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Gestão do processo de design de arquitetura efêmera em museus

Management of the design process of ephemeral architecture in museums

Resumos

A gestão de empreendimentos de museus e espaços museográficos têm crescido em complexidade, particularmente na sua fase de concepção. Contribui para isso o reduzido ciclo de vida dos empreendimentos, a arquitetura efêmera, que supõe pouco tempo para projetação, execução e montagem. Soma-se a mudança de significado que os espaços museográficos tiveram em anos recentes, com a interação entre acervo, ambiente construído e público, gerando um briefing mais dinâmico e complexo. Nesse contexto, o presente trabalho apresenta, de maneira sintética, um modelo de referência para o processo de projeto de espaços museográficos. Nesse modelo são estabelecidas fases para o processo de projeto e seus produtos, priorizando os conceitos de projeto integrado. O termo de referência assume um núcleo de coordenação, formado por três agentes variáveis de acordo com a natureza do projeto. Por meio do método de pesquisa- ação, o modelo foi implementado e validado no projeto de um museu universitário. Os resultados da implementação são discutidos, e apontam para o fato de que os mecanismos de colaboração e comunicação durante o processo de projeto e a adoção dos princípios de projeto integrado, são fundamentais para o sucesso da implementação.

Projeto de museus e exposições; Gestão do processo de projeto; Projeto integrado


The project management of museums and exhibition spaceshas become more complex, particularly at the conceptual design stage. That is a consequence of the limited lifecycle of the projects, the use of ephemeral architecture, which means that there is limited time for design development, construction and assembly. In addition, the change in the meaning of museums spaces, with interaction between the collections, the built environment and the public, leads to a more dynamic and complex architectural and construction programming. This study outlines a reference model for the design process of exhibition spaces. This reference model establishes design stages and their deliverables, and emphasizesintegrated design concepts. The model establishes a coordinating body, formed by three agents defined according to the nature of the project. By using an action research method, the model was implemented and testedin a university museum project. The implementation results are discussed, pointing out that collaboration mechanisms and communication protocols during the design process, as wellas the adoption of integrated design principles are essential for a successful implementation of the design model.

Museums and exhibitions projects; Design management; Integrated design


Gestão do processo de design de arquitetura efêmera em museus

Management of the design process of ephemeral architecture in museums

Ana Cecilia Nascimento Rocha Veiga; Paulo Roberto Pereira Andery

Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte - MG - Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Ana Cecilia Nascimento Rocha Veiga Escola de Arquitetura | Universidade Federal de Minas Gerais | Rua Paraíba, 697, Funcionários | Belo Horizonte - MG - Brasil | CEP 30130-140 | Tel.: (31) 3409-8823 Ramal 8851 | E-mail: acrochaveiga@gmail.com

RESUMO

A gestão de empreendimentos de museus e espaços museográficos têm crescido em complexidade, particularmente na sua fase de concepção. Contribui para isso o reduzido ciclo de vida dos empreendimentos, a arquitetura efêmera, que supõe pouco tempo para projetação, execução e montagem. Soma-se a mudança de significado que os espaços museográficos tiveram em anos recentes, com a interação entre acervo, ambiente construído e público, gerando um briefing mais dinâmico e complexo. Nesse contexto, o presente trabalho apresenta, de maneira sintética, um modelo de referência para o processo de projeto de espaços museográficos. Nesse modelo são estabelecidas fases para o processo de projeto e seus produtos, priorizando os conceitos de projeto integrado. O termo de referência assume um núcleo de coordenação, formado por três agentes variáveis de acordo com a natureza do projeto. Por meio do método de pesquisa- ação, o modelo foi implementado e validado no projeto de um museu universitário. Os resultados da implementação são discutidos, e apontam para o fato de que os mecanismos de colaboração e comunicação durante o processo de projeto e a adoção dos princípios de projeto integrado, são fundamentais para o sucesso da implementação.

Palavras-chaves: Projeto de museus e exposições. Gestão do processo de projeto. Projeto integrado.

ABSTRACT

The project management of museums and exhibition spaceshas become more complex, particularly at the conceptual design stage. That is a consequence of the limited lifecycle of the projects, the use of ephemeral architecture, which means that there is limited time for design development, construction and assembly. In addition, the change in the meaning of museums spaces, with interaction between the collections, the built environment and the public, leads to a more dynamic and complex architectural and construction programming. This study outlines a reference model for the design process of exhibition spaces. This reference model establishes design stages and their deliverables, and emphasizesintegrated design concepts. The model establishes a coordinating body, formed by three agents defined according to the nature of the project. By using an action research method, the model was implemented and testedin a university museum project. The implementation results are discussed, pointing out that collaboration mechanisms and communication protocols during the design process, as wellas the adoption of integrated design principles are essential for a successful implementation of the design model.

Keywords: Museums and exhibitions projects. Design management. Integrated design.

Introdução

Nas últimas três décadas a produção de espaços expográficos e museográficos, bem como a arquitetura das edificações museais, passou por significativas transformações. Visitar uma exposição tornou-se uma experiência pessoal, que estimula inúmeras possibilidades de interação entre designers, arquitetos e especialistas em museografia (JENKINS, 2009). Mac Leod (2005) afirma que os museus deixaram de ser, do ponto de vista da concepção e construção arquitetônica, ícones e marcos culturais, para se tornarem elementos do ambiente construído que devem propiciar "usabilidade" e significado aos visitantes e ao próprio staff dessas instituições. Segundo a autora, apesar de alguns exemplos recentes parecerem "forçados" ou restritivos, a arquitetura dos museus confere dinamismo aos espaços urbanos, considerando demandas que crescem em complexidade. Nesta mesma linha apontam Cossio e Cattani (2010) e Newhouse (1997).

