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Formação humanista o papel da leitura literária na atuação do bibliotecário escolar

RESUMO

Introdução:

A leitura literária é considerada uma das atividades mais pertinentes para o aperfeiçoamento de habilidades interpessoais, como a empatia, tida como essencial na realização das funções do bibliotecário escolar.

Objetivo:

Dessa forma, o presente estudo objetiva discorrer sobre a maneira como a prática da leitura literária pode influenciar na atuação do bibliotecário escolar a partir da perspectiva apresentada pelo autor Carlos Ruiz Záfon no enredo de sua obra A Sombra do Vento.

Método:

Quanto aos procedimentos metodológicos, trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa, que teve como método científico o uso da pesquisa bibliográfica e do questionário como instrumento de coleta de dados.

Resultado:

Os resultados demonstram que os bibliotecários têm consciência da importância da leitura literária para a realização de suas atividades profissionais e para a construção de uma relação mais empática e humanista com os alunos, porém essa prática não costuma ser discutida com frequência nas pesquisas da área e incentivada nos cursos de graduação.

Conclusão:

Contudo, espera-se que o presente estudo possa contribuir para os debates acerca da temática na área da Ciência da Informação e refletir sobre a influência da leitura literária para uma formação mais humanista e empática do bibliotecário escolar.

PALAVRAS-CHAVE:
Leitura literária; Atuação profissional; Bibliotecário escolar; Práticas de leitura

ABSTRACT

Introduction:

Literary reading is considered one of the most relevant activities for the improvement of interpersonal skills, such as empathy, considered essential in performing the functions of the school librarian.

Objective:

Thus, this study aims to discuss how the practice of literary reading can influence the performance of the school librarian from the perspective presented by the author Carlos Ruiz Záfon in the plot of his work A Sombra do Vento.

Method:

Regarding methodological procedures, this is a qualitative research, which had as scientific method the use of bibliographic research and the questionnaire as a data collection instrument.

Results:

The results show that librarians are aware of the importance of literary reading for the performance of their professional activities and for the construction of a more empathic and humanistic relationship with students, but this practice is not often discussed frequently in research in the area and encouraged in undergraduate courses.

Conclusion:

However, it is expected that the present study can contribute to the debates on the subject in the area of Information Science and reflect on the influence of literary reading for a more humanistic and empathic formation of the school librarian.

KEYWORDS:
Literary reading; Professional performance; School librarian; Reading practices

1 INTRODUÇÃO

Os livros são espelhos: neles só se vê o que possuímos dentro.

Julián Carax (ZAFÓN, Carlos Ruiz).

A biblioteca escolar é vista como um centro dinâmico de informação, de democratização do conhecimento e de formação integral, sendo que o profissional que nela atua é o responsável por desenvolver ações que contribuam para esse objetivo. No entanto, para que esse processo de mediação ocorra satisfatoriamente, é necessário que o bibliotecário escolar não somente aprimore as competências técnicas provenientes da profissão, mas que também observe como o seu comportamento influi na relação que ele estabelece com os alunos.

De acordo com Kidd e Castano (2013KIDD, David Comer; CASTANO, Emanuele. Reading literary fiction improves theory of mind. Science, v. 342, n. 6156, oct. 2013.), as “práticas culturais (...) podem promover e refinar a sensibilidade interpessoal por toda nossa vida. Uma dessas práticas é a leitura de ficção”. Desse modo, a leitura literária é classificada como uma das atividades mais apropriadas para o aperfeiçoamento de habilidades interpessoais, uma vez que “possui características que simulam a realidade e coloca o leitor em situações que o fazem refletir a partir da perspectiva do outro” (ORNELLAS; ALENCAR, 2015ORNELLAS, Adriana da Silva; ALENCAR, Patrícia Vargas. A relação entre a empatia e a prática da leitura literária e sua influência para o bibliotecário de referência. In: Anais [...] ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 16., João Pessoa: ENANCIB, 2015. Disponível em: http://www.ufpb.br/evento/index.php/enancib2015/enancib2015/paper/viewFile/2892/1059. Acesso em: 14 jan. 2021.
http://www.ufpb.br/evento/index.php/enan...
, p. 1).

Zaffón (2007), em seu livro A Sombra do Vento, por meio de uma narrativa envolvente, traz ao leitor atributos que são trabalhados por meio da prática da leitura literária e que são mencionadas pela literatura científica e por estudos sobre o tema. Assim, este estudo visa discorrer sobre a maneira como a prática da leitura literária pode influenciar na atuação do bibliotecário escolar de acordo com as concepções de leitura apresentadas no livro de Zafón.

Concepções estas que são também compartilhadas por autores como Freire e Almeida Júnior, os quais sustentam a construção do conhecimento na relação/interação com o mundo. “Também advogo e defendo que, mais e antes de qualquer coisa, lemos para conhecer o mundo, os outros, para nos entendermos; mais e antes de qualquer coisa, a leitura nos ajuda em nossa interminável busca pelo humano, pela ética, pela cidadania” (ALMEIDA JÚNIOR, 2021, p. 4).

