no período. A implementação da inovação ocorre quando o produto é colocado no mercado ou quando o processo é operado pela empresa.

Poderíamos ter escolhido variáveis com o propósito de medir o impacto da inovação no mercado, porém, como há um número reduzido de empresas em cada categoria, decidimos condensá-las em apenas uma variável. Além disso, identificamos a inovação de forma muito mais ampla do que simplesmente consistindo em P&D, uma questão que é particularmente importante nos contextos de industrialização dos países. Incluímos atividades de projeto e engenharia, mudanças organizacionais, inovações de processo e os resultados dessas atividades refletindo inovações que são novas tanto globalmente quanto para a empresa (Marin & Bell, 2010Marin, A., & Bell, M. 2010. The local/global integration of MNC subsidiaries and their technological behavior: Argentina in the late 1990s. Research Policy, 39(7), 919-931.).

3.2.2 Variáveis independentes

3.2.2.1 Cadeia de valor

Incluímos no modelo seis variáveis relacionadas à cadeia de valor global e local as quais medem a cooperação externa da empresa para a inovação com parceiros locais no país de origem e com parceiros estrangeiros localizados em outro país. São eles: fornecedor, cliente e concorrente no Brasil e no exterior. A cadeia de valor engloba toda a gama de atividades necessárias para um produto ou serviço passar pelas diferentes etapas da produção, desde o projeto original até a entrega aos consumidores e o descarte final após o uso (Kaplinsky & Morris, 2002Kaplinsky, R., & Morris, M. (2002). A handbook for value chain research. Paper prepared for the IDRC. Retrieved from www.fao.org/fileadmin/user_upload/fisheries/docs/Value_Chain_Handbool.pdf
www.fao.org/fileadmin/user_upload/fisher...
). A experiência e a colaboração das empresas com várias parcerias, como fornecedores, clientes e concorrentes, ajudam-nas a desenvolver rotinas de parceria eficazes que atenuam as restrições de pesquisa locais e, assim, melhoram o impacto geral do desempenho de inovação (Beers & Zand, 2014Beers, V., & Zand, F. (2014). R&D cooperation, partner diversity, and innovation performance: an empirical analysis. Journal of Productive Innovation Management, 31(2), 292-312.).

Fizemos a distinção de CVL e CVG para capturar se há alguma diferença em relação aos tipos de relações e interações com atores desses dois ambientes - seja no país nativo ou estrangeiro - no que diz respeito ao acesso e à aquisição de conhecimento valioso e, consequentemente, à inovação e aos níveis de capacidade tecnológica. Além disso, como a pesquisa da Pintec faz distinção entre parceiros (fornecedores, consumidores e concorrentes) na cadeia de valor, consideramos cada um deles como uma variável. Esperamos que as empresas locais ligadas a outras empresas locais sejam menos eficientes em atividades de inovação do que as locais ligadas a empresas globais, embora ambas possam aumentar sua capacidade de inovação, uma vez que as relações interorganizacionais foram consideradas cruciais para inovar (Boehe, 2007Boehe, D. M. (2007). Os papéis de subsidiárias brasileiras na estratégia de inovação de empresas multinacionais estrangeiras. Revista Eletrônica de Administração, 42(1), 5-18.).

3.2.2.2 Recursos internos

Medimos recursos internos identificando os recursos existentes utilizados pela empresa para criar novos conhecimentos. A variável proxy, intensidade de P&D, é a proxy mais comum para a capacidade absortiva na literatura. Ela mede, essencialmente, a quantia que uma empresa gasta para desenvolver novos produtos e serviços a cada ano, sendo, possivelmente, capaz de ter maior sucesso colaborando com os parceiros.

