Acessibilidade / Reportar erro

Estimativa de frentes de carbonatação baseada em análises estatísticas: aplicando modelo europeu em território brasileiro

Estimation of carbonation front based on statistical analysis: using European modeling in Brazilian territory

Resumo

Este artigo tem como objetivo avaliar a aplicabilidade do modelo de predição de frentes de carbonatação preconizado pelo CEB Bulletin 34 (2006) em território brasileiro. Para isso, dados de concretos produzidos em laboratório e expostos à carbonatação natural por 10 anos foram utilizados como balizadores. Tempo de exposição, relação água/ligante, adição mineral e cura foram consideradas variáveis independentes, ao passo que a profundidade e o coeficiente de carbonatação como dependentes. Foram realizadas análises de variância e regressão linear entre os dados reais e os estimados, de maneira a estabelecer critériosque permitiram constatar a aplicabilidade do modelo. Consideraram-se condições ambientais e climáticas da cidade de Goiânia, GO, localizada na zona tropical Brasil Central, com clima quente semiúmido. Como resultado, com base nos coeficientes de correlação e determinação - iguais a 0,83 e 0,68 respectivamente - conclui-se que o modelo precisa ser revisto antes de ser aplicado no Brasil. Mais especificamente, o fator de resistência inversa efetiva à carbonatação natural, que associa a relaçãoágua/ligante e o tipo de adição, deve ser reajustado de maneira que represente os efeitos em ordem de grandeza semelhantes às reais.

Palavras-chave:
Concreto; Carbonatação; Vida útil; Modelo de predição; CEB Bulletin 34

Abstract

This paper aims to evaluate the applicability of the carbonation front prediction model recommended by CEB Bulletin 34 (2006) in Brazilian territory. For this, data from concrete mixtures produced in laboratory and exposed to natural carbonation for 10 years were used as benchmarks. Time of exposure, water/binder ration, different types of mineral admixtures and curing were considered as independent variables, while carbonation depth and coefficient as dependent ones. Analysis of variance and linear regression were performed between the actual and estimated data in order to establish criteria that allowed verifying the applicability of the model. It was considered the environmental and climatic conditions of the city of Goiânia/GO located in the tropical zone of Brazil Central with a hot semi-humid climate. As a result, based on the correlation and determination coefficients - equal to 0.83 and 0.68 respectively - it is concluded that the model needs to be revised before being applied in Brazil. More specifically, the inverse effective normal carbonation resistance factor, which associates the water/binder ration and the type of mineral admixture, should be readjusted so that it represents the effects in orders of magnitude similar to the real ones.

Keywords:
Carbonation; Service life;Predictive model; CEB Bulletin 34

Introdução

A carbonatação em sistemas cimentícios diz respeito à reação do CO2 atmosférico (inicialmente em sua fase gasosa) com algumas fases do cimento hidratado, principalmente o hidróxido de cálcio [Ca(OH)2], tendo como um dos produtos principais o carbonato de cálcio (CaCO3) em forma de calcita (TAYLOR, 1990TAYLOR, H. F. W. Cement chemistry. London: Academic Press, 1990.). A reação leva à alteração da microestrutura do concreto e à redução do pH nos poros do material, além de uma redução global da alcalinidade do sistema (CASCUDO et al., 2021CASCUDO, O. et al. Evaluation of the pore solution of cocnretes with mineral additions subjected to 14 years of natural carbonation. Cement and Concrete Composites, v. 115, 2021.; CASCUDO; CARASEK, 2022CASCUDO, O.; CARASEK, H. Carbonatação do concreto. In: ISAIA, G. C. (org.). Concreto: ciência e tecnologia. 3. ed. São Paulo: Ibracon, 2022.). À medida que o processo avança, desenvolve-se a corrosão do aço, que acarreta graves danos às estruturas de concreto (MALAMI et al., 2021MALAMI, S. I. et al. Implementation of hybrid neuro-fuzzy and self-turning predictive model for prediction of concrete carbonation depth: a soft computing technique. Results in Engineering, v. 10, 2021.).

O processo se dá na forma de uma frente de carbonatação que avança em direção ao interior do concreto, e, caso atinja a profundidade das armaduras, não haverá mais condições termodinâmicas para a estabilidade do filme passivador existente sobre o aço, propiciando, assim, a iniciação dos processos de corrosão eletroquímica. Sob corrosão ativa, a armadura passa por um processo de expansão do volume devido aos produtos de corrosão, o que leva à fissuração do concreto de cobrimento, reduzindo a resistência mecânica e a durabilidade do elemento estrutural. Por esse motivo, no período de iniciação da corrosão, a carbonatação tem sido amplamente usada como indicador de durabilidade das estruturas (CHO et al., 2015CHO, H. C. et al. Remaining service life estimation of reinforced concrete buildings based on fuzzy approach. Computers and Concrete, v. 15, n. 6, 2015.; NEVILLE, 2015NEVILLE, A. M. Propriedades do concreto. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2015.; LONDHE et al., 2021LONDHE, S. N. et al. Carbonation coefficient using artificial neural networks and genetic programming. Journal of Building Engineering, v. 39, 2021. ).

Nesse contexto, a realização da estimativa precisa das frentes de carbonatação é fundamental para garantir a durabilidade e a segurança das estruturas de concreto. Vários pesquisadores (TUUTTI, 1982TUUTTI, K. Corrosionofsteel in concrete. Stockholm, 1982. Thesis (Doctoral Thesis) - Division of Building Materials, Swedish Cement and Concrete Research Institute, Stockholm, 1982.; SENTLER, 1984SENTLER, L. Stochastic characterization of carbonation of concrete. In: INTERNATIONAL CONFERENCE ON DURABILITY OF BUILDING MATERIALS AND COMPONENTS, 3., Espoo, 1984. Proceedings […] Espoo, 1984.; PARROT, 1987PARROT, L. J. Review of carbonation in reinforced concrete. Buckinghamshire: Cement and Concrete Association, 1987.; PAPADAKIS; VAYENAS; FARDIS, 1991PAPADAKIS, V. G.; VAYENA, C. V.; FARDIS, M. N. Fundamental modeling and experimental investigation of concrete carbonation. ACI Materials Journal, v. 88, n. 4, 1991.; HELENE, 1997HELENE, P. R. L. Vida útil das estruturas de concreto. In: CONGRESSO IBEROAMERICANO DE PATOLOGIA DAS CONSTRUÇÕES, 4., Porto Alegre, 1997. Anais [...] Porto Alegre, 1997.; ANDRADE, 2004ANDRADE, C. Calculation of initiation and propagation periods of service life of reinforcements by using the electrical resistivity. In: INTERNATIONAL RILEM SYMPOSIUM ON CONCRETE SCIENCE AND ENGINEERING: A TRIBUTE TO AMON BENTUR, Paris, 2004. Proceedings […] Paris: Rilem, 2004.; POSSAN, 2010POSSAN, E. Modelagem da carbonatação e precisão de vida útil de estruturas de concreto em ambiente urbano. Porto Alegre, 2010. Tese (Doutorado em Engenharia), Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010.; CASCUDO et al., 2021CASCUDO, O. et al. Evaluation of the pore solution of cocnretes with mineral additions subjected to 14 years of natural carbonation. Cement and Concrete Composites, v. 115, 2021.) e instituições (COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.) já avaliaram e/ou propuseram modelos de previsão da carbonatação. Grande parte dos modelos propostos tem como ponto de partida os estudos de Tuutti (1982)TUUTTI, K. Corrosionofsteel in concrete. Stockholm, 1982. Thesis (Doctoral Thesis) - Division of Building Materials, Swedish Cement and Concrete Research Institute, Stockholm, 1982. e do CEB (COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.). Ambos adotam a lei de difusão de Fickcomo fundamentação teórica para estimativa da carbonatação. Além disso, sabe-se que a carbonatação é influenciada por diversos fatores internos e externos ao concreto, como materiais constituintes do concreto e condições de exposição da estrutura.

