Acessibilidade / Reportar erro

A prototipagem virtual para o detalhamento de projetos na construção civil

Virtual prototyping for detail design in construction

Resumos

Apesar da importância da etapa de projeto no desenvolvimento de produtos, com freqüência falhas de projeto têm impactam negativamente o processo de produção. Muitas destas falhas decorrem do emprego de apenas duas dimensões para representação do produto. Uma das alternativas para vencer este problema é a modelagem do produto em 3D. Este artigo apresenta os resultados de um estudo cujo objetivo foi explorar as contribuições da prototipagem virtual para integrar as etapas de projeto e produção. A pesquisa foi conduzida a partir da modelagem virtual para detalhamento dos acabamentos de banheiros. Também foi acompanhada a prototipagem física com a intenção de verificar a conformidade da execução em relação às soluções adotadas na prototipagem virtual e identificar os requisitos para que aumentasse o grau de conformidade. As principais contribuições foram: (a) definição e análise de soluções para o detalhamento voltado a orientar a produção; e (b) antecipação de situações não previstas no projeto 2D que poderiam resultar em interferências na produção. Como requisitos foram apontados: (a) controle de qualidade dos materiais e serviços executados para minimizar as variações dimensionais; (b) emprego de tecnologias mais avançadas, menos sujeitas a variações dimensionais; e (c) necessidade de incorporação do conhecimento técnico a respeito do processo de produção.

Prototipagem virtual; Detalhamento de projeto; Processo de desenvolvimento do produto (PDP)


Despite the importance of the design stage in product development, often design failures have a negative impact in the production process. Many of these failures are due to the use of only two dimensions in product representation. An alternative to overcome this problem is the use of 3D modeling. This article presents the results of a research study which aimed to explore the contribution of virtual prototyping to the integration of design and production stages. This study involved the use of virtual modeling at the detail design of the finishings of bathrooms. Physical prototyping was also used for verifying the conformity to the solutions adopted in virtual prototyping, and for identifying a set of requirements to increase the degree of conformity. The main contributions were: (a) definition and analysis of detail solutions focused on guiding the production process; and (b) anticipation of unforeseen situations in 2D design that could result in interferences in the production process. The requirements pointed out were: (a) quality control of materials and tasks carried out on site in order to minimize dimensional variations; (b) employment of more advanced technology, less subject to dimensional variations; and (c) the need to incorporate technical knowledge about the production process.

Virtual prototyping; Project details; Product development process (PDP)


ARTIGOS

A prototipagem virtual para o detalhamento de projetos na construção civil

Virtual prototyping for detail design in construction

Ana Luiza MüllerI; Fernanda Aranha SaffaroII

ICentro de Tecnologia e Urbanismo, Universidade Estadual de Londrina, Rod. Celso Garcial Cid, PR-445, km 380, Londrina - PR - Brasil, CEP 86051-990, Tel.: (43) 3371-4455. E-mail: analuiza_muller@hotmail.com

IICentro de Tecnologia e Urbanismo, Universidade Estadual de Londrina, Tel.: (43) 3371-4455. E-mail: saffaro@uel.br

RESUMO

Apesar da importância da etapa de projeto no desenvolvimento de produtos, com freqüência falhas de projeto têm impactam negativamente o processo de produção. Muitas destas falhas decorrem do emprego de apenas duas dimensões para representação do produto. Uma das alternativas para vencer este problema é a modelagem do produto em 3D. Este artigo apresenta os resultados de um estudo cujo objetivo foi explorar as contribuições da prototipagem virtual para integrar as etapas de projeto e produção. A pesquisa foi conduzida a partir da modelagem virtual para detalhamento dos acabamentos de banheiros. Também foi acompanhada a prototipagem física com a intenção de verificar a conformidade da execução em relação às soluções adotadas na prototipagem virtual e identificar os requisitos para que aumentasse o grau de conformidade. As principais contribuições foram: (a) definição e análise de soluções para o detalhamento voltado a orientar a produção; e (b) antecipação de situações não previstas no projeto 2D que poderiam resultar em interferências na produção. Como requisitos foram apontados: (a) controle de qualidade dos materiais e serviços executados para minimizar as variações dimensionais; (b) emprego de tecnologias mais avançadas, menos sujeitas a variações dimensionais; e (c) necessidade de incorporação do conhecimento técnico a respeito do processo de produção.

Palavras-chave: Prototipagem virtual. Detalhamento de projeto. Processo de desenvolvimento do produto (PDP)

ABSTRACT

Despite the importance of the design stage in product development, often design failures have a negative impact in the production process. Many of these failures are due to the use of only two dimensions in product representation. An alternative to overcome this problem is the use of 3D modeling. This article presents the results of a research study which aimed to explore the contribution of virtual prototyping to the integration of design and production stages. This study involved the use of virtual modeling at the detail design of the finishings of bathrooms. Physical prototyping was also used for verifying the conformity to the solutions adopted in virtual prototyping, and for identifying a set of requirements to increase the degree of conformity. The main contributions were: (a) definition and analysis of detail solutions focused on guiding the production process; and (b) anticipation of unforeseen situations in 2D design that could result in interferences in the production process. The requirements pointed out were: (a) quality control of materials and tasks carried out on site in order to minimize dimensional variations; (b) employment of more advanced technology, less subject to dimensional variations; and (c) the need to incorporate technical knowledge about the production process.

Keywords: Virtual prototyping. Project details. Product development process (PDP)

Introdução

A necessidade de redução nos prazos e de aumento da produtividade, além da competitividade e exigência quanto a uma maior qualidade, tem contribuído para a maior complexidade do produto e exigido um número maior de profissionais envolvidos em todo o seu processo de desenvolvimento (KOSKELA, 2000). Esses aspectos aliados às peculiaridades do setor da construção civil têm levado a discussões por mudanças nas formas de gestão e nas ferramentas empregadas para o Processo de Desenvolvimento do Produto (PDP), sobretudo no que tange às etapas de projeto (FERREIRA, 2007).

Durante o processo de projeto, são definidas as principais diretrizes dos empreendimentos, que influenciam diretamente os custos, prazos e métodos de produção (TZORTZOPOULOS, 1999). Porém, apesar da evidente importância, os projetos frequentemente apresentam falhas, tais como:

(a) incompatibilidades entre as diferentes partes funcionais da edificação;

(b) insuficiente detalhamento das informações; e

(c) deficiências na comunicação das decisões do projetista, principalmente em função do emprego de apenas duas dimensões para representação.

Essas falhas resultam em uma parcela significativa dos problemas enfrentados durante a construção e o uso do edifício.