Embora os estudos apontem que os gastos em P&D não são um pré-requisito para a inovação, em nossos modelos, assumimos que a variável influencia o sucesso da inovação da empresa por meio de mecanismos de aprendizagem. Uma empresa com alta capacidade de absorção é mais capaz de cooperar com parceiros na cadeia de valor, reconhecer conhecimento externo e transformar informações e recursos de diversas fontes de conhecimento. Então, esperamos um impacto positivo dessa variável na variável dependente, inovação da firma (Lorenzoni & Lipparini, 1999Lorenzoni, G., & Lipparini, A. (1999). The leveraging of inter-firm rela­tionships as a distinctive organizational capability: A longitudinal study. Strategic Management Journal, 20, 317-338. ; Phene & Almeida, 2008Phene, A., & Almeida, P. (2008). Innovation in multinational subsidiaries: The role of knowledge assimilation and subsidiary capabilities. Journal of International Business Studies, 39(5), 901-919.).

3.2.2.3 Recursos externos

Essa variável é utilizada nos modelos 4 e 5 e mede a cooperação para inovação com grupos brasileiros e estrangeiros com participação ativa da empresa em projetos conjuntos de P&D e outros projetos de inovação com outra organização (empresa ou instituto), o que não necessariamente implica que as partes obtenham benefícios comerciais imediatos. A simples contratação de serviços de outra organização, sem sua colaboração ativa, não é considerada cooperação.

As questões relacionadas à cooperação para a inovação buscam identificar as relações entre uma ampla gama de atores, interligados por canais de troca de conhecimento e/ou articulados em redes. A pesquisa identifica as empresas parceiras em projetos de cooperação, o objeto desta e sua localização (Estado, outros Estados, Mercosul, Estados Unidos, Europa e outros países) (Pintec, 2011Pesquisa de Inovação Tecnólogica. (2011). Pesquisa de Inovação do IBGE. Retrieved from: https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/pintec/tabelas
https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/pinte...
).

3.2.3 Variáveis-controle

3.2.3.1 Setor

Para testar a intensidade de P&D por setor, foram introduzidas variáveis ​​dummy. A variável dummy indica se o setor ao qual a empresa pertence é de alta e média-alta tecnologia e média e baixa-tecnologia, usando a classificação da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (2011). Esperamos uma influência positiva do setor de alta tecnologia na propensão a inovar.

3.2.3.2 Tamanho

Diversos estudos mostram que a propensão para cooperar em P&D e inovar está positivamente relacionada ao tamanho da empresa (Miotti & Sachwald, 2003Miotti, L., & Sachwald, F. (2003). Cooperative R&D: Why and with whom? An integrated framework of analysis. Research Policy, 32, 1481-1499.). A variável foi medida pelo logaritmo do número de funcionários, e esperamos que tenha uma influência positiva na propensão a cooperar e inovar, uma vez que a empresa se baseia mais em fontes externas próximas à pesquisa científica, incluindo patentes, universidades e institutos de pesquisa.

3.2.3.3 Investimento direto estrangeiro

Os dados de IDE abrangem empresas que recebem investimentos diretos estrangeiros e tomadores de crédito estrangeiro, bem como aqueles que possuem participação estrangeira indireta. Compreende as empresas que recebem investimento estrangeiro, porém somente aquelas com participação direta ou indireta de não residentes em seu capital social, representando, no mínimo, 10% das ações ou direito de voto, ou 20% ou mais de seu capital total. Essa abordagem é consistente, por exemplo, com a definição do Fundo Monetário Internacional (FMI) de investimentos estrangeiros diretos.

Esperamos que a presença de IDE no país possa aumentar a colaboração com agentes estrangeiros e ajudar a maximizar a inovação, combinando conhecimento extraído de diferentes fontes externas de conhecimento.

3.3 Descrição das variáveis

O conjunto de variáveis dependentes e independentes está resumido na Figura 3.3.1.

Figura 3.3.1
DESCRIÇÃO DAS VARIÁVEIS E SUA OPERACIONALIZAÇÃO

3.4 Método

Os efeitos das variáveis relacionadas à cadeia de valor e recursos internos na capacidade de inovação das empresas foram analisados usando modelos lineares generalizados (generalized linear models - GLM). Realizamos a análise neste estudo usando o software estatístico SAS, versão 8. Os GLM são úteis para muitas situações de modelagem em que a distribuição da variável dependente ou resposta pode ser (explicitamente) não normal e não precisa ser contínua.