Em diversas passagens do enredo de A Sombra do Vento, Zafón explicita, por meio das falas e do comportamento dos personagens, como a leitura literária pode exercer impacto na relação de cada sujeito com o mundo exterior.

Certa ocasião ouvi um cliente habitual da livraria de meu pai comentar que poucas coisas marcam tanto um leitor como o primeiro livro que realmente abre caminho ao seu coração. As primeiras imagens, o eco dessas palavras que pensamos ter deixado para trás, nos acompanham por toda a vida e esculpem um palácio em nossa memória ao qual mais cedo ou mais tarde - não importa os livros que leiamos, os mundos que descubramos, o quanto aprendamos ou nos esqueçamos - iremos retornar. (ZAFÓN, 2007ZAFÓN, Carlos Ruiz. A sombra do vento. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007., p. 11).

Tendo em mente, então, que a literatura exerce influência na forma como os sujeitos se desenvolvem e se relacionam com as pessoas à sua volta, a prática da leitura literária pelo bibliotecário escolar também se mostra como um método de educação continuada, pois auxilia na construção de uma relação mais humanizada e empática com os alunos.

2 METODOLOGIA

Falar é para bobos; calar é para covardes; escutar é para sábios.

Barceló (ZAFÓN, Carlos Ruiz).

Quanto aos procedimentos metodológicos, trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa, que teve como método científico o uso da pesquisa bibliográfica e do questionário como instrumento de coleta de dados.

O questionário foi aplicado por meio de formulário eletrônico encaminhado por e-mail a um grupo de 74 bibliotecários que fazem parte de uma rede de Bibliotecas do Estado de São Paulo e obteve um retorno de 35 respostas.

A realização da pesquisa bibliográfica apontou para um número significativo de investigações que dissertam sobre a importância/influência da biblioteca/bibliotecário para a formação do leitor e a construção do conhecimento. Todavia, as pesquisas que abordam esse assunto e o modo como essa prática pode interferir na sua relação com o aluno ainda são pouco discutidas na área.

Witter (1986WITTER, Geraldina Porto. Aspectos psicológicos no relacionamento bibliotecário e usuário. Ciência da Informação, Brasília, v. 15, n. 1, p. 33-37, jan./jun. 1986. Disponível em: http://revista.ibict.br/ciinf/article/view/245/245. Acesso em: 09 jan. 2021.
http://revista.ibict.br/ciinf/article/vi...
, p. 33) vincula esse cenário ao contexto do bibliotecário escolar, dizendo que “Os aspectos psicológicos envolvidos na relação entre o bibliotecário e o usuário são complexos, variados e possivelmente, por esta razão, insuficientemente estudados.”.

A fim de salientar como a prática da leitura literária é retratada na obra de Zafón, também foi conduzida uma pesquisa na sua versão digital, para se ter uma noção da recorrência de termos associados ao universo literário, cujos resultados serão evidenciados na seção específica.

Ademais, essa pesquisa tem a intenção de contribuir com o debate acerca da temática e de refletir a respeito da influência da leitura literária para uma formação mais humanista e empática do bibliotecário escolar.

3 A LEITURA LITERÁRIA E O FAZER BIBLIOTECÁRIO

“A arte de ler está morrendo muito aos poucos, que é um ritual íntimo, que um livro é um espelho e só podemos encontrar nele o que carregamos dentro de nós, que colocamos nossa mente e alma na leitura, e que esses bens estão cada dia mais escassos”

Bea (ZAFÓN, Carlos Ruiz).

A leitura literária consiste na prática de leitura de livros e/ou textos de gêneros narrativos como romances, contos, poesias, crônicas, suspenses, histórias em quadrinhos, entre outros. “À parte sua estrutura literária e discursiva, ela se apresenta como uma aproximação do outro e do mundo exterior através de suas histórias, proporcionando um desenvolvimento equilibrado do intelecto e das emoções” (ORNELLAS; ALENCAR, 2015ORNELLAS, Adriana da Silva; ALENCAR, Patrícia Vargas. A relação entre a empatia e a prática da leitura literária e sua influência para o bibliotecário de referência. In: Anais [...] ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 16., João Pessoa: ENANCIB, 2015. Disponível em: http://www.ufpb.br/evento/index.php/enancib2015/enancib2015/paper/viewFile/2892/1059. Acesso em: 14 jan. 2021.
http://www.ufpb.br/evento/index.php/enan...
, p. 4).

De acordo com Candido (2004CANDIDO, Antônio. O direito à literatura. In: CANDIDO, Antônio. Vários escritos. São Paulo; Rio de Janeiro: Duas Cidades; Ouro sobre azul, 2004. p. 169-191., p. 172), a leitura literária tem ação direta na formação dos sujeitos, haja vista que

pode ser uma aquisição consciente de noções, emoções, sugestões, inculcamentos, mas na maior parte se processa nas camadas do subconsciente e do inconsciente, incorporando-se em profundidade como enriquecimento difícil de avaliar. As produções literárias, de todos os tipos e todos os níveis, satisfazem necessidades básicas do ser humano, sobretudo através dessa incorporação que enriquece a nossa percepção e a nossa visão do mundo. (CANDIDO, 2004CANDIDO, Antônio. O direito à literatura. In: CANDIDO, Antônio. Vários escritos. São Paulo; Rio de Janeiro: Duas Cidades; Ouro sobre azul, 2004. p. 169-191., p. 172).

