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Banheiros pré-fabricados: seus benefícios e como criam valor para consumidores

Prefabricated bathroom pods: benefits and how they create value for consumers

Resumo

A industrialização de processos construtivos é uma prática antiga que tem ganhado espaço no contexto atual. Particularmente para os processos de pré-fabricação de banheiros, o avanço no setor da construção nacional tem sido modesto, com poucas empresas atuantes, baixo volume produtivo e literatura acadêmica escassa. Tal panorama dificulta a tomada de decisão de construtores, que possuem poucas referências para quantificar os benefícios e estabelecer comparativos com sistemas convencionais. O presente estudo reuniu 14 especialistas do ramo no Brasil com os quais foram conduzidas rodadas Delphi em um processo de cocriação do valor percebido por consumidores de banheiros pré-fabricados. Ao longo de três rodadas, os especialistas definiram e debateram os principais benefícios desse sistema construtivo e as formas como criam valor para os consumidores. A pesquisa cria uma base de dados que associa o rigor acadêmico às experiências práticas dos especialistas, permitindo que tomadores de decisão tenham mais referências para comparar com processos convencionais e que acadêmicos tenham um ponto de partida para o desenvolvimento de artefatos que auxiliem no processo decisório.

Palavras-chave:
Banheiro pré-fabricado; Valor percebido; Delphi; Cocriação

Abstract

The industrialisation of construction processes is a tried and tested practice that has currently been gaining space. In the specific case of prefabricated bathroom pods, progress in the national construction sector has been modest, with only a small number of manufacturers, low production volumes and scarce academic literature. Such scenario hinders the decision making of builders, who have too few references to be able to quantify their benefits and establish comparisons with conventional building systems. Thus, this study brought together 14 industry experts in Brazil, and conducted Delphi rounds in a process of co-creating the value perceived by consumers of prefabricated bathroom pods. Over three rounds, experts defined and discussed the key benefits of this building system and the ways in which it creates value for consumers. This study creates a database that combines academic rigour with the practical experience of experts, offering decision makers more references to compare with conventional processes, and providing academics a starting point for the development of devices that can assist the decision-making process.

Keywords:
Prefabricated bathroom pods; Perceived value; Delphi; Co-creation

Introdução

O setor da construção civil brasileira é reconhecido pela baixa produtividade, seja em comparação com a média dos demais setores, seja em relação ao cenário internacional. Tal panorama foi registrado pelo Sinduscon (SINDICATO..., 2015SINDICATO DA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO CIVIL. Produtividade na Construção. São Paulo, 2015.), o qual conclui que, apesar do aquecimento setorial entre 2003 e 2013, a produtividade da construção brasileira manteve-se praticamente estática nesse período e 31,8% inferior à média da economia. Ainda, apresentou produtividade correspondente a 23% da média do mesmo setor em países desenvolvidos.

A industrialização pode ser empregada em diferentes fases e processos construtivos de um empreendimento e posiciona-se como uma alternativa para proporcionar ganhos de produtividade no setor. Tal potencial foi verificado por Shahzad, Mbachue e Domingo (2015), que coletaram dados de 66 edificações construídas na Nova Zelândia com técnicas industrializadas e compararam os custos e tempos de execução com estimativas para construções similares executadas com métodos convencionais. A comparação resultou em 34% e 19% de reduções médias no tempo para conclusão e custos respectivamente. Esse ganho foi traduzido em um aumento de 7% na produtividade média dos projetos.

Como a construção de banheiros em edificações convencionais compreende uma das atividades mais complexas e custosas de um empreendimento (VOKES; BRENNAN, 2013VOKES, C.; BRENNAN, J. Technology and skills in the construction industry. London: Commission for Employment and Skills, 2013. Technical report.), técnicas de pré-fabricação de banheiros têm sido difundidas mundialmente. Em relatório detalhado do mercado de banheiros pré-fabricados na Europa, Bonaccorsi (2015)BONACCORSI, P. The European Bathroom Pod Industry Review 2015: simplifying the construction process. Iorque: Intelligent Offsite, 2015. estimou que o volume anual médio de banheiros produzidos no ano de 2015 no continente europeu foi de 128 mil unidades, o que representa uma indústria de 750 milhões de dólares por ano. Adicionalmente, estima-se que 250 mil banheiros pré-fabricados sejam manufaturados por ano no mundo e que, de todos os empreendimentos construídos no Japão, 80% utilizem esse sistema construtivo (MODULAR..., 2017MODULAR BUILDING INSTITUTE. Saving time with modular bathroom pods. Charlottesville, 2017. Relatório técnico.). O reconhecimento da capacidade de aumentar a produtividade do setor também é reforçado pelo governo de Singapura, que em 2014 passou a exigir seu uso em ao menos 65% de todas as unidades de banheiros dos empreendimentos enquadrados no programa denominado Government Land Sales (SINGAPURA, 2014SINGAPURA. Building and Construction Authority. APPBCA-2014-16. Amendments to building control (buildability) regulations to further raise construction productivity. Singapura, 31 out. 2014.).