Esse é o caso de nossa variável dependente, número de inovações das empresas, na qual temos que especificar uma distribuição para nossa variável de resposta. Os valores das variáveis dependentes são explicados a partir de uma combinação linear de variáveis preditoras que são associadas à variável dependente por meio de uma função de ligação.

Nos GLM, espera-se que os valores das variáveis dependentes sigam uma distribuição normal, e a função de ligação é uma função de identidade simples (ou seja, a combinação linear de valores para as variáveis preditoras não é transformada). Em nosso estudo, dada a natureza da variável dependente (número de inovações), temos que especificar uma distribuição para nossa variável de resposta. Nesse caso, é razoável supor que a variável dependente segue uma distribuição de Poisson. Além disso, a regressão GLM fornece técnicas que abordam especificamente a modelagem de dados corre­lacionados e de alta dimensão, e grandes conjuntos de dados que contêm muitas variáveis geralmente evidenciam problemas de multicolinearidade.

Os valores dos parâmetros nos GLM são obtidos por estimativa de máxima verossimilhança. A análise de ajuste nos GLM é baseada em desvio estatístico. Para fazer isso, seguimos as instruções de Allison (2001)Allison, P. D. (2001). Logistic regression using SAS Systems: Theory and applications (2nd ed.). Cary, NC: SAS Institute.. Em geral, quanto menor é o valor do desvio, melhor o modelo se ajusta aos dados.

Antes de estimarmos os modelos, realizamos um teste de adequação do ajuste para a variável dependente nos modelos analisados. Os resultados indicaram uma adequação para o uso da especificação de Poisson. O desvio é uma medida de quão bem o modelo se adéqua aos dados. Se o modelo se adequar bem, os valores observados estarão próximos de suas médias previstas, fazendo com que os termos sejam pequenos e, portanto, o desvio seja pequeno. Para amostras grandes, a distribuição do desvio é aproximadamente um qui-quadrado com n-p graus de liberdade (df), em que n é o número de observações, e p, o número de parâmetros. Assim, o desvio pode ser usado diretamente para testar a qualidade do ajuste do modelo (Hilbe, 2014Hilbe, J. (2014). Poisson regression. In J. Hibe. Modeling count data (pp. 35-73). Cambridge: Cambridge University Press. doi:10.1017/CBO978113923 6065.003
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). Com base nisso, se o valor/df para as estatísticas deviance e Pearson Chi-Square não for maior do que 1, o modelo de Poisson é adequado e se ajusta bem aos dados.

4. RESULTADOS ECONOMÉTRICOS

Os resultados para a variável dependente, inovação da empresa, indicaram aos nossos modelos um desvio médio de 1,06 por df e forneceram uma descrição razoável dos dados. Então o modelo atende ao teste de ajuste.

Um teste de correlação também foi realizado para verificar o grau de relacionamento entre as variáveis e se houve problemas associados à multicolinearidade. O método utilizado para medir o grau de associação entre as variáveis deste estudo foi o coeficiente de correlação de Pearson. A tolerância (TOL) e o fator de inflação da variância (variance inflation factor - VIF) também foram utilizados como medida complementar para detectar multicolinearidade. Os resultados indicaram ausência de problemas associados à multicolinearidade nos modelos analisados.

As estatísticas resumidas são apresentadas na Figura 4.1. As médias amostrais sugerem que há uma grande variação nas empresas brasileiras em termos de desenvolvimento de inovações, ou seja, uma média de 1.179,27 empresas que inovaram no período. Em média, as empresas cooperam mais com grupos estrangeiros do que com os brasileiros, mas, considerando os parceiros da cadeia de suprimentos, as empresas brasileiras cooperam mais com empresas da cadeia local.

Figura 4.1
ESTATÍSTICAS DESCRITIVAS DAS VARIÁVEIS

A quantidade de IDE tem uma maior variação nos setores. Analisando os setores, podemos perceber que a maioria deles é considerada de baixa intensidade tecnológica, o que não é uma surpresa, já que nossa amostra é de países emergentes.