Independentemente de qualquer tempo e para o que seja dedicado o seu uso, a leitura literária sempre preserva seu caráter de mudança, e é nesse poder autêntico que reside seu maior prestígio.

Por a leitura ser uma atividade que se sustenta no preenchimento das lacunas de seu texto pelo leitor, ela se apoia na imaginação para se realizar de forma plena. Por esse motivo, ela não pode ser completamente controlada ou induzida e é por isso que a leitura literária pode ser considerada o melhor caminho para nos desenvolvermos criticamente (ORNELLAS, 2014ORNELLAS, Adriana da Silva. O bibliotecário de referência e a necessidade de uma atuação empática na contemporaneidade: uma análise sobre a influência da leitura literária. 2014. Dissertação (Mestrado em Biblioteconomia) - Centro de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014. Disponível em: http://www.repositorio-bc.unirio.br:8080/xmlui/handle/unirio/11823. Acesso em: 14 jan. 2021.
http://www.repositorio-bc.unirio.br:8080...
, p. 51).

Apesar de a leitura ser uma atividade solitária, ela pode gerar consequências expressivas que se destacam socialmente, pois ela garante ao leitor ampliar sua habilidade de enxergar e de portar-se no mundo. Nas palavras de Freire (2011, p. 30), “a leitura da palavra não é apenas precedida pela leitura do mundo, mas por uma certa forma de “escrevê-lo” ou de “reescrevê-lo”, quer dizer, de transformá-lo através de nossa prática consciente”.

Petit (2009PETIT, Michèle. A arte de ler ou como resistir à adversidade. São Paulo: Editora 34, 2009. ), por seu turno, argumenta que a literatura consente uma aproximação da gente com o outro e, portanto, provoca a arte de habitar, familiarizando-nos com o exterior, tornando possível atravessar paredes e divisórias para que nos coloquemos próximos aos outros, menos indiferentes. Em outras palavras, “a leitura literária é uma aproximação do outro e do mundo externo, se configurando como uma necessidade humana de ter contato com histórias e de um desenvolvimento equilibrado do intelecto e das emoções” (ORNELLAS, 2014ORNELLAS, Adriana da Silva. O bibliotecário de referência e a necessidade de uma atuação empática na contemporaneidade: uma análise sobre a influência da leitura literária. 2014. Dissertação (Mestrado em Biblioteconomia) - Centro de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014. Disponível em: http://www.repositorio-bc.unirio.br:8080/xmlui/handle/unirio/11823. Acesso em: 14 jan. 2021.
http://www.repositorio-bc.unirio.br:8080...
, p. 64).

Traçando uma breve contextualização sobre a obra aqui usada como base, A Sombra do Vento, do autor espanhol Carlos Ruiz Zafón (formado em Ciências da Informação), foi o primeiro de uma série de quatro livros (tetralogia 1 1 JITA: CF. Reading and story telling ) escrita pelo autor e denominada “O Cemitério dos livros esquecidos”. Publicado em 2001, o livro foi uma sensação literária, com traduções realizadas para cerca de 50 idiomas e milhões de cópias vendidas por todo o mundo.

Em 2016, ano de lançamento do último livro da série, O Labirinto dos Espíritos, o autor foi questionado sobre o porquê de nunca ter se deixado seduzir e ter aceito o convite para adaptar a saga aos cinemas, ao que ele respondeu: “Para mim, esses livros são uma homenagem à literatura, à palavra escrita. Seria uma traição transformá-los em obras para o cinema ou para a televisão” (ZAFÓN, 2016ZAFÓN, Carlos Ruiz. Apresentação em Barcelona do quarto volume, "O Labirinto dos Espíritos". In: NASSIF, Tamara. Carlos Ruiz Zafón, autor de ‘A Sombra do Vento’, morre aos 55 anos. Revista Veja online. Barcelona: s. n., 2016. Disponível em: https://veja.abril.com.br/cultura/carlos-ruiz-zafon-autor-de-a-sombra-do-vento-morre-aos-55- anos/. Acesso em: 22 jun. 2021.
https://veja.abril.com.br/cultura/carlos...
). O autor ainda enfatiza a sensação ao entregar ao leitor a tetralogia:

São livros do meu próprio mundo, que falam de escrever e ler. Eu quis explorar o processo criativo do ato de contar uma história, e isso me permitiu entender muitas coisas sobre mim mesmo. Não sei se estou mais sábio, mas me sinto em paz comigo mesmo (ZAFÓN, 2016ZAFÓN, Carlos Ruiz. Apresentação em Barcelona do quarto volume, "O Labirinto dos Espíritos". In: NASSIF, Tamara. Carlos Ruiz Zafón, autor de ‘A Sombra do Vento’, morre aos 55 anos. Revista Veja online. Barcelona: s. n., 2016. Disponível em: https://veja.abril.com.br/cultura/carlos-ruiz-zafon-autor-de-a-sombra-do-vento-morre-aos-55- anos/. Acesso em: 22 jun. 2021.
https://veja.abril.com.br/cultura/carlos...
).