Em linhas gerais, quando fundamentados em parâmetros como qualidade dos materiais constituintes das misturas de concreto e condições de exposição (climáticas e ambientais), esses modelos preditivos são formulados com base em cenários locais/regionais, o que, geralmente, limita sua aplicação em diferentes localizações. Diante desse fato e da importância de se estimar a frente de carbonatação das estruturas de concreto, este trabalho tem como objetivo avaliar a aplicabilidade do modelo preconizado pelo CEB Bulletin 34 (2006) em território brasileiro. Para isso, resultados de ensaios de carbonatação natural de concretos produzidos pelo Grupo de Estudos em Durabilidade (GEDur) da UFG em parceria com Furnas e Aneel foram analisados estatisticamente e comparados aos resultados previstos pelo modelo. Como os corpos de prova estão localizados em Goiânia, GO, foram consideradas as condições climáticas/ambientais dessa região. Por fim, buscou-se apontar quais parâmetros demandariam maior atenção caso o modelo fosse amoldado às condições climáticas dessa microrregião brasileira. O planejamento de experimentos foi realizado utilizando-se abordagens de Análise de Variância (ANOVA) multifatorial e regressão linear.

Método

O processo de pesquisa foi elaborado com o objetivo de avaliar se o modelo europeu de estimativa de carbonatação pode ser aplicado em território brasileiro. Além disso, oestudo buscou apontar quais variáveis poderiam ser ajustadas para que o modelo representasse com maior eficiência o processo de deterioração dos concretos armados expostos a condições ambientais equivalentes à microrregião Goiânia, GO. Para tanto, algumas etapas e considerações foram tecidas, conforme descrito na Figura 1. As etapas da pesquisa também estão descritas nos subtópicos a seguir.

Materiais: concretos e banco de dados reais

Para comparar profundidades de carbonatação e avaliar o ajuste do modelo europeu à situação brasileira, foram utilizados dados dedez anos de pesquisas do grupo GEDur. Os concretos estudados foram produzidos em abril de 2002 por Castro (2003)CASTRO, A. Influência das adições minerais na durabilidade do concreto sujeito à carbonatação. Goiânia, 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2003. e estão dispostos em ambiente protegido de chuva (Figura 2).

Figura 1
Fluxograma de etapas da pesquisa

Figura 2
Corpos de prova de ensaio de carbonatação natural produzidos em 2002 e dispostos em ambiente protegido de chuva

Os corpos de prova utilizados na avaliação da carbonatação natural são prismáticos, com dimensões de 200 x 200 x 500 mm, armados com quatro barras longitudinais CA-50 de diâmetro nominal de 10 mm e quatro estribos CA-60 de 5 mm. As barras longitudinais foram posicionadas de maneira a garantir cobrimento de 25 mm, medidos a partir da superfície externa do estribo.A consistência dos concretos foi padronizada, com abatimento de tronco de cone inserido em uma faixa de 80±10 mm.

As misturas foram produzidas com cinco diferentes adições (além da situação de referência, sem adição), três níveis de relações água/ligante (a/lig) e duas condições de cura. A cura adequadamente executada pode aprimorar características microestruturais do cobrimento, logo se optou por analisar o comportamento dos concretos sob condições extremas de cura (úmida e seca). A cura úmida se estendeu por 28 dias em câmara com temperatura e umidade controladas e fixadas em 23±2°C e 90% respectivamente. Já na cura seca, um dia após a moldagem, os corpos de prova foram desenformados e dispostos ao ar no local de armazenamento, sem nenhum tipo de molhagem.

Os três níveis de relação a/lig (0,40, 0,55 e 0,70) visaram estabelecer diferentes estruturas internas e alterações nas propriedades mecânicas e relacionadas à durabilidade, enquanto o uso de diversas adições minerais (sílica ativa, cinza de casca de arroz, metacaulim, cinza volante e escória de alto-forno), em substituição ao cimento Portland, buscou analisar o desempenho desses materiais suplementares quando adicionados à matriz cimentícia, como contribuição no campo da durabilidade do concreto.

Castro (2003)CASTRO, A. Influência das adições minerais na durabilidade do concreto sujeito à carbonatação. Goiânia, 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2003. avaliou as frentes de carbonatação em três momentos distintos, equivalentes a 0,25, 0,50 e 0,82 ano de exposição natural, isto é, 3, 6 e 10 meses. No total, 108 corpos de prova foram submetidos a mais de 1.200 medições individuais de profundidade de carbonatação (x c ) natural. Como resultado, aplicando o modelo de Tuutti, chegou-se à disposição dos grupos pela comparação múltipla de média (teste de Duncan) ordenados quantos às médias globais dos coeficientes de carbonatação (k) natural apresentadas na Figura 3a. O melhor desempenho foi atingido pelo concreto referência (R) - sem adições minerais -seguido pelas misturas com adições pozolânicas de alta finura e reatividade, a saber, sílica ativa (S), cinza de casca de arroz (A) e metacaulim (M), todas com teores de 10% em substituição à massa de cimento; e, por fim, pelas misturas com cinza volante (V), com teor de 25%, e escória de alto-forno (E), com teor de 65%.

Ferreira (2013)FERREIRA, M. B. Estudo da carbonatação natural de concretos com diferentes adições minerais após 10 anos de exposição. Goiânia, 2013. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2013. deu seguimento à pesquisa iniciada por Castro (2003)CASTRO, A. Influência das adições minerais na durabilidade do concreto sujeito à carbonatação. Goiânia, 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2003., realizando 864 medições individuais da profundidade de carbonatação aos 9 e 10 anos de exposição nas mesmas amostras. Como resultado, por meio do teste de Duncan, foram obtidas organizações dos coeficientes de carbonatação natural (Figura 3b), diferenciadas pelo tipo de cura. Pôde-se verificar que as misturas de referência e com escória, após 10 anos de exposição natural, mantiveram-se com o melhor e o pior desempenhos globais em comparação com os demais concretos. Ainda é possível notar aumento dos coeficientes de carbonatação em relação aos dados determinados por Castro (2003)CASTRO, A. Influência das adições minerais na durabilidade do concreto sujeito à carbonatação. Goiânia, 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2003., principalmente nos concretos com cura seca.

Entre 0,82 e 9 anos, foram realizadas medições individuais aos 3 e 7 anos de exposição dos corpos de prova, isto é, nos anos de 2005 e 2009, perfazendo 684 medições nessas idades. No total global, dentro do período de 10 anos, foram realizadas mais de 2.750 medições de profundidade de carbonatação.

Com o intuito de avaliar a aplicabilidade do modelo europeu em território nacional, independentemente da qualidade ou composição dos concretos, o recorte do banco de dados foi realizado identificando as adições que proporcionaram desempenhos extremos em se tratando do avanço da carbonatação. Logo, com base nos resultados dos trabalhos de Castro (2003)CASTRO, A. Influência das adições minerais na durabilidade do concreto sujeito à carbonatação. Goiânia, 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2003. e Ferreira (2013)FERREIRA, M. B. Estudo da carbonatação natural de concretos com diferentes adições minerais após 10 anos de exposição. Goiânia, 2013. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2013., foram selecionadas as misturas de referência (R), por apresentar desempenho superior às demais; com adições de escória de alto-forno (E), por apresentar globalmente desempenho inferior; e sílica ativa (S), por seu desempenho intermediário.

Com a definição dos limites da pesquisa, partiu-se para a tabulação dos dados, que foram organizados e separados em função do modelo de determinação da profundidade de carbonatação, ou seja, dados reais obtidos em ensaios de campo e dados previstos pelo modelo europeu. Após a tabulação, foi executada a análise da presença de valores espúrios por meio do teste de Dixon, conforme a norma E178-21 (AMERICAN..., 2021AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS. E178: standard practice for dealing with outlying observations. Philadelphia, 2021.).

Em suma, entre os dados reais das medições individuais foram computadas 926 profundidades de carbonatação das misturas R, E e S, com outliers já excluídos. Todos esses dados foram utilizados na análise estatística e comparação com os valores estimados. A Figura 4 apresenta as variáveis independentes consideradas nos estudos de carbonatação.

