Acessibilidade / Reportar erro

A construção de um quadro analítico sobre as significações de espaço no contexto das mudanças organizacionais

The construction of an analytical framework on the meaning of space within the organizational change context

Resumos

Tempo e espaço são conceitos que estão na essência da construção da vida em sociedade e da própria constituição do ser. Na visão de autores como Giddens (1984) e Lefebvre (1991), a tradição sociológica tem, no entanto, dedicado maior atenção aos aspectos temporais da realidade social, relegando o espaço a um papel secundário. Este artigo se propõe a analisar como a noção de espaço e a dinâmica de sua produção influenciam a maneira como os indivíduos percebem as mudanças organizacionais, partindo da premissa de que as significações espaciais afetam a construção de suas identidades e suas possibilidades de subjetivação. O estudo faz parte de uma linha de pesquisa interinstitucional cujo objetivo é compreender a influência de tempo e espaço na produção da realidade organizacional e nos sentidos do trabalho. Os resultados, baseados nas experiências de 133 indivíduos em oito diferentes organizações, revelam que as mudanças são por eles percebidas e sentidas em termos das transformações que provocam nas práticas espaciais, nas representações de espaço e no espaço representacional, categorias apontadas por Lefebvre (1991) como fundamentais para que se compreenda a produção do espaço social. Nas conclusões, é proposto um quadro para análise da influência do espaço nas situações de mudança organizacional.

mudança organizacional; espaço; tempo; identidade; subjetividade


Time and space are concepts found in the essence of the constitution of society and of the being itself. For authors such as Giddens (1984) and Lefebvre (1991), sociological tradition has, however, dedicated greater attention to the time aspects of social reality, relegating space to a secondary role. This study aims to analyze how the notion of space and the dynamics of its production influence the manner in which individuals perceive organizational changes, assuming that the meaning of space affects their identities and subjectivities. The study is part of a research agenda which aims to understand the influence of time and space upon the production of organizational reality and on the meanings of work. The results, based on the experiences of 133 people in eight different organizations, reveal that changes are interpreted on grounds of the perceptions of spatial practices, representations of space and representational spaces, categories pointed out by Lefebvre (1991) as basic for the understanding of the production of social space. A reference framework for analyzing the influence of space in individuals' interpretations about organizational change is proposed.

organizational change; space; time; identity; subjectivity


ARTIGOS

A construção de um quadro analítico sobre as significações de espaço no contexto das mudanças organizacionais* * Trabalho desenvolvido com apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, por meio de projeto de pesquisa na área de Ciências Humanas, Sociais e Sociais Aplicadas (processo 401416/2004-6).

The construction of an analytical framework on the meaning of space within the organizational change context

José Roberto Gomes da SilvaI; Ursula WetzelII

IDoutor e Mestre em Administração de Empresas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro / PUC-Rio Professor e pesquisador do IAG/PUC-Rio. Endereço: Rua Marquês de São Vicente, 225 - Gávea. Rio de Janeiro - CEP: 22451900. E-Mail: jrgomes@iag.puc-rio.br

IIDoutora em Administração pelo COPPEAD-UFRJ; Professora Adjunta da área de Organizações, Estratégia e Sistemas - Instituto COPPEAD de Administração - UFRJ. Endereço: Rua 36 n. 255. Bairro: Cidade Universitária. Cidade: Rio de Janeiro. CEP: 21949900. Bairro: idade Universitária. Estado: RJ. País: BR. E-Mail: ursula@coppead.ufrj.br

RESUMO

Tempo e espaço são conceitos que estão na essência da construção da vida em sociedade e da própria constituição do ser. Na visão de autores como Giddens (1984) e Lefebvre (1991), a tradição sociológica tem, no entanto, dedicado maior atenção aos aspectos temporais da realidade social, relegando o espaço a um papel secundário. Este artigo se propõe a analisar como a noção de espaço e a dinâmica de sua produção influenciam a maneira como os indivíduos percebem as mudanças organizacionais, partindo da premissa de que as significações espaciais afetam a construção de suas identidades e suas possibilidades de subjetivação. O estudo faz parte de uma linha de pesquisa interinstitucional cujo objetivo é compreender a influência de tempo e espaço na produção da realidade organizacional e nos sentidos do trabalho. Os resultados, baseados nas experiências de 133 indivíduos em oito diferentes organizações, revelam que as mudanças são por eles percebidas e sentidas em termos das transformações que provocam nas práticas espaciais, nas representações de espaço e no espaço representacional, categorias apontadas por Lefebvre (1991) como fundamentais para que se compreenda a produção do espaço social. Nas conclusões, é proposto um quadro para análise da influência do espaço nas situações de mudança organizacional.

Palavras-chave: mudança organizacional; espaço; tempo; identidade; subjetividade.

ABSTRACT

Time and space are concepts found in the essence of the constitution of society and of the being itself. For authors such as Giddens (1984) and Lefebvre (1991), sociological tradition has, however, dedicated greater attention to the time aspects of social reality, relegating space to a secondary role. This study aims to analyze how the notion of space and the dynamics of its production influence the manner in which individuals perceive organizational changes, assuming that the meaning of space affects their identities and subjectivities. The study is part of a research agenda which aims to understand the influence of time and space upon the production of organizational reality and on the meanings of work. The results, based on the experiences of 133 people in eight different organizations, reveal that changes are interpreted on grounds of the perceptions of spatial practices, representations of space and representational spaces, categories pointed out by Lefebvre (1991) as basic for the understanding of the production of social space. A reference framework for analyzing the influence of space in individuals' interpretations about organizational change is proposed.

Keywords: organizational change; space; time; identity; subjectivity.

Introdução

Hillier e Hanson (1988) lembram que, de maneira óbvia, pode-se dizer que as sociedades humanas são, em sua essência, fenômenos espaciais. A ordem espacial da realidade social pode ser percebida nas manifestações da cultura e no estilo de vida de cada povo, ou, como observa Maffesoli (1993), "existe uma ligação estreita entre o espaço e o cotidiano" (p.203). Hillier e Hanson ressaltam, no entanto, que a sociedade não pode ser compreendida apenas segundo características observáveis: a sua própria constituição, seu processo de formação e de evolução estão impregnados de questões relacionadas à noção de espaço, de sua percepção e apropriação.

Conforme reflete Massey (1994), como uma categoria indissociável da noção de tempo, a dimensão espacial está na essência dos processos de mudança que ocorrem em qualquer grupamento humano. Não é possível falar em mudança, seja ela na sociedade como um todo, seja em uma organização, sem que se leve em conta as origens e implicações de sua dinâmica em termos das significações de espaço a ela associadas. Como afirmam Hillier e Hanson (1988):

A revolução agrícola, a formação de povoamentos fixos, a urbanização, o desenvolvimento do estado, a industrialização e até mesmo o crescimento do estado intervencionista moderno foram associados a mudanças na morfologia da sociedade, nas quais as mudanças sociais e espaciais parecem quase dimensões necessárias uma à outra. Diferentes tipos de formação social [...] requerem uma ordem espacial característica, assim como diferentes tipos de ordem espacial requerem uma formação social particular para sustentá-las. (HILLIER; HANSON, 1988, p.27, tradução livre dos autores)

Sobre a relação de inseparabilidade entre tempo e espaço, Lefebvre (1991) ressalta que, apesar de considerar absurdo tratar cada uma dessas categorias como uma existência per se (p.181), isolada da outra, é preciso buscar uma saída para a "obsessão tradicional" com que as ciências modernas trataram a noção de tempo em detrimento do espaço. Mesmo quando este tem sido levado em conta, as diferentes discussões ocorrem de maneira fragmentada, abarcando uma diversidade de significados, de acordo com a vontade de cada analista. A necessidade de resgate da importância da noção de espaço no entendimento da realidade social é também argumentada por Giddens (1984), para quem a tradição sociológica tem negligenciado essa dimensão, talvez, por uma falsa ponderação de que ela possui uma natureza menos complexa do que a noção de tempo. Assim, Lefebvre dedica-se à proposição de uma "reorientação do questionamento humano" (DEAR, 1997, p.49), de modo a se construir uma teoria unificante que pudesse expor a real produção de espaço, resumindo os vários tipos de espaço e as modalidades de sua gênese.