No livro A Sombra do Vento, Záfon transmite ao leitor o que a literatura científica e os estudos sobre esse tópico aludem como característica da prática da leitura literária. Na trama desenrolada em torno da obra, o autor consegue manifestar que a literatura é o exercício da palavra escrita e que ela propicia aos leitores a desacomodação de seus mundos confortáveis.

Trata-se de um suspense que conta como cenário uma Barcelona pós-guerra civil espanhola. A construção da narrativa ocorre por meio da relação que os personagens criam com a leitura. Daniel Sempere (protagonista), ao ser seduzido pela leitura de um manuscrito, tenta desvendar os mistérios que cercam o autor do livro (Júlian Carax) e, no decorrer do romance, conforme vai apurando os enigmas, percebe-se envolvido de tal forma, que sua vida pessoal passa a tomar um rumo semelhante à do autor.

No livro, o Sr. Sempere, ao apresentar o Cemitério dos Livros Esquecidos a seu filho Daniel, descreve o ambiente com toda a representatividade e os significados que uma biblioteca e os livros que ela abriga podem reproduzir no universo de um leitor.

Este lugar é um mistério, Daniel, um santuário. Cada livro, cada volume que você vê, tem alma. A alma de quem o escreveu, e a alma dos que o leram, que viveram e sonharam com ele. Cada vez que um livro troca de mãos, cada vez que alguém passa os olhos pelas suas páginas, seu espirito cresce e a pessoa se fortalece. Faz já muitos anos que meu pai me trouxe aqui pela primeira vez, e este lugar já era velho. Quase tão velho quanto a própria cidade. Ninguém sabe ao certo desde quando existe ou quem o criou. Conto a você o que me contou meu pai. Quando uma biblioteca desaparece, quando uma livraria fecha as suas portas, quando um livro se perde no esquecimento, nós, guardiões, os que conhecemos este lugar, garantimos que ele venha para cá. Neste lugar, os livros dos quais já ninguém se lembra, os livros que se perderam no tempo, viverão para sempre, esperando chegar algum dia às mãos de um novo leitor, de um novo espírito. Na loja, nós os vendemos e compramos, mas na verdade os livros não têm dono. Cada livro que você vê aqui foi o melhor amigo de um homem. (ZAFÓN, 2007ZAFÓN, Carlos Ruiz. A sombra do vento. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007., p. 9).

Ao ser presenteado com a possibilidade de selecionar um livro daquele lugar, Daniel escolhe um exemplar desconhecido, de um autor também desconhecido. Ao longo da leitura, Daniel fica tão fascinado que desperta em si a curiosidade por saber mais sobre aquele autor e sua obra, e é assim que a história se desenvolve.

A informação gera dúvidas e conflito e desperta interesses a partir da relação das pessoas com o externo. A leitura está no cerne da apropriação da informação. Nas palavras de Almeida Júnior (2021, p. 2),

a biblioteca é a grande, a imensa arena em que se digladiam as ideias, as concepções, os modos de entender o mundo. Ela permite e incentiva essa luta. Não há batalha silenciosa. Quando leio, luto com as ideias, com os pensamentos. Discuto com o ausente e, muitas vezes, desconhecido autor. Apresento meus argumentos para mim mesmo e me alço em juiz das verdades que resultam desse confronto. Meus conhecimentos se defrontam com o novo e se transformam, mesmo contra minha vontade.

Por sua vez, a literatura é um fator indispensável de humanização, vital para a sua sobrevivência interior e subjetiva, isso porque ela “a todos humaniza, isto é, permite que os sentimentos passem do estado de mera emoção para o da forma construída, que assegura a generalidade e a permanência” (CANDIDO, 2004CANDIDO, Antônio. O direito à literatura. In: CANDIDO, Antônio. Vários escritos. São Paulo; Rio de Janeiro: Duas Cidades; Ouro sobre azul, 2004. p. 169-191., p. 179).

Em vista disso, a prática da leitura literária vai além de uma atividade de entretenimento e de busca por conhecimento, mas é também um meio de qualificação pessoal e profissional, capaz de oportunizar o desenvolvimento enquanto sujeitos sociais. Logo, a leitura literária contribui para a otimização das relações pessoais entre bibliotecário escolar e aluno, pois se expõe como um princípio determinante para a formação da habilidade de empatia (ORNELLAS; ALENCAR, 2015ORNELLAS, Adriana da Silva; ALENCAR, Patrícia Vargas. A relação entre a empatia e a prática da leitura literária e sua influência para o bibliotecário de referência. In: Anais [...] ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 16., João Pessoa: ENANCIB, 2015. Disponível em: http://www.ufpb.br/evento/index.php/enancib2015/enancib2015/paper/viewFile/2892/1059. Acesso em: 14 jan. 2021.
http://www.ufpb.br/evento/index.php/enan...
, p. 3).