Figura 3
Disposição dos resultados de agrupamento de médias dos coeficientes de carbonatação natural obtidos até 0,82 ano, considerando os efeitos de relação a/lig e cura (a) e até 10 anos, considerando os efeitos da relação a/lig (b)

Figura 4
Variáveis independentes consideradas nesta pesquisa

Seleção do modelo preditivo

Uma série de pesquisas desenvolvidas pelo Grupo de Estudos em Durabilidade (GEDur) da UFG, em parceria com Furnas e Aneel (CASTRO, 2003CASTRO, A. Influência das adições minerais na durabilidade do concreto sujeito à carbonatação. Goiânia, 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2003.; CASTRO et al., 2004CASTRO, A. et al. Relationship between results of accelerated and natural carbonation in various concretes. In: INTERNATIONAL RILEM CONFERENCE OF USE OF RECYCLED MATERIALS IN BUILDINGS AND STRUCTURES, Barcelona, 2004. Proceedings […] Paris: Rilem , 2004.; FERREIRA et al., 2012FERREIRA, M. B. et al. Avaliação da carbonatação natural ao longo do tempo de concretos com diferentes adições minerais. In: CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO, 54., Maceió, 2012. Anais [...] São Paulo: Ibracon , 2012.; FERREIRA, 2013FERREIRA, M. B. Estudo da carbonatação natural de concretos com diferentes adições minerais após 10 anos de exposição. Goiânia, 2013. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2013.; PIRES, 2016PIRES, P. F. Estudo da carbonatação avançada em concretos contendo adições minerais. Goiânia, 2016. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2016.; CASCUDO et al., 2021CASCUDO, O. et al. Evaluation of the pore solution of cocnretes with mineral additions subjected to 14 years of natural carbonation. Cement and Concrete Composites, v. 115, 2021.), constatou que o modelo de Tuutti (1982)TUUTTI, K. Corrosionofsteel in concrete. Stockholm, 1982. Thesis (Doctoral Thesis) - Division of Building Materials, Swedish Cement and Concrete Research Institute, Stockholm, 1982. é preciso e pode ser adotado para estabelecer profundidades e coeficientes de carbonatação. Entretanto, modelos mais recentes buscam desvendar o coeficiente em função dos diversos fatores que podem influenciar o avanço da carbonatação. Entre os modelos que objetivam discriminar a velocidade de carbonatação em função da sinergia dos fatores, o CEB Bulletin 34 (COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.) apresenta uma modelagem que tem como base de cálculo a Equação 1.

Neste modelo, a profundidade carbonatada é estimada por meio da interação dos seguintes fatores:

  1. função ambiental (k e ), que considera a umidade relativa do ar;

  2. parâmetro de execução (k e ), que é função do tempo de cura;

  3. resistência inversa efetiva à carbonatação natural (R -1 NAC,0 ) , que depende de parâmetros como difusividade do CO2 e do teor de óxido de cálcio (CaO) ligado ao CO2 por unidade de volume de concreto;

  4. concentração de CO2 na atmosfera (C s );

  5. função climática (W (t) ), que faz alusão à incidência de chuva dirigida no concreto; e

  6. tempo de exposição/idade (t).

x c = 2 * k e * k c * R NAC , 0 - 1 * C s * W t * t Eq. 1

em que:

Xc = profundidade de carbonatação (mm);

Ke = função ambiental (-);

Kc = parâmetro de execução (-);

R-1NAC,0 = resistência inversa efetiva à carbonatação [(mm²/ano)/(kg/m³)];

Cs = concentração de CO2 (kg/m³);

W(t) = função climática (-); e

t = tempo de exposição (anos).

O modelo europeu foi selecionado tendo em vista que suas raízes vão ao encontro da formulação de Tuutti, no entanto o coeficiente de carbonatação é decomposto em consequência da ação de agentes relativos à qualidade do concreto e às condições de exposição. Os dados exigidos para aplicação do modelo já foram levantados pelo grupo de pesquisa, o que facilita sua aplicação, além de ser um modelo normatizado e validado com materiais e condições climáticas/ambientais bastante díspares da realidade brasileira. Dessa forma, optou-se por comparar os resultados obtidos pelo Grupo GEDur - que constatou a eficácia do modelo de Tuutti em pesquisas com dados coletados por uma década - com aqueles estimados pelo modelo, buscando compreender quão ajustado este se mostra quando implementado em outro continente e hemisfério.

Processo de aplicação do CEB Bulletin 34 (COMITÉ..., 2006)

Como visto na Equação 1, o coeficiente de carbonatação é assente na interação de diferentes fatores. Aqueles referentes às condições de exposição foram estabelecidos conforme clima predominante na cidade de Goiânia, GO. A cidade, onde os corpos de prova estão estocados, está localizada na zona tropical Brasil Central, com clima quente semiúmido, apresentando de 4 a 5 meses secos (INSTITUTO..., 2002INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Mapa de clima do Brasil. 1:5 000 000. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, 2002. Disponível em: Disponível em: https://www.ibge.gov.br/geociencias/cartas-e-mapas/informacoes-ambientais/15817-clima.html?=&t=acesso-ao-produto . Acesso em: 20 set. 2022.
https://www.ibge.gov.br/geociencias/cart...
).Os parâmetros foram determinados de acordo com suas equações matemáticas, apresentadas no CEB Bulletin 34 (COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.).

A função ambiental (K e ) considera a umidade relativa do ar (UR real ) do local de exposição das amostras em relação à umidade relativa de referência (UR ref ) normatizada e igual a 65%. A UR real foi determinada pelas médias horárias históricas de 2002 a 2012. Logo, para cada idade calculou-se um valor de K e considerando a umidade média do período. Os valores de K e estão descritos na Tabela 1. Os dados meteorológicos foram apanhados da estação meteorológica automática número A002 do Instituto Nacional de Meteorologia (INSTITUTO..., 2022INSTITUTO NACIONAL DE METEOROLOGIA. Histórico de dados meteorológicos: dados históricos anuais (2002/2022). Brasília, 2022. Disponível em: Disponível em: https://portal.inmet.gov.br/dadoshistoricos . Acesso em: 15 ago. 2022.
https://portal.inmet.gov.br/dadoshistori...
), localizada em Goiânia.

O parâmetro de execução (k c ) faz alusão ao período de cura do concreto e como esse dado pode influenciar o processo de deterioração. Para os concretos de cura úmida adotou-se um período de 28 dias, enquanto para os concretos de cura seca adotou-se 1 dia, pois estes foram mantidos nas formas em ambiente de laboratório antes de serem encaminhados ao local de estocagem permanente. Os valores d k c e, conforme dias de cura, foram 0,456 e 3,014 para cura úmida e seca respectivamente.

A concentração de CO2 (C s ) considera valores atmosféricos e de fontes emissoras. No entanto, foi considerado somente o valor atmosférico, haja vista que o valor de emissões é aplicável apenas a obras localizadas em ambientes viciados, como túneis rodoviários e locais com motores a combustão.

Com uso do aparelho CO-6 Plus mediram-se concentrações volumétricas de CO2 em horários distintos. Nos horários diurnos a concentração registrou 0,0363%, e em horários noturnos, 0,0385%. Os resultados se assemelham aos elencados por Saetta e Vitaliani (20041 1 SAETTA, A. V.; VITALIANI, R. V. Experimental investigation and numerical modeling of carbonation process in reinforced concrete structures: part I: theoretical formulation. Cement and Concrete Research, v. 34, n. 4, 2004. apudALMEIDA; SALES, 2014ALMEIDA, F. C. R.; SALES, A. Efeitos da ação do meio ambiente sobre as estruturas de concreto. In: RIBEIRO, D. V. (org.). Corrosão em estruturas de concreto armado: teoria, controle e métodos de análise. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014.), que afirmam que as concentrações em centros urbanos são de aproximadamente 0,036%, e em regiões industriais, de 0,045%. O CEB Bulletin 34 (COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.) estabelece que, para o período de exposição das amostras - 2002 a 2012 -, a concentração atmosférica de CO2 deve ser considerada entre 0,035% e 0,038%, reforçando a faixa de concentração adequada para o estudo.

Portanto, adotou-se neste estudo o valor de 0,038% (em volume), o que equivale a 0,0006244 kg/m³ para todos os concretos, pois todos estão submetidos às mesmas condições de exposição. As conversões de unidade de concentração foram realizadas pela plataforma Gastec Corporation (2022)GASTEC CORPORATION. Concentration unit conversion. Disponível em: https://www.gastec.co.jp/en/technology/knowledge/concentration/. Acesso em: 14 set. 2022.
https://www.gastec.co.jp/en/technology/k...
, considerando temperatura média anual local igual 25 ºC e pressão atmosférica igual a 925 hPa (INSTITUTO..., 2022INSTITUTO NACIONAL DE METEOROLOGIA. Histórico de dados meteorológicos: dados históricos anuais (2002/2022). Brasília, 2022. Disponível em: Disponível em: https://portal.inmet.gov.br/dadoshistoricos . Acesso em: 15 ago. 2022.
https://portal.inmet.gov.br/dadoshistori...
).