Lefebvre utiliza o termo "produção" para se referir à natureza social do espaço, o qual, segundo a sua proposta de teorização, não pode ser compreendido apenas no que se refere às suas propriedades físicas. Para ele, a noção de espaço só faz sentido quando provida de significação, uma vez que "o espaço nunca está vazio: ele sempre incorpora um significado" (p.154). Compreender a produção de espaço é, portanto, fundamental para que se compreenda a produção da ação em sociedade, bem como, conforme ressalta Strohmayer (1997), a própria constituição do ser.

Este artigo se propõe a analisar como a noção de espaço e a dinâmica de sua produção influenciam a maneira como os indivíduos percebem as mudanças organizacionais, partindo da premissa de que as significações espaciais afetam a construção de suas identidades e suas possibilidades de subjetivação. A análise ora realizada baseia-se sobretudo na proposta de Lefebvre (1991) e em diferentes reflexões sobre a produção do espaço elaboradas por outros autores que nela se inspiraram ou a ela se referenciaram de forma crítica. Articulando, ainda, conceitos como os de espaço social, lugar, espaço incorporado, espaço pessoal e território o artigo procura construir um quadro de referência que permita analisar a dinâmica das representações espaciais dos indivíduos sobre as situações de mudança.

O artigo faz parte de uma linha de pesquisa interinstitucional sobre tempo e espaço nas organizações e nas recentes transformações da realidade do trabalho. Busca, ainda, complementar a discussão realizada em outros trabalhos produzidos na mesma linha de pesquisa, os quais têm privilegiado a dimensão temporal nas situações de mudança. Os dados que serviram para a composição da análise foram obtidos a partir de estudos de campo sobre situações de mudança ocorridas em diferentes organizações brasileiras nos últimos sete anos, na tentativa de se obter insights que apontem para a possibilidade de metateorizações acerca do tema.

Conceituações de espaço

Shields (1997) ressalta que os usos da palavra espaço em diferentes ciências, tais como a antropologia, a geografia e a sociologia, são variados e, muitas vezes, até mesmo conflitantes, seja no interior de cada um desses campos de estudo, seja entre eles. Em todas essas disciplinas, autores como Low (2003), Massey (1994), Rämö (2004), Rodman (2003) e Shields (1997) observam uma atual tendência a entender o espaço como uma noção múltipla que leve em conta suas características, seus usos, suas interpretações e os pressupostos socioculturais que influenciam as percepções espaciais socialmente construídas.

Em sua proposta de teoria sobre o espaço, Lefebvre (1991) sugere a unidade entre três campos que, tradicionalmente, têm sido tratados de forma separada: o físico (da natureza), o mental (das abstrações lógicas e locais) e o social. Trata-se, segundo esse autor, de uma conceituação que se assenta sobre três eixos: (i) as práticas espaciais, (ii) as representações do espaço e (iii) o espaço representacional. As práticas espaciais dizem respeito às percepções sobre a dinâmica da produção e reprodução social, ou "aos fluxos, transferências e interações, físicos e materiais, que ocorrem no e ao longo do espaço" (Harvey, 1992, p.201), de maneira a garantir essa produção e reprodução. As representações espaciais compreendem os conhecimentos, signos, códigos e significações que permitem compreender as práticas espaciais e traduzi-las em uma linguagem. O espaço representacional envolve a significação das experiências na vida social ou, conforme observa Harvey (1992), corresponde às invenções mentais que "imaginam novos sentidos ou possibilidades para as práticas espaciais" (p.201). Nos termos de Lefebvre (1991), esses conceitos corresponderiam, respectivamente, a espaços percebidos, concebidos e vividos; as práticas espaciais acentuam a vida e hábitos cotidianos, as representações do espaço acentuam o aspecto conceitual do espaço e o espaço representacional dá ênfase ao simbólico e emocional.

Como observa Dear (1997), o conceito de espaço social é central às reflexões de Lefebvre, na medida em que ele representa tanto um campo de ação quanto base da ação em sociedade: as relações sociais se projetam no espaço, tornam-se inscritas nele e, nesse processo, produzem o próprio espaço. O espaço social é, portanto, ao mesmo tempo, um produto e um meio de produção.

Para Lefebvre, o espaço é vivido antes de ser percebido e produzido antes que possa ser lido. Assim, o autor critica, igualmente, aqueles que desvinculam a noção de espaço da prática social que lhe confere significado e os que superestimam a importância da linguagem, colocando-a em um "pedestal epistemológico" (DEAR, 1997, p.54) e subestimando o valor do espaço. Para ele, toda linguagem é localizada no espaço. A linguagem teria, então, o papel de auxiliar a compreensão da transição dos espaços representacionais (no âmbito do vivido) para as representações de espaço (no âmbito dos conceitos).

Ford e Harding (2004) procuram fazer uma diferenciação entre as noções de espaço e lugar, embora as reconheçam como conceitos interligados que não podem ser concebidos de modo não dissociado. Na visão de tais autores, o lugar (place) representaria o "aqui e agora da percepção imediata", enquanto o espaço (space) seria o pano de fundo no qual a materialidade do lugar encontra as condições políticas e econômicas globais" (FORD; HARDING, 2004, p.817). Rämö (2004), por sua vez, associa os conceitos de space e place às expressões gregas chora e topos, as quais representariam, respectivamente, o espaço abstrato e o lugar concreto. Na ótica de Lefebvre, o espaço social contém e atribui lugares apropriados para as relações de produção e reprodução (incluindo a reprodução biológica e a reprodução das relações sociais e de poder), o que resulta na existência de espaços dominantes capazes de moldar espaços subordinados periféricos (DEAR, 1997).

Massey (1994) observa, no entanto, que existe, em parte dos estudos sobre o tema, a tendência de alguns autores a associarem a noção de lugar à esfera do local exclusivamente material, enquanto o espaço estaria associado a uma visão mais global e interpretativa da realidade social. Essa seria, no entanto, uma categorização que implicaria o risco de se reduzir ambos os conceitos, uma vez que ambos são relativos e subjetivos. Conforme pondera Dear (1997), eles representam camadas do mesmo tecido espacial que se interpenetram. Além disso, lembram Ford e Harding, a noção de lugar implicaria um complexo imbricamento de realidades materiais e territoriais com significados psicológicos e sociais. Segundo Rodman (2003), assim como os espaços, os lugares não são, tampouco, elementos inertes. Eles são "construções locais e múltiplas, politizadas, culturalmente relativas, historicamente específicas" (p.205). Não são simplesmente configurações nas quais a ação social acontece, nem meros reflexos da sociedade. Conforme reflete Giddens (1984, p.367), "a atividade social tem lugar (takes place) em diferentes locais, mas isso não pode ser entendido simplesmente como uma localização passiva de tais atividades em uma situação particular". Rämö (2004) chama a atenção, ainda, para o fato de que a importância da noção de lugar, no sentido de "localizar", como fundamental à contextualização da ação humana, torna-se mais evidente quando se observa expressões antônimas a ela, tais como "retirar", "deslocar" e "desvincular", ou os sinônimos de contexto, como "quadro de referência", "situação", "ambiente", "clima" ou "atmosfera" (p.854).