Podemos dizer que a literatura é o sonho acordado das civilizações. Portanto, assim como não é possível haver equilíbrio psíquico sem o sonho durante o sono, talvez não haja equilíbrio social sem a literatura. Deste modo, ela é fator indispensável de humanização e, sendo assim, confirma o homem na sua humanidade, inclusive porque atua em grande parte no subconsciente e inconsciente. Neste sentido, ela pode ter importância equivalente à das formas conscientes de inculcamento intencional, como a educação familiar, grupal ou escolar. Cada sociedade cria as manifestações ficcionais, poéticas e dramáticas de acordo com os seus impulsos, as suas crenças, os seus sentimentos, as suas normas, a fim de fortalecer em cada um a presença e atuação deles (CÂNDIDO, 2004, p. 175).

Goleman (2012GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional: a teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.) assevera que a habilidade de compreender outras pessoas é uma capacidade da inteligência interpessoal que possibilita entender o que as motiva: “o âmago da inteligência interpessoal inclui a capacidade de discernir e responder adequadamente ao humor, temperamento, motivação e desejo de outras pessoas” (p. 63).

Esse entendimento está atrelado ao conceito de empatia, que, segundo o autor, é uma competência pessoal essencial para as interações humanas: “as pessoas empáticas estão mais sintonizadas com os sutis sinais do mundo externo que indicam o que os outros precisam ou o que querem. Isso as torna boas profissionais no campo assistencial, no ensino, nas vendas e administração” (GOLEMAN, 2012GOLEMAN, Daniel. Inteligência emocional: a teoria revolucionária que redefine o que é ser inteligente. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012., p. 67).

Por conseguinte, a habilidade empática é fundamental para os profissionais que, assim como os bibliotecários, exercem atividade de interação direta e precisam assimilar diferentes atitudes, respeitando a diversidade das pessoas sem sobrepor seus valores ou manifestar preconceitos.

A American Library Association (ALA) preconiza alguns requisitos primordiais na performance dos bibliotecários, os quais devem ser observados para que alcancem uma percepção positiva na relação com os usuários: 1- Visibilidade/acessibilidade: é substancial que o bibliotecário seja acessível. A resposta inicial do bibliotecário “define o tom para todo o processo de comunicação, e influencia a profundidade e nível de interação”; 2- Interesse: “Bibliotecários que demonstram um alto nível de interesse nas demandas dos usuários irão gerar um maior nível de satisfação”; 3- Capacidade de ouvir e questionar: “Habilidades eficazes de escuta e questionamento são necessários para uma interação positiva”; 4- Investigar: “Muitos aspectos da procura, que conduzem a resultados exatos dependem do comportamento do bibliotecário”; 5- Acompanhar: O bibliotecário deve observar se o resultado da abordagem atendeu a necessidade do usuário (AMERICAN, 2004).

Todos esses requisitos envolvem predicados comportamentais que, de certo modo, estão vinculados ao conceito de empatia, aqui apresentado como uma habilidade imprescindível para alcançar o sucesso nas relações de interação entre o bibliotecário escolar e sua comunidade educacional.

O bibliotecário se destaca por, entre outras, desempenhar a função de disponibilizar informação organizada tecnicamente para sua comunidade visando atuar como um colaborador na construção do conhecimento dentro da sociedade. Para tanto, não apenas o domínio técnico eficaz é necessário, mas também a capacidade de se relacionar de maneira empática, visto que atingir o objetivo de sua função dependerá, em grande parte, de sua postura e atitudes em relação ao usuário. Por isso, esse profissional não deve priorizar somente o desenvolvimento das habilidades técnicas que norteiam o seu fazer, mas, também, as habilidades sociais e humanas que influenciam o desenvolvimento de sua relação com o usuário. (ORNELLAS, 2014ORNELLAS, Adriana da Silva. O bibliotecário de referência e a necessidade de uma atuação empática na contemporaneidade: uma análise sobre a influência da leitura literária. 2014. Dissertação (Mestrado em Biblioteconomia) - Centro de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014. Disponível em: http://www.repositorio-bc.unirio.br:8080/xmlui/handle/unirio/11823. Acesso em: 14 jan. 2021.
http://www.repositorio-bc.unirio.br:8080...
, p. 13).

A Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) traz uma série de competências pessoais que devem ser exercitadas pelo bibliotecário em sua atuação. Dentro dessa relação, não constam somente competências técnicas, mas também emocionais, conforme mencionado na relação instituída pelos participantes da descrição da ocupação de bibliotecário pela CBO: 1- Manter-se atualizado; 2- Liderar equipes; 3- Trabalhar em equipe e em rede; 4- Demonstrar capacidade de análise e síntese; 5- Demonstrar conhecimento de outros idiomas; 6- Demonstrar capacidade de comunicação; 7- Demonstrar capacidade de negociação; 8- Agir com ética; 9- Demonstrar senso de organização; 10- Demonstrar capacidade empreendedora; 11- Demonstrar raciocínio lógico; 12- Demonstrar capacidade de concentração; 13- Demonstrar proatividade; 14- Demonstrar criatividade (CBO, 2021).