A resistência inversa efetiva à carbonatação natural (R -1 NAC,0 ) pode ser determinada de duas maneiras:

  1. adotando-se valores normativos determinados com correspondência à resistência inversa efetiva à carbonatação acelerada (R -1 ACC,0 ) determinada por meio de ensaios laboratoriais; e

  2. por meio da relação entre a difusividade do CO2 na matriz cimentícia e o teor de CaO presente em cada 1,0 m³ de concreto.

Nesta pesquisa, optou-se por determinar a resistência por meio de dados tabelados estabelecidos no CEB Bulletin 34 (COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.).

Tabela 1
Valores de k e equivalentes à UR real média de cada período

A R ACC,0 −1 deve ser quantificada por meio do modelo estabelecido nas normativas europeias, mas na ausência de informações e equipamentos suficientes para sua quantificação dados do DARTS (20042 2 EUROPEAN COMMISSION. Durable and reliable tunnel structures: data report project GrD1-25633. Denmark, 2004. apud COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.) podem ser utilizados como referência (Tabela 2). O valor de R-1 ACC,0 pode ser determinado em função do tipo de cimento e da relação a/lig.

Em todos os concretos utilizou-se o cimento Portland CP II F-32, logo para o concreto de referência foi considerado como cimento equivalente o CEM I, que não possui adições pozolânicas e/ou cimentantes. Sabe-se que o CP II tem adições de fíler calcário e gesso de fábrica, no entanto se optou por adotara ausência dos outros tipos de adição como fator determinante.

Para a mistura com escória optou-se por adotar o valor referente ao cimento CEM III, que possui teores de escória semelhantes ao adotado por Castro (2003)CASTRO, A. Influência das adições minerais na durabilidade do concreto sujeito à carbonatação. Goiânia, 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2003.. Por fim, para a mistura com sílica ativa foi considerado o cimento CEM I 42,5 R + SF, que considera a pozolana na composição do material em teor inferior, porém próximo ao de Castro (2003)CASTRO, A. Influência das adições minerais na durabilidade do concreto sujeito à carbonatação. Goiânia, 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2003.. A definição das equivalências entre os cimentos listados no boletim e os utilizados neste estudo fundou-se primordialmente nos materiais constituintes de cada mistura.

Como a Tabela 2 apresenta dados apenas até a relação a/lig de 0,60 enquanto os concretos em estudo possuem misturas com 0,70, optou-se por aplicar regressão linear na predição dos valores após a constatação do comportamento linear da variável. Além disso, foi dada devida atenção às unidades de medida, sendo que para transformar a unidade de R-1 ACC,0 de (m²/s)/(kg/m³) para (mm²/ano)/(kg/m³) - assim como R-1 NAC,0 - multiplicou-se o valor tabelado pelo fator de 315,4. A Tabela 3 apresenta os valores de R-1 NAC,0 calculados para cada cenário em função da relação a/lig e do tipo de adição mineral (dependente do cimento adotado).

Por fim, a função climática (W(t) ) considera as condições mesoclimáticas decorrentes das chuvas e/ou exposição direta à água. Como todos os corpos de prova foram armazenados em local livre da ação de chuvas, a probabilidade de chuva dirigida (PSR ) é igual a zero, logo a função climática se iguala a 1,0.

Como estabelecido na própria norma, todos os parâmetros constantes utilizados nos cálculos de ke , kc e R-1 NAC,0 são independentes de condições de exposição e foram mantidos inalterados neste estudo. Ao final, em posse de todas as informações necessárias para determinação dos fatores que compõem o modelo europeu, partiu-se para os cálculos das profundidades de carbonatação referentes aos mesmos períodos/tempos de exposição preestabelecidos pelo grupo GEDur.

Processo de análise estatística

De posse de todos os dados reais e estimados, partiu-se para os tratamentos estatísticos no software Statistica 10. Inicialmente, foram realizados tratamento e análise dos dados de carbonatação reais e previstos separadamente, pois dessa maneira foi possível identificar os efeitos e significâncias das variáveis independentes nos cenários real e estimado.

Tabela 2
Quantificação de R -1 ACC,0

Tabela 3
Valores de R-1 NAC,0 em função do tipo de adição e relação a/lig

Para ambos os cenários, as variáveis independentes desta pesquisa foram idade/tempo de exposição, relação a/lig, tipo de adição mineral e cura (Figura 4). No caso do cenário estimado, o modelo europeu considera todas essas variáveis, associadas a outros parâmetros, como o tipo de cura associado à kc , enquanto a relação a/lig e o tipo de adição mineral estão associados ao parâmetro R-1 NAC,0 . Logo, neste cenário, as variáveis independentes continuam as mesmas, mas representadas pelos parâmetros aos quais estão vinculadas.

Como variáveis dependentes foram tidas duas respostas:

  1. profundidade de carbonatação; e

  2. coeficiente de carbonatação.

No cenário de dados reais, em posse das profundidades, foram determinados os coeficientes de carbonatação por meio da Equação 2 (TUUTTI, 1982TUUTTI, K. Corrosionofsteel in concrete. Stockholm, 1982. Thesis (Doctoral Thesis) - Division of Building Materials, Swedish Cement and Concrete Research Institute, Stockholm, 1982.), cuja acurácia foi constatada por Ferreira (2013)FERREIRA, M. B. Estudo da carbonatação natural de concretos com diferentes adições minerais após 10 anos de exposição. Goiânia, 2013. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2013.. Já no cenário de dados estimados, o coeficiente é calculado com base na Equação 1, considerando todos os parâmetros descritos na seção anterior. As análises considerando xc e k como resposta foram efetuadas de forma a avaliar se os dados apresentam normalidade e homocedasticidade em ambas as condições.

x c = k * t Eq. 2

em que:

xc = profundidade de carbonatação (mm);

k = coeficiente de carbonatação (mm/ano0,5); e

t = idade/tempo de exposição (anos).

Realizou-se ANOVA Multifatorial dos dados estimados pelo modelo do CEB Bulletin 34 (COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.). Esse tratamento foi executado de forma a estudar os efeitos das variáveis - detalhadas na Equação 1 - sobre a profundidade e o coeficiente de carbonatação. Optou-se por utilizar como tratamento o modelo fatorial completo desconsiderando a interação tripla (idade * kc * R-1 NAC,0 ), pois não há repetição. Na seção anteriorjá foram descritos todos os parâmetros e seus níveis.

Dentro das análises ANOVA Multifatorial completas foram realizadas análises de variância com somas de quadrados, teste F, valor-p, coeficientes de correlação e determinação, além de agrupamentos de médias, testes de normalidade e homocedasticidade, entre outros detalhados na seção seguinte. Posteriormente, foi realizado teste de amplitudes múltiplas de Duncan, um teste post hoc para encontrar diferenças entre grupos por meio da comparação de médias que difiram estatisticamente.

Os mesmos tratamentos estatísticos foram aplicados aos dados do Grupo GEDur. Esse tratamento foi idealizado como parâmetro para nortear possíveis ajustes a serem integrados ao modelo europeu,para tornar viável sua aplicação em território nacional. Todas as variáveis e seus níveis estão descritos na Materiais.

Por fim, para quantificar o quão ajustado o modelo europeu se apresenta para o contexto nacional, realizou-se regressão linear considerando os dados reais e previstos pelo CEB Bulletin 34 (COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.). Com essa análise, foi possível determinar níveis de significância, coeficientes de correlação e determinação e avaliação de dispersão de resíduos, o que permitiu identificar o quão assertivo o modelo preditivo se mostrou quando aplicado em outro hemisfério. Todas as análises estatísticas deste artigo consideraram nível de significância de 0,05.