Na etapa projetual de detalhamento, há aumento da complexidade no ato de projetar decorrente da grande variedade de materiais, do alto grau de exigência quanto a decisões arquitetônicas relacionadas à estética e da necessidade de atender à construtibilidade. Dessa forma, a elaboração dos projetos deve considerar as interfaces com o processo de produção e deve ocorrer mediante o emprego de ferramentas que representem os diferentes atributos do produto, de forma a amparar as tomadas de decisões envolvendo o nível de detalhamento adequado a cada etapa do desenvolvimento.

Nesse sentido, a tecnologia da informação tem permitido que os projetistas utilizem softwares para representação tridimensional, originando modelos virtuais do produto e possibilitando a representação de atributos normalmente não apresentados em um único desenho bidimensional.

Os protótipos virtuais têm sido utilizados para aprovar alternativas de projeto, fazer análises de engenharia, apoiar o planejamento da produção e apresentar o produto aos clientes (DAI et al., 1996). Dessa forma, possibilitam despender menos tempo e recursos nas tomadas de decisões, assim como antecipar problemas que possam gerar dificuldades na produção (FERREIRA, 2007).

Nesse contexto, a pesquisa que originou este artigo teve como objetivo explorar os benefícios do uso da prototipagem virtual (PV) para o detalhamento de produtos na construção civil, integrando as atividades de projeto e produção.

A pesquisa foi conduzida a partir da oportunidade de efetuar a modelagem virtual dos acabamentos de banheiros de alto padrão na etapa de detalhamento do projeto. Considerando que essa etapa visa a definir detalhes que orientem a produção, ambos os estudos abrangeram a modelagem virtual e a prototipagem física (PF) no canteiro. Ao longo do processo, foram identificadas condições que permitiam que os benefícios da PV se concretizassem. Sendo assim, na discussão deste artigo essas condições são explicitadas, uma vez que se considera que elas se constituem em requisitos para a modelagem virtual.

Prototipagem no Processo de Desenvolvimento do Produto

Prototipagem

Prototipagem é o processo pelo qual são elaborados protótipos, sendo estes definidos como um original, isto é, um primeiro exemplar ou modelo do produto final. A palavra é derivada do grego, prototypon, que significa a primeira forma (GRIMM, 2004). Já Ulrich e Eppinger (2000, p. 275) definem protótipo como “[ . . . ] uma aproximação do produto segundo uma ou mais dimensões de interesse [ . . . ]”. Esta definição sugere que qualquer entidade que exiba pelo menos um aspecto do produto possa ser vista como um protótipo.

Quanto à forma empregada para representação do produto em desenvolvimento, os protótipos podem ser classificados em físicos e analíticos (virtuais). Protótipos físicos são objetos, ou seja, elementos tangíveis, e possibilitam avaliar aspectos como ergonomia e estabilidade (GRIMM, 2005), enquanto os analíticos representam o produto de maneira intangível (ULRICH; EPPINGER, 2000). Estes são aplicados em situações nas quais a prototipagem física é impraticável, impossível ou ineficiente (GRIMM, 2005).

Os protótipos virtuais geralmente apresentam maior flexibilidade para ajustes do que os protótipos físicos, pois aqueles permitem que as alterações sejam efetuadas a menores custos e em menor espaço de tempo (FAITHFULL; BALL; JONES, 2001). Normalmente, as alterações em protótipos físicos demandam a execução de um novo protótipo (PINHO; FREITAS; TRAMONTANO, 2003) e, em geral, são mais caras e demoradas (ULRICH; EPPINGER, 2000). A PV, geralmente, precede a PF, porém não necessariamente elimina esta segunda, havendo uma complementaridade entre ambas (ULRICH; EPPINGER, 2000; FAITHFULL; BALL; JONES, 2001).

A prototipagem ao longo do PDP

O processo de desenvolvimento do produto tem sido descrito por diversos autores com significado e abrangência distintos (MIRON, 2002). Segundo Ulrich e Eppinger (2000), o PDP abrange um conjunto de atividades que se inicia com o planejamento, isto é, com a percepção da oportunidade de mercado, evoluindo para o desenvolvimento do conceito; projeto; projeto do detalhe; refinamento e teste; e, por fim, o ramp-up. Esta última é definida como uma produção de caráter experimental que busca o crescimento da capacidade de produção. A transição dessa fase para a produção contínua é gradual e, em algum ponto desse percurso, o produto é lançado no mercado.

Para Pahl e Beitz (1996) e Ulrich e Eppinger (2000), a prototipagem ocorre ao longo de praticamente todas as fases do PDP, uma vez que as informações fornecidas pela realização dos protótipos são necessárias para dar continuidade à definição do produto ou da produção e, por isso, não é possível fixá-las em alguma etapa particular. Nesse sentido, Clark, Chew e Fujimoto (1992) e Ulrich e Eppinger (2000) destacam a necessidade de adotar o nível adequado de aproximação do produto, tendo em vista as respostas que se procuram, sem buscar um refinamento excessivo dos protótipos nas fases iniciais do PDP.

Prototipagem Virtual (PV)

A ideia básica da PV é integrar técnicas de projeto e engenharia auxiliados por computador (Computer Aided Design - CAD e Computer Aided Engineering - CAE) com realidade virtual (RV), construindo o objeto virtual com funcionalidades do produto projetado (DAI et al., 1996; MCLEOD, 2001). No entanto, a PV (termo similar a prototipagem digital ou modelagem virtual) não é restrita somente ao uso de um software para simular o comportamento de um produto, mas também engloba uma abordagem para seu desenvolvimento e a adoção bem-sucedida da tecnologia de informação para uma maior colaboração entre designers, engenheiros, comerciantes e clientes (MCLEOD, 2001).

Assim, a prototipagem virtual é entendida como um processo de aproximação do produto que ocorre ao longo das etapas do PDP, por meio da utilização de tecnologias CAD (desenho bidimensional ou modelagem tridimensional no computador) com RV. Em geral, esse termo refere-se a uma experiência imersiva e interativa baseada em imagens gráficas 3D geradas em tempo real por computador. Os fatores importantes em sistemas de RV são a imersão, que pode ser explicada como o sentimento de estar dentro do ambiente virtual, e a interatividade, que é a capacidade do computador de detectar os comandos do usuário e modificar instantaneamente o mundo virtual conforme as ações realizadas (NETO; VOLPATO, 2004).

Com relação ao grau de interação humana com o modelo virtual, existem, basicamente, dois tipos de protótipos virtuais: o imersivo, com novas interfaces homem-computador propiciadas por recursos tais como luvas e capacetes de realidade virtual; e o analítico, com tecnologia computacional padrão, isto é, mouse, teclado e monitor (TSENG; JIAO; SU, 1998).