Competências emocionais, como a empatia e a capacidade de comunicação e de negociação, são habilidades passíveis de serem desenvolvidas e treinadas. Nesse processo, a leitura literária é uma prática capaz de auxiliar na busca pelo aperfeiçoamento dessas aptidões sociais. Sobre a influência da leitura literária nas relações humanas, Calvino (1990CALVINO, Ítalo. Seis propostas para o próximo milênio: lições americanas. São Paulo: Companhia das letras, 1990., p. 103) declara: “Minha confiança no futuro da literatura consiste em saber que há coisas que só a literatura com seus meios específicos nos pode dar”.

Não obstante, é possível dizer que a leitura literária também é uma atividade de educação continuada que viabiliza aumentar a habilidade de empatia dos sujeitos. Consequentemente, é vista como sendo crucial para o bibliotecário escolar, posto que esse profissional deve procurar sempre aprimorar suas habilidades sociais na procura por uma relação de interação mais humanista com a comunidade acadêmica.

4 REFLEXÕES ACERCA DOS RESULTADOS

“Cresci no meio de livros, fazendo amigos invisíveis em páginas que se desfaziam em pó cujo cheiro ainda conservo nas mãos”

Daniel Sempere (ZAFÓN, Carlos Ruiz).

Cada leitura é única. As palavras são mutantes, são especialmente dependentes de cada leitor e do momento que ele vivencia (ALMEIDA JÚNIOR, 2021). Com a finalidade de frisar como a prática da leitura literária é retratada no enredo de A Sombra do Vento, realizou-se uma pesquisa na versão digital da obra para levantar a frequência com que o autor utiliza termos associados ao universo literário para a construção da sua narrativa.

Figura 1:
Termos associados ao universo literário da obra.

Como ilustra a figura 1, a recorrência com que o autor utiliza os referidos vocábulos é significativa e expressa sua importância na construção de uma narrativa que tem por objetivo homenagear a literatura. Nas palavras do próprio Zafón:

Com esta série quis homenagear a literatura de todos os géneros. No jogo de referências literárias há muitas influências a muitas obras, como Alice no País das Maravilhas e outras mais obscuras que atravessam também os outros livros e são mais ou menos apreendidas dependendo da bagagem do leitor. Há várias camadas possíveis. Cada leitor vai encontrar referências diferentes. É um jogo onde pode entrar ou não; pode passar ao largo e não ver nenhuma referência e mesmo assim apreender a história (ZAFÓN, 2017ZAFÓN, Carlos Ruiz. Entrevistas. 2017. In: LUCAS, Isabel. Carlos Ruiz Zafón: “com esta série quis homenagear a literatura”. Revista Estante online. s. l.: FNAC, 2017. Disponível em: http://www.revistaestante.fnac.pt/entrevista-carlos-ruiz-zafon/. Acesso em: 22 jun. 2021.
http://www.revistaestante.fnac.pt/entrev...
).

Além desse levantamento, buscou-se, ainda, a coleta de dados por meio de um questionário, o qual foi composto por um total de 7 questões fechadas e enviado para um grupo de bibliotecários que atua em uma rede de bibliotecas do Estado de São Paulo. Esse instrumento teve por intuito identificar a prática da leitura literária entre os profissionais da rede, almejando conhecer como eles compreendem a relação da leitura literária com a prática cotidiana e como ela pode influenciar na relação que se estabelece com os alunos. Uma tentativa de observar se a prática de um determinado grupo de profissionais que atua na área educacional está alinhada ao que se identificou nos estudos bibliográficos.

A pesquisa obteve o retorno de 35 participantes, e as respostas serão brevemente discutidas, conforme exibição das figuras abaixo:

Figura 2:
Você costuma ler livros de literatura?

A questão nº 1 mostra que a maioria dos participantes tem o hábito de ler livros literários (94,3%), o que é altamente recomendado pelos pesquisadores para o desenvolvimento de habilidades como a empatia, essencial para um bom relacionamento com os alunos.

Ao lermos sobre as mais variadas histórias, em contextos e situações diversos, somos levados a encarar sentimentos, sensações e reflexões a partir do olhar do outro e, ao pensarmos como se estivéssemos fora de nosso corpo, de nossos condicionamentos e contexto social e fôssemos esse outro - o personagem -, podemos passar a ter a capacidade de identificar como o outro pensa e se sente e, assim, nos tornarmos mais humanos, compreensivos e tolerantes. (ORNELLAS; ALENCAR, 2015ORNELLAS, Adriana da Silva; ALENCAR, Patrícia Vargas. A relação entre a empatia e a prática da leitura literária e sua influência para o bibliotecário de referência. In: Anais [...] ENCONTRO NACIONAL DE PESQUISA EM CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO, 16., João Pessoa: ENANCIB, 2015. Disponível em: http://www.ufpb.br/evento/index.php/enancib2015/enancib2015/paper/viewFile/2892/1059. Acesso em: 14 jan. 2021.
http://www.ufpb.br/evento/index.php/enan...
, p.6).

Figura 3:
Quantos livros literários você costuma ler por ano?

A questão nº 2 explicita que, embora a maioria afirme costumar ler livros literários, a quantidade lida por ano não é muito alta. Uma grande parte (40%) dos bibliotecários disse ter o hábito de ler de 1 a 5 livros de literatura durante o ano.