Adicionalmente, técnicas industrializadas podem criar outros benefícios não necessariamente monetários, mas que impactam de forma indireta os custos globais de um empreendimento (ANTILLÓN; MORRIS; GREGOR, 2014ANTILLÓN, E. I.; MORRIS, M. R.; GREGOR, W. A value-based cost-benefit analysis of prefabrication processes in the healthcare sector: a case study. In: INTERNATIONAL GROUP FOR LEAN CONSTRUCTION, 22., Oslo, 2014. Proceedings […] Oslo, 2014.). Blismas, Pasquire e Gibb (2006)BLISMAS, N. G.; PASQUIRE, C.; GIBB, A. Benefit evaluation for offsite production in construction. Construction Management and Economics, v. 24, n. 2, p. 121-130, 2006. qualificam a situação em que não é feita uma investigação dos benefícios gerados, como “baseada em custos” (cost-based), e sugere que seja “baseada em valor” (value-based). Os seis casos pesquisados por esses autores demonstraram que métodos usuais de orçamentação são em sua maioria baseados em custos diretos. Um comparativo preciso entre sistemas construtivos convencionais e industrializados requer, portanto, uma análise baseada em valor.

O termo “valor” é empregado de forma ampla em contextos distintos, enquanto valor para o consumidor refere-se àquilo que ele quer e acredita conseguir ao adquirir produtos ou serviços da organização (WOODRUFF, 1997WOODRUFF, R. B. Customer value: the next source for competitive advantage. Journal of the Academy of Marketing Science, v. 25, n. 2, p. 139-153, 1997.). Churchill e Peter (2000)CHURCHILL, G. A.; PETER, J. P. Marketing: criando valor para o cliente. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2000. sintetizam o conceito de valor para o consumidor como o resultado dos benefícios percebidos subtraídos dos custos percebidos. Tal conceito vem ganhando espaço, e, com isso, o processo de criação de valor deixa de ser papel exclusivo das organizações. Do ponto de vista acadêmico, Ranjan e Read (2014)RANJAN, K. R.; READ, S. Value co-creation: concept and measurement. Journal of the Academy of Marketing Science, v. 44, n. 3, p. 239-315, 2014. pontuam que a criação de valor conjunta entre consumidores e organizações teve sua disseminação acelerada após os estudos de Prahalad e Ramaswamy (2000)PRAHALAD, C. K.; RAMASWAMY, V. Co-opting customer competence. Harvard Business Review, v. 78, n. 1, p. 79-90, 2000. e de Vargo e Lusch (2004)VARGO, S. L.; LUSCH, R. F. Evolving to a new dominant logic for marketing. Journal of Marketing, v. 68, p. 1-17, 2004.. Para compreender tal processo, conhecido como cocriação de valor, Prahalad e Ramaswamy (2004)PRAHALAD, C. K.; RAMASWAMY, V. Co-opting customer competence. Harvard Business Review, v. 78, n. 1, p. 79-90, 2000. traçam um paralelo entre os conceitos de mercado tradicional e emergente. No primeiro caso, a criação de valor ocorria dentro da firma, com os consumidores alheios ao processo. O papel da firma era produzir, e o do consumidor, consumir. O mercado emergente, em contraste, é um espaço para trocas de experiências e criação conjunta de valor, ou seja, o consumidor deixa de ser passivo para atuar junto às organizações na definição e resolução de problemas.

Com foco em banheiros pré-fabricados, ainda incipientes no Brasil, nesta pesquisa o processo de cocriação de valor para consumidores foi conduzido durante rodadas Delphi. O estudo objetivou a identificação dos ganhos de valor atribuídos aos principais benefícios do sistema construtivo e serviu como etapa prévia para a criação de método para a quantificação dos valores atribuídos a seu principal benefício (SENGER, 2018SENGER, E. W. Método para quantificação do valor percebido por construtores e incorporadores para sistemas de banheiros pré-fabricados: redução do cronograma. Curitiba, 2018. 309 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Construção Civil) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Construção Civil, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2018.).

Método

Foi adotado para a condução desta pesquisa o método Delphi, que é uma forma de avaliar e debater dados coletados em pesquisas quantitativas (HSU; SANDFORD, 2007HSU, C.; SANDFORD, B. A. The Delphi technique: making sense of consensus. Practical Assessment, Research & Evaluation, v. 12, n. 10, p. 1-8, 2007.). Seu objetivo é buscar o consenso entre um grupo de especialistas a respeito de um evento futuro. Para isso, são aplicados questionários interativos, os quais devem circular diversas vezes por um grupo de peritos, mantendo o anonimato dos respondentes. Os questionários devem ser respondidos individualmente, geralmente com respostas quantitativas apoiadas por justificativas e informações qualitativas. A cada rodada as respostas são tabuladas e recebem tratamento estatístico, para então serem devolvidas aos participantes para a rodada seguinte. As perguntas são mantidas nas etapas que se seguem, mas as respostas devem ser reavaliadas à luz do conjunto de respostas quantitativas e justificativas da rodada anterior. O processo é repetido até que as divergências entre opiniões sejam reduzidas a um nível satisfatório, de forma a considerar a última rodada como a previsão do grupo (WRIGHT; GIOVINAZZO, 2000WRIGHT, J. T. C.; GIOVINAZZO, R. A. Delphi: uma ferramenta de apoio ao planejamento prospectivo. Caderno de Pesquisas em Administração, São Paulo, v. 1, n. 12, p. 54-65, 2000.).