Desse modo, a revisão da literatura permite concluir que, quando se projeta em 3D por meio de softwares CAD, a modelagem virtual do produto ocorre a todo o momento dentro do processo de desenvolvimento. Nesse caso, todo o processo de projeto é um exercício de aproximação e refinamento do produto conduzido mediante testes, análises e tomadas de decisões intermediárias, isto é, seguindo uma abordagem da prototipagem.

Benefícios da prototipagem virtual

Os benefícios da prototipagem virtual apresentados na literatura são:

(a) inovação: Thomke (2001) menciona que a PV favorece a inovação, uma vez que os experimentos realizados com recursos dela, normalmente, reduzem custo e tempo de resposta;

(b) aprendizagem: para Ulrich e Eppinger (2000), os protótipos constituem-se em ferramentas de aprendizagem na medida em que são utilizados para responder a questões como “o produto irá funcionar?” ou “o produto atende as necessidades dos consumidores?”. Além disso, conforme destaca Oliveira (2001), a PV é um suporte didático eficaz para o treinamento da mão de obra;

(c) comunicação e colaboração: a PV favorece a troca de informações e a colaboração entre os envolvidos (ULRICH; EPPINGER, 2000). Assim, pessoas com diferentes conhecimentos técnicos, como clientes, usuários e projetistas, podem influenciar de forma interativa as características do produto (DAI et al., 1996; OTOSSON, 2002);

(d) visualização e compreensão: a capacidade de visualização dos protótipos virtuais pode ser usada para analisar a estética do produto, a forma, folgas e requisitos de montagem com maior clareza (MCLEOD, 2001). Além disso, pode facilitar a interpretação dos projetos pelos trabalhadores (BOUCHLAGHEM et al., 2005). A facilidade de visualização colabora para a minimização das alterações de projeto, uma vez que permite a compreensão do projeto pelos clientes de maneira mais simples, amplia a capacidade de demonstrar soluções diferentes e os efeitos de cada escolha (YEOMANS; BOUCHLAGHEM; EL-HAMALAWI, 2006);

(e) integração: a prototipagem permite encontrar falhas e detectar interferências geométricas ou conflitos entre partes do produto, evitando que esses erros sejam vislumbrados somente no momento da fabricação (ULRICH; EPPINGER, 2000; NETO; VOLPATO, 2004; YEOMANS; BOUCHLAGHEM; EL-HAMALAWI, 2006);

(f) gerenciamento das informações: os protótipos virtuais devem ser usados como meio de extração (FAITHFULL; BALL; JONES, 2001), registro (FORTI, 2005), intercâmbio (BOUCHLAGEM et al., 2005), controle (OLIVEIRA, 2001), retroalimentação (FLOYD, 1984) e reutilização (MCLEOD, 2001) de informações ao longo do PDP;

(g) testes, simulações, análises e avaliações: os protótipos virtuais permitem analisar possíveis soluções para o produto (OLIVEIRA, 2001), envolvendo análises de propriedades físicas (massa e volume) (ULRICH; EPPINGER, 2000; NETO; VOLPATO, 2004), mecânicas, térmicas e elétricas (GRIMM, 2005). Além disso, podem ser efetuados testes funcionais, testes de forma e encaixe, testes ergonômicos, testes de montagem/desmontagem (CHOI; CHAN, 2004) e análises de operação e manutenção (OLIVEIRA, 2001). Os protótipos virtuais também possibilitam a execução de testes impossíveis ou inviáveis devido ao custo elevado ou ao risco à vida (FORTI, 2005);

(h) flexibilidade, redução do tempo e custos do PDP: o protótipo virtual pode ser mais prático e eficiente em casos nos quais as mudanças são rápidas e frequentes (GRIMM, 2005), possibilitando maior liberdade de criação (PINHO; FREITAS; TRAMONTANO, 2003), permitindo a repetição e exploração de possibilidades praticamente sem custo adicional (CHOI; CHAN, 2004) e reduzindo a necessidade de protótipos físicos (MCLEOD, 2001); e

(i) melhoria da qualidade: a PV possibilita prever erros nas etapas iniciais do projeto, investigar diferentes soluções e facilitar a personalização do produto segundo o desejo do cliente, propiciando melhora da qualidade final e maior satisfação do consumidor em relação ao produto adquirido (NETTO; OLIVEIRA, 2001; OTOSSON, 2002).

Muitos dos benefícios da PV para a construção civil coincidem com os apresentados anteriormente. No entanto, a maioria dos autores aponta para os benefícios atingidos na etapa de projetos:

(a) aumento de soluções e revisões, favorecendo a maior exploração de opções de design (BOUCHLAGEM et al., 2005); e

(b) a compreensão das interferências físicas com maior facilidade (MIKALDO JÚNIOR; SCHEER, 2006).

Limitações da prototipagem virtual

Apesar da grande quantidade de benefícios, a aplicação da PV na indústria da construção civil ainda é relativamente nova (MCLEOD, 2001). As razões para o uso ainda limitado são:

(a) questões culturais e econômicas: relutância das empresas do setor em buscar inovações representadas pelo emprego do 3D em detrimento ao 2D, devido à crença de que produzir um modelo em 3D é mais caro e demorado (YEOMANS; BOUCHLAGHEM; EL-HAMALAWI, 2006). Quanto aos custos totais para aquisição de equipamentos e softwares (MCLEOD, 2001; OTOSSON, 2002), a prototipagem virtual aumenta o esforço e o investimento nos estágios preliminares do processo de desenvolvimento do produto para melhorar a qualidade, produtividade e redução de perdas, ocasionando, posteriormente, redução nos custos de construção e manutenção da edificação (SARCHAR; CHRISTIANSSON; WINTER, 2004);

(b) questões educacionais: falta de compreensão quanto aos benefícios advindos do emprego da PV (YEOMANS; BOUCHLAGHEM; EL-HAMALAWI, 2006) e escassez de profissionais capacitados para o emprego eficaz dos softwares em 3D (MCLEOD, 2001); e

(c) questões técnicas: falta de investimento no desenvolvimento de softwares adequados, especialmente quando comparado às indústrias aeronáutica e automotiva, e deficiências na interoperabilidade entre os softwares, prejudicando o trabalho colaborativo entre os projetistas (YEOMANS; BOUCHLAGHEM; EL-HAMALAWI, 2006).

Método

Contexto da pesquisa

Os estudos foram realizados em uma empresa construtora de grande porte, que atua há quase quatro décadas na cidade de Londrina. Desde 2004, a empresa faz uso da PF em seus empreendimentos residenciais. Esse processo se desenvolve por intermédio da construção de um apartamento no primeiro pavimento desde a etapa de alvenaria até a primeira demão de pintura em paredes e tetos. Esses protótipos têm a finalidade de estabelecer soluções para resolver conflitos entre etapas executivas e analisar a interface de diferentes materiais de acabamento.