4.1 Inovação das empresas, cadeia de valor local e global e capacidade de absorção

Apresentamos nossas conclusões para o número de inovações da empresa na Figura 4.1.1. Analisamos os efeitos da inserção nas cadeias de valor local e global como um fator determinante da inovação das empresas, bem como a relação entre inovação, recursos internos e sua inserção em cadeias de valor.

Figura 4.1.1
RESULTADOS PARA A REGRESSÃO POR MODELOS LINEARES GENERALIZADOS

Os modelos 1 e 2 incorporam os efeitos da cadeia local e da cadeia estrangeira, respectivamente. Nos modelos 3 e 4, com variáveis de interação, exploramos a relação entre recursos internos e externos, analisando diferentes situações em que se estabelecem relações de cooperação entre parceiros globais e domésticos na cadeia de valor ao longo do tempo com o objetivo de analisar os efeitos em cada modelo, em vez de compará-los.

A hipótese 1b foi apoiada: a cooperação para inovar com os clientes locais aumenta positivamente a probabilidade de intensidade de inovação das empresas. Fornecedores locais e concorrentes tiveram parâmetros significativos, mas negativos. No entanto, como esperado nas hipóteses 2a, 2b e 2c, fornecedores, clientes e concorrentes estrangeiros apresentaram coeficientes significativos e positivos, indicando que o nível de envolvimento na cadeia de valor global influencia positivamente a inovação.

A falta de resultados positivos para fornecedores e concorrentes locais no modelo 1 pode ser consequência da menor capacidade das empresas brasileiras de aumentar sua produtividade e competitividade proporcionadas pelo menor conhecimento tecnológico sobre os processos de produção, e, embora o número de parceiros locais seja maior do que os estrangeiros, o último é mais eficaz para gerar inovação. Também sugerimos que a média para as variáveis cooperação com fornecedores e concorrentes locais é baixa, indicando que muitas empresas possuem parceiro local, e, se o fizessem, seria de intensidade de tecnologia inferior (com base nos dados médios do setor).

Os modelos 4 e 5 consideram o papel dos recursos internos das empresas como crucialmente importante no processo de inovação. Em ambos os modelos, a Hipótese 3a foi apoiada com coeficientes significativos e positivos, significando que os recursos internos, medidos pelo gasto em P&D, foram considerados capazes de influenciar a inovação.

Além disso, a cooperação com grupos de pesquisa, local e global, variável proxy para recursos externos, teve o mesmo comportamento. A cooperação com os parceiros também é influente para as atividades de inovação da empresa, no entanto, em nossos resultados, não houve diferença entre grupos estrangeiros e locais.

A interação dos recursos internos e externos de uma empresa, acessíveis por meio da cooperação entre empresas, foi capturada apenas no modelo 5, em que consideramos a variável grupo estrangeiro. Assumimos que a posse de laboratórios instalados com alto nível de capacitação de funcionários pode contribuir para a cooperação com parceiros estrangeiros, apoiando a Hipótese 3d.

Quanto às variáveis de controle, a variável tamanho, medida pelo número de empregados em cada setor, apresentou resultado positivo e significativo. A variável setor também apresentou resultado significativo nos modelos analisados.

A comparação entre os setores de alta e baixa tecnologia revela que a colaboração é mais eficaz em setores de baixa tecnologia. Os resultados sugerem que a colaboração para fazer alianças entre empresas é mais essencial para inovações nesses mercados, pois as empresas dependem mais desses recursos externos.