Merkel (2002) e Siming (2012) assinalam também um novo papel dos museus e seus espaços, sugerindo que essas instituições e seus acervos não são mais "repositórios de tesouros" ou "depósitos de curiosidades", mas adquirem novos significados, numa crescente interação entre o acervo, o público e o espaço construído. Nos tempos hodiernos, os museus enumeram uma variedade de funções não imaginadas em décadas anteriores. Os acervos passam, cada vez mais, a interagir com o ambiente construído, configurando uma narrativa que desafia os códigos convencionais de percepção.

Nesse contexto, o presente trabalho objetiva propor um termo de referência para o processo de projeto (design) de espaços museográficos em arquitetura efêmera, a partir de um referencial teórico que prioriza os conceitos de colaboração e integração entre os agentes mais relevantes, a partir das diretrizes estabelecidas para cada espaço e/ou exposição. Esse termo é inserido em um project mais amplo, que considera todo o empreendimento. Por meio do método de pesquisa-ação, o termo de referência foi implementado no processo de projeto de um museu universitário.

Na próxima seção é feita uma breve contextualização do ambiente de desenvolvimento do termo de referência.

Complexidade dos projetos de espaços museográficos

Novas visões de espaços museográficos tornam os empreendimentos ainda mais complexos, quer seja em sua dimensão de project, quer seja na consideração específica da fase de concepção e projeto desses espaços, o que exige o desenvolvimento de modelos particulares para sua gestão.

Isso ocorre, em parte, pela complexidade resultante da necessária interação entre ambiência, arquitetura e instalações do ambiente construído, acervo, público, curadoria e corpo técnico especializado (INTERNACIONAL..., 1984). Cada nova exposição implica um novo empreendimento e projetos com reduzido ciclo de vida, tornando-se necessário aprofundar o diálogo entre a Arquitetura e a Museografia (BOGUS, 2009; SIREFMAN, 1999; CORREA, 2009; WINEMAN; PEPONAS, 2010).

Ressalta-se o fato de que parte dessa complexidade decorre da multiplicidade de agentes, demandas, requisitos de projeto e valores que devem ser alinhados e que, com frequência, mudam ao longo do desenvolvimento do empreendimento ou não podem ser completamente captados na fase inicial de concepção. Configura-se uma situação de "complexidade direcional" (BROCKMAN, 2012).

Outro aspecto de complexidade que faz com que o processo de projeto de espaços museográficos adquira características distintas do processo de projeto tradicional é a efemeridade das exposições e dos espaços para acolhê-las, a qual exige adaptações aos procedimentos usuais na projetação do espaço construído transitório (PAZ, 1997). Nesses casos, os mecanismos tradicionais de gestão do processo de projeto frequentemente não são adequados, tornando-se necessária a proposição de mecanismos específicos de comunicação e colaboração (TANET et al., 2010).

O processo de projeto de museus e, mais concretamente, do ambiente construído em torno de exposições efêmeras (nas quais a arquitetura/design é específica para certa exposição, com um ciclo de vida curto e determinado) tem sido foco de pesquisas recentes, de caráter multidisciplinar. No entanto, pouca atenção tem sido dada à caracterização e desenvolvimento de propostas para o processo de projeto desses empreendimentos, que, como se ressaltou, são caracterizados por complexidade e multidisciplinaridade.

Exemplos mais recentes são encontrados na proposta de Tzorti (2007), que identifica um conjunto de princípios básicos, desdobrados em diretrizes para a ação projetual do ambiente construído em torno de espaços museográficos. Esses princípios induzem a decisões a respeito do leiaute e visibilidade dos acervos, de forma a gerar várias possibilidades arquitetônicas, que, segundo o autor, podem ser exploradas e combinadas, determinando formas distintas de interação entre o acervo, o público e os curadores/organizadores.

Outros autores se debruçam não somente sobre a concepção dos espaços arquitetônicos efêmeros em museus, mas também na relação entre o processo de projeto (design) e o empreendimento (uma exposição ou o museu como um todo).

Nessa direção, Lin (2008) estabelece critérios e diretrizes para o projeto de exposições em ambientes de arquitetura efêmera, na mesma linha de trabalho da presente pesquisa. São definidos critérios para o desenvolvimento dos empreendimentos em vários níveis de abrangência:

(a) o conceito museológico;

(b) a estratégia de implementação; e

(c) o desenvolvimento dos projetos.

É nesse mesma perspectiva que elaboramos o presente trabalho.

O termo de referência proposto considera tanto a dimensão mais ampla do empreendimento (project, ou seja, da análise de viabilidade à avaliação pós-ocupação da edificação/exposição), como especificamente o processo de projeto do ambiente construído (design management). Essa segunda dimensão é o foco principal do presente artigo.

Considera-se aqui termo de referência como um conjunto de fases do empreendimento, desdobradas em etapas e processos, com seus respectivos dados de entrada e produtos gerados, como conceituado em Rozenfeld et al. (2006), que discute a importância desses termos de referência no desenvolvimento de produtos.