Por outro lado, segundo a 5ª edição da pesquisa Retratos da Leitura, a quantidade média de livros que são lidos por ano na região Sudeste é de 4,9 (INSTITUTO, 2021, p. 41). Dessa forma, boa parte dos sujeitos costuma ler, o que pode ser considerado acima da média, já que 13 (37,1%) selecionaram a opção de 6 a 10, 3 (8,6%) declararam ler de 11 a 15 e 5 (14,3%) informou ler acima de 15 livros por ano.

Figura 4:
A leitura literária influência de alguma maneira a sua atividade profissional?

A questão nº 3 revela que o grande número (94,3%) dos respondentes acredita que a leitura literária pode exercer influência na sua atividade profissional. Essa perspectiva pode ser confirmada na pesquisa de Ornellas (2014ORNELLAS, Adriana da Silva. O bibliotecário de referência e a necessidade de uma atuação empática na contemporaneidade: uma análise sobre a influência da leitura literária. 2014. Dissertação (Mestrado em Biblioteconomia) - Centro de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014. Disponível em: http://www.repositorio-bc.unirio.br:8080/xmlui/handle/unirio/11823. Acesso em: 14 jan. 2021.
http://www.repositorio-bc.unirio.br:8080...
, p. 11), que esclarece:

considerando que a literatura, ao que tudo indica, exerce influência no desenvolvimento dos sujeitos, a formação de leitor literário do bibliotecário se apresenta como uma forma de educação continuada que pode auxiliar na construção de uma relação com o usuário.

Os resultados apontados na pesquisa de Ornellas (2014ORNELLAS, Adriana da Silva. O bibliotecário de referência e a necessidade de uma atuação empática na contemporaneidade: uma análise sobre a influência da leitura literária. 2014. Dissertação (Mestrado em Biblioteconomia) - Centro de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2014. Disponível em: http://www.repositorio-bc.unirio.br:8080/xmlui/handle/unirio/11823. Acesso em: 14 jan. 2021.
http://www.repositorio-bc.unirio.br:8080...
) complementam, ainda, a resposta que os bibliotecários apresentaram na questão nº 4, que versa sobre a capacidade de aproximação da leitura literária na relação com os alunos, como segue:

Figura 5:
Acredita que a leitura literária pode aproximar a sua relação com os alunos?

A questão nº 4 também demonstra a consciência que os bibliotecários possuem acerca da prática da leitura literária, dado que a resposta afirmativa recebeu quase unanimidade (97,1%) quando se trata da influência que a leitura literária exerce na construção de uma relação de proximidade com os alunos.

Inazawa e Baptista (2012INAZAWA, Fernandez Kenji; BAPTISTA, Sofia Galvão. Modelo conceitual de comunicação da informação para estudos de interação informacional baseado em competências conversacionais em serviço de referência. Perspectiva em Ciência da Informação, v. 17, n. 1, p. 169-184, jan./mar. 2012. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/pci/v17n1/a10v17n1.pdf. Acesso em: 09 jan. 2021.
https://www.scielo.br/pdf/pci/v17n1/a10v...
) descrevem essa relação como uma competência conversacional, a qual, para eles, é uma habilidade desenvolvida pela leitura literária que possibilita ao sujeito “o uso da comunicação através de conhecimentos, habilidades, atitudes e valores, com o propósito de aumentar o entendimento e a cooperação entre os indivíduos” (INAZAWA; BAPTISTA, 2012INAZAWA, Fernandez Kenji; BAPTISTA, Sofia Galvão. Modelo conceitual de comunicação da informação para estudos de interação informacional baseado em competências conversacionais em serviço de referência. Perspectiva em Ciência da Informação, v. 17, n. 1, p. 169-184, jan./mar. 2012. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/pci/v17n1/a10v17n1.pdf. Acesso em: 09 jan. 2021.
https://www.scielo.br/pdf/pci/v17n1/a10v...
, p. 118).

Figura 6:
Seu interesse pela leitura foi uma motivação para a escolha do curso de Biblioteconomia?

A questão nº 5 teve por propósito atrelar a escolha do curso de Biblioteconomia ao fato de os sujeitos se interessarem pela leitura. No entanto, desmistificando o enunciado pelo senso comum, essa relação não pôde ser comprovada, visto que 21 (60%) dos respondentes disseram que o interesse pela leitura não foi uma motivação para a escolha do curso.

Figura 7:
Durante a graduação algum professor te incentivou/inspirou a ler literatura?

A questão nº 6 foi elaborada com o intento de desvelar se durante a graduação/formação os professores costumavam incentivá-los a ler livros literários. O resultado elucida que a maior parte (54,3%) dos sujeitos alegou ter incentivo por parte de algum professor. Nesse contexto, Carvalho (2005CARVALHO, Marlene. Alfabetizar e letrar: um diálogo entre a teoria e a pratica. Petrópolis,RJ: Editora Vozes, 2005., p.67) comenta que

algumas pessoas criam o gosto pela leitura pelo exemplo dos familiares, outras, por influência de professores ou por circunstâncias fortuitas de suas histórias de vida. No entanto, a formação de leitores em grande escala, via escola, só ocorrerá se houver uma política de leitura, traduzida na adequada formação de professores leitores, na oferta abundante de bons e variados materiais escritos, e na instalação de bibliotecas e salas de leitura bem equipadas, dinamizados por bibliotecários.