Resultados e discussões

Análise estatística do banco de dados reais

Fundando-se nos 926 dados, foi realizada análise de variância considerando xc e k como respostas. Esse tratamento estatístico foi realizado considerando-se dois grupos:

  1. profundidade de carbonatação como variável dependente/resposta e tempo de exposição/idade, relação a/lig, tipo de cura e adição mineral como variáveis independentes/fatores; e

  2. coeficiente de carbonatação como resposta e tempo de exposição/idade, relação a/lig, tipo de cura e adição mineral como fatores.

Inicialmente, foram avaliados os ajustes dos modelos com as duas respostas, e se observaram os valores dos coeficientes de correlação de Pearson (R), para determinar qual a relação entre a variável dependente e as independentes; e coeficientes de determinação (R²), para explicar quanto a variável dependente varia quando realizadas mudanças nas variáveis independentes. A Tabela 4 apresenta os valores de R e R² para a profundidade e coeficiente de carbonatação.

Observa-se que os valores dos coeficientes são superiores quando adotada a profundidade de carbonatação como resposta. Isso indica que os dados se ajustam fortemente (superior a 0,90) ao modelo e, posteriormente foram realizadas análises da distribuição normal e homocedasticidade dos resíduos para validar essa investigação (MUKAKA, 2012MUKAKA, M. M. A guide to appropriate use of correlation coefficient in medical research. Malawi Medical Journal, v. 24, n. 3, 2012.).

No que tange aos histogramas, é possível elencar que ambas as amostras se ajustam à curva de Gauss. A amostra com xc como resposta (Figura 5a) apresentou maiores dispersões dos valores em relação às medidas de tendência central. Isso ocorre devido à variabilidade dos valores das profundidades em comparação aos coeficientes, haja vista que esses últimos tendem a se manter estáveis com o passar dos anos (TUUTTI, 1982TUUTTI, K. Corrosionofsteel in concrete. Stockholm, 1982. Thesis (Doctoral Thesis) - Division of Building Materials, Swedish Cement and Concrete Research Institute, Stockholm, 1982.). Essa informação fica evidenciada no histograma de k como resposta (Figura 5b), onde há maior concentração de observações próximas ao valor central.

Ainda no âmbito da suposição de normalidade, foram verificados os gráficos de probabilidade normal dos resíduos. Foi possível identificar visualmente que os resíduos da amostra com xc como resposta (Figura 6a) apresentaram melhor ajuste ao modelo normal, pois os resíduos se alinham de maneira quase perfeita à linha. No caso em que k é resposta (Figura 6b), os resíduos apresentaram maiores desvios da linha consideravelmente superiores, não se ajustando à normalidade.

Essas informações são fundamentais para determinar que o banco de dados é mais bemcompreendido quando considerada a profundidade de carbonatação como variável dependente. Não obstante, associado aos testes de normalidade, foi realizado teste de homoscedasticidade, que avalia a suposição de que os erros da análise possuem variâncias constantes em todas as condições (MORETIN; SINGER, 2022MORETIN, P. A.; SINGER, J. M. Estatística e ciência de dados. São Paulo: LTC, 2022.). Caso as variâncias sejam diferentes para cada observação, então se caracteriza heterocedasticidade, o que implica estimativas viesadas, não sendo indicado aplicar testes estatísticos, como a regressão linear.

A Figura 7a apresenta os diagramas de valores previstos e resíduos, onde é possível observar que, ao adotar a profundidade como variável dependente, os resíduos apresentam variâncias mais homogêneas. O diagrama que tem o coeficiente de carbonatação como resposta (Figura 7b) ilustra resíduos com variações maiores, uma característica da heterocedasticidade, não sendo indicadasua aplicação neste estudo.

Tomando como base as análises de suposição de normalidade e homocedasticidade, fica evidente que a adoção da profundidade de carbonatação como variável dependente é mais indicada. Logo, o modelo tende a apresentar maior sensibilidade ao avaliar os efeitos dos fatores sobre a carbonatação. Dessa forma, a análise de variância com os efeitos das variáveis independentes sobre a dependente foi realizada considerando esse cenário.

A Tabela 5 apresenta os valores dos graus de liberdade (GL), somas dos quadrados (SQ), quadrado médio (MQ), F calculado e valor-p do cenário em que a profundidade é tida como resposta. Como todos os valores-p foram inferiores ao nível de significância da análise (0,05), verifica-se que todos os fatores têm efeito sobre a profundidade de carbonatação.

Tabela 4
Coeficientes de correlação e determinação oriundos do banco de dados reais para xc e k como respostas

Figura 5
Histogramas de frequência do banco de dados reais com xc (a) e k (b) como respostas

Figura 6
Gráficos de probabilidade normal do banco de dados reais com xc (a) e k (b) como respostas

Figura 7
Gráficos de valores previstos e resíduos para xc (a) e k (b) referentes ao banco de dados reais

Tabela 5
ANOVA com efeitos principais e de interações dos fatores sobre a profundidade de carbonatação

Era esperado que a idade apresentasse efeito sobre o avanço da carbonatação, haja vista que é o principal fator vinculado ao envelhecimento natural dos corpos de prova. No entanto, como o avanço da carbonatação se dá em escala exponencial, isto é, tende a se estabilizar com o passar dos anos, caso estudos como este sejam replicados com maiores tempos de exposição, pode ser que o efeito da idade acabe se reduzindo (PAUL et al., 2018PAUL, S. C. et al. An empirical model design for evaluation and estimation of carbonationdepth in concrete. Measurement, v. 124, 2018.).

A relação a/lig também possui grande influência no processo, pois é fator associado apropriedades físicas determinantes da qualidade do concreto, como porosidade e resistência mecânica. O tipo de adição também é responsável por propriedades do material, como porosidade, o que é evidenciado pelo melhor desempenho da mistura com sílica ativa em comparação à escória de alto-forno. Por fim, a cura, quando realizada adequadamente, previne fissuração e evita perda de água de amassamento, garantindo maior durabilidade do material. Todas as misturas com cura úmida apresentaram menores profundidades de carbonatação quando contrapostas às suas equivalentes com cura seca.

Diversos autores (PARROT, 1987PARROT, L. J. Review of carbonation in reinforced concrete. Buckinghamshire: Cement and Concrete Association, 1987.; POSSAN et al., 2020POSSAN, E. et al. Model to estimate concrete carbonation depth and servisse life prediction. In: DELGADO, J. (ed.) Hygrothermal behaviour and building pathologies. New York: Springer, 2020.; EKOLU, 2018EKOLU, S. O. Model for practical prediction of natural carbonation in reinforced concrete: Part 1-formulation. Cement and Concrete Composites , v. 86, 2018.; OTIENO; IKOTUN; BALLIM, 2020OTIENO, M.; IKOTUN, J.; BALLIM, Y. Experimental investigations on the effect of concrete quality, exposure conditions and duration of initial moist curing on carbonation rate in concretes exposed to urban, inland environment. Construction and Building Materials , v. 246, 2020.) atestam que a adição mineral é um fator determinante na carbonatação, pois, quanto maior seu teor de adição, mais acelerada será a progressão da carbonatação. Isso resulta na formação de menos produtos de hidratação, além do fato de misturas com adições pozolânicas exigirem maior tempo de cura em condições saturadas quando comparadas a misturas sem adições. Liu, Yu e Chen (2020)LIU, P.; YU, Z.; CHEN, Y. Carbonation depth model and carbonated acceleration rate of concrete under different environment. Cement and Concrete Composites , v. 114, 2020. estudaram os efeitos de diversos fatores sobre a carbonatação, entre os quais se destacaram a relação a/lig e o teor de adição (cinza volante). Ambos apresentaram forte influência, sendo que, quanto maior a quantidade de água de amassamento e teor de adição, maior foi a profundidade de carbonatação.

A análise de variância é um teste global de significância e efeitos dos fatores, mas não permite que sejam diferenciados os grupos de fatores entre si. Para isso, realizou-se o teste de Duncan, que compara a amplitude de um conjunto de médias amostrais com uma amplitude mínima significante calculada. Se a amplitude das médias do conjunto exceder a amplitude mínima significante calculada, as médias da população são declaradas significativamente diferentes (VIEIRA, 2016VIEIRA, S. Teste das amplitudes múltiplas de Duncan. 2016. Disponível em: Disponível em: http://soniavieira.blogspot.com/2016/09/teste-de-amplitudes-multiplas-de-duncan.html#:~:text=O%20teste%20de%20Duncan%20compara,popula%C3%A7%C3%A3o%20s%C3%A3o%20declaradas%20significantemente%20diferentes . Acesso em: 09 fev. 2023.
http://soniavieira.blogspot.com/2016/09/...
). A Figura 8 apresenta os agrupamentos de médias considerando as variáveis independentes da pesquisa.