Considerando que a atividade social se dá por uma sucessão de eventos, Kuper (2003) define ainda outro conceito importante para que se compreenda a lógica da produção social - o local (site), como um pedaço delimitado do espaço social, "um lugar socialmente e ideologicamente demarcado e separado dos outros lugares" (p.258). Trata-se, portanto de um conceito que lida com a noção de diferença, com a necessidade de se compreender de modo contextualizado a ação e o processo de significação dos eventos sociais. Como afirma a autora, "é necessário entender porque ações específicas acontecem em um local específico e não em qualquer outro local" (p.258). Um local pode ser, então, uma sala, uma casa, um edifício, uma rua ou um país. Assim como a noção de lugar, o local não é definido apenas por suas características geográficas ou físicas, mas em termos da maneira como o espaço social é organizado, por um conjunto de referências, tais como os valores, a linguagem, as estruturas que envolvem os grupos em interação e que definem a política do espaço.

Espaço, identidade e subjetividade

Para Giddens (1984), o sentido de lugar parece ser de importância fundamental na sustentação da segurança ontológica do indivíduo, porque fornece um elo psicológico entre a sua biografia, sua trajetória de vida e os locais (ou as configurações de espaço-tempo) nos quais ele se move. O autor pondera ainda que:

No projeto reflexivo do eu, a narrativa da auto-identidade apresenta uma fragilidade que lhe é inerente. A tarefa de forjar uma identidade distinta pode ser capaz de trazer ganhos psicológicos específicos, mas também é claramente um peso. Uma auto-identidade precisa ser criada e, de certa forma, reordenada contra o pano de fundo das experiências cambiantes da vida diária e das tendências fragmentadas das instituições modernas. Ademais, a sustentação de tal narrativa afeta diretamente, e até certo ponto ajuda a construir, tanto o corpo quanto o eu. (GIDDENS, 2002, p.172, tradução livre dos autores)

Natter e Jones III (1997) ressaltam que qualquer discussão sobre identidade, em torno de qualquer forma de autocategorização, tal como gênero, sexualidade, raça ou classe, envolve necessariamente a questão das fronteiras nas quais as identidades se circunscrevem e de como elas se constituem. Como observam Halford e Leonard (2003), não apenas as pessoas constroem espaços, mas os espaços podem ser usados para construir as pessoas, tanto em termos de restrições e oportunidades de ação, quanto em termos da construção de suas identidades. Van Loon (2002) defende, ainda, a necessidade de se compreender a noção de sujeito a partir da exterioridade de seus desejos ou, em outras palavras, de uma perspectiva relacional.

Massey (1994) lembra, entretanto, que, apesar da influência espacial mais imediata dos lugares na constituição das identidades, estas não podem ser entendidas como isoladas de um contexto maior, da influência de outras realidades que transcendem às fronteiras locais. Além disso, as identidades são fluidas e múltiplas, na medida em que se reconstruem continuamente e que são percebidas de modos diferenciados por indivíduos e grupos (p.121). Halford e Leonard (2003) observam que a própria noção de self não pode ser entendida como a idéia de um sujeito fixo e historicamente transcendente, mas como um elemento em construção, dependente, em algum grau, dos recursos imediatos disponíveis no tempo-espaço.

Mesmo quando se trata da existência corpórea nas situações cotidianas de copresença, Giddens (1984) pondera sobre a importância do sentido de espaço na consciência de si (p.65, tradução livre dos autores):

O "aqui" do corpo se refere não a uma determinada série de coordenadas mas à situação do corpo ativo orientado em direção às suas tarefas [...] a imagem do corpo é finalmente um modo de estabelecer que o meu corpo está no-mundo

.

Low (2003) opta por utilizar a palavra corpo(body) para se referir às características biológicas e sociais e usa incorporação (embodiment) como um termo associado à experiência perceptiva e aos modos de presença e engajamento no mundo. Partindo desses conceitos, a autora define como espaço incorporado(embodied space) a localização na qual "a experiência e a consciência humanas tomam forma material e espacial" (LOW, 2003, p.10). A noção de espaço incorporado estaria ligada, portanto, à maneira como ocorre a apropriação e transformação do espaço pelos indivíduos, o que Hall (2003) categoriza como proxemia.

Para fins deste artigo, o conceito de espaço incorporado é assumido como referente à parcela do espaço social na qual o sujeito percebe a sua inclusão, envolvendo a multiplicidade de locais que fazem parte de sua experiência de vida, influenciando suas possibilidades de ação, a afirmação de seu espaço pessoal, de suas identidades e de suas percepções de territorialidade. Essa tentativa de entender o sujeito da perspectiva de sua incorporação no espaço é coerente com a tese defendida por Olivier (1995), para quem o sujeito se constrói por meio das ações e relações que é capaz de constituir, além de corroborar com as idéias de Van Loon (2004), para quem:

Precisamos situar o desejo de identidade, da completude do corpo-sujeito, como uma exterioridade. Por isso, é analiticamente frutífero falar em incorporação (embodiment) em vez de corpo e articular isso em termos de "espacialização", em vez de "espaço". (p.90, tradução livre dos autores)

Fischer (1997) se refere ao conceito de espaço pessoal para caracterizar a existência de um "muro ou bolha psicológica" (p.16) que nos delimita com relação aos outros a nossa volta e que varia em função de fatores psicológicos e culturais. Trata-se de um conceito não relacionado apenas ao espaço material ao redor do corpo, à esfera que contém os movimentos ou atividades físicas, mas também às distâncias mantidas nas relações sociais.

Na visão de Low (2003), mesmo a percepção sobre o espaço ocupado pelo corpo pode não ser definida exclusivamente por uma fronteira física fixa, mas pelas fronteiras percebidas que mediam as experiências vividas e a interação social. A percepção desse espaço pode contrair-se ou expandir-se, em função das emoções e do estado da mente da pessoa, do senso de si, das relações sociais e das predisposições culturais. Como exemplo da dependência dos estados mentais, a autora toma emprestada uma ilustração gerada por Harold Searle sobre um paciente esquizofrênico que, ao tentar expressar para o seu médico algo sobre o mundo no qual habita, o surpreende com a seguinte sentença: "Doutor, o senhor não sabe como ele é, olhando para o mundo através destes olhos quadrados". Para esse paciente, as fronteiras de seu corpo e da sala (cujas janelas são os "olhos quadrados") não podem ser diferenciadas. Seu corpo é a sala, e toda experiência e interação social é mediada por essa percepção. Como exemplo da dependência das predisposições culturais, Low menciona o fato de que a cultura ocidental tende a assumir como um a priori cultural o conceito de self como algo naturalmente situado no corpo e que funcionaria como a pele social que define nossas relações com o mundo.

A distância seria, segundo Fischer (1997), um mecanismo de regulação importante, por meio do qual os indivíduos tendem a preservar o seu espaço pessoal e a definir a sua forma de interação com os outros, variando em função da personalidade dos sujeitos, de fatores individuais, tais como idade e status social, de fatores interpessoais, tais como a atração, de fatores situacionais (elementos físicos ligados ao contexto) e de fatores culturais.

Além da noção de espaço pessoal, igualmente importante para que se entenda a maneira como o indivíduo percebe a sua relação espacial com o mundo é o conceito de território, o qual se refere ao modo de demarcação, apropriação e personalização do espaço (FISCHER, 1997). Enquanto o espaço pessoal fornece ao indivíduo uma possibilidade de definir a fronteira entre ele e o mundo à sua volta, a territorialidade permite-lhe definir e preservar a parcela do espaço exterior sobre a qual ele pode exercer controle. Quanto mais públicos, ou menos privados ou primários forem os territórios, menos controle direto o indivíduo tende a exercer e mais tende a estar subordinado a regras ou instituições sobre o seu acesso e uso.