Método de pesquisa

Os detalhes da metodologia de pesquisa, aqui sintetizados, são amplamente descritos em Veiga (2012). A estratégia adotada consistiu na elaboração de uma pesquisa-ação, ou seja, desenvolveu-se uma pesquisa de base empírica concebida e realizada com a interação entre os pesquisadores e os participantes envolvidos com um problema específico, objeto de estudo e ação, uma vez que a pesquisa-ação tem simultaneamente um caráter científico e prático (TRIPP, 2005; THIOLLENT, 2005). Dentro desta metodologia, destacamos os passos a seguir.

Primeiro passo: pesquisa bibliográfica, que compreende conceitos museológicos, a interação entre os acervos e sua ambiência, modelos de gerenciamento de projetos e conceitos de engenharia simultânea.

Segundo passo: visitas técnicas adiversos museus, para estudo e análise dos reflexos museográficos dos novos conceitos museológicos, em termos práticos. No Brasil, foram visitados 82 museus e espaços culturais, em 15 cidades e 5 estados. No exterior, somaram-se 57 em 14 cidades e 7 países. Em cada visita foram feitas observações diretas aos acervos, registro fotográfico para análise da relação entre acervo e ambiência, e, em alguns casos, entrevistas e visitas guiadas com especialistas da instituição.

Terceiro passo: com base no referencial teórico, nas visitas técnicas, nas entrevistas com diversos profissionais da área de museus e de projeto, elaborou-se o termo de referência, que é descrito na próxima seção.

Quarto passo: realizou-se o planejamento e a implementação do termo de referência, em instituição selecionada em função de cumprir com os requisitos da proposta (projeto de ambientes para exposição).

Quinto passo: análise dos resultados, do ponto de vista dos aspectos da implementação e impacto no processo de projeto, bem como nos produtos desenvolvidos. Essa análise incluiu a revisão constante do termo de referência, com seu formato final apresentado na próxima seção, e cada etapa projetual incorporava as melhorias no termo desenvolvidas na etapa anterior, dentro da pesquisa-ação.

O museu utilizado como ambiente de pesquisa-ação é o Centro de Memória da Medicina da UFMG (Cememor) e foi selecionado por atender aos seguintes critérios:

(a) necessidade de reestruturação arquitetônica e museográfica de seus espaços, estando o museu temporariamente fechado;

(b) multiplicidade de agentes envolvidos, por possuir uma equipe de profissionais motivada a participar do projeto e do processo de aprimoramento do termo de referência;e

(c) existência de um acervo de inestimável valor, o que confere legitimidade às demandas de projeto e agrega função social ao estudo de caso.

Inaugurado no saguão principal da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em 1977, o Centro de Memória da Medicina possui em seu acervo coleções valiosas, compostas de frascos e remédios variados, mobiliário de gabinetes de estudos médicos, equipamentos de todas as épocas, o que permite uma rica análise comparativa da evolução das tecnologias e conhecimentos na área da Saúde. Entre seus espaços mais visitados está a Biblioteca de Obras Raras do Cememor, com um acervo de mais de 16 mil exemplares, alguns particularmente relevantes, sem mencionar os arquivos de documentos. Por sua importância histórica e função social, bem como por questões de brevidade do artigo, o exemplo de implementação do termo de referência é limitado aqui ao projeto da Biblioteca do Centro de Memória, ainda que o empreendimento como um todo tenha contemplado a integralidade dos espaços do referido museu.

A implementação do termo de referência envolveu os seguintes agentes:

(a) Coordenação do Museu: representada por seu diretor, responsável legal pelas aprovações das intervenções em termos de espaço físico e acervo;

(b) Equipe do Projeto: que envolve todas as equipes do museu, das áreas museais às áreas técnicas, com destaque para a participação de cientista da informação, historiadora, especialista em documentos e arquivos, coordenadora de atividades educativas, engenheiro calculista e curadores de diversas áreas vinculadas ao museu, para citarmos os principais; e

(c) Colegiado do Cememor: composto de curadores, professores e ex-professores, alunos e ex-alunos, e pesquisadores da instituição. Este conselho, que se reúne semanalmente, configura-se como um stakeholder de altíssima influência no museu e participa ativamente deste projeto em todas as suas etapas.

Para facilitar o acesso e o envolvimento dos agentes, vários deles com grande dificuldade de utilização de tecnologias digitais, sobretudo em função de idade avançada, o plano de gestão foi elaborado em meio físico e digital. Desenvolveram-se a estrutura analítica do projeto e cronogramas com softwares consagrados no mercado e ambiente colaborativo (extranet), sem prejuízo de que essas informações fossem disponibilizadas na forma de documentos físicos. Destaca-se o fato de que se procurou utilizar meios de comunicação adaptados à realidade de cada agente.

O plano de gerenciamento do empreendimento envolveu:

(a) planejamento de cada etapa do empreendimento desdobrando objetivos, entradas, saídas, atividades, fluxos de trabalho, cronogramas e organogramas, quando oportuno;

(b) memória da etapa, com o registro dos trabalhos desenvolvidos; e

(c) definição dos produtos finais por etapa, como é o caso dos projetos, memoriais e especificações projetuais.

Todo o trabalho foi acompanhado por um dos autores, que atuou como facilitador do processo de implementação. Dessa forma, foram observadas rotinas de trabalho, analisados todos os documentos gerados, projetos em suas várias versões e etapas, atas de reunião e procedimentos desenvolvidos ao longo da implementação do termo de referência.