Embora a empresa também execute um apartamento-modelo em um showroom antes do início da obra, o fato de a empresa empregar uma tecnologia diferente (gesso acartonado) daquela adotada na obra (alvenaria com blocos cerâmicos) e não incluir determinados elementos construtivos, tais como ralos, alguns pontos elétricos e certas esquadrias, algumas análises permitidas pela prototipagem física ficam prejudicadas. O propósito do showroom é limitado à comunicação do produto ao cliente para, assim, alavancar vendas. Essas características ou limitações fazem com que seja necessária a construção do protótipo físico na obra.

Os projetos arquitetônicos e complementares dos empreendimentos da empresa são elaborados por escritórios de destaque na cidade, que prestam serviços há vários anos para ela. Esse fato favorece a integração entre os projetistas e o processo de compatibilização dos projetos. No entanto, esses projetistas ainda utilizam somente a representação por meio de softwares CAD em 2D.

O interesse da empresa em explorar a PV deu-se pela necessidade de antecipar soluções relativas aos acabamentos para a etapa de detalhamento do projeto. À PF caberia a confirmação das decisões.

Delineamento da pesquisa

A pesquisa desenvolveu-se a partir de dois estudos de caso consecutivos, que tiveram o objetivo de apontar as contribuições da prototipagem virtual para o detalhamento de produtos na construção civil e se as soluções adotadas na PV são passíveis de ser replicadas na PF.

Os estudos de caso, EC1 e EC2, foram constituídos de três etapas básicas:

(a) prototipagem virtual;

(b) prototipagem física (execução no primeiro pavimento da obra); e

(c) análise dos resultados.

A Figura 1 representa esquematicamente o processo de pesquisa.


O estudo de caso 1 (EC1) se desenvolveu em um banheiro de alto padrão de um empreendimento em construção (Figura 2). O período do estudo foi de setembro de 2009 a fevereiro de 2010. Para a construção do modelo virtual do EC1 foi empregado o software de modelagem geométrica Google Sketchup 7.


O estudo de caso 2 (EC2) envolveu um banheiro de alto padrão, porém nesta situação, em um showroom de um empreendimento em lançamento (Figura 3). O período do estudo ocorreu de janeiro a março de 2010. Para a construção do modelo virtual do EC2 foi empregado o software de modelagem paramétrica Autodesk Revit Architecture 2010.


Os protótipos virtuais foram elaborados por uma das pesquisadoras a partir de informações dos projetos executivos e de detalhamento em 2D preexistentes, e as decisões tomadas ao longo de todo o processo envolveram o engenheiro de produção da obra, o escritório de arquitetura e o operário da empreiteira que executou os protótipos físicos.

A coleta de informações ocorreu em duas etapas: na fase de modelagem do produto (prototipagem virtual) e, posteriormente, na fase de produção (prototipagem física).

A PV ocorreu por intermédio de sucessivos refinamentos do modelo virtual. Os aprimoramentos dos protótipos virtuais do EC1 se deram com base em discussões realizadas nas reuniões com os diferentes agentes envolvidos no processo de desenvolvimento do produto. Durante as reuniões, a última versão do protótipo virtual era utilizada para intermediar as discussões, e as decisões tomadas eram incorporadas à nova versão. Ao término dos estudos, foram geradas as documentações para a execução, que continham, além das representações convencionais em 2D, perspectivas do modelo virtual.

Os recursos empregados para coleta de dados durante a PV de ambos os estudos foram:

(a) documentações: projetos executivos e de detalhamento em 2D; e

(b) observação participante: ao longo das reuniões e da elaboração do modelo.

Durante a PF, as decisões tomadas na execução e as respectivas justificativas foram registradas. As ferramentas de coleta de dados em ambos os estudos foram:

(a) observação direta: registro fotográfico e registros descritivos da construção do protótipo no caderno de campo; e

(b) entrevistas informais com o executor.

Além das discussões que ocorreram durante todo o processo, ao final do EC1, realizou-se entrevista com o engenheiro e com o operário. O objetivo dessa entrevista foi verificar se as contribuições da PV identificadas pelas pesquisadoras coincidiam com as percepções de ambos.

Resultados e discussão

Estudo de caso 1 (EC1)

No EC1, foi elaborado o protótipo virtual de um banheiro de alto padrão mediante discussões com a arquiteta responsável pelo projeto, engenheiro de produção e operário que executou o protótipo físico. A intenção ao elaborar o protótipo virtual foi definir todos os detalhes necessários para orientar a execução, de forma a não comprometer aspectos estéticos do produto final. Durante a construção do protótipo físico, houve o intuito de analisar o cumprimento das decisões tomadas na fase de prototipagem virtual.

O protótipo físico encontrava-se com os serviços de obra bruta já executados. Assim, ao elaborar o protótipo virtual foram empregadas as dimensões reais do banheiro rebocado. O profissional responsável pela execução participou de algumas etapas da PV e, portanto, já havia entrado em contato com algumas decisões e restrições analisadas durante as reuniões.

Soluções adotadas na PV e forma de utilização na PF

No início da modelagem virtual houve a necessidade de se averiguarem quais medidas de espessura da peça cerâmica e da argamassa de assentamento eram utilizadas pela construtora, uma vez que as medidas do projeto arquitetônico apenas apresentavam a espessura do tijolo com 9 cm mais 2,5 cm de reboco de cada lado. Uma vez que o banheiro já se encontrava rebocado, adotou-se, por indicação do engenheiro de produção, a espessura total de 1,2 cm, sendo 3 mm para a argamassa de assentamento e 9 mm para a peça cerâmica. Também foram adotadas as medidas reais das peças de acabamento, restrições referentes a arremates, critérios para sobreposição das peças cerâmicas nos encontros de planos ortogonais e largura e alinhamento de juntas de pisos e paredes. A alteração das espessuras dos acabamentos resultou em mudanças nas dimensões internas do banheiro em relação ao projeto executivo.

O projeto arquitetônico previa uma bancada de granito cujo tamanho era de 180 cm, equivalente a quatro azulejos de 45 cm. No entanto, ao efetuar a modelagem com a medida real da peça (43,7 cm) mais a espessura das juntas com 2 mm, constatou-se que haveria um filete de azulejo no canto da parede. Assim, acrescentou-se uma fileira de pastilhas e reduziu-se o tamanho da bancada de granito para evitar o filete. Outra decisão tomada consistiu no desalinhamento das juntas dos pisos e dos azulejos, privilegiando o alinhamento das juntas do azulejo com a largura da bancada (Figura 4). A visualização de planos ortogonais (piso, parede e bancada) em um único desenho facilitou a tomada de decisão a partir da simulação de duas opções que envolviam:


(a) coincidir juntas de piso e parede; e

(b) coincidir juntas de parede com a largura da bancada.