As discussões de autores como Fischer (1997), Giddens (2002), Halford e Leonard (2003), Massey (1994), Olivier (1995) e Van Loon (2004) permitem afirmar que o modo de incorporação e apropriação do espaço constitui uma fonte importante para que se compreenda a constituição do sujeito e de suas múltiplas identidades. Nesse sentido, assevera Van Loon (2004), é importante que se entendam as narrativas ou as manifestações reflexivas sobre as múltiplas formas de espacialização (ou de incorporação do espaço) e ritmos que fazem parte do fluxo da vida cotidiana, sobre as diferentes expressões do estar-no-mundo.

Mudanças organizacionais e representações de espaço

Segundo Lefebvre (1991, p.46), "a passagem de um modo de produção (social, sic) para outro é da mais alta importância teórica". Como cada modo de produção tem seu próprio espaço particular, a mudança de um modo a outro implica, necessariamente, a produção de um novo espaço. Harvey (1992) observa, por exemplo, que uma das características marcantes da passagem de um modelo de produção fordista para o sistema de produção just-in-time foi a reconfiguração da maneira de conceber o espaço, de uma ótica de especialização (centralização/descentralização) e divisão espacial do trabalho para uma visão de aglomeração e integração espaciais.

Boltanski e Chiapello (1999), ao analisarem as recentes transformações do sistema capitalista, fazem menção a diferentes aspectos que podem ser associados a reconfigurações de espaço. No âmbito da sociedade global, observa-se, por exemplo, a própria redefinição da geografia do mundo, após a queda do muro de Berlim, além da reconfiguração na distribuição do poder econômico, com a emergência de um terceiro pólo capitalista na Ásia e do crescimento da importância de países como a Espanha. No âmbito do discurso da gestão, as mudanças se fazem sentir, por exemplo, nas imagens construídas para representar os modelos organizacionais: no meio de produção fordista, a organização se assemelharia a uma pirâmide estática e segmentada, na qual cada camada vertical é responsável por um nível de abstração do processo produtivo, enquanto cada "fatia" vertical pode ser associada a um nível de especialização funcional (HARVEY, 1992); no modelo de acumulação flexível, pós-fordista, a imagem mais apropriada para representar a organização seria a de uma rede dinâmica.

Na metáfora da rede, as fronteiras espaciais se rompem, uma vez que a organização passa a ser vista como uma conjunção de ligações contratuais mais ou menos duráveis, nas quais as equipes não são compostas exclusivamente de pessoal permanente na empresa, mas incorporam uma variedade de atores que compreendem fornecedores, clientes, consultores e especialistas externos. Além disso, os membros de tais equipes não necessariamente atuam juntos, em termos físicos, uma vez que o progresso das telecomunicações lhes permite trabalhar à distância.

Nesse discurso, a organização é substituída pela imagem de uma rede flexível com fronteiras voláteis, vista como um nó de uma rede maior de alianças. No discurso dessa organização em rede, cujas inconsistências têm sido objeto de inúmeras críticas, reconfiguram-se papéis e significados na organização do espaço: gerentes voltados para o controle passam a ser vistos como gestores que focalizam a inovação e a manutenção da conectividade da rede; a organização em torno de tarefas é substituída pela organização por projetos, pela composição de equipes autônomas interconectadas; e a imagem das relações de trabalho é a da mobilidade, da empregabilidade, na qual o indivíduo, consciente e autogestor de suas habilidades, deve estar pronto para construir uma carreira desvinculada de um único espaço organizacional (BOLTANSKI; CHIAPELLO, 1999).

Tais mudanças na sociedade e no contexto das organizações têm conduzido a um crescente número de estudos que procuram compreender a relação que elas guardam com o próprio significado de organização, com a dinâmica de sua produção e seus efeitos para os indivíduos e para os propósitos da gestão.

Nos últimos anos, alguns autores, em diferentes áreas, têm se dedicado a entender como as reconfigurações de espaço inerentes às mudanças nas organizações afetam a maneira como os indivíduos entendem a realidade organizacional e a sua própria existência nessa realidade. Gustafsson (2002) observa, por exemplo, o quanto a reconfiguração da arquitetura em uma empresa em processo de mudança, influenciou, de modo intencional, a maneira como os indivíduos percebiam o conteúdo do trabalho, os comportamentos individuais, as relações interpessoais e a própria identidade organizacional. Milligan (2003), por sua vez, descreve uma situação em que a simples mudança física de lugar de uma organização (uma coffee house) assumiu, para boa parte de seus empregados, o significado de uma perda irreparável em suas identidades e de uma verdadeira morte organizacional.

Em face da natureza profunda das transformações na sociedade em geral e, mais particularmente, no contexto do trabalho, com a globalização e a inserção crescente da tecnologia da informação e da comunicação, outros autores têm se dedicado também a entender como tais mudanças têm levado a sociedade e os indivíduos a reconstruírem a própria noção de espaço. Como exemplo, Gotved (2002) propôs o que chamou de uma "tipologia do espaço online" que ajudasse a compreender como a comunicação via computador influencia nas interpretações dos indivíduos sobre o espaço e sobre as interações sociais mediadas por essa tecnologia.

Encontram-se também, na literatura recente, autores que seguem mais explicitamente a tradição moderna de tratar espaço e tempo como categorias de gestão que podem ser "administradas" em prol de objetivos traçados (exemplos: BRADLEY; WOODLING, 2000; GIBSON, 2003; ROBERTSON, 2000).

Este artigo segue, entretanto, a proposta de discussão de autores como Cooren e Fairhust (2004) e Jones, McLean e Quattrone (2004), para quem a noção de organização, em vez de uma entidade reificada, deve ser compreendida como uma realidade continua e subjetivamente construída no tempo-espaço. De tal perspectiva, não há sentido em se diferenciar a noção de organizing, tal como utilizada por Weick (1995), das noções de spacing e timing, uma vez que as representações e significados de espaço, tempo e organização são inerentes à dinâmica das construções intersubjetivas da realidade.

Um exemplo que ilustra essa maneira de procurar entender a relação entre mudança, organização e espaço (e, de forma indireta, o tempo que, por questões de delimitação, não é abordado em profundidade neste artigo) é a reflexão promovida por Ford e Harding (2004). Analisando as narrativas de indivíduos posicionados em diferentes níveis da hierarquia em dois hospitais que passavam por um processo de fusão, tais autores observaram que o que se convenciona chamar de "organização" emerge, na percepção de tais indivíduos, como uma presença metafísica jamais possível de ser objetivada como uma entidade concreta.

Na fala daqueles que ocupam os níveis inferiores da hierarquia, principalmente os enfermeiros, o termo "organização" poucas vezes é sequer mencionado e, quando o é, surge apenas para expressar algo externo à realidade cotidiana, dos corredores do hospital. Para esses indivíduos, a organização que de fato importa, aquela que contribui para que dêem sentido à sua ação, para que construam as suas identidades, é o lugar em que essa ação se desenvolve, manifestada nas relações imediatas, nas instalações físicas povoadas por pacientes, colegas de trabalho e chefes de serviço.

Na fala dos gerentes, por outro lado, desaparece o sentido de lugar da ação propriamente dita. O que surge é a idéia de um espaçoconceitual, descrito em termos de organogramas, departamentos e mapas de poder. O espaço do gerente não é o espaço de um escritório, mas o de "toda a organização" (p.822): em seu discurso, ele circula por vários lugares, simultaneamente, enquanto representa a si mesmo, tanto como sujeito quanto como objeto desse espaço. Ford e Harding sugerem, então, que, na linguagem do indivíduo desse nível intermediário, gerente (ele mesmo) e organização se transformem em "um", tornando sem sentido o dualismo entre agência e estrutura. No espaço incorporado que é objeto de seu discurso, ele projeta seus desejos e experimenta o poder que lhe permite ser sujeito, mas, ao mesmo tempo, ele está sujeito a uma estrutura de poder.