O termo de referenciafoi estruturado em forma de roteiros e fichas, tendo sido facilitada a localização, aplicação e registro dos dados de projeto e seus resultados. Os principais agentes que participaram do plano de gerenciamento foram alvo de um plano de comunicação específico, fruto de uma análise prévia dos stakeholders, com o objetivo de se adaptarem as ferramentas de comunicação à realidade de cada um. Destacaram-se os seguintes agentes e seus processos de interação com o projeto:

(a) Coordenação do Museu:o Diretor do Cememor é médico e professor da Faculdade de Medicina da UFMG, com pouco tempo disponível para envolvimento nas atividades de projeto. Por isso, o plano de comunicação implicou repassar as informações essenciais em meio físico, conforme sua preferência;

(b) Equipe do Projeto CEMEMOR: além da pasta arquivo e pendrive, para a equipe do projeto, os arquivos editáveis foram disponibilizados nos computadores de trabalho do museu, sendo suas atualizações encaminhadas para todos os envolvidos por suporte informático;

(c) Colegiado de Curadores do Cememor: ainda que as tecnologias virtuais apresentem vantagens, outro aspecto relevante aqui, previamente abordado, consistiu na adequação das ferramentas a seu público-alvo. No Projeto Cememor, logo se percebeu o benefício do uso de formas tradicionais de comunicação dos processos gerenciais e produtos gerados, especialmente no atendimento deste importante stakeholder: o Colegiado do Museu, formado em sua grande maioria por ex-alunos, ex-professores e funcionários aposentados da Faculdade. Exemplo de forma simples e eficiente de comunicação é mostrado na Figura 1; e

(d) Comunidade Acadêmica da Faculdade de Medicina da UFMG: na proposta de desenvolvimento coletivo do projeto, toda a comunidade acadêmica da Faculdade de Medicina foi convidada a participar das audiências públicas (equivalentes aos workshops no modelo proposto), com caráter deliberativo.


Por fim, cabe ressaltar que a estrutura da "Pasta Verde", que reuniu a documentação do projeto, reflete, em sua essência, a Gestão do Project do Projeto Cememor, originando, com as devidas revisões e melhorias, o fluxograma geral do modelo de referência proposto neste artigo, anteriormente mencionado e apresentado a seguir.

Termo de referência para o projeto de museus e exposições

O processo de projeto e seu termo decorrente apresentado neste artigo integram uma proposta de Project mais ampla, representada esquematicamente na Figura 2. Abrange todo o ciclo de vida dos empreendimentos, desde o estudo de viabilidade até a avaliação pós-ocupação. Considera-se que o termo de referência para o empreendimento encontra-se dividido em três grandes fases: inicial, intermediária e final. É inteiramente estruturado em fichas, tabelas e fluxogramas, que podem ser obtidos em arquivo digital editável.


Na fase inicial, é definida a estratégia do empreendimento e planejada sua concepção, execução e utilização. Será brevemente descrita apenas para contextualizar a gestão do processo de concepção no termo de referência como um todo.

A fase intermediária, na qual concentramos a atenção, diz respeito ao processo de projeto expográfico e arquitetônico.

A fase final foca especialmente na preparação e obras para a utilização das exposições/edificações.

Cada fase possui distintas etapas, correspondentes aos retângulos da Figura 2. Por sua vez, cada etapa desdobra-se em atividades e produtos de entrada e saída, detalhadamente descritos em Veiga (2013).

A fase inicial corresponde à definição da estratégia do empreendimento e inclui as etapas de:

(a) análise de demandas e estudo de viabilidade;

(b) termo de abertura do empreendimento;

(c) declaração de escopo, que tem por objetivo apresentar as principais características do projeto; e

(d) elaboração do plano de gerenciamento do projeto, com planejamento de atividades, cronogramas, orçamentação, análise de riscos e alocação de recursos humanos.

Os produtos gerados em cada etapa são indicados na Figura 2.

A fase intermediária corresponde ao processo de projeto e será detalhada na sequência.

A fase final, também indicada na Figura 2, engloba a etapa de pós-projeto, na qual é gerada a documentação referente aos projetos as built, bem como instruções para a utilização dos espaços e acervos em cada exposição. Envolve ainda a etapa de avaliação e encerramento, que inclui a retroalimentação aos agentes envolvidos no processo.

A fase intermediária abarca o processo de projeto propriamente dito. Possui duas etapas e é objeto de maior atenção neste artigo.

A primeira etapa dessa fase, denominada Pré-Projeto, refere-se à definição das informações necessárias à elaboração dos projetos expográficos e arquitetônicos. Contempla desde a organização e análise aplicada dos dados coletados na fase anterior até as questões de cunho técnico-criativo do museu, como o conceito e curadoria. O fluxo de atividades é indicado na Figura 3, abaixo.


A etapa de Pré-Projeto compõe-se pelas seguintes atividades, correspondentes aos itens do fluxograma acima:

(a) estruturação da equipe de design, incluindo profissionais dedicados ao projeto da edificação e de sua museografia;

(b) seleção e análise dos dados coletados na fase anterior, de modo a embasar as decisões projetuais. No caso de edificações existentes ou de museus/exposições em funcionamento, a subetapa também lançará mão dos dados disponíveis no Roteiro de Diagnóstico de Museus;

(c) definição do conceito museológico: temática, público-alvo, percursos, diretrizes para as linguagens visuais utilizadas, entre outros dados pertinentes;

(d) definição de curadoria e temas: levantamento das peças que comporão as exposições,definição das questões de ambiência arquitetônica e relações simbólicas (patrimônio imaterial e demais aspectos intangíveis);

(e) predefinição do programa de necessidades, validado posteriormente; e

(f) obtenção do terreno, quando for o caso, a partir das demandas levantadas até o momento. Em muitos casos, o terreno ou edificação já foi adquirido antes desta subetapa. Em tal situação, é imprescindível avaliar a viabilidade de se projetar a proposta no local disponível, a partir das demandas museais. Caso não seja possível, a equipe precisará decidir por alienar o bem imóvel e adquirir outro, mais adequado, ou então revisar a proposta para que se encaixe no terreno/edificação existente.