Estimular a prática da leitura literária é fundamental para a formação de qualquer profissional, uma vez que contribui com o desenvolvimento de competências relevantes nas interações humanas. Trata-se da leitura além dos olhos, ou, como destaca Paulo Freire, da “leitura de mundo”.

Figura 8:
O que a leitura literária significa para você?

A questão nº 7 permitia a seleção de mais de uma opção, por isso boa parte dos respondentes optou por mais de uma alternativa, ressaltando, assim, a importância da leitura literária como Fonte de prazer (26), como Fonte de conhecimento cultural (22), como Fonte de conhecimento para a vida (19) e como Fonte de atualização profissional (17), respectivamente.

Dos 35 bibliotecários que participaram da pesquisa, apenas 2 decidiram utilizar a alternativa outras, e as respostas dadas por deles foram:

Sujeito 1: Acredito que significa uma fonte de conhecimento cultural, Histórico e também fonte de prazer. Deveria ler mais do que leio. É uma ótima oportunidade de aproximação e cultura de leitura com o alunado.

Sujeito 2: Possibilidade de compreensão e reflexão sobre a vida e as facetas do ser humano.

Contudo a coleta de dados pôde confirmar que o grupo de bibliotecários participantes têm consciência da maneira como a prática da leitura literária pode influenciar de maneira positiva a sua atividade profissional, bem como a relação interpessoal que exercem com os alunos.

Todavia, como o objetivo deste estudo foi o de discorrer sobre a maneira como a prática da leitura literária pode influenciar na atuação do bibliotecário escolar de acordo com as concepções de leitura apresentadas no livro A Sombra do Vento, as questões encaminhadas ao grupo tiveram como finalidade complementar o que divulga a literatura sobre a relação da leitura com a construção de competências e a formação humanista desse profissional. Isso posto, não se intencionou, com as questões aplicadas, identificar a influência dessa prática nas atividades do cotidiano da rede de bibliotecas investigadas, abrindo, então, possibilidades para um futuro levantamento e estudos na área.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

“Não conhecia o prazer de ler, de explorar portas que se nos abrem na alma, de nos abandonarmos à imaginação, à beleza e ao mistério da ficção e da linguagem”

Clara (ZAFÓN, Carlos Ruiz).

O estudo descortina a necessidade de o bibliotecário escolar interagir de modo empático com os alunos, procurando compreender suas atitudes e seus valores para atender sua demanda de maneira mais humanizada, aplicando, em suas relações, competências comportamentais, e não somente técnicas.

A empatia é uma das habilidades que auxiliam para a formação humanista desse profissional, na medida em que ela é inerente ao ser humano e que pode tanto ser exercitada quanto diminuída ao longo do seu processo de socialização e de cultura. Dentre as atividades que podem colaborar para a promoção da empatia, a prática da leitura literária ganha relevo.

A leitura literária propicia simular a realidade e colocar o leitor em diferentes situações e perspectivas que fazem parte do universo do outro. Por meio da narrativa de acontecimentos e de sentimentos que envolvem os personagens, ela possibilita a reflexão e o conhecimento a partir do olhar de diferentes pessoas. Essa experiência favorece a percepção do mundo e do outro, o que concorre para o desenvolvimento da empatia.

Dessa forma, propôs-se a prática da leitura literária como uma atividade que favorece a promoção de características subjetivas e humanizadoras essenciais para o aprimoramento da habilidade de empatia. Apesar de tratar-se de uma pesquisa preliminar, os dados expressam que os bibliotecários que se dispuseram a participar do estudo conduzem a leitura literária no seu cotidiano e têm consciência da influência/importância que essa ação exerce na realização de suas atividades profissionais e na edificação de uma relação mais empática e humanista com os alunos, porém essa prática não costuma ser discutida com frequência nas pesquisas da área ou incentivada nos cursos de graduação.

Contudo, espera-se que o presente estudo possa cooperar para os debates a respeito da temática na área da Ciência da Informação e refletir sobre a influência da leitura literária para uma formação mais humanista e empática do bibliotecário escolar.

REFERÊNCIAS

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    » http://www.revistaestante.fnac.pt/entrevista-carlos-ruiz-zafon
  • 1
    JITA: CF. Reading and story telling
  • RECONHECIMENTOS:

    Não é aplicável.
  • FINANCIAMENTO:

    Não é aplicável.
  • APROVAÇÃO ÉTICA:

    Não é aplicável.
  • DISPONIBILIDADE DE DADOS E MATERIAL:

    Não é aplicável.
  • 7
    Composta por: A sombra do vento (2001), O Jogo do Anjo (2008), O Prisioneiro do Céu (2011) e O Labirinto dos Espíritos (2016).

Disponibilidade de dados

Não é aplicável.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    06 Jul 2021
  • Aceito
    25 Jul 2021
  • Publicado
    30 Jul 2021
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