A organização aqui proposta para esse procedimento técnico seguiu três grupos de atividades. Primeiro foram selecionados os especialistas. Em seguida, foram definidos o tema dos questionários, sua estrutura e demais atividades relacionadas. Por fim, elaborou-se o relatório final entregue aos envolvidos.

Seleção dos especialistas

De maneira distinta aos estudos de levantamento em que pesquisadores devem selecionar amostras cujo tamanho seja capaz de detectar estatisticamente os efeitos em uma população, os grupos escolhidos em técnicas Delphi não dependem de poder estatístico, mas da dinâmica para encontrar um consenso entre especialistas (OKOLI; PAWLOWSKI, 2004OKOLI, C.; PAWLOWSKI, S. D. The Delphi method as a research tool: an example, design considerations and applications. Information & Management, v. 42, p. 15-29, 2004.). Não há, contudo, consenso na literatura quanto à quantidade ideal de especialistas para estudos com essa técnica (HSU; SANDFORD, 2007HSU, C.; SANDFORD, B. A. The Delphi technique: making sense of consensus. Practical Assessment, Research & Evaluation, v. 12, n. 10, p. 1-8, 2007.). Rowe e Wright (1999)ROWE, G.; WRIGHT, G. The Delphi technique as a forecasting tool: issues and analysis. International Journal of Forecasting, v. 15, p. 353-375, 1999. revisaram 27 artigos com uso da técnica, e as amostras variavam entre 3 e 98 especialistas. Alguns estudos variaram a quantidade de participantes e não chegaram a relações conclusivas. Por outro lado, a qualidade do resultado é influenciada pelo nível e especialização dos participantes (JOLSON; ROSSOW, 1971JOLSON, M. A.; ROSSOW, G. The Delphi process in marketing decision making. Journal of Marketing Research, v. 8, n. 4, p. 443-448, 1971.; RIGGS, 1983RIGGS, W. E. The Delphi method: an experimental evaluation. Technological Forecasting and Social Change, v. 23, p. 89-94, 1983.). Por exemplo, participantes pouco experientes podem ser incapazes de endereçar as afirmações mais importantes identificadas por especialistas (HSU; SANDFORD, 2007HSU, C.; SANDFORD, B. A. The Delphi technique: making sense of consensus. Practical Assessment, Research & Evaluation, v. 12, n. 10, p. 1-8, 2007.).

Por se tratar de um processo de cocriação de valor, os autores optaram por trabalhar com dois grupos de especialistas: consumidores e fornecedores. Tal escolha foi embasada de acordo com os seguintes raciocínios:

  1. são os grupos com envolvimento direto no processo executivo;

  2. possuem potencial acentuado de divergências opinativas, o que cria espaço para debates;

  3. são encontrados com mais facilidade; e

  4. fornecedores fazem produtos para consumidores, então é primordial que o valor percebido por ambos esteja alinhado.

Para esta pesquisa, adaptou-se o modelo de seleção apresentado por Okoli e Pawlowski (2004)OKOLI, C.; PAWLOWSKI, S. D. The Delphi method as a research tool: an example, design considerations and applications. Information & Management, v. 42, p. 15-29, 2004., ilustrado na Figura 1 e descrito nas subseções seguintes.

Figura 1
Procedimento para seleção dos especialistas

Etapa 1: preparar planilha de indicação

O propósito da planilha de indicação1 1 Tradução nossa: Knowledge Resource Nomination Worksheet. é assistir a categorização de especialistas antes de identificá-los individualmente, a fim de evitar o esquecimento de classes importantes de participantes (OKOLI; PAWLOWSKI, 2004OKOLI, C.; PAWLOWSKI, S. D. The Delphi method as a research tool: an example, design considerations and applications. Information & Management, v. 42, p. 15-29, 2004.).

Foram listadas as organizações envolvidas na fabricação de banheiros pré-fabricados no Brasil, incluindo aquelas que já deixaram de existir. A investigação foi feita por sites de busca, redes sociais, listas de congressos, literatura nacional, buscas nos depósitos de patentes do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi) e conversas com colaboradores e sócios dessas organizações. Os consumidores de banheiros pré-fabricados foram encontrados em sites de busca, redes sociais, reportagens e portfólio disponibilizado pelos fornecedores.

Etapa 2: completar a planilha de indicação

Esta etapa foi necessária para filtrar as categorias listadas. Para cada organização foram buscados nomes de indivíduos com potencial para participar da pesquisa. O procedimento de busca assemelhou-se ao da etapa anterior, com inclusão de contatos telefônicos e correio eletrônico. Definiram-se os seguintes critérios mínimos para inclusão de indivíduos:

  1. organizações fornecedoras:

    • - trabalhar ou ter trabalhado em organização(ões) que fornece(m) banheiros pré-fabricados;

    • - ter formação em engenharia e/ou assumir cargos da alta gestão; e

  2. organizações consumidoras: ter formação em engenharia e/ou assumir cargos da alta gestão relacionados à parte construtiva.