Durante a modelagem virtual verificou-se um erro entre o projeto em 2D e o detalhe executivo na representação do acabamento na região da esquadria de manutenção da banheira, que ocorreu devido à fragmentação inerente à representação (por meio de diferentes desenhos) em 2D. Outra deficiência do projeto em 2D foi a não representação de uma verga na abertura da esquadria de manutenção da banheira, identificada pelo engenheiro de produção em uma das reuniões de discussão do modelo virtual. Essa desconsideração e o acréscimo da fileira de pastilha resultaram na redução do espaço disponível para a instalação da esquadria, que, por uma questão de estética, deveria ser instalada na região de azulejo, mantendo um filete de cerâmica entre o vão da esquadria e a pastilha de vidro (Figura 5). Assim, foram reduzidas as dimensões da esquadria para o mínimo exigido e foi criado um chanfro de 2,5 cm na parte interna da alvenaria da banheira (Figura 6). As figuras demonstram que a execução acompanhou essas decisões.



Para a modelagem de quinas entre as peças cerâmicas foi utilizado um chanfro em 45º como recorte da peça e, posteriormente, executado conforme esse padrão adotado pela empresa (Figura 7).


No revestimento do piso houve uma pequena alteração no alinhamento das juntas, pois o executor percebeu que poderia alinhar as juntas entre o piso externo e interno do box (Figura 8). O processo de PV não compreendeu essa decisão, pois, segundo o engenheiro de produção, a junta do piso deveria partir exatamente do eixo do ralo para não haver recortes diagonais nas peças cerâmicas. No entanto, durante a produção, constatou-se que a solução estabelecida pelo executor no protótipo físico não acarretaria perdas funcionais no escoamento da água e propiciaria ganho estético.


A definição de alternativas para absorver imprecisões dimensionais era necessária, uma vez que um modelo com medidas precisas não reflete as dificuldades decorrentes da variabilidade na dimensão dos materiais e no processo de produção. Assim, na construção do protótipo físico, a faixa de granito foi adotada pela construtora como área para eventuais ajustes. No entanto, essa solução poderia ter sido mais bem analisada, pois apresenta inconvenientes sob o ponto de vista gerencial, uma vez que aumenta o tempo de execução do banheiro completo em função de a fabricação das peças de granito ser autorizada somente após o término do revestimento cerâmico.

Ao longo da modelagem virtual, constatou-se a necessidade de executar um enchimento em argamassa na região onde seria aplicada a pastilha, com a finalidade de alinhá-la com o revestimento em azulejo. Essa constatação antecipou a identificação de uma atividade que não havia sido prevista e que poderia ocasionar atrasos caso fosse detectada apenas na construção do protótipo físico.

Apesar de o modelo virtual apresentar as cotas necessárias para a produção, muitas vezes foram utilizadas galgas ou gabaritos ao invés das medidas indicadas nos projetos. Essa constatação pode ser observada pela quantidade de vezes que o executor utilizou esse recurso (Figura 9). O emprego de galgas pode ser justificado pela prática comum de não utilização das medidas reais dos acabamentos nos projetos de construção civil e pela facilidade e confiabilidade propiciada por esse ato, já que não há risco de erro proveniente de leitura do projeto e de manuseio da trena. Pôde-se constatar que a utilização de galgas é uma atividade de experimentação e característica da prototipagem. Ao dispor o material no local a ser aplicado, o executor realiza um processo de aproximação do revestimento, ou seja, a disposição das peças permite a visualização de como ficará o revestimento antes de assentá-lo.


O emprego de galgas durante a PF reforça a necessidade de utilização de medidas reais durante a PV. No entanto, é preciso assegurar um nível mínimo de qualidade em cada etapa executada em canteiro.

As formas de representação do modelo para orientar a execução foram definidas por uma prancha contendo os projetos em 2D e uma contendo perspectivas extraídas do protótipo virtual. A prancha com os projetos em 2D foi elaborada no software Autocad, seguindo o mesmo padrão de desenho do escritório de arquitetura responsável pelos projetos do empreendimento, e as vistas foram extraídas diretamente do protótipo virtual.

Ambos os modelos foram utilizados durante a PF. A prancha em 2D foi utilizada, principalmente, para localizar os pontos de saída da paginação e visualizar as medidas necessárias. A prancha com as perspectivas do protótipo virtual foi utilizada para visualizar as interações entre os diferentes planos, por exemplo, o alinhamento entre juntas e como ficaria exatamente o acabamento final do banheiro.

Síntese dos resultados do EC1

O Quadro 1 apresenta as soluções ou informações adotadas na PV e a forma como elas foram utilizadas ao longo da PF.


Estudo de caso 2 (EC2)

No EC2, foi elaborado o protótipo virtual de um banheiro de alto padrão mediante discussões entre as pesquisadoras e o engenheiro de produção. Como no estudo anterior, o propósito foi identificar as contribuições da modelagem 3D no detalhamento do acabamento visando a orientar a execução de forma a não comprometer aspectos estéticos do produto final. Durante a PF, analisou-se o cumprimento das decisões tomadas na PV.

No início do estudo, o protótipo físico encontrava-se com os serviços de obra bruta (alvenaria, revestimento argamassado e paredes de gesso acartonado) já executados. Portanto, a prototipagem física compreendeu a etapa de acabamentos.

Soluções adotadas na PV e forma de utilização na PF

No início da modelagem virtual, houve a necessidade de refazer o projeto de locação das paredes de gesso acartonado, pois as espessuras apresentadas no projeto executivo não eram compatíveis com as espessuras reais. Assim, elaborou-se uma nova planta em 2D, adotando-a como referência para a modelagem, o que ocasionou a redução de 0,5 cm na área interna do box.

Além disso, no projeto de arquitetura de interiores, a espessura final de revestimento cerâmico era de 2,5 cm, diferente da medida utilizada pela produção, que é de 1,2 cm, ocasionando novas alterações nas dimensões internas do banheiro. Para a readequação das medidas da área da banheira, criou-se uma restrição durante a modelagem de tal forma que houvesse um transpasse de 5 cm entre o acabamento em granito da parede de apoio da banheira e a parede com acabamento cerâmico, para que, posteriormente, fosse instalado o box de vidro (Figura 10).