Considerando as profundidades de carbonatação medidas nos corpos de prova, todos os fatores, como visto na tabela de ANOVA, têm efeito sobre o processo, e, consequentemente, as amostras se dividem em diversos grupos. As variáveis independentes apresentaram grupos distintos em todos os seus níveis, exceto pela idade. Como esperado, as profundidades registradas aos 9 e 10 anos de exposição foram consideradas semelhantes, haja vista que o processo de carbonatação, nas primeiras idades, ocorre de forma acelerada devido à elevada reserva alcalina e ao diâmetro dos poros. Entretanto, ao longo dos anos, a reserva alcalina se reduz, e os poros acabam sendo parcialmente obstruídos pelo carbonato de cálcio (CaCO3), produto resultante da reação de carbonatação. Logo, a profundidade de carbonatação tende a avançar lentamente com o passar do tempo, como visto no grupo formado pelas medições dos últimos anos de ensaio.

De modo geral, com base nos resultados da análise estatística dos dados reais, indica-se adotar a profundidade como variável dependente nos estudos de carbonatação em concretos com longo tempo de exposição.

Análise estatística do banco de dados estimados

Assim como na seção anterior, a análise estatística dos dados estimados pelo CEB Bulletin 34 (COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.) foi realizada considerando 144 observações individuais divididas em dois grupos:

  1. profundidade de carbonatação como resposta e tempo de exposição/idade, R-1 NAC,0 (vinculado à relação a/lig e ao tipo de adição) e kc (relacionado ao tipo de cura) como fatores; e

  2. coeficiente de carbonatação como resposta e tempo de exposição/idade, R-1 NAC,0 (vinculado à relação a/lig e ao tipo de adição) e kc (relacionado ao tipo de cura) como fatores.

Foram realizados testes de normalidade e homoscedasticidade, e, em síntese, assim como no caso de dados reais, o modelo apresentou melhores resultados quando considerada a profundidade de carbonatação como resposta. Observou-se também, por meio da ANOVA, que todas as variáveis independentes apresentaram efeitos sobre a profundidade de carbonatação. Isso atesta que o modelo considera importante que os esforços aplicados à tecnologia de produção de concretos sejam voltados não apenas aos parâmetros associados aos materiais constituintes e proporcionamentos, mas também aos critérios de execução das estruturas de concreto armado.

Realizou-se o teste de Duncan, cujo resultado está ilustrado na Figura 9. Neste teste as diferenças entre os dados reais e estimados ficaram mais evidentes, pois não apresentaram agrupamentos semelhantes. Apenas o tipo de cura manteve a mesma configuração (dois grupos com cura distinta) que a encontrada nas amostras reais.

As profundidades estimadas para o primeiro ano se dividiram em dois grupos, estabelecendo-se que nesse período - início da carbonatação - o tempo não apresenta grande efeito sobre o processo. No entanto, sabe-se que nas primeiras idades a carbonatação tende a ocorrer de forma acelerada, logo é preciso que o modelo, caso seja ajustado à realidade brasileira, seja revisto. No que tange à R-1 NAC,0 , os grupos formados respeitaram conceitos já revelados por outros autores (PARROT, 1987PARROT, L. J. Review of carbonation in reinforced concrete. Buckinghamshire: Cement and Concrete Association, 1987.; POSSAN et al., 2020POSSAN, E. et al. Model to estimate concrete carbonation depth and servisse life prediction. In: DELGADO, J. (ed.) Hygrothermal behaviour and building pathologies. New York: Springer, 2020.; EKOLU, 2018EKOLU, S. O. Model for practical prediction of natural carbonation in reinforced concrete: Part 1-formulation. Cement and Concrete Composites , v. 86, 2018.; OTIENO et al., 2020OTIENO, M.; IKOTUN, J.; BALLIM, Y. Experimental investigations on the effect of concrete quality, exposure conditions and duration of initial moist curing on carbonation rate in concretes exposed to urban, inland environment. Construction and Building Materials , v. 246, 2020.; LIU; YU; CHEN, 2020LIU, P.; YU, Z.; CHEN, Y. Carbonation depth model and carbonated acceleration rate of concrete under different environment. Cement and Concrete Composites , v. 114, 2020. ), isto é, concretos com menores teores de adição mineral e relação a/lig tendem a apresentar menores profundidades de carbonatação.

Portanto, caso o modelo europeu seja ajustado às condições brasileiras, será preciso que o método de determinação da R-1 NAC,0 seja revisto, de modo que seu efeito de interação passe a corresponder aos efeitos principais da relação a/lig e tipo de adição.

Figura 8
Agrupamentos de médias dos dados reais separados por fatores

Figura 9
Agrupamentos de médias dos dados estimados separados por fatores

Tomando as informações aqui apresentadas, no contexto global, o modelo europeu apresentou resultados que se ajustam ao modelo normal quando do uso da profundidade de carbonatação. Todavia, buscando avaliar sua acurácia ao ser aplicado em território brasileiro sem que sejam feitos ajustes prévios, seus resultados foram relacionados aos reais. Essa relação permitiu que fossem observadas as diferenças nos valores estimados, se firmando como mais um recurso para estudo do modelo em condições alheias às de origem.

Relação entre carbonatação real e estimada

Viu-se que o uso da profundidade de carbonatação em ambas as situações (real e estimada) mostrou melhor ajuste ao modelo normal. Portanto, buscando compreender a relação existente entre os dados reais e os estimados, foi realizada regressão linear para avaliar se o modelo europeu se mostra assertivo e representa o processo de carbonatação natural de diferentes misturas de concreto armado cujos corpos de prova estão localizados em território brasileiro há dez anos de exposição.

A regressão linear simples é um dos modelos estatísticos mais utilizados para analisar dados pareados de duas variáveis contínuas num ambiente onde a distribuição de frequências da variável resposta pode depender de outra variável explicativa. O modelo estrutural da regressão linear simples é que as variáveis são linearmente relacionadas de modo que a média amostral da resposta para qualquer valor explicativo é β0 + β1x (MORETIN; SINGER, 2022MORETIN, P. A.; SINGER, J. M. Estatística e ciência de dados. São Paulo: LTC, 2022.).

A Tabela 6 apresenta os coeficientes de correlação de Pearson (R) e de determinação (R²) alcançados considerando as profundidades reais como variável resposta e estimadas como explicativa. De acordo com Mukaka (2012)MUKAKA, M. M. A guide to appropriate use of correlation coefficient in medical research. Malawi Medical Journal, v. 24, n. 3, 2012., coeficientes de correlação entre 0,70 e 0,90 indicam forte correlação, portanto se pode afirmar que os dados estimados possuem forte correlação positiva com os dados reais, com R igual a 0,83.Já o coeficiente de determinação busca explicar a variação de um fator com base nas alterações do outro, ou seja, neste caso, cerca de 68% (R² = 0,68) das variações nos dados reais podem ser explicadas pelas variações dos dados estimados.

No que tange aos resíduos, a Figura 10a apresenta o histograma que possibilita verificar a suposição de normalidade. É possível observar que os resíduos se ajustam à curva de Gauss, apresentando pequena assimetria à esquerda e dispersão dos valores. Felix, Cazzaredo e Possan (2021)FELIX, E. F.; CARRAZEDO, R.; POSSAN, E. Carbonation model for fly ash concrete based on artificial neural network: Development and parametric analysis. Construction and Building Materials, v. 266, 2021. afirmam que ruídos da ordem de 5,0 mm são aceitáveis como régua de medição da profundidade de carbonatação, ou seja, os valores estão acima do aceitável. Os valores dos resíduos, como visto na mesma figura, concentram-se na faixa entre -5,0 mm e 5,0 mm, dentro do aceitável.

Todavia, nenhum modelo representa perfeitamente a realidade, mas vale a pena valorizar análises de regressão em favor de permitir suposições/previsões. Se a suposição de linearidade (Figura 10b) for violada mais do que uma pequena quantidade razoável, a regressão perde seu significado. A regressão linear é bastante robusta para a suposição de normalidade, sendo preciso apenas se preocupar com violações graves. Neste estudo, os resíduos apresentam bom ajuste à linearidade na probabilidade normal.