Etapa 3: indicar especialistas adicionais

Nesse ponto, os indivíduos listados na planilha de indicação foram contatados para indicar novos nomes para o estudo. O primeiro contato não foi um convite para participar das rodadas, mas no qual o estudo foi explicado - o funcionamento e os resultados esperados. Os indivíduos foram informados de que a pesquisa estava buscando participantes e que seriam contatados novamente assim que a base de indicações estivesse consolidada. Essa etapa garantiu a ampliação do leque de especialistas, em particular dos consumidores, cujos contatos e constatação das experiências foram de difícil acesso.

Delbecq, Van de Ven e Gustafson (1975)DELBECQ, A. L.; VAN DE VEN, A. H.; GUSTAFSON, D. H. The Delphi technique. In: DELBECQ, A. L.; VAN DE VEN, A. H.; GUSTAFSON, D. H. Group techniques for program planning: a guide to nominal groups and Delphi process. Glenview: Scott Foresman and Company, 1975. sugeriram que o processo de indicação tem um apelo de lisonjeio, pois os indivíduos sentem-se importantes ao serem cogitados como referências para indicação de novos participantes. O processo passa a criar um engajamento prévio que motiva o grupo.

Etapa 4: ranquear especialistas

Para cada grupo (fornecedores e consumidores) foram definidos critérios para posterior classificação do nível de expertise de cada participante. Baseando-se no modelo de organização das características de especialistas desenvolvido por Giublin (2002)GIUBLIN, C. R. Diretrizes para o planejamento de canteiros de obra de pavimentação de concreto. Curitiba, 2002. 175 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Construção Civil, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2002. e mantendo-se o anonimato dos participantes, as seguintes características foram avaliadas, sendo o maior peso atribuído à primeira, e o menor, à última:

  1. indivíduos de organizações fornecedoras:

    • - quantidade aproximada de banheiros pré-fabricados com que teve envolvimento;

    • - é engenheiro(a) ou arquiteto(a) e durante a atuação com banheiros pré-fabricados assumiu cargo de alta gestão;

    • - tempo de atuação com banheiros pré-fabricados;

    • - tempo de atuação com construção civil;

    • - atualmente trabalha com banheiros pré-fabricados; e

    • - teve experiência internacional com banheiros pré-fabricados.

  2. indivíduos de organizações consumidoras:

    • - quantidade aproximada de banheiros pré-fabricados com que teve envolvimento;

    • - é engenheiro(a) ou arquiteto(a) e durante a atuação com banheiros pré-fabricados assumiu cargo de alta gestão;

    • - tempo de atuação com construção civil; e

    • - somatório dos seguintes processos em que esteve envolvido durante as contratações de banheiros pré-fabricados:

      • . processo decisório;

      • . compra;

      • . gestão/instalação; e

      • . pós-obra.

Etapa 5: convidar especialistas

O convite para participar da pesquisa foi iniciado pelos indivíduos com maiores pontuações na etapa 4. As técnicas de pré-fabricação de banheiros são pouco difundidas no cenário nacional, o que incorre em barreiras para acessar grande quantidade de especialistas no tema. Portanto, ficou estabelecido como meta angariar um grupo entre 10 e 20 especialistas.

A fim de garantir o sucesso do estudo, é essencial motivar o grupo. Para tal, Delbecq, Van de Ven e Gustafson (1975)DELBECQ, A. L.; VAN DE VEN, A. H.; GUSTAFSON, D. H. The Delphi technique. In: DELBECQ, A. L.; VAN DE VEN, A. H.; GUSTAFSON, D. H. Group techniques for program planning: a guide to nominal groups and Delphi process. Glenview: Scott Foresman and Company, 1975. citaram quatro características que devem ter os participantes:

  1. sentir-se pessoalmente envolvido no problema colocado;

  2. ter informações pertinentes para compartilhar (experiência);

  3. estar motivado para incluir o Delphi em sua agenda de tarefas; e

  4. sentir que os resultados incluem informações que não possui e que valoriza, mas não teria acesso sem o estudo.

Os dois primeiros itens foram endereçados a partir das etapas anteriores. Os itens “c” e “d”, por sua vez, foram abordados durante os primeiros contatos, que esclareceram objetivos do Delphi, a natureza dos respondentes, as obrigações dos participantes, a duração do Delphi e a informação que seria compartilhada.

Rodadas

O método Delphi consiste em diversas rodadas, cada qual com um questionário específico até que um consenso seja estabelecido (Figura 2). O número de rodadas varia, pois depende da existência de consenso. Entretanto, a quantidade de rodadas costuma permanecer entre 3 e 5 (ROWE; WRIGHT, 1999ROWE, G.; WRIGHT, G. The Delphi technique as a forecasting tool: issues and analysis. International Journal of Forecasting, v. 15, p. 353-375, 1999.). Como orientação para o processo, as rodadas foram baseadas na proposta de Hsu e Sandford (2007)HSU, C.; SANDFORD, B. A. The Delphi technique: making sense of consensus. Practical Assessment, Research & Evaluation, v. 12, n. 10, p. 1-8, 2007., adaptadas conforme evolução da pesquisa, todas envolvendo consumidores e fornecedores.