Os resultados sugerem que a quantidade de IDE afeta negativamente a inovação das empresas, provavelmente pelo fato de ele estar concentrado em alguns setores, como mostra a Figura 4.1. Estudos sobre o IDE brasileiro demonstraram que setores de alta tecnologia atraem mais IDE do que menores (Bruhn & Calegario, 2014Bruhn, N. C. P., & Calegario, C. L. L. (2014). Productivity spillovers from Foreign Direct Investment in the Brazilian processing industry. Brazilian Administration Review, 11(1), 22-46.). Além disso, nem todas as economias anfitriãs têm a capacidade de explorar as vantagens do IDE por simplesmente não terem capacidade de absorção para fazê-lo (Cohen & Levinthal, 1990Cohen, W., & Levinthal, D. (1990). Absorptive capacity: A new perspective on learning and innovation. Administrative Science Quarterly, 35, 128-152.).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados deste estudo indicam que o relacionamento com todos os parceiros na cadeia de valor global (fornecedores, clientes e concorrentes) contribuiu para a capacidade de inovação das empresas brasileiras. Na cadeia de valor local, apenas o relacionamento com os parceiros clientes apresentou os mesmos resultados.

As evidências mostram que as interações com diferentes tipos de parceiro produzem um efeito distinto na capacidade de inovação das empresas locais. Esses resultados sugerem que a integração do conhecimento interno de uma empresa com o conhecimento externo, acessível por meio da cooperação entre empresas, afeta fortemente a inovação. Os resultados sugerem ainda que o uso de fontes externas de conhecimento por parte de parceiros estrangeiros permite adaptar os produtos às necessidades do cliente e que as redes de relacionamento ajudam a superar a limitada capacidade de inovação e de tamanho na comercialização de produtos inovadores.

Os recursos internos tiveram influência positiva na capacidade de inovação das empresas brasileiras. Os resultados sugerem que o papel dos recursos internos de uma empresa também é crucialmente importante no acesso ao conhecimento externo, o que significa que a capacidade das empresas de utilizar esse conhecimento depende, por sua vez, de sua própria base de conhecimento e da capacidade absortiva, o que lhes permite reconhecer o valor do conhecimento gerado externamente e absorver os transbordamentos criados por outras empresas.

Ao contrário das expectativas, os resultados indicam que o IDE não contribuiu para o desempenho inovador das empresas locais. A literatura sobre os efeitos de transbordamentos apoia a premissa de que nem todas as economias anfitriãs têm a capacidade de explorar as vantagens da propriedade do IDE, porque elas simplesmente não têm capacidade de absorção. Os efeitos benéficos do IDE ocorrerão apenas se as empresas das economias domésticas tiverem a capacidade de assimilar e aplicar um novo conhecimento.

A habilidade superior para inovar não é transferida automaticamente da empresa parceira para a empresa receptora. Alianças tecnológicas inovadoras são mais difíceis de ser gerenciadas por causa da complexidade dos componentes tecnológicos, da incerteza associada ao ritmo e à direção do desenvolvimento de tecnologia e do possível conflito de interesses entre empresas parceiras. A transferência de conhecimento tecnológico por meio dos limites organizacionais requer novas rotinas, códigos e convenções para superar as barreiras para uma colaboração eficaz. Assim, a experiência é importante nessas alianças, e os benefícios das relações com parceiros de tecnologia superiores só podem se manifestar com o tempo.

Algumas limitações deste estudo merecem ser mencionadas. Em primeiro lugar, este estudo se baseia em dados secundários agregados, o que impede uma análise mais aprofundada. Ela poderia ser feita a partir de pesquisa buscando coletar dados primários, contendo, portanto, uma combinação de aplicação de questionários com questões abertas e fechadas, bem como entrevistas com gerentes. Em segundo lugar, o conjunto de dados impôs algumas restrições à nossa análise, e algumas análises mais desagregadas que poderiam ser interessantes não são possíveis de ser realizadas.

Finalmente, concluímos que inovação em empresas de mercados emergentes é um fenômeno recente, sobre o qual temos conhecimento limitado. Os resultados desta pesquisa oferecem suporte para identificar os efeitos da inserção em cadeias de valor local e global como um determinante da inovação das empresas brasileiras, bem como sugerem que os recursos internos da empresa são crucialmente importantes no acesso ao conhecimento externo, o que significa que a capacidade das empresas que fazem uso desse conhecimento depende, por sua vez, de sua capacidade de absorção.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jan 2020
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    14 Abr 2019
  • Aceito
    13 Jun 2019
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