Na fala dos executivos do mais alto nível hierárquico, as situações, as ações e as coisas materiais são representadas por números, por metas e por planos. Tal espaço abstrato é definido em termos da existência de um sujeito também abstrato, nesse caso o cliente, para quem apontam todas as estratégias e cujos desejos devem condicionar todo o comportamento dos trabalhadores. O executivo se projeta, então, na figura de um "paciente ideal" (p.826) do hospital, o qual assume o status de todos os pacientes. Nesse nível, observam Ford e Harding, a organização é uma representação meramente metafísica: o que é comunicado é uma organização como o simulacro de um espaço abstrato ocupado por um cliente abstrato e servido por empregados abstratos.

O que Ford e Harding tentam mostrar é que, nesses três diferentes níveis, a organização, como instituição reificada, como presença material, tal como tradicionalmente representada nos estudos organizacionais, não existe de fato. O que existem são formas de compreensão da dinâmica da vida e, concomitantemente, de suas formas de espacialização e temporalidade.

Características metodológicas do estudo

Este estudo faz parte de uma linha de pesquisa contínua e cooperativa entre duas escolas de administração brasileiras, cujo foco aborda questões relativas a tempo e espaço nas situações de mudanças organizacionais. Utiliza-se como base de análise do estudo um corpus de dados obtido por meio de 133 entrevistas em profundidade com participantes nas mudanças ocorridas em oito diferentes organizações, nos anos de 2000 e 2001. As pesquisas originais que produziram esses dados, realizadas pelos mesmos autores deste artigo, versavam sobre a análise do comportamento humano, da comunicação e das relações de trabalho nas situações de mudança. A observação de que os dados se mantinham atuais, para fins de análise, bem como a de que as opiniões dos indivíduos entrevistados apontavam para importantes questões espaço-temporais serviu de inspiração para a constituição desta linha de pesquisa, na qual, por questões de delimitação de escopo, optou-se por separar as análises das dimensões de espaço e tempo.

Para a composição deste artigo, os dados foram integralmente reanalisados e recategorizados, com base em tópicos semelhantes, presentes no roteiro de todas as entrevistas, as quais, em todas as organizações, mesclavam indivíduos da base e do nível de gerência intermediária e possuíam inúmeras similaridades metodológicas. Tais tópicos requeriam que os entrevistados desenvolvessem narrativas acerca de suas percepções sobre os processos de mudança de que participavam ou haviam participado em suas organizações. Essas narrativas foram utilizadas, portanto, como o recorte de análise para o estudo, uma vez que se percebia que nelas estavam contidas as principais referências sobre a maneira como os indivíduos lidavam com a noção de espaço. Espera-se que, dessa forma, a linha de pesquisa cumpra um de seus objetivos mais importantes: o de produzir metateorizações que propiciem um maior conhecimento sobre a dinâmica das mudanças nas organizações brasileiras.

São as seguintes, as principais características das situações de mudança analisadas - cujas respectivas empresas, por razões éticas, são identificadas por nomes fictícios:

TELECOM - empresa de serviços de telecomunicações, privatizada dois anos antes da realização das entrevistas, além de passar por um processo de fusão com outras congêneres (22 entrevistados);

TRANSFER - empresa de serviços de transporte, privatizada quatro anos antes da realização das entrevistas e adquirida por um grupo nacional (21 entrevistados);

CONCESSIONÁRIA A - empresa de distribuição de energia elétrica, privatizada quatro anos antes da realização do estudo e cuja gestão foi assumida por grupos estrangeiros (15 entrevistados);

CONCESSIONÁRIA B - Empresa do setor de serviços de infra-estrutura urbana, privatizada quatro anos antes da realização das entrevistas, passando a ser controlada por um grupo estrangeiro (15 entrevistados);

ACADÊMICA - fundação privada de ensino e pesquisa em administração e economia, cujas mudanças eram decorrentes de uma reconfiguração na estrutura de captação de recursos para as suas atividades (14 entrevistados);

BANCO - instituição financeira estatal, cujas mudanças eram decorrentes de redefinições da política governamental para o setor e para a empresa em particular (17 entrevistados);

SECRETARIA - órgão de fiscalização da administração direta municipal que vinha passando por importantes reestruturações, em função de um projeto de modernização de sua gestão, além de estar submetida às sucessivas mudanças de governo (14 entrevistados); e

FARMACÊUTICA - empresa multinacional do setor farmacêutico que vinha passando pelo terceiro processo sucessivo de fusão ou aquisição em 11 anos (15 entrevistados).

A análise dos dados inspirou-se inicialmente nos três eixos que compõem a categorização proposta por Lefebvre (1990), a saber: as representações de espaço, as práticas espaciais e o espaço representacional. No decorrer da análise, verificou-se, entretanto, a necessidade de subdividir o conteúdo das falas dos indivíduos referentes ao espaço representacional em três subcategorias, em função de sua complexidade: o espaço da empresa no mundo, o espaço organizacional e o espaço incorporado dos indivíduos. Na análise relativa a cada categoria, buscou-se priorizar o que de comum se revelava na fala dos diferentes entrevistados, em um esforço de extrair, a partir de suas narrativas individuais, maior compreensão sobre as estruturas perceptivas, cognitivas e afetivas (correspondentes às três categorias de Lefebvre) por eles compartilhadas.

As representações de espaço

Percebe-se, nas narrativas dos participantes das mudanças, nos diferentes casos analisados, a existência de elementos comuns que dizem respeito à percepção de novos conceitos que parecem nortear as transformações ocorridas nas organizações e no mundo à sua volta, bem como nos próprios indivíduos. Globalização de setores, mudanças na estrutura econômica e política no país e no mundo, necessidade de estabelecer maior foco na competitividade com vistas ao mercado, de construir maior foco no cliente, empregabilidade em lugar de estabilidade de emprego, bem como mudanças de regras regulatórias, são alguns dos fatores apontados como condições de contorno que modificam a lógica do trabalho e até mesmo da vida. Essas representações do espaço, por outro lado, são constantemente confrontadas com representações anteriores, nas quais a empresa operava em ambientes socioeconômicos menos duros, sofria menos a ação da concorrência e protegia mais seus empregados, propiciando-lhes certa segurança de sobrevivência. Mais do que simples elementos de um discurso geral, tais conceitos são utilizados pelos indivíduos como forma de constatação da emergência de uma nova ordem que modifica não apenas a lógica de funcionamento das organizações, mas a maneira como eles se percebem como profissionais e como entendem o seu futuro, seja nas organizações nas quais se encontravam, seja na continuidade de suas trajetórias de trabalho. São também conceitos que parecem provocar a necessidade de que os indivíduos revejam a sua identificação com as organizações, procurando enxergar a normalidade da vida organizacional e sua atuação no novo contexto.

No discurso dos indivíduos das quatro empresas privatizadas (TELECOM, TRANSFER, CONCESSIONÁRIA A e CONCESSIONÁRIA B) predomina, por exemplo, um sentimento de rompimento drástico com a lógica do passado, que faz com que eles precisem reconstruir o seu entendimento sobre a organização, sobre o sentido do trabalho, sobre o perfil desejado para o profissional no novo contexto e, em alguns casos, até mesmo sobre suas vidas. Nesses discursos, alguns dos conceitos direcionadores da nova ordem são: a competição, o poder das grandes multinacionais e dos grandes grupos econômicos, o enxugamento das estruturas, as terceirizações e os novos donos. Em contraposição, as referências à antiga ordem falam de continuidade, de rotinas burocráticas, de valorização da eficiência técnica, de influência da esfera política, de disputas por cargos de confiança, de diferenças entre "concursados" e "apadrinhados". O Estado passa do status de patrão para o de regulador, o cidadão comum passa de usuário a cliente real ou potencial, os antigos chefes se transformam em gerentes, a empresa passa a ter um dono, com nome e sobrenome corporativo (em alguns casos, um sobrenome estrangeiro) e o próprio indivíduo passa de funcionário a profissional de mercado. O discurso da mudança se confunde com o discurso de um "mundo novo" que faz com que todos os espaços, incluindo o espaço pessoal, tenham suas práticas reconstruídas e sejam reinterpretados e sentidos de um modo diferente do passado.