Figura 2
Sequência de execução do método Delphi via internet

Primeira rodada

Após o aceite dos especialistas, foi elaborado um e-mail explicativo com os pontos já tratados e um link para o primeiro questionário. Hsu e Sandford (2007)HSU, C.; SANDFORD, B. A. The Delphi technique: making sense of consensus. Practical Assessment, Research & Evaluation, v. 12, n. 10, p. 1-8, 2007. afirmam que o primeiro questionário é geralmente formulado com questões abertas para que criem base para estruturar questionários de levantamento. Em alguns casos, é aceitável e comum a modificação do processo Delphi para que sejam utilizados questionários estruturados, baseados em revisão extensiva da literatura, já na primeira rodada. Para a pesquisa, o primeiro questionário combinou questões abertas e fechadas e foi elaborado com a ferramenta Google Forms. A primeira questão apresentou um conjunto com os principais benefícios resultantes de uma revisão bibliográfica sistemática (RBS) (SENGER, 2018SENGER, E. W. Método para quantificação do valor percebido por construtores e incorporadores para sistemas de banheiros pré-fabricados: redução do cronograma. Curitiba, 2018. 309 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Construção Civil) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Construção Civil, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2018.) e um levantamento com construtores e incorporadores (SENGER, 2017SENGER, E. W. Percepções de construtores e incorporadores sobre industrialização na construção civil em Curitiba. E-Tech: Tecnologias para Competitividade Industrial, v. 10, n. 1, p. 23-43, 2017.), previamente elaborados pelos autores, dispostos de forma aleatória. A partir dessa lista, os especialistas selecionaram dez benefícios cujos valores gerados julgaram ser os mais relevantes para as técnicas de pré-fabricação de banheiros.

Em seguida, foram elencados os três benefícios principais. Pesos foram atribuídos segundo a colocação selecionada, em que 1º, 2º e 3º lugares pontuavam 3, 2 e 1 respectivamente. Partiu-se do raciocínio de que, ainda que um benefício seja atrelado ao método construtivo, o consumidor pode perceber certos benefícios como mais relevantes durante a tomada de decisão.

Por fim, para cada um desses três benefícios, os especialistas discorreram abertamente sobre as formas como agregariam valor para consumidores, doravante denominados “criadores de valor”. A primeira rodada era requisito para participação nas demais e posterior recebimento do relatório final.

Segunda rodada

O questionário da segunda rodada foi personalizado para cada especialista. Composto de sete seções, as duas primeiras traçaram uma breve introdução e trouxeram um resumo dos resultados quantitativos gerais da primeira rodada, divididos em dois grupos:

  1. principais benefícios dos banheiros pré-fabricados; e

  2. benefícios que mais criam valor para o consumidor.

A Terceira seção - comparativo: benefícios listados na 1ª rodada - abordou o primeiro grupo de resultados e comparou os totais dos especialistas com suas marcações individuais. Em seguida, a quarta seção - alteração de benefícios listados na 1ª rodada - ofereceu a oportunidade de substituição de até quatro benefícios marcados durante a primeira rodada

A quinta seção explorou os criadores de valor. Estes foram agrupados por benefícios e apresentados para que o especialista definisse se concordaria ou não. Havendo discordância, um campo opcional para argumentação estava disponível.

Por fim, seguiu-se com procedimento análogo às seções de comparativo entre os benefícios listados na 1ª rodada (terceira seção) e de alteração de benefícios listados na 1ª rodada (quarta seção), mas com foco no segundo grupo de resultados.

Rodadas seguintes e relatório final

A partir da terceira rodada, o foco passou a ser exclusivo nos criadores de valor cujas opiniões haviam sido contra-argumentadas e/ou cujo consenso mínimo de 75% não havia sido atingido. Em um questionário único, todas as opiniões fornecidas em rodadas anteriores foram apresentadas para que os especialistas debatessem abertamente cada questão e, em vista dos argumentos expostos, revissem suas respostas. Com o encerramento da última rodada, foi elaborado um relatório final contendo informações gerais e os principais resultados do estudo.

Cronograma

Em função de sua natureza sequencial e iterativa, abordagens Delphi exigem intervalos longos (HSU; SANDFORD, 2007HSU, C.; SANDFORD, B. A. The Delphi technique: making sense of consensus. Practical Assessment, Research & Evaluation, v. 12, n. 10, p. 1-8, 2007.). Delbecq, Van de Ven e Gustafson (1975)DELBECQ, A. L.; VAN DE VEN, A. H.; GUSTAFSON, D. H. The Delphi technique. In: DELBECQ, A. L.; VAN DE VEN, A. H.; GUSTAFSON, D. H. Group techniques for program planning: a guide to nominal groups and Delphi process. Glenview: Scott Foresman and Company, 1975. sugeriram 45 dias como o intervalo total mínimo. No presente estudo, manteve-se um intervalo aproximado de 3 semanas entre rodadas. Tal decisão foi tomada para que a carga horária que os especialistas dedicavam à pesquisa fosse diluída e permitisse maior engajamento. Ainda, em função da definição de que a primeira rodada seria requisito para a continuação na pesquisa, estendeu-se o período de preenchimento àqueles que sinalizaram interesse em participar da pesquisa, mas que não conseguiram preencher o questionário no prazo estabelecido. Nesses casos, o preenchimento pôde ser efetuado até a conclusão da segunda rodada.