Uma vez finalizada a etapa de Pré-Projeto, passa-se à etapa de Projeto, conforme indicado no segundo quadro da fase intermediária, na Figura 2. Para a referida etapa, assumem-se os seguintes princípios:

(a) adoção de conceitos de projeto integrado, com o desenvolvimento simultâneo das disciplinas de projeto. Desde o primeiro momento, os curadores, museólogos, arquitetos e demais projetistas são envolvidos nos trabalhos de definição do projeto em todo seu ciclo de vida, com forte interação entre os agentes (AMERICAN..., 2007; ZHANG; HE; ZHOU, 2013);

(b) a implementação de uma estrutura de colaboração, com o planejamento do uso de mecanismos de comunicação (em particular extranets de projeto) e a criação de consenso a respeito dos valores e demandas dos agentes envolvidos. Dá-se especial ênfase à realização de workshops, nos termos indicados por Thyssen et al. (2008) para definição do que é valor para os agentes envolvidos; e

(c) a figura do coordenador como um agente de fomento da comunicação e colaboração, mais do que ordenador de tarefas e processos, o que é próprio de projetos complexos (BROCKMAN, 2012); e

(d) em especial, destaca-se a utilização do Núcleo Central de Coordenação (NCC), formado por três agentes, de forma a garantir que o processo de projeto considere as especificidades da arquitetura museológica e a relação entre o acervo, a ambiência e os projetos arquitetônicos e complementares.

A partir dessas premissas, o primeiro passo consiste em formar uma equipe multidisciplinar que participará da etapa do design: museólogos, curadores, conservadores, artistas, historiadores, projetista de arquitetura, estrutura, instalações, consultores, etc. Não há uma sequência inicial e hierárquica sugerida para o desenvolvimento dos projetos na fase inicial de concepção, e sim uma interação entre os membros, que vão se comunicando à medida que o processo criativo avança, dentro da demanda e necessidade do momento.

Para representar esse processo colaborativo, utiliza-se, portanto, uma "mesa-redonda", assentada pelos profissionais da equipe, conectados pelas tecnologias de informação e softwares projetuais interativos, em que todos têm acesso a todos os projetos em andamento e intervêm a partir de alguma solicitação ou sempre que acharem conveniente.

No centro do processo de programação e concepção do projeto (interrogação) encontra-se a equipe de coordenação, ou o NCC, formado por três agentes.

Para que os trabalhos fluam, um profissional precisa assumir a coordenação geral: será o coordenador de projetos, ou mesmo o arquiteto da equipe, dependendo das características do empreendimento. Pode ser ainda o museólogo, o diretor da instituição, o curador ou qualquer outro profissional essencial que domine as técnicas gerenciais, as ferramentas comunicacionais e o processo de projeto.

A esse profissional soma-se o profissional de maior impacto projetivo, ou seja, aquele cujos conhecimentos são indispensáveis para a projetação e execução do produto desejado. Trata-se do segundo agente da tríade. Como exemplos de profissionais de impacto, temos: para uma nova edificação, o arquiteto de museus; para a restauração de edificação histórica, a figura do arquiteto restaurador; para uma nova exposição, o designer de exposição, e assim por diante.

O NCC se completa com o último elemento, o ponto gerador, tendo em vista que o processo de projeto arquitetônico está intimamente condicionado pelas definições conceituais impostas pelo acervo a ser exposto e pela interpretação dele a partir da concepção museológica, envolvendo a arquitetura efêmera e os aspectos imateriais e simbólicos da concepção projetual.O ponto gerador envolve o profissional responsável pelo "conceito" da exposição. A título de exemplo, no caso de um museu que adote como partido salas escuras e negras, com vitrines iluminadas pontualmente, teríamos o lighting designer como ponto gerador.

Fica configurado o NCC, formado pelos três profissionais de maior relevância no projeto, que, sob a interface e liderança do coordenador de projetos, estarão à frente dos trabalhos, comunicando-se entre si com maior frequência, mas também com toda a equipe, a partir da demanda e evolução dos trabalhos. Teremos:

(a) Coordenador do Projeto (CP): agente responsável pela determinação das rotinas e processos de trabalho, supervisão e administração destes, integração entre profissionais e interface entre projetos, e comunicação entre os membros da equipe, entre outras funções gerenciais;

(b) Profissional de Impacto (PI): agente responsável pelos conhecimentos necessários e imprescindíveis à realização do projeto ou etapa de projeto; e

(c) Ponto Gerador (PG): agente responsável pelo aspecto de maior influência no conceito da proposta, que norteará as demais decisões projetuais.

Essa interação entre NCC e equipe de projeto encontra-se representada esquematicamente na Figura 4.


Os demais profissionais, portanto, seriam acessados pelo núcleo central de coordenação, de acordo com a demanda, acompanhariam o andamento do projeto por mecanismos de colaboração via TI (estrela na Figura 4), de maneira síncrona e assíncrona, utilizando também mecanismos informais de colaboração, o que parece ser essencial em organizações temporárias de projeto (EMMIT; GORSE, 2007).