A estrutura da parede de apoio da banheira foi definida pelo mestre de obras, uma vez que não havia sido prevista nos projetos de arquitetura. No modelo virtual, ela foi apenas posicionada para atender ao transpasse mencionado anteriormente. O primeiro posicionamento dessa parede não seguiu as informações extraídas do protótipo virtual, não atendendo à restrição do transpasse de 5 cm para a instalação do vidro do box. Além do problema citado, não foi prevista a aplicação de uma chapa de gesso acartonado na face superior da parede de apoio da banheira. Assim, toda a estrutura foi rebaixada em 1,25 cm (Figura 11).


Conforme se pode observar no acompanhamento da PF, a execução da parede de apoio da banheira apresentou maior quantidade de erros e retrabalho. Assim, a omissão de informações importantes durante as etapas de projetos causou dificuldades para a produção.

A peça de granito para acabamento da parede de apoio da banheira não foi fabricada a partir da dimensão do modelo virtual, mas sim com base na medida no local. Esse fato ocasionou um erro na medida da peça assentada e ela teve de ser substituída (Figura 12).


Durante a modelagem não puderam ser adicionadas as informações a respeito das espessuras das juntas, pois no software Revit as peças cerâmicas são consideradas hachuras aplicadas sobre uma camada de acabamento da parede. Essa forma de abstração não possibilita a representação da dimensão real das juntas. A alternativa adotada foi calcular o tamanho real da peça juntamente com o tamanho da junta e transformar essas medidas em hachura. Embora o tamanho da junta tenha sido considerado na modelagem, essa informação não foi explicitada textualmente no modelo virtual.

Outra diferença relevante do modelo paramétrico é que nele não se pode observar as sobreposições entre as peças cerâmicas em planos ortogonais, pois o software reconhece o revestimento como uma camada de acabamento (finish) aplicada sobre a estrutura básica da parede (core structure - substrate). Assim, a camada de revestimento une-se à camada aplicada na parede seguinte, não permitindo representar como se dá a sobreposição entre as peças (Figura 13). Da mesma forma, o software não é capaz de representar chanfros a 45º na peça cerâmica para a reprodução de quinas.


Durante a modelagem do nicho do box, foram verificadas diferenças entre a paginação no projeto de arquitetura de interiores e a paginação no modelo virtual. No primeiro, as peças apresentavam-se com tamanhos nominais ao passo que, no segundo, com medidas reais das peças. Dessa forma, pode-se observar no modelo virtual a ocorrência de duas juntas na parte interna do nicho, diferente do projeto em 2D.

O nicho foi modelado como pertencendo a uma família de janelas do Revit. Assim, quando hospedado dentro da alvenaria, o nicho gera uma abertura com profundidade e acabamentos determinados. Nessa forma de modelagem, a limitação do software impedia aplicar o revestimento na parte interna do nicho, de forma que as juntas ficassem alinhadas com o revestimento da parede. No protótipo físico, o nicho apresentou duas juntas internas, exatamente como o previsto no protótipo virtual (Figura 14).


Outra situação em que a modelagem virtual possibilitou análises acerca da estética, resultando em uma solução que, posteriormente, foi executada no protótipo físico, foi nas juntas do piso dentro e fora do box (Figura 15). Destaca-se, também, que, embora o modelo virtual apresentasse as cotas necessárias para orientar a produção, durante o assentamento dos azulejos foi elaborada uma galga simulando a disposição das peças. Essas evidências reforçaram os resultados do estudo anterior no que diz respeito à contribuição da PV para antecipar análises das características do produto a partir da utilização de medidas reais.


A partir da modelagem, pôde-se discutir a respeito das possibilidades de absorção de variações dimensionais. Neste estudo, as últimas áreas a receber os acabamentos (painéis de madeira e moldura do espelho) foram definidas como regiões de ajustes, pois deveriam se adequar às medidas resultantes das tarefas anteriores.

As formas de representação do modelo para orientar a execução foram definidas por uma prancha contendo os projetos em 2D e perspectivas extraídas do protótipo virtual. Cabe ressaltar que a documentação do EC2 foi extraída diretamente do modelo e elaborada no mesmo software. Na prancha para execução, adicionaram-se outras informações, tais como cotas e símbolos de saída da paginação. Durante a execução, a prancha em 2D foi utilizada para averiguar informações referentes a medidas e saída da paginação, e as perspectivas não foram utilizadas, pois, como comentado pelo executor, as perspectivas renderizadas1 1 . O termo “renderização” é derivado da palavra inglesa render, que significa acabamento. Renderização consiste em um processo aplicado especialmente em programas de modelagem por meio do qual se pode obter uma imagem do produto simulando condições realísticas. eram difíceis de compreender. Esse fato ocorreu porque as imagens do EC1 foram obtidas pelo software Sketchup, que utiliza um modo de representação baseado na combinação do modo wireframe (aramado) com o renderizado, o que facilita a visualização das linhas que correspondem às juntas entre as peças cerâmicas. Já no software Revit, as imagens renderizadas perdem a qualidade dessa representação, pois não há a possibilidade de representar as medidas reais da peça e juntas (Figura 16).


Síntese dos resultados do EC2

O Quadro 2 apresenta as soluções ou informações adotadas na PV e a forma como elas foram utilizadas ao longo da PF.


Discussão dos resultados dos estudos de caso

O EC2 apresentou maiores limitações em relação ao EC1 no que diz respeito às contribuições da modelagem virtual para orientar a produção. Dois fatos contribuíram para essa limitação:

(a) o propósito do showroom voltado a apresentar determinadas soluções de acabamento que não serão replicadas nos apartamentos entregues aos clientes; e

(b) a intensa pressão em termos de prazo para o lançamento do empreendimento, buscando acelerar as vendas.

Apesar dessa limitação, no EC2 foi possível obter evidências (nicho no box, transpasse para espaço da porta do box, juntas piso banheiro e box, definição de áreas para absorção de pequenas imprecisões, interfaces de acabamentos) relativas à contribuição da modelagem virtual para o detalhamento voltado a orientar a produção e o cumprimento das decisões na etapa de execução.

No EC1, além de orientações para a produção voltadas a garantir a estética do produto (presença de filetes de azulejos, recorte de pastilhas, coincidência de juntas), houve a antecipação de situações não previstas (necessidade de camada de enchimento, falta de espaço para encaixe da esquadria da banheira), que poderiam resultar em interferências na produção.

Assim, em ambos os estudos constatou-se a contribuição da PV para antecipar soluções que, na empresa em que a pesquisa se desenvolveu, vem sendo atribuição da PF. O emprego da PV permitiu a definição e análise de diferentes soluções para o detalhamento sem que fosse necessário construir um modelo físico. Esse benefício permitiu que a empresa vislumbrasse a possibilidade de utilizar a PF para avançar em análises relacionadas ao processo de produção.