No ato do envio do questionário e em intervalos de 1 semana após o envio, contatos entre pesquisadores e especialistas foram estabelecidos. Assim, pôde-se verificar o recebimento dos questionários, bem como o surgimento de dúvidas, além de manter contato e acompanhar os especialistas que ainda não haviam registrado as respostas. As datas de cada contato (desconsiderando o contato no ato do envio) foram anotadas em uma planilha eletrônica para cálculo da taxa média de acompanhamentos por rodada/especialista.

Resultados e discussões

Após a análise de indivíduos de acordo com os critérios para a planilha de indicação (etapa 2), foram encontradas 9 organizações fornecedoras de banheiros pré-fabricados que atuam ou já atuaram no Brasil e 20 organizações consumidoras. Tentativas de contato por diversos meios foram estabelecidas durante a etapa 3, e ao todo foram realizados 12 contatos bem-sucedidos com fornecedores e 9 com consumidores. Ainda que o total de organizações consumidoras listadas tenha superado em mais de duas vezes o de organizações fornecedoras, a obtenção dos dados dos indivíduos foi restrita. As percepções/constatações do pesquisador a respeito das possíveis justificativas para tal dificuldade foram:

  1. empreendimentos que adotaram o método já foram concluídos há anos e informações sobre as equipes envolvidas são escassas;

  2. por questões relacionadas à confidencialidade entre contratante e contratado, muitos fornecedores optaram por não repassar contatos;

  3. pouco material jornalístico cita diretamente indivíduos envolvidos na contratação de tal solução construtiva;

  4. dada a escassez de indicações de contatos diretos, muitas abordagens iniciais foram realizadas por meio de redes sociais ou diretamente com secretárias das organizações; e

  5. de maneira distinta do que ocorre com fornecedores, é limitada a relação consumidor-consumidor.

Dezessete especialistas concordaram em participar das rodadas Delphi. Apenas 13, entretanto, efetivamente responderam ao questionário inicial dentro do prazo estabelecido. Aos demais, manteve-se aberto o primeiro questionário até que a segunda rodada estivesse concluída. Nesse período, um dos especialistas completou o questionário, o que totalizou 14 participantes.

A classificação do nível de expertise dos participantes seguiu os critérios estabelecidos em 2.1.4 e está disposta na Tabela 1 e na Tabela 2. Todos os 6 fornecedores participaram da fabricação de centenas de unidades de banheiros. O grupo contou com figuras de grande importância para o cenário nacional de banheiros pré-fabricados, com especialistas que ultrapassaram a marca dos 10 mil banheiros produzidos ao longo da carreira e um especialista cuja experiência com o sistema construtivo passa dos 40 anos. Além disso, todos os especialistas de organizações fornecedoras ocupam ou ocuparam cargos de alta gestão.

Tabela 1
Ranqueamento dos especialistas participantes (fornecedores)
Tabela 2
Ranqueamento dos especialistas participantes (consumidores)

A quantidade de unidades utilizadas por consumidores é relativamente inferior, o que é esperado, uma vez que empreendimentos levam anos desde a fase de planejamento à entrega e que a adoção desse método construtivo depende de uma ampla gama de fatores, não ocorrendo em todos os empreendimentos de uma organização. Ademais, usualmente profissionais atuam em poucas obras simultaneamente. Contudo, todos participaram de ao menos dois empreendimentos com banheiros pré-fabricados, tendo superado a marca de 300 unidades, e dois especialistas vivenciaram a execução de mais de mil unidades. Adicionalmente, todos os especialistas possuíam formação em arquitetura ou engenharia e, em ambos os grupos de organizações, todos os indivíduos tinham cinco ou mais anos de experiência profissional com construção civil.

Resultado das rodadas

A Tabela 3 fornece os resultados gerais da pesquisa, que teve duração de 67 dias entre o envio do primeiro questionário e o encerramento do recebimento de respostas da terceira e última rodada. Entre os 14 especialistas que participaram da primeira rodada, 6 foram classificados como fornecedores e 8 como consumidores. A taxa de resposta da primeira rodada foi de 82%, seguida de 86% e 64%. Cada especialista recebeu em média 1,64, 1,36 e 1,79 contato de acompanhamentos para a primeira, segunda e terceira rodada respectivamente. Tais valores indicam que, além do contato efetuado no momento do envio do questionário, ao longo do período entre rodadas, ao menos um acompanhamento precisou ser realizado. Ainda, a rodada só foi dada como encerrada após estabelecer no mínimo três acompanhamentos para especialistas que não haviam respondido.

Tabela 3
Números gerais por rodada

Benefícios dos banheiros pré-fabricados

Os principais benefícios de banheiros pré-fabricados, independentemente do valor criado para consumidores, foram listados na primeira rodada e revisados na segunda. O resultado foi uma lista com 36 benefícios.