Mesmo nos casos em que as mudanças se assemelham menos a situações de rompimento com o passado, percebe-se, na fala dos indivíduos, a tentativa de ajuste de seus conceitos sobre a realidade observada e vivida. Um exemplo é o caso do BANCO, no qual, em meio às mudanças de política econômica do governo, emerge um forte discurso de mercado, em uma empresa centenária que, desde a sua fundação, pautou-se por uma lógica burocrática. Discurso semelhante se desenvolve na ACADÊMICA, onde a necessidade de buscar negócios parece invadir a antiga lógica da busca pela excelência, trazendo um sentimento de ambigüidade. No caso da SECRETARIA, por sua vez, o discurso do mercado e do foco no cliente, importados da lógica empresarial, mesclam-se com a idéia de um Estado em transformação, trazendo uma nova forma de conceituar aquilo que sempre se fez, segundo as mesmas regras e para o mesmo contribuinte, porém, agora, com um novo sentido, seguindo uma nova ordem, como se fosse preciso mudar o olhar sobre a realidade.

Merecem destaque, finalmente, as narrativas dos indivíduos da FARMACÊUTICA que, após 11 anos de sucessivas fusões, aquisições e reestruturações, parecem se dar conta de que todas essas mudanças estão inseridas em um movimento gigante de concentração de mercados, de um acelerado processo de globalização que fará com que a rotina do passado seja apenas a lembrança distante de uma fábrica pequena, uma "casinha" na qual, um dia, habitou uma feliz família perdida em um bairro da periferia.

As práticas espaciais

As práticas espaciais trazem à tona o espaço como um lugar, percebido em sua forma concreta. As mudanças na estrutura organizacional, associadas à transferência de unidades, fechamento de fábricas, centralização ou descentralização de funções, criação de núcleos regionais, reorganização de funções, transferências de pessoal, mudanças de layout em oficinas e escritórios, implantação de novas tecnologias de automação e de informação, afetam as práticas espaciais. Tome-se, como exemplo, a TRANSFER que, eliminando as paredes das salas, ampliou o campo de visão, alterou os espaços de circulação e modificou os códigos de conduta, favorecendo as situações de encontro e copresença. Como outro exemplo, tem-se a CONCESSIONÁRIA A que, implantando um sistema de comunicação por meio eletrônico, o Notes, enfraquece os deslocamentos de contínuos e motoristas, altera a noção de "comunicação interna", bem como seu sistema de produção, circulação e arquivamento.

Se os lugares se reconfiguram, reconfiguram-se também os territórios: profissionais especializados e experientes precisam lidar com novas tarefas, com novas esferas de atuação; gerentes deixam de ser agentes de controle de tarefa e passam a ser mentores, canais de contato com os clientes, agentes de controle da estratégica; fronteiras entre departamentos se desfazem, gerando a necessidade de que a ação seja vista de maneira interdependente; antigos colegas são excluídos do lugar e novos indivíduos são incorporados, redistribuindo as parcelas de poder sobre a ação cotidiana; e clientes passam a assumir um poder maior sobre a dinâmica do trabalho, condicionando a autonomia de atuação profissional.

O espaço pessoal, por sua vez, tende a ser comprimido pelas demandas intensas do trabalho e pelas múltiplas obrigações que concorrem entre si, na vida de cada um. Em um contexto comprimido, não há, muitas vezes, lugar para olhar para si mesmo, para suas próprias demandas. O indivíduo tende a ser cada vez mais absorvido pelos papéis ocupados nos diferentes lugares - como profissional, pai, mãe, cidadão.

As práticas espaciais revelam-se, portanto, como suportes concretos das representações do espaço, mantendo com ela uma relação próxima. Nesse sentido é que se pode entender a adoção de um sistema de comunicação interno à empresa, por meio do qual as hierarquias se aplainam e dão origem a um tráfego diferenciado de comunicação. É nesse sentido também que se pode compreender as modificações de layout, fazendo com que o empregado perca parte do controle de seu espaço mais nuclear de trabalho, agora freqüentado - visual e presencialmente - por colegas e clientes.

O espaço representacional

A noção de espaço representacional, por sua densidade e complexidade, foi subdivida, para efeito de análise, em três outras categorias: o espaço da organização no mundo, o espaço organizacional e o espaço incorporado. O primeiro diz respeito ao papel que a organização tem na sociedade, ou seja, trata da relação da empresa com seu ambiente. O segundo diz respeito à organização propriamente dita. O terceiro indica como os indivíduos se vêem, levando em conta não apenas seu ambiente mais imediato de trabalho mas também outras esferas de atuação (exemplos: família, sociedade).

O espaço da organização no mundo

As expressões do espaço organizacional como espaço representacional indicam que as organizações se encontram em mutação quanto ao seu papel primordial diante da sociedade. Assim, por exemplo, é o caso das empresas privatizadas TELECOM, TRANSFER, CONCESSIONÁRIA A e CONCESSIONÁRIA B que, ao passarem para o controle privado, passaram a prestar contas a acionistas e órgãos reguladores e intensificaram as interações com clientes e fornecedores. É o caso também do BANCO, que passou a ter a um enfoque maior na parte comercial, sem, no entanto, reduzir a ênfase em seu papel social e político. Caso similar se passou com a ACADÊMICA que, tendo tradição de pesquisa, lançou-se como fornecedora de cursos ao mercado, modificando parte de suas atividades internas para atender a esse novo papel. Esses casos ilustram mudanças, algumas mais, outras menos fundamentais, na razão de existência da organização, alterando por conseqüência seu relacionamento com o ambiente e modificando, em última instância, sua identidade. Ao falarem sobre o espaço da organização no mundo, os indivíduos tendem a se posicionar em termos de como se identificam com esses papéis e de como se vinculam às identidades organizacionais a eles associadas.

O espaço organizacional

Em suas narrativas sobre as mudanças, os indivíduos são capazes de compor imagens acerca da organização que vão além da simples descrição sobre as práticas espaciais: trata-se de um tipo de descrição valorativa que tende a construir sentido sobre a dinâmica da organização, à luz dos conceitos trazidos do passado e dos conceitos percebidos como característicos do novo tempo. Em tais narrativas, as organizações adquirem, simbolicamente, qualidades psicológicas e físicas que demonstram exercer influência sobre a maneira como os indivíduos com elas se identificam.

São comuns, por exemplo, observações de que a empresa do passado era mais baseada em regras e tornou-se mais informal (exemplo: FARMACÊUTICA), de que era mais estática e tornou-se mais dinâmica (exemplo: BANCO), de que a lógica "tumultuada" de tempos atrás deu lugar a uma forma de agir mais "arrumada" (exemplo: TRANSFER), de que a relação era mais autoritária e tornou-se mais aberta à participação (exemplo: CONCESSIONÁRIA B).

Tais narrativas são ricas na utilização de metáforas que parecem ajudar o indivíduo a expressar seus sentimentos e sua identificação com as diferentes "organizações" com que se defrontam, em função das mudanças ocorridas. Nas metáforas sobre a organização, os indivíduos alternam imagens positivas e negativas sobre o passado e o presente, revelando um esforço de ajuste da própria identidade. Tome-se, como exemplo, o caso da SECRETARIA: mesma organização do passado que é associada, por diferentes indivíduos, à imagem de uma "delegacia de polícia", por não ser sensível às dificuldades do contribuinte, é, em outros momentos das entrevistas, categorizada como uma instituição "profissional", defensora dos interesses da sociedade, em oposição às constantes tentativas de manipulação política.