Ao final de cada etapa projetual, o produto resultante é avaliado por todos os profissionais envolvidos, de acordo com seu impacto, classificado de 1 a 10 (círculos), em sequência representada pela seta do fluxograma, no sentido horário. Havendo a necessidade de alguma grande mudança, o projeto retorna ao NCC e às atividades colaborativas e simultâneas, passando, posteriormente, por nova rodada de avaliação sequencial.

A ilustração da Figura 4 representa as atividades indicadas nos círculos da Figura 5, que resume a etapa projetual. As setas convencionais referem-se às tarefas predominantemente lineares; as setas arredondadas, aos workshops; e os quadrados, às tarefas decorrentes da geração de produtos a partir de softwares, a exemplo dos desenhos técnicos extraídos do modelo BIM.


Cabe ressaltar que três workshops antecedem cada subetapa projetual. O "Workshop Visão", que envolve a equipe de projeto e outros agentes (promotor, curador, etc.), refere-se à análise crítica e validação do programa de necessidades e discussão de propostas e alternativas arquitetônicas/museográficas, considerando as condições definidas pelo "Ponto Gerador" e "Profissional de Impacto".

O "Workshop Realismo" faz a avaliação da adequação da proposta do anteprojeto, levando em consideração indicadores de custo, prazo de execução e aspectos técnicos das montagens da ambiência em arquitetura efêmera, quando for o caso. Já o "Workshop Crítica Final" tem como resultado a validação dos projetos e compatibiliza o conceito museológico com as definições arquitetônicas e construtivas.

Aplicação do modelo de referência no estudo de caso: análise dos resultados e impactos do termo de referência proposto

Embora detalhes da gestão do empreendimento não sejam o foco deste artigo, é imprescindível apresentar o processo de trabalho e seus impactos no rumo da estruturação do projeto. Tendo em vista, ainda, que se trata se uma pesquisa-ação, resultados e método encontram-se imbricados. Em um primeiro momento se destaca o processo de implantação e suas consequências, para, posteriormente, apresentar as principais contribuições e resultados.

Como cada espaço do museu requisitou um design diferenciado, devido a suas respectivas peculiaridades e demandas, foi necessário estruturar uma equipe e um processo específico para cada um dos setores do museu. Entre os vários setores, destacou-se a Biblioteca como objeto particular de estudo.

O passo preliminar consistiu no levantamento de dados a respeito da situação do Cememor, em particular da Biblioteca, quando do início dos trabalhos, incluindo a elaboração do projeto as built e o levantamento de demandas prévias. Também foram compiladas diretrizes específicas para o caso em estudo, reunidas a partir das referências, documentos, legislação e cartas patrimoniais, nacionais e internacionais. Ainda nessa etapa se elaborou uma versão preliminar do programa de necessidades, para validação pelo conjunto dos agentes.

A partir desse levantamento, partiu-se para a definição de:

(a) o NCC; e

(b) o conjunto de profissionais/funções que comporiam o núcleo de especialidades de projeto.

No caso da Biblioteca, o Núcleo Central de Coordenação foi formado pela Coordenadora de Projetos e Arquiteta (sendo as duas funções - coordenação e profissional de impacto -exercidas pela mesma pessoa) e pela profissional de Ciência da Informação, responsável pelos aspectos de exposição e demandas do acervo da Biblioteca. Nesse caso, a conservação e a correta utilização do acervo condicionaram outras especialidades de projeto, o que determinou o Ponto Gerador.

Em seguida, foi estruturada a mesa de profissionais que comporiam a equipe do design desse setor. Por razões de brevidade, não se justifica aqui a presença/ordem de cada profissional.

A representação esquemática do funcionamento da equipe de projeto é indicada na Figura 6, que relaciona os agentes envolvidos no trabalho colaborativo e indica o Núcleo Central de Coordenação, conforme mencionado anteriormente.


Também nessa etapa foram selecionados os softwares a serem utilizados, particularmente as ferramentas de CAD e BIM, bem como se criaram um protocolo e um plano de comunicação virtual, sem prejuízo de outros meios de comunicação tradicionais, como indicado acima.

As etapas do processo de projeto nesse caso de validação do modelo são esquematicamente representadas na Figura 7.


Destacamos, a seguir, algumas particularidades desse processo, anotações estas que tiveram impacto na formatação final de nossa proposta de termo de referência.

Coleta de Demandas - Workshop Visão: foram realizados workshops com a equipe do Museu para determinação do Programa de Necessidades, que incluiu também diretrizes reunidas a partir das recomendações técnicas dos manuais supracitados.

Projeto Conceitual da Biblioteca: foram elaborados os primeiros conceitos projetuais relativos à Biblioteca. Como hipótese, ela permaneceria no espaço atual, sofrendo mudanças somente de design interno. As estantes convencionais seriam substituídas por arquivos compactadores sobre trilhos, e o leiaute interno foi estabelecido.