A maior convergência de opiniões ocorreu para redução de tempo de construção e certeza de custos, listados por 93% e 71% dos especialistas respectivamente, entre os dez principais benefícios. Empatados com 64% de convergência estão atendimento aos prazos, controle de qualidade melhorado, redução dos desperdícios da construção e redução de tempo. A maior qualidade do produto (57%) e o custo minimizado de materiais (36%) também figuraram entre os benefícios citados por mais de um terço dos especialistas. Cinco benefícios foram citados apenas uma vez, e outros doze foram citados duas vezes.

Entre os oito benefícios mais citados, sete fazem menção explícita à base da gestão de projetos: custo, tempo e qualidade. Esse fato pode significar preferência pelas análises quantitativas às qualitativas e o consequente posicionamento tradicionalista quanto ao desempenho de projetos, conforme revisado por Toor e Ogunlana (2010)TOOR, S. R.; OGUNLANA, S. O. Beyond the ‘iron triangle’: stakeholder perception of key performance indicators (KPIs) large-scale public sector development projects. International Journal of Project Management, v. 28, p. 228-236, 2010.. Entretanto, houve citação de diversos benefícios que não se limitam a esses fatores, com destaque para a redução de desperdício na construção (64%).

Benefícios que mais criam valor para consumidores

Sob o ponto de vista do consumidor, os benefícios elencados foram semelhantes àqueles listados na etapa anterior. Os sete principais benefícios permaneceram os mesmos, com pequena alteração na ordem de classificação para o benefício de qualidade do produto e o controle de qualidade melhorado, que alternaram as posições entre si. Ao todo, foram quinze benefícios considerados entre os três principais por ao menos um especialista (Tabela 4).

Tabela 4
Benefícios que mais criam valor para consumidores

Nota-se que redução do tempo de construção e certeza do custo foram os principais benefícios para consumidores, ambos citados por 8 dos 14 especialistas e pontuando 18 e 16 respectivamente (Tabela 4). Alguns benefícios que haviam sido citados com frequência na etapa anterior não constaram como essenciais para a criação de valor. São eles:

  1. custo de materiais minimizado;

  2. integridade entre projeto e construção; redução de retrabalho; e

  3. redução da dependência de mão de obra desqualificada.

Destes, três haviam sido citados nas primeiras iterações, mas, após debates, foram substituídos.

Criadores de valor

Após a primeira rodada, 59 criadores de valor haviam sido listados, mas três não puderam ser debatidos pelo grupo porque o preenchimento ocorreu durante o prazo extra concedido para a primeira rodada, ou seja, após o envio do segundo questionário. Em seguida, na segunda rodada, dos 56 criadores de valor, 16 receberam argumentações contrárias. Pôde-se notar, contudo, que grande parte dos criadores de valor obteve consenso após a primeira iteração, com 93,2% de concordância média. Por fim, 14 desses criadores de valor e suas contra-argumentações foram levados à terceira rodada para aprofundar o debate.

O resultado, após modificação dos principais benefícios entre as rodadas 1 e 2, agrupamento de criadores de valor repetidos e a exclusão daqueles cujo consenso não atingiu 75%, foi uma lista com 45 criadores de valor (Quadro 1).

Quadro 1
Criadores de valor que atingiram consenso

Debates: criadores de valor que não atingiram consenso

Três criadores de valor não atingiram consenso, fato que implicou sua eliminação. Destes, dois atribuíram à redução do tempo de obra ganhos com redução de funcionários e padronização no acabamento. O terceiro criador de valor excluído sugere que a maior qualidade do produto implica redução dos chamados de assistência técnica e seus respectivos custos pós-venda. Nesse caso, os pontos negativos relacionam-se às experiências passadas de consumidores que tiveram de arcar com manutenções pós-obra, mesmo tendo optado por soluções industrializadas. Por outro lado, os argumentos favoráveis enfatizam maior qualidade na manufatura em função de fatores intrínsecos à industrialização, tais como ambiente controlado, emprego de equipes especializadas, rigor nos processos e controle de qualidade, bem como experiências positivas em que poucos chamados de assistência foram abertos após entrega do(s) empreendimento(s).

Debates: criadores de valor que atingiram consenso

Os debates concentraram-se em sete criadores de valor e são apresentados em três grupos:

  1. relação entre redução de tempo e redução de custo;

  2. enfrentamento da falta de mão de obra; e

  3. relação entre qualidade e pós-obra.

No grupo 1 (Quadro 2) foram registradas 17 argumentações para dois criadores de valor. No primeiro: redução de custo/valor global como resultado do benefício reduzir tempo (75% de concordância); e argumentos contrários alegaram que banheiros pré-fabricados são mais caros que métodos convencionais e que não necessariamente a redução do tempo implicaria uma obra mais barata. Em contraposição, argumentos favoráveis defendem que a redução de tempo pode significar agilidade no retorno financeiro, eliminação de custos fixos/indiretos (canteiro, equipe etc.) e outros custos que não chegam nem a ser contabilizados na obra convencional. Para o segundo criador de valor debatido:

Quadro 2
Debates do grupo 1: redução de tempo x redução de custo
  1. encurtamento do prazo de construção e consequente redução do custo indireto quando relacionado à redução do custo total do empreendimento (91,7% de concordância); e

  2. a variabilidade de argumentos contrários mostrou a complexidade do tema.