Algumas metáforas são utilizadas de forma semelhante pelos participantes das diferentes situações analisadas. São comuns, por exemplo, as narrativas que descrevem a organização do passado como a "grande família", a "mãe", a "casa acolhedora". Há coincidências também no que se refere à imagem da nova organização como "um ambiente frio, de competição", no qual cada indivíduo é valorizado apenas por sua capacidade de gerar resultados. Poucos indivíduos produzem, no entanto, um discurso uniforme que atribua apenas características positivas ou negativas, seja à organização do passado, seja àquela que resultou das mudanças.

O próprio movimento da mudança é referenciado, por diversas vezes, de maneira metafórica. São diversas as imagens utilizadas para descrever o processo vivido, tais como: um "barco" que passa para levar aqueles que forem capazes de prosseguir; um "desmonte" da antiga organização, com a sua conseqüente reconstrução; e um "carro de som" que tenta conduzir uma massa de pessoas alienadas para um destino incerto e pouco promissor.

São comuns, ainda, as metáforas utilizadas para descrever os elementos que habitam o espaço organizacional, tais como: a "rádio corredor", utilizada para representar os canais de articulação entre os indivíduos; o "gerente trator" ou o "gerente paizão", usados para representar a imagem das lideranças próximas; e a "ilha da fantasia", utilizada para representar a visão alienada que muitos colegas alimentavam acerca da antiga organização.

O espaço incorporado

As narrativas dos indivíduos revelam, ainda, que as mudanças organizacionais que ocorrem no contexto atual tendem a alterar a noção de seu espaço incorporado (LOW, 2003), por diferentes razões. A primeira delas, um elemento comum às narrativas, é o fato de que, no novo contexto, o espaço do trabalho não tende mais a ser visto, prioritariamente, como o lugar da tarefa ou o ambiente organizacional, mas sim o mercado, para onde todas as atenções do indivíduo devem estar voltadas, caso deseje ter sucesso em suas funções e queira encontrar alternativas de sobrevivência. Há, na maioria dos entrevistados, uma consciência clara de que uma das características trazidas pela mudança é justamente a necessidade de se buscar, individualmente, uma desvinculação progressiva do espaço organizacional, de se pensar como um "profissional de mercado", empregável, que constrói a sua trajetória de carreira e o seu desenvolvimento de maneira mais autônoma.

Expressões como "contexto global" e "mercado de trabalho", endossadas pelo discurso da cúpula organizacional, tornam-se referências freqüentes que parecem ser utilizadas pelos indivíduos como uma base de comparação sobre as suas oportunidades e suas chances de sobrevivência. Esse discurso assume uma conotação mais reveladora, particularmente, entre aqueles que, no passado, construíram trajetórias profissionais fortemente vinculadas ao exercício de suas especialidades profissionais em uma única organização, como é o caso de alguns engenheiros e técnicos da CONCESSIONÁRIA A, os quais passam a se dar conta de que precisam descobrir novas competências, sob o risco de se tornarem candidatos à exclusão do mercado de trabalho em suas profissões.

Os diferentes lugares que compõem o espaço incorporado da vida tendem, ainda, a se amalgamar. O lugar do trabalho precisa ser também um lugar de aprendizagem, antes reservado à escola, aos ambientes de educação formal. As fronteiras entre a casa e o trabalho tendem a se desfazer, uma vez que as demandas do ritmo de trabalho intenso e a racionalidade da vida profissional subordinam a convivência em família e tendem a restringir o acesso àqueles que não fazem parte da rotina do trabalho, inclusive os amigos.

Um aspecto que demonstra relevância na maneira como os indivíduos caracterizam as situações de mudança é a forma como elas interferem na delimitação das fronteiras de seu espaço incorporado. Alguns tendem a atribuir uma conotação negativa a esse tipo de interferência, que pode ser associada a sentimentos de intrusão de novos elementos no espaço, bem como de compressão, de fragmentação ou mesmo de expansão de suas fronteiras.

Nas diferentes situações analisadas, o status de intruso pode ser associado a entidades diversas, tais como novos colegas ou gerentes, clientes, novos controladores ou trabalhadores terceirizados. Novos colegas tendem a assumir tal status, como nos casos da TRANSFER, da CONCESSIONÁRIA B e do BANCO, especialmente quando se aproximam da imagem do trabalhador que, acredita-se, é desejado pela organização no novo contexto. São adjetivos associados ao protótipo do "modelo de empregado no novo contexto": dinâmicos, ambiciosos, individualistas e competitivos. São, sobretudo na visão de alguns gerentes e profissionais especialistas, sobreviventes dos processos de mudança, pessoas mais jovens, mais atualizadas e com maior nível de formação, que, portanto, conseguem, rapidamente, ocupar um espaço considerável na rotina da organização e que, conseqüentemente, reduzem o espaço de ação e os níveis de oportunidade dos antigos. Na visão dos empregados antigos mais localizados na base da organização (exemplos: operários e auxiliares administrativos), os novos colegas tendem a ser vistos, ainda, como "rostos desconhecidos" que provocam estranhamento, com os quais, em um primeiro momento, é difícil construir uma relação de companheirismo ou mesmo de proximidade, dadas as distâncias culturais, de idade e de expectativas.

Clientes podem assumir a conotação de intrusos, na medida em que, extremamente valorizados nos novos discursos, passam a exercer uma influência decisiva no curso da ação. Em alguns casos, essa influência se opera de maneira indireta, na medida em que o cliente não é uma presença física no ambiente de trabalho, mas a sua referência está presente todo o tempo nas justificativas acerca das novas condições estabelecidas. Em outros casos, a influência se dá até mesmo no ambiente de trabalho, em função da maior aproximação física. Um exemplo é o caso da SECRETARIA, na qual a reformulação da atividade de atendimento aos contribuintes eliminou os antigos guichês que mantinham os funcionários "protegidos" em sua privacidade, uma vez que passaram a trabalhar em mesas localizadas diante de fileiras de cadeiras ocupadas por clientes em espera.

Conclusões

A identificação e análise das categorias anteriormente abordadas permitiu a proposição de um quadro de referência conceitual que pode ajudar a compreender a forma como os indivíduos percebem as mudanças organizacionais, em termos das configurações de espaço. Esse quadro de referência é apresentado na figura 1.


Na figura 1, as três formas de categorização do espaço identificadas por Lefebvre, as representações de espaço, as práticas espaciais e o espaço representacional, são associados, respectivamente, a holofotes, a objetos do mundo real e às projeções de tais objetos no plano das abstrações. O movimento da mudança seria percebido pelos indivíduos como a comparação entre dois diferentes contextos, representados pelas partes superior e inferior da figura.

O ângulo de inclinação, a direção e a intensidade da luz emitida pelos holofotes corresponderiam às mudanças percebidas pelos indivíduos, em termos dos conceitos que definem a lógica de cada contexto, ou seja, das representações de espaço. Tal como argumentado por Boltanski e Chiapello (1999) e Harvey (1992), observa-se, por exemplo, no discurso dos participantes das situações analisadas, uma convergência em torno da percepção de que as mudanças em curso nas organizações contemporâneas estão fortemente associadas a uma "mudança na ordem da própria sociedade". Essa mudança de conceitos fala da transformação de uma lógica na qual os espaços eram vistos como mais protegidos, os mercados tendiam a ser mais cativos, o Estado ocupava um papel de provedor do bem-estar social, as empresas enfrentavam um grau de concorrência baixa ou moderada e os empregos tendiam a ser duradouros, para outra na qual os espaços tendem a ser inteiramente permeáveis, a competição tende a ser acirrada, a globalização dos mercados é acompanhada por um desmantelamento do papel do Estado como provedor de bem-estar e os empregos tendem a ser fluidos, rompendo com a segurança ontológica dos indivíduos.