Rodada de Conferência do Projeto Conceitual: o primeiro profissional consultado - o engenheiro calculista - aprovou a proposta e autorizou o uso de compactadores (mais pesados do que estantes usuais), bem como a permanência da Biblioteca no local de origem, sem danos estruturais ao edifício. Entretanto, toda a proposta conceitual foi rejeitada pelos demais profissionais do Museu, visto que o uso de compactadores conferiria à biblioteca um caráter de reserva técnica, indesejada por eles. Parece que a proposta concentrou-se apenas nos aspectos técnicos e de conservação preventiva e nos critérios geradores, o que deixou a desejar nos quesitos psicossociais do espaço (estética, acesso e visualização direta do acervo), razão pela qual se adotou uma solução próxima da situação inicial para a exposição do acervo. O resultado desta etapa provou, para a equipe, a eficiência da metodologia, por ter poupado retrabalho e tempo gasto em um anteprojeto que seria amplamente rejeitado a posteriori.

Anteprojeto da Biblioteca: com base neste novo projeto conceitual, construído coletivamente ao longo da rodada de conferência, iniciou-se a elaboração de um anteprojeto que procurava levar em consideração os aspectos do ponto gerador, sem perder de vista que a Biblioteca precisaria ter uma estrutura de biblioteca convencional. Na entrada, o visitante encontraria um painel com instruções de uso do espaço, luvas, máscaras de proteção e lixeira para descarte desses equipamentos após a visita. Passaria, ainda, por um tapete de alta absorção, especialmente desenvolvido para bibliotecas (Nomad - 3M). Equipamentos de prevenção a incêndio, como extintores de Halon, encontrar-se-iam à mão. Em arquivos e bibliotecas, um dos fatores de preservação mais importantes é a estante, o que levou a se cogitar os compactadores. Nesta nova proposta, as estantes seriam fabricadas especialmente para o local (máximo aproveitamento do espaço, 45% a mais de volume de estantes em relação à situação atual). O projeto previa, ainda, um expositor especial, onde as obras raras seriam dispostas em rodízio semanal. Detalhes do processo criativo e técnico são encontrados em Veiga (2013).

Audiência Pública da Etapa (Workshop Realismo): o anteprojeto proposto foi levado a uma ampla consulta. Além da equipe e Colegiado do Cememor, toda a comunidade acadêmica da faculdade foi convidada a conhecer a proposta, debatê-la e votar por sua aprovação ou não. Ao contrário das primeiras impressões, a nova proposta recebeu apenas uma sugestão de alteração. Incorporada a sugestão, o projeto foi novamente sujeito a aprovação pelos agentes envolvidos, o que reforçou o caráter colaborativo do empreendimento.

Projeto Executivo: tendo em vista a aceitação da nova proposta, procedeu-se diretamente à elaboração dos cadernos técnicos e desenhos executivos, automaticamente gerados pelo modelo BIM (em Autodesk®Revit®) e finalizados em softwares CAD (AutoCAD da Autodesk®).

Aprovações:em seguida, o projeto recebeu as aprovações oficiais da Diretoria do Cememor e do Colegiado, iniciando-se os trabalhos de captação de recursos e estruturação de sua execução, o que foge do escopo deste artigo.

A análise da implementação do modelo de referência, feita a posteriori, permitiu chegar-se a algumas conclusões, destacadas resumidamente a seguir:

(a) a utilização do termo de referência mostrou-se fundamental. O curto prazo para execução dos projetos, a heterogeneidade entre os agentes envolvidos e a falta de experiência com o gerenciamento de empreendimentos por parte dos agentes especializados mostraram a necessidade de seguir-se um conjunto de processos suficientemente concretos para nortear o trabalho do grupo e, ao mesmo tempo, passíveis de flexibilidade. O termo de referência proposto está em consonância com as observações feitas por Lin (2008) e Tzorti (2007);

(b) a estruturação do termo de referência em forma de fichas editáveis e adaptáveis ao contexto projetual específico dos museus e exposições representou um grande avanço em relação aos roteiros disponíveis na área museal, geralmente genéricos e textuais. Diversos manuais de referência foram, com as contribuições da pesquisa, alimentando as fichas, de modo a tornar as informações organizadas e acessíveis aos diversos agentes de uma equipe interdisciplinar. A estruturação de roteiros para o projeto de exposições na forma de texto corrido pode ser uma das grandes razões para a pouca adoção dos roteiros estruturantes de processo de projeto de museus. Na atual proposta, uma parte teórica embasa o uso das fichas, porém não as incorpora, isolando informativos e instruções de capacitação dos dados a serem coletados.

O processo de utilização do termo de referência comprovou que esse sistema facilita a rotina do gestor, bem como amplia a adoção da documentação, em especial por stakeholders não especializados em gestão e/ou processo de projeto, bem como nas próprias matérias de conservação preventiva e museologia;

(c) ainda que, independentemente do modelo usado, houvesse por parte dos agentes interesse e comprometimento com o trabalho colaborativo, o modelo mostrou-se particularmente útil nesse sentido. O envolvimento de todos os agentes desde o início do empreendimento deu-se graças à utilização desse termo. Por outro lado, mostrou-se adequada a diversificação de ferramentas de comunicação, dependendo das características dos agentes;

(d) contribuiu significativamente para incrementar os mecanismos de colaboração a realização dos workshops indicados anteriormente. Nesse sentido, os resultados corroboram as observações de Thyssen et al. (2008), o que demonstra a eficácia de reuniões de colaboração. Diversas mudanças projetuais foram incorporadas devido a essa ferramenta, inclusive mudanças estruturantes, cujas demandas só se tornaram conhecidas graças à metodologia.