Um dos especialistas alegou que o custo do empreendimento aumenta, contudo outros dois foram mais comedidos explicando que:

  1. para ter uma posição mais precisa sobre a redução do custo total, deve-se considerar, além da redução de custos fixos indiretos, os ganhos financeiros;

  2. menos tempo implica redução de custos indiretos, mas para afirmar que isso leva à diminuição do custo total uma análise mais elaborada precisaria ser feita.

Novamente, argumentos favoráveis defendem que a entrega antecipada proporciona retorno financeiro adiantado e que custos fixos indiretos deixam de existir, sendo que existe uma gama de custos que é diretamente proporcional ao tempo de obra.

Observou-se que as discussões reproduzidas nos dois criadores de valor do grupo 1 possuem argumentos similares. Tal semelhança ocorreu porque ambos vincularam a diminuição do tempo à redução do custo total do empreendimento, mesmo quando debatidas em campos de benefícios distintos. Ainda, as divergências de opiniões podem ser interpretadas como efeito da falta ou baixa adoção de ferramentas comparativas eficazes para sistemas convencionais e pré-fabricação de banheiros.

O primeiro debate do grupo 2 (Quadro 3) gira em torno da afirmação de que há incerteza na disponibilidade de mão de obra qualificada no mercado, podendo haver paralização no processo, e que a industrialização de banheiros reduziria esse risco (75,0% de concordância). Foram registrados um argumento contrário e um favorável. Neste, o especialista alega que as indústrias de manufatura investem no treinamento de seu pessoal e buscam reter talentos, o que não ocorre nos canteiros de obra, onde equipes são desfeitas a cada empreendimento. Por outro lado, há o argumento de que as indústrias de banheiros também sofrem com a escassez de mão de obra no mercado. Um debate mais extenso (sete argumentações) seguiu para os três criadores de valor que atribuíam aos banheiros pré-fabricados um potencial de redução dos esforços/recursos para contratação de mão de obra no canteiro. Três argumentos condicionam os criadores de valor ao momento vivenciado pelo setor, considerando válidos somente em condições de escassez de mão e obra. Também havia argumentos favoráveis relacionados à centralização da contratação de diversos serviços em um único fornecedor.

Quadro 3
Debates do grupo 2: enfrentamento da falta de mão de obra

Por fim, o grupo 3 (Quadro 4) trata de um criador de valor similar àquele que havia sido descartado por falta de concordância ao tratar do pós-obra. Nesse caso, entretanto, relacionou-se a maior qualidade para conexão e instalação com o pós-obra (83,3% de concordância). Novamente, dois argumentos contrários refletem experiências negativas com o uso do sistema. Outros seis argumentos favoráveis foram computados, relacionando itens como controle rigoroso no processo, idoneidade e experiência dos fabricantes, e tipo de instalação, que usualmente é flexível (PEX).

Quadro 4
Debates do grupo 3: qualidade x pós-obra

Conclusão

A pesquisa conduzida consistiu em um processo de cocriação de valor entre consumidores e fornecedores de banheiros pré-fabricados, que puderam debater suas vivências e opiniões ao longo de três rodadas Delphi. O rigor na condução do procedimento de seleção de especialistas possibilitou a participação de profissionais renomados, cujas experiências somadas superavam 30 mil banheiros pré-fabricados no Brasil e no mundo. Ao seguir as etapas descritas, os especialistas permaneceram engajados e interessados a ponto de responderem aos três questionários, de participarem dos debates e de fornecerem indicações e informações gerais durante contatos telefônicos.

A partir de dois estudos prévios - um levantamento e uma RBS - foi possível adaptar uma lista com benefícios genéricos da construção industrializada para uma nova lista, com os principais benefícios atribuídos aos banheiros pré-fabricados. Durante as rodadas, constatou-se que a redução de tempo de construção é o principal benefício dos banheiros pré-fabricados, seguida da certeza de custo e da redução dos desperdícios da construção. Para cada benefício, os especialistas listaram e debateram seus criadores de valor, ou seja, formas como consumidores percebem o valor de tais benefícios.

Os resultados apresentados criam uma base de dados sem precedente, que aprofunda a base de conhecimento e atribui um olhar específico a um sistema construtivo que oferece potenciais ganhos ao setor da construção civil. Além disso, permite-se que pesquisadores utilizem os resultados para direcionar esforços à criação de artefatos para comparação entre sistemas construtivos, como foi o caso do método para quantificação do valor percebido ao reduzir o cronograma de obra com banheiros pré-fabricados, desenvolvido pelos autores no presente estudo.

  • 1
    Tradução nossa: Knowledge Resource Nomination Worksheet.

Agradecimentos

Os autores registram seu agradecimento aos especialistas que dedicaram tempo e compartilharam suas experiências em prol dos objetivos desta pesquisa.

Agradecem também à Capes, por uma bolsa de mestrado.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2020

Histórico

  • Recebido
    05 Maio 2019
  • Aceito
    27 Dez 2019
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