Contudo, é preciso avaliar também a variâncias dos resíduos na Figura 11. É possível notar que, quanto maior a profundidade de carbonatação prevista, menor será a possibilidade de se manter homocedasticidade, ou seja, variâncias constantes.

Em toda a extensão de profundidades previstas, os resíduos estão entre -15,0 mm e 15,0 mm, entretanto, à medida que os valores previstos aumentam, os resíduos também crescem. Isso pode ser explicado pelo fato de que o modelo europeu apresentou pequena porcentagem de dados da amostra com profundidades de carbonatação superiores a 30,0 mm, o que resultou em maior variabilidade de resíduos a partir desse valor. Uma possível solução para esse problema é revisitar este estudo avaliando o avanço da carbonatação com mais de 10 anos de exposição das mesmas amostras.

Tabela 6
Estatística da regressão linear entre dados reais e estimados

Figura 10
Histograma (a) e gráfico de probabilidade normal dos resíduos (b) resultantes da regressão linear entre dados reais e estimados

Figura 11
Gráfico de valores previstos e resíduos da regressão linear entre dados reais e estimados

Por fim, através do gráfico de dispersão (Figura 12) é possível compreender os coeficientes de correlação e determinação entre as variáveis. É visível que o aumento de uma variável reflete na outra, o que justifica a forte correlação entre elas. Entretanto, nem todas modificações realizadas nos valores de uma variável refletem igualmente na outra, o que justifica R² igual a 0,68.

A Figura 13 apresenta as profundidades de carbonatação ao longo dos 10 anos com dados reais e estimados. Observa-se que os valores reais diferem dos estimados, em que é possível notar as diferenças nas inclinações das curvas de carbonatação no início (até 1 ano) e fim (entre 9 e 10 anos), retratando o que foi visto nos agrupamentos de médias. O modelo, quando aplicado em território brasileiro, não se ajustou à curva de carbonatação dos corpos de prova, cujo processo ocorreu acentuadamente no início e atenuou-se nas últimas idades.

Dessa forma, buscando identificar quais fatores apresentaram melhores ajustes à curva de carbonatação, avaliaram-se os coeficientes de correlação e determinação resultantes da regressão linear. Esses parâmetros permitem que sejam identificadas as curvas obtidas pelo CEB Bulletin 34 (COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.) que mais se aproximam da curva real e podem indicar um possível ponto de partida para futuras modificações do modelo europeu.

Para isso, as medições individuais foram separadas de acordo com as variáveis independentes, e os valores R e R² estão discriminados na Tabela 7. As colunas esverdeadas apontam as variáveis independentes que apresentaram maiores valores, isto é, melhores ajustes, enquanto as avermelhadas identificam os que não alcançaram os valores de referência. Entende-se como valores de referência aqueles atingidos pelo conjunto de dados globais, sem distinção de grupos por variável independente.

Figura 12
Gráfico de ajuste de linha da regressão entre dados reais e estimados

Figura 13
Curvas de carbonatação real (azul) e estimada (laranja)

Tabela 7
Coeficientes de correlação e determinação oriundos das regressões lineares entre dados reais e estimados separados por grupos de carbonatação

Esses resultados reforçam o caráter genérico do modelo que busca estimar frentes de carbonatação de diversos tipos de mistura sem grandes modificações na estrutura matemática. De todo o modo, a tabela indica que o modelo representa apropriadamente os efeitos do tipo de cura no desempenho dos concretos frente à carbonatação, isto é, além da distinção dos grupos de cura, os coeficientes de determinação foram superiores aos globais.

No que diz respeito à relação a/lig e ao tipo de adição, apenas os grupos 0,55 e com escória de alto-forno apresentaram melhores desempenhos, o que mostra que o fator R-1 NAC,0 não está bem ajustado para a identificação dos efeitos reais da relação a/lig e tipo de adição nas condições brasileiras. Logo, é fundamental que o método de determinação desse fator seja revisto com base em estudos avançados que incluam ensaios laboratoriais de carbonatação acelerada e natural em amostras controladas.

Esta seção buscou avaliar a aplicabilidade do modelo europeu sem fazer distinção quanto ao tipo de concreto, isto é, tipo de adição, relação a/lig e tipo de cura. Assim, estimar a profundidade com o modelo europeu dentro das condições de exposição do território brasileiro pode implicar resultados distintos dos reais. Essas divergências entre o modelo do CEB Bulletin 34 (COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.) e as profundidades de carbonatação reais dos corpos de prova são reflexo do acerto feito para as condições de origem do modelo, incluindo qualidade dos materiais, serviços e procedimentos de execução e condições climáticas/ambientais.

Considerações finais

Este trabalho analisou a aplicabilidade do modelo preconizado pelo CEB Bulletin 34 (COMITÉ..., 2006COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.), identificou os efeitos das variáveis independentes (idade, relação a/lig, tipos de adição mineral e cura) na profundidade de carbonatação e elencou os aspectos que merecem ser revistos para sua utilização em regiões de clima quente semiúmido, como na zona tropical Brasil Central. As principais conclusões estão descritas a seguir:

  1. foi identificada correlação forte (R = 0,83) na regressão linear entre os dados obtidos por medições em campo e estimados pelo modelo europeu. No entanto, o coeficiente de determinação indicou que apenas 68% dos dados reais poderiam ser explicados pelos dados estimados. Isso mostra que o modelo tem grande potencial de predição de frentes de carbonatação, mas, quando aplicado em condições diferentes das originárias, acaba tendo sua acurácia limitada, exigindo que ajustes sejam implementados;

  2. para ajustar o modelo internacional aos parâmetros nacionais é preciso realizar investigações que incluam ensaios laboratoriais e de campo com amostras controladas. Os ajustes do modelo devem ser voltados para os métodos de determinação dos fatores que o compõem, mais especificamente para a resistência inversa efetiva à carbonatação natural ao qual estão vinculados o tipo de adição mineral e a relação a/lig. Os efeitos deste fator - quando avaliados estatisticamente com base nos dados estimados - não foram condizentes com os efeitos principais do tipo de adição e relação a/lig determinados com base nos dados reais. É preciso que novas pesquisas nacionais sejam desenvolvidas para compreender melhor os princípios da resistência à carbonatação e transformá-los de acordo com critérios nacionais;

  3. a curva de carbonatação obtida com os valores calculados com o modelo europeu apresentou padrão semelhante, mas não atingiu valores próximos aos reais. As inclinações das curvas nas primeiras idades foram distintas, ou seja, o modelo não representou adequadamente o processo inicialmente acelerado da carbonatação. Já nas idades avançadaso modelo não foi capaz de representar a tendência à desaceleração do processo;

  4. quando feita a distinção das variáveis independentes, os coeficientes de correlação e determinação da regressão linear entre dados reais e estimados de alguns grupos de amostras elevaram-se. Entre os fatores que apresentaram melhores ajustes podem-se citar os dois tipos de cura, a relação a/lig 0,55 e a mistura com adição de escória de alto-forno. Melhores coeficientes não indicam que o modelo represente fielmente as profundidades esperadas, mas apenas que a curva de carbonatação por ele obtida apresenta padrão mais próximo da realidade; e

  5. No que tange ao agrupamento de médias, os dados reais atestaram que, em idades avançadas, a carbonatação tende a desacelerar, visto que as profundidades aos 9 e 10 anos foram vinculadas em um único grupo. Já o modelo europeu agrupou as medições individuais do primeiro ano (3, 6 e 10 meses), além de determinar grupos de tipo de adição e relação a/lig conforme validado na literatura, isto é, misturas com baixos teores de adição e relação a/lig apresentam melhor resistência à carbonatação.

Agradecimentos

Os autores, participantes do Grupo de Estudos em Durabilidade (GEDur), agradecem a Furnas Centrais Elétricas, Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ). O primeiro autor ainda agradece à Universidade de Rio Verde (UniRV) pela concessão de licença para capacitação com bolsa.