O propósito do modelo virtual voltado ao detalhamento do acabamento para orientar a execução de um apartamento de alto padrão repercutiu no nível de aproximação do protótipo em relação ao produto e, consequentemente, exigiu preocupação com a precisão da informação. Dessa forma, foi necessário incorporar uma série de informações relacionadas aos materiais (tamanho real das peças) e às técnicas de execução (espessuras da camada de substrato, da argamassa de assentamento da peça cerâmica e de juntas de assentamento, presença de vergas).

Destaca-se que, ainda que fosse empregada a modelagem 3D, a consideração de espessuras de argamassas diferentes das praticadas pela empresa ou a desconsideração da verga acarretaria o mesmo erro detectado nos projetos em 2D, ou seja, é importante esclarecer que a incorporação de informações corretas e do conhecimento técnico no desenvolvimento do produto em 2D poderia levar, ao menos, a alguns dos benefícios constatados neste estudo.

No entanto, constatou-se que a percepção dos benefícios da modelagem virtual, tais como visualização dos reflexos de determinada solução de projeto em diferentes planos (reflexo do aumento de uma fileira de pastilhas na redução do espaço para a esquadria de manutenção da banheira) e análises para a tomada de decisão (coincidência ou não das juntas de piso e parede), induz o projetista a adotar informações reais e a buscar a incorporação do conhecimento técnico. Em contraponto, a limitação do 2D com relação à visualização de interferências espaciais e às análises para a tomada de decisão aliada à desconfiança dos projetistas com relação à precisão dimensional dos materiais e dos serviços executados em canteiro contribui para a falta de preciosismo na entrada de informações de projeto.

A falta de confiança na precisão das informações de projeto foi evidenciada por meio do uso frequente de galgas na execução. Esse fato reforça a importância do uso de informações reais de materiais como um requisito para a modelagem virtual.

Outra evidência que denotou a falta de confiança na precisão dimensional dos materiais e dos serviços executados em canteiro foi a prática de autorizar a fabricação de determinadas peças (acabamento em granito da banheira) mediante a medição em canteiro somente após todos os serviços anteriores estarem executados. Essa prática traz repercussões negativas em termos de gestão, tais como não padronização das peças a serem fabricadas e aumento de prazo do processo de produção. Além disso, há também implicações na obtenção dos benefícios da prototipagem, seja ela virtual ou física, na medida em que se assume não ser possível replicar uma mesma solução para uma série de produtos iguais.

Vale salientar que o preciosismo na inserção de informações que permitisse antecipar análises e decisões normalmente tomadas na produção definiu um modelo virtual passível de ser replicado na execução. Nesse aspecto, é necessário esclarecer que o contexto em que o estudo foi realizado caracterizava-se pela preocupação com a qualidade dos serviços executados.

Assim, o controle de qualidade dos materiais e dos serviços executados em canteiro se constitui no principal requisito identificado para se atingirem os benefícios advindos da modelagem virtual. Em seus estudos acerca da prototipagem física, Saffaro (2007) havia chegado à mesma conclusão, na medida em que não é possível replicar as soluções estabelecidas no protótipo físico nas demais unidades a serem construídas quando há grandes variações dimensionais no canteiro. No que diz respeito à prototipagem virtual, esse requisito torna-se mais evidente, uma vez que a modelagem ocorre a partir de elementos virtuais e, portanto, com uniformidade e precisão dimensional.

Conclusão

O estudo apresentou resultados referentes às contribuições e requisitos do processo de prototipagem virtual para o detalhamento de produtos na construção civil. Como contribuições da prototipagem virtual, pode-se destacar:

(a) a definição e análise de diferentes soluções para o detalhamento voltado a orientar a produção, de forma a garantir que o produto possua as características estéticas desejadas; e

(b) a antecipação de situações não previstas no projeto 2D, que poderiam resultar em interferências na produção.

Essas contribuições foram favorecidas pela peculiaridade da modelagem em 3D de permitir a visualização de interferências espaciais e pelo ato de construção virtual do produto a partir de informações precisas quanto às práticas de execução da empresa e ao tamanho das peças.

Esses resultados têm implicações importantes para o desenvolvimento de projetos e para a PF na medida em que, principalmente em decorrência das limitações do projeto em 2D, a esta última vem sendo atribuída a função de definir soluções aqui identificadas como contribuições da PV. Uma vez que a PF, normalmente, vem ocorrendo próximo à produção do produto final, é necessário antecipar decisões a serem tomadas, visando à redução da carga de respostas a serem dadas pelo protótipo físico. Assim, o desenvolvimento de projetos a partir de software de modelagem 3D deve permitir avanços no emprego da PF para a discussão de alternativas para melhorar o processo de produção.

Como requisitos para que essas contribuições da PV se concretizem são apontados:

(a) o controle de qualidade dos materiais e dos serviços executados em canteiro, para minimizar as variações dimensionais;

(b) o emprego de tecnologias mais avançadas, isto é, menos artesanais e, portanto, menos sujeitas a variações dimensionais; e

(c) a necessidade de incorporação do conhecimento técnico a respeito das práticas de execução da empresa ao longo do processo de construção do modelo.

Esses requisitos têm implicações importantes quando se trata da organização do setor, especialmente porque há tendência de uso de ferramentas para desenvolvimento de produtos com a abordagem da modelagem paramétrica. Nessa abordagem, o produto edificação é modelado a partir de objetos virtuais disponibilizados pelos fornecedores e o propósito do modelo virtual é subsidiar as diversas etapas do PDP, abrangendo a produção, operação e manutenção. Nesse sentido, é necessário, de fato, que esses requisitos se concretizem.

Agradecimentos

Os autores agradecem à CAPES, pelo apoio a essa pesquisa mediante concessão de bolsa de mestrado, e aos representantes da empresa construtora estudada, pela disponibilidade em auxiliar na realização deste trabalho.