Nesse sentido, os resultados apontam que a constituição de workshops e o balanço entre mecanismos formais e informais de comunicação permitem que haja efetiva interação entre os agentes, o que garante o essencial diálogo entre a arquitetura e a museografia, como sugerem, entre outros, Wineman e Peponas (2010) e Bogus (2009), citados acima;

(e) a criação de um Núcleo Central de Coordenação permitiu que requisitos específicos para o empreendimento pudessem ser traduzidos em soluções de projeto a partir da atuação do ponto gerador, e essas soluções puderam ser trabalhadas pelas demais disciplinas em um ambiente de projeto simultâneo. Todas as tipologias de projeto, em maior ou menor grau, contam com certa subjetividade, representada pelos desejos do cliente, variações de mercado, aspectos psicológicos, entre outros dados intangíveis, que geralmente se encontram mapeados nos primeiros estágios do projeto, estudos de viabilidade, etc.

Entretanto, no caso dos museus, um "cliente silente" possui importância capital para as decisões criativas: o acervo e sua interação com o público. Além disso, as questões de funcionalidade e conservação preventiva precisam dialogar de modo fértil com a transmissão do conhecimento e a fruição dos objetos em exposição.

Nesse sentido, o "ponto gerador" do projeto nunca é previsível e único; ao contrário, ganha individualidade sem precedentes e gera demandas sem paralelo em outras áreas projetuais, como residências, hospitais, etc. Assim, a inserção no Núcleo de Coordenação de um representante que agregue tanto os conhecimentos técnicos quanto as ambições criativas que se desejam para a exposição das coleções representou uma contribuição essencial do termo de referência, que leva em consideração essa peculiaridade do universo museal.

A constituição do NCC permitiu um diálogo ágil entre as disciplinas e a criação de soluções de interface, por meio de trabalho colaborativo, o que é essencial em projetos complexos, como ressaltado por Brockman (2012), mencionado acima; e

(f) por fim, a elaboração de um processo que incluísse etapas lineares e não lineares, porém documentadas e estruturadas dentro de um fluxo de trabalho, contribuiu para a compreensão dos mecanismos criativos e de gestão do processo de projeto proposto.

Por outro lado, a realização de workshops permitiu a formalização e o incremento dos mecanismos de colaboração e integração entre os agentes, como aspecto fundamental destacado na literatura recente (THYSSEN et al., 2008; ZHANG; HE; ZHOU, 2013).

Conclusões

O presente trabalho chamou a atenção para as particularidades do processo de projeto de espaços museográficos e exposições envolvendo arquitetura efêmera em museus, destacando a complexidade decorrente da interação entre acervo, ambiente e espaço construído, com reduzidos ciclos de vida dos empreendimentos.

Essas circunstâncias exigem a criação de um ambiente de colaboração, com o envolvimento dos distintos agentes na etapa inicial de concepção do espaço e das exposições.

Apresentou-se um termo de referência para o processo de projeto de espaços museográficos e exposições, com a definição de fases e processos internos a essas etapas. Nesse trabalho destacou-se o processo de projeto, a fase intermediária do project do modelo. O modelo proposto para a gestão do empreendimento, particularmente para o processo de projeto, teve como elemento-chave a criação de uma estrutura de trabalho que priorizasse a colaboração entre os agentes, desde as etapas iniciais de definição dos requisitos do empreendimento e das características expográficas e museológicas.

O termo de referência prevê a definição, para cada empreendimento específico, de um Núcleo Central de Coordenação, com a presença do coordenador de projetos, do profissional de impacto e do ponto gerador, o que permite que características específicas de expografia, bem como requisitos de conservação e fruição do acervo, sejam consideradas desde o primeiro momento pelas demais disciplinas de projeto. Por outro lado, previu-se a realização de workshops entre os agentes, como mecanismo de destaque para a colaboração.

Por meio de processos de pesquisa-ação, um dos autores atuou na implementação do termo de referência no processo de projeto de um museu universitário, tendo sido destacada sua Biblioteca para fins deste artigo.

Os resultados obtidos sugerem a validade do modelo proposto e de suas inovações. Os processos previstos se mostraram factíveis e flexíveis, a ponto de permitir que distintas formas de comunicação funcionassem como instrumentos efetivos de colaboração. Os valores dos agentes foram identificados e puderam ser transformados em requisitos de projeto, respeitando-se os limites e demandas do Museu.

A aplicação desse termo a projetos de maior porte ou que envolvam agentes com menor afinidade pode ser objeto de trabalhos futuros, bem como a elaboração de templates e plug-ins específicos para a adoção deste termo de referência, em diversos softwares essenciais, desde extranets a plataformas BIM. Por outro lado, trabalhos futuros podem apontar, ainda, outros mecanismos de colaboração entre curadoria, profissionais de impacto e projetistas, e identificar formas de interação dinâmicas - uma exigência dos projetos complexos, como é o caso dos espaços expográficos.

Paulo Roberto Pereira Andery

Departamento de Engenharia de Materiais e Construção Civil, Escola de Engenharia | Universidade Federal de Minas Gerais | Av. Presidente Antônio Carlos, 6627, Bloco I, Sala 3314, São José | Belo Horizonte - MG - Brasil | CEP 31275-013 | Tel.: (31) 3409-1856 | E-mail: paulo@demc.ufmg.br

Recebido em 22/04/14

Aceito em 17/09/14

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  • Endereço para correspondência
    Ana Cecilia Nascimento Rocha Veiga
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Jan 2015
    • Data do Fascículo
      Dez 2014

    Histórico

    • Recebido
      22 Abr 2014
    • Aceito
      17 Set 2014
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