Referências

  • ALMEIDA, F. C. R.; SALES, A. Efeitos da ação do meio ambiente sobre as estruturas de concreto. In: RIBEIRO, D. V. (org.). Corrosão em estruturas de concreto armado: teoria, controle e métodos de análise. Rio de Janeiro: Elsevier, 2014.
  • AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS. E178: standard practice for dealing with outlying observations. Philadelphia, 2021.
  • ANDRADE, C. Calculation of initiation and propagation periods of service life of reinforcements by using the electrical resistivity. In: INTERNATIONAL RILEM SYMPOSIUM ON CONCRETE SCIENCE AND ENGINEERING: A TRIBUTE TO AMON BENTUR, Paris, 2004. Proceedings […] Paris: Rilem, 2004.
  • CASCUDO, O. et al. Evaluation of the pore solution of cocnretes with mineral additions subjected to 14 years of natural carbonation. Cement and Concrete Composites, v. 115, 2021.
  • CASCUDO, O.; CARASEK, H. Carbonatação do concreto. In: ISAIA, G. C. (org.). Concreto: ciência e tecnologia. 3. ed. São Paulo: Ibracon, 2022.
  • CASTRO, A. et al. Relationship between results of accelerated and natural carbonation in various concretes. In: INTERNATIONAL RILEM CONFERENCE OF USE OF RECYCLED MATERIALS IN BUILDINGS AND STRUCTURES, Barcelona, 2004. Proceedings […] Paris: Rilem , 2004.
  • CASTRO, A. Influência das adições minerais na durabilidade do concreto sujeito à carbonatação. Goiânia, 2003. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2003.
  • CHO, H. C. et al. Remaining service life estimation of reinforced concrete buildings based on fuzzy approach. Computers and Concrete, v. 15, n. 6, 2015.
  • COMITÉ EURO-INTERNATIONAL DU BETÓN. Model code for service life design. Lausanne, 2006. Bulletin 34.
  • EKOLU, S. O. Model for practical prediction of natural carbonation in reinforced concrete: Part 1-formulation. Cement and Concrete Composites , v. 86, 2018.
  • FELIX, E. F.; CARRAZEDO, R.; POSSAN, E. Carbonation model for fly ash concrete based on artificial neural network: Development and parametric analysis. Construction and Building Materials, v. 266, 2021.
  • FERREIRA, M. B. Estudo da carbonatação natural de concretos com diferentes adições minerais após 10 anos de exposição. Goiânia, 2013. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2013.
  • FERREIRA, M. B. et al. Avaliação da carbonatação natural ao longo do tempo de concretos com diferentes adições minerais. In: CONGRESSO BRASILEIRO DO CONCRETO, 54., Maceió, 2012. Anais [...] São Paulo: Ibracon , 2012.
  • GASTEC CORPORATION. Concentration unit conversion. Disponível em: https://www.gastec.co.jp/en/technology/knowledge/concentration/ Acesso em: 14 set. 2022.
    » https://www.gastec.co.jp/en/technology/knowledge/concentration/
  • HELENE, P. R. L. Vida útil das estruturas de concreto. In: CONGRESSO IBEROAMERICANO DE PATOLOGIA DAS CONSTRUÇÕES, 4., Porto Alegre, 1997. Anais [...] Porto Alegre, 1997.
  • INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Mapa de clima do Brasil. 1:5 000 000. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, 2002. Disponível em: Disponível em: https://www.ibge.gov.br/geociencias/cartas-e-mapas/informacoes-ambientais/15817-clima.html?=&t=acesso-ao-produto Acesso em: 20 set. 2022.
    » https://www.ibge.gov.br/geociencias/cartas-e-mapas/informacoes-ambientais/15817-clima.html?=&t=acesso-ao-produto
  • INSTITUTO NACIONAL DE METEOROLOGIA. Histórico de dados meteorológicos: dados históricos anuais (2002/2022). Brasília, 2022. Disponível em: Disponível em: https://portal.inmet.gov.br/dadoshistoricos Acesso em: 15 ago. 2022.
    » https://portal.inmet.gov.br/dadoshistoricos
  • LIU, P.; YU, Z.; CHEN, Y. Carbonation depth model and carbonated acceleration rate of concrete under different environment. Cement and Concrete Composites , v. 114, 2020.
  • LONDHE, S. N. et al. Carbonation coefficient using artificial neural networks and genetic programming. Journal of Building Engineering, v. 39, 2021.
  • MALAMI, S. I. et al. Implementation of hybrid neuro-fuzzy and self-turning predictive model for prediction of concrete carbonation depth: a soft computing technique. Results in Engineering, v. 10, 2021.
  • MORETIN, P. A.; SINGER, J. M. Estatística e ciência de dados. São Paulo: LTC, 2022.
  • MUKAKA, M. M. A guide to appropriate use of correlation coefficient in medical research. Malawi Medical Journal, v. 24, n. 3, 2012.
  • NEVILLE, A. M. Propriedades do concreto. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2015.
  • OTIENO, M.; IKOTUN, J.; BALLIM, Y. Experimental investigations on the effect of concrete quality, exposure conditions and duration of initial moist curing on carbonation rate in concretes exposed to urban, inland environment. Construction and Building Materials , v. 246, 2020.
  • PAPADAKIS, V. G.; VAYENA, C. V.; FARDIS, M. N. Fundamental modeling and experimental investigation of concrete carbonation. ACI Materials Journal, v. 88, n. 4, 1991.
  • PARROT, L. J. Review of carbonation in reinforced concrete. Buckinghamshire: Cement and Concrete Association, 1987.
  • PAUL, S. C. et al. An empirical model design for evaluation and estimation of carbonationdepth in concrete. Measurement, v. 124, 2018.
  • PIRES, P. F. Estudo da carbonatação avançada em concretos contendo adições minerais. Goiânia, 2016. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Programa de Pós-Graduação em Geotecnia, Estruturas e Construção Civil, Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2016.
  • POSSAN, E. et al. Model to estimate concrete carbonation depth and servisse life prediction. In: DELGADO, J. (ed.) Hygrothermal behaviour and building pathologies. New York: Springer, 2020.
  • POSSAN, E. Modelagem da carbonatação e precisão de vida útil de estruturas de concreto em ambiente urbano. Porto Alegre, 2010. Tese (Doutorado em Engenharia), Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010.
  • SENTLER, L. Stochastic characterization of carbonation of concrete. In: INTERNATIONAL CONFERENCE ON DURABILITY OF BUILDING MATERIALS AND COMPONENTS, 3., Espoo, 1984. Proceedings […] Espoo, 1984.
  • TAYLOR, H. F. W. Cement chemistry. London: Academic Press, 1990.
  • TUUTTI, K. Corrosionofsteel in concrete. Stockholm, 1982. Thesis (Doctoral Thesis) - Division of Building Materials, Swedish Cement and Concrete Research Institute, Stockholm, 1982.
  • VIEIRA, S. Teste das amplitudes múltiplas de Duncan. 2016. Disponível em: Disponível em: http://soniavieira.blogspot.com/2016/09/teste-de-amplitudes-multiplas-de-duncan.html#:~:text=O%20teste%20de%20Duncan%20compara,popula%C3%A7%C3%A3o%20s%C3%A3o%20declaradas%20significantemente%20diferentes Acesso em: 09 fev. 2023.
    » http://soniavieira.blogspot.com/2016/09/teste-de-amplitudes-multiplas-de-duncan.html#:~:text=O%20teste%20de%20Duncan%20compara,popula%C3%A7%C3%A3o%20s%C3%A3o%20declaradas%20significantemente%20diferentes
  • 1
    SAETTA, A. V.; VITALIANI, R. V. Experimental investigation and numerical modeling of carbonation process in reinforced concrete structures: part I: theoretical formulation. Cement and Concrete Research, v. 34, n. 4, 2004.
  • 2
    EUROPEAN COMMISSION. Durable and reliable tunnel structures: data report project GrD1-25633. Denmark, 2004.
  • 3
    EUROPEAN COMMISSION. Durable and reliable tunnel structures: data report project GrD1-25633. Denmark, 2004.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Jun 2023
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2023

Histórico

  • Recebido
    04 Out 2022
  • Aceito
    23 Fev 2023
Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído - ANTAC Av. Osvaldo Aranha, 93, 3º andar, 90035-190 Porto Alegre/RS Brasil, Tel.: (55 51) 3308-4084, Fax: (55 51) 3308-4054 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: ambienteconstruido@ufrgs.br