Recebido em 23/09/2010

Aceito em 29/01/2011

  • BOUCHLAGHEM, D. et al Visualisation in Architecture, Engineering and Construction (AEC). Automation in Construction, v. 14, n. 3, p. 287-295, 2005.
  • CHOI, S. H.; CHAN, A. M. M. A Virtual Prototyping System for Rapid Product Development. Computer-Aided Design, v. 36, n. 5, p. 401-412, 2004.
  • CLARK, K. B.; CHEW, W. B.; FUJIMOTO, T. Manufacturing for Design: beyond the production/R&D dichotomy. In: SUSMAN, Gerald I. (Ed.). Integrating Design and Manufacturing for Competitive Advantage Oxford: Oxford University Press, 1992.
  • DAI, F. et al. Virtual Prototyping Examples for Automotive Industries Darmstadt: Fraunhofer Institute for Computer Graphics, 1996.
  • FAITHFULL P. T.; BALL, R. J.; JONES, R. P. An Investigation Into the Use of Hardware-in-the-Loop Simulation with a Scaled Physical Prototype as an Aid to Design. Journal of Engineering Design, v. 12, n. 3, p. 231-243, set. 2001.
  • FERREIRA, R. C. Uso do CAD 3D na Compatibilizaçăo Espacial em Projetos de Produçăo de Vedaçőes Verticais em Edificaçőes 2007. Dissertaçăo (Mestrado em Engenharia Civil) Escola Politécnica, Universidade de Săo Paulo, Săo Paulo, 2007.
  • FLOYD, C. A Systematic Look at Prototyping. In: BUDDE, R.; KUHLENKAMP, K.; ZULLIGOHOVEN, H. (Eds.). Approaches to Prototyping Berlin: Springer, 1984. p. 12-20.
  • FORTI, F. S. D. Uma Avaliaçăo do Ensino da Prototipagem Virtual nas Graduaçőes de Design de Produto do Estado do Rio de Janeiro 2005. Dissertaçăo (Mestrado em Engenharia Civil) Escola de Engenharia, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. 2005.
  • GRIMM, T. Users Guide to Rapid Prototyping Dearborn: Society of Manufacturing Engineers, 2004.
  • GRIMM, T. Virtual Versus Physical: will computer-generated virtual prototypes obsolete rapid prototyping? Time-Compression Technologies, v. 13, n. 2, p. 67-69, maio/jun. 2005.
  • KOSKELA, L. An Exploration Towards a Production Theory and its Application to Construction 2000. 298 f. Tese (Doctor of Philosophy) VTT Technical Research Centre of Finland, Helsinki University of Technology, Espoo, 2000.
  • MCLEOD, P. The Availability and Capabilities of Low-End Virtual Modelling (Prototyping) Products to Enable Designers and Engineers to Prove Concept Early in the Design Cycle, PRIME Faraday Partnership. Loughborough: Pera Knowledge, 2001.
  • MIKALDO JUNIOR. J.; SCHEER, S. Compatibilizaçăo de Projetos em 3D como Indicativo de Reduçăo de Custo em Edificaçőes In: ENCONTRO NACIONAL DE TECNOLOGIA DO AMBIENTE CONSTRUÍDO, 11., 2006, Florianópolis. Anais.. Florianópolis: ANTAC, 2006. v. 1, p. 1641-1650.
  • MIRON, L. Proposta de Diretrizes para o Gerenciamento dos Requisitos do Cliente em Empreendimentos da Construçăo 2002. 150 f. Dissertaçăo (Mestrado em Engenharia Civil) Escola de Engenharia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2002.
  • NETO, I. M.; VOLPATO, N. Um Estudo de Caso Sobre o Papel do Protótipo no Desenvolvimento de Produto. In: SEMINÁRIO DE INICIAÇĂO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA, 9., Curitiba, 2004. Anais... Curitiba: CEFET-PR, 2004. v. 1, p. 106-109.
  • OLIVEIRA, J. H. A. Avaliaçăo das Mudanças Ocorridas no Desenvolvimento de Produtos Devidas ŕ Utilizaçăo de Modelos Produzidos por Prototipagem Rápida 2001. Dissertaçăo (Mestrado em Engenharia Civil) Escola Politécnica, Universidade de Săo Paulo, Săo Paulo, 2001.
  • OTOSSON, S. Virtual Reality in the Product Development Process. Journal of Engineering Design, v. 13, n. 2, p. 159-172, jun. 2002.
  • PAHL G.; BEITZ, W. Engineering Design: a systematic approach. London: Springer-Verlag, 1996.
  • PINHO, A. C.; FREITAS, U. C.; TRAMONTANO, M. A Modelagem Digital Aplicada ao Processo de Projeto de Edifícios de Apartamentos. In: WORKSHOP BRASILEIRO DE GESTĂO DO PROCESSO DE PROJETO NA CONSTRUÇĂO DE EDIFÍCIOS, 3., 2003, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte, 2003.
  • SAFFARO, F. A. O Uso da Prototipagem para Gestăo do Processo de Produçăo da Construçăo Civil 2007. Tese (Doutorado em Engenharia Civil) Escola de Engenharia, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2007.
  • SARSHAR, M.; CHRISTIANSSON, P.; WINTER, J. Towards Virtual Prototyping in the Construction Industry: the case study of the DIVERCITY project. In: WORLD IT CONFERENCE FOR DESIGN AND CONSTRUCTION, Langkawi, Malaysia. 2004. Proceedings Langkawi, Malaysia, 2004. p. 581588.
  • THOMKE, S. Enlightened Experimentation: the new imperative for innovation. Harvard Business Review, v. 79, n. 2, p. 66-75, 2001.
  • TSENG, M. M.; JIAO, J.; SU, C. J. Virtual Prototyping for Customized Product Development. Integrated Manufact Syst, v. 9, n. 6, p. 334-343, 1988.
  • TZORTZOPOULOS, P. Contribuiçőes para o Desenvolvimento de um Modelo do Processo do Processo de Projeto de Edificaçőes em Empresas Construtoras Incorporadoras de Pequeno Porte Dissertaçăo (Mestrado em Engenharia Civil) Escola de Engenharia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1999.
  • ULRICH, K. T., EPPINGER, S. D. Product Design and Development 2nd ed. London: McGraw-Hill, 2000.
  • YEOMANS, S. G.; BOUCHLAGHEM N. M.; EL-HAMALAWI A. An Evaluation of Current Collaborative Prototyping Practices Within the AEC Industry. Automation in Construction, v. 15, p. 139-149, 2006.
  • 1
    . O termo “renderização” é derivado da palavra inglesa
    render, que significa acabamento. Renderização consiste em um processo aplicado especialmente em programas de modelagem por meio do qual se pode obter uma imagem do produto simulando condições realísticas.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      16 Maio 2011
    • Data do Fascículo
      Mar 2011

    Histórico

    • Aceito
      29 Jan 2011
    • Recebido
      23 Set 2010
    Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído - ANTAC Av. Osvaldo Aranha, 93, 3º andar, 90035-190 Porto Alegre/RS Brasil, Tel.: (55 51) 3308-4084, Fax: (55 51) 3308-4054 - Porto Alegre - RS - Brazil
    E-mail: ambienteconstruido@ufrgs.br