O nível das práticas espaciais, correspondente à parte central da figura, é, como sugere Lefebvre, o nível das percepções concretas acerca da organização, vista como um lugar no qual a ação se desenvolve, dos territórios que cada indivíduo considera ter construído nessa realidade e da maneira como eles entendem que seus espaços pessoais estão nela inseridos. Apesar de concretas, essas percepções não são independentes dos conceitos que as "iluminam". Quando mudam as premissas sobre a realidade, elementos do cotidiano que antes eram pouco percebidos tornam-se mais acentuados, enquanto outros que eram considerados importantes tornam-se ofuscados ou sombreados, em função dos novos ângulos assumidos pelos holofotes. Em outras palavras, mudam as práticas e muda também a leitura sobre elas, já que passam a ser "iluminadas por outras fontes".

O nível do espaço representacional, descrito por Lefebvre como o espaço das significações da experiência vivida, seria representado pelas projeções das percepções sobre as práticas no plano do abstrato, à luz dos conceitos que delineiam o sentido da realidade. Nesse plano estariam projetados os sentimentos sobre o espaço da empresa no mundo, o espaço organizacional e o espaço incorporado por cada indivíduo. Ao mesmo tempo em que tais representações podem ser entendidas como um produto dos conceitos e das percepções sobre as práticas, elas são também elementos que ajudam a reconstruir, de modo continuado, esses conceitos e práticas. O aprendizado sobre as experiências vividas faz com que os indivíduos "ajustem" o foco, a intensidade e o ângulo de seus holofotes e influenciem o curso das práticas cotidianas (o que é representado na figura 1 por meio das linhas pontilhadas que retornam à base dos holofotes). Conforme ponderado por Giddens (1984), estrutura e agência são dois lados complementares e interdependentes da construção da realidade social, o que equivale a dizer que os holofotes não são fixos.

Conforme indicado na figura 1, o conteúdo das narrativas analisadas sugere que, ao falarem sobre as práticas espaciais, os indivíduos tendem, em geral a descrever a sua relação com o mundo em termos das suas territorialidades e das suas possibilidades de constituição como agentes nessa realidade. Já no plano dos significados, a sua relação com o mundo tende a ser definida em termos de sua identificação com os objetos da realidade, nesse caso, a organização e os demais indivíduos e grupos, bem como de suas possibilidades de se sentirem sujeitos de sua própria existência.

Como resultado de um estudo exploratório acerca de um tema complexo, este artigo não se propõe a construir uma explicação inequívoca acerca da maneira como os indivíduos lidam com a noção de espaço nas situações de mudanças organizacionais e utilizam as configurações espaciais para dar sentido às suas experiências. Acredita-se, no entanto, que o quadro de referência proposto, por revelar um caráter dinâmico do processo de construção de significado acerca da realidade social, e por fundamentar-se, ainda que de forma simplificada, em teorias consistentes sobre esse processo, tais como a de Giddens (1984) e Lefebvre (1991), poderá contribuir para o aprofundamento das reflexões sobre a influência do espaço na vida organizacional. A utilização desse quadro para analisar outras situações de mudança pode fornecer subsídios para avaliar a sua consistência e complementar os elementos ora destacados.

Artigo recebido em outubro de 2006 e aceito para publicação em dezembro de 2006

  • BOLTANSKI, L.; CHIAPELLO, E. Le nouvel esprit du capitalisme Paris: Gallimard, 1999.
  • BRADLEY, S.; WOODLING, G. Accomodating future business intelligence: new work-space and work-time challenges for management and design. Facilities, v.18, n.3-4, 2000.
  • COOREN, F.; FAIRHUST, G. T. Speech timing and spacing: the phenomenon of organizational closure. Organization, v.11, n.6, p.793-824, 2004.
  • DEAR, M. Postmodern bloodlines. In: BENKO, G.; STROHMAYER, U. Space and social theory: interpreting modernity and postmodernity. Oxford: Blackwell, 1997. p.49-71.
  • FISCHER, G. N. Individuals and environment: a psychosocial approach to workspace. New York: de Gruyter, 1997.
  • FORD, Jackie; HARDING. Nancy. We went looking for as organization but could find only the metaphysics of its presence. Sociology, v.38, n.4, p.815-830, 2004.
  • GIBSON, V. Flexible working needs flexible space? Towards an alternative workplace strategy. Journal of Property Investment and Finance, v.21, n.1, p.12-22, 2003.
  • GIDDENS, A.. The constitution of society Berkeley: University of California Press, 1984.
  • ______. Modernidade e identidade 2.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002.
  • GOTVED, S. Spatial dimensions in online communities. Space & Culture, v.5, n, 4, 2002.
  • GUSTAFSSON, C. From concept to norm - an explorative study of office design management from an organizational perspective. Facilities, v.20, n.13-14, p.423-431, 2002.
  • HALFORD, S.; LEONARD, P. Space and place in the construction and performance of gendered nursing identities. Journal of Advanced Nursing, v.42, n.2, 2003.
  • HALL, E. T. Proxemics. In: LOW, S. M.; LAWRENCE-ZÚÑIGA, D. (Org.). The anthropolopy of space and place: locating culture. Malden: Blackwell, 2003. p.51-73.
  • HARVEY, D. Condição pós-moderna São Paulo: Loyola, 1992.
  • HILLIER, B.; HANSON, J. The social logic of space Cambridge: Cambridge University Press, 1988.
  • JONES, G.; McLEAN, C.; QUATTRONE, P. Spacing and timing. Organization, v.11, n.6, p.723-741, 2004.
  • KUPER, H. The language of sites in the politics of space. In: LOW, S. M.; LAWRENCE-ZÚÑIGA, D. (Org.). The anthropology of space and place: locating culture. Malden, MA: Blackwell, 2003. p.247-263.
  • LEFEBVRE, Henri. The production of space Malden, MA: Blackwell Publishing, 1991.
  • LOW, S. M. Anthropological theories of body, space and culture. Space & Culture, v.6, n.1, p.9-18, 2003.
  • MAFFESOLI, M. Le quotidien et le local comme espaces de la socialite. In: STRUCTURATION du social et modernité avancée. Sainte-Foy, CA: Les Presses de L´Université Laval, 1993. p.203-218.
  • MASSEY, D. Space, place and gender Minneapolis: University of Minnesota Press, 1994.
  • MILLIGAN, M. J. Loss of site: organizational site movies as organizational deaths. The International Journal of Sociology and Social Policy, v.23, n.6-7, p.115-152, 2003.
  • NATTER, W.; JONES III, J. P. Identity, space and other uncertainties. In: BENKO, G.; STROHMAYER, U. Space and social theory: interpreting modernity and postmodernity. Oxford: Blackwell, 1997. p.141-161.
  • OLIVIER, B. L'acteur et le sujet: vers un nouvel acteur économique. Paris: Desclée de Brower, 1995.
  • RÄMÖ, H. Spatio-temporal notions and organized environmental issues: an axiology of action. Organization, v.11, n.6, p.849-872, 2004.
  • ROBERTSON, K. Work transformation: integrating people, space and technology. Facilities, v.18, n.10/11/12, p.376-382, 2000.
  • RODMAN, M. C. Empowering place: multilocality and multivocality. In: LOW, S. M.; LAWRENCE-ZÚÑIGA, D. (Org.). The anthropolopy of space and place: locating culture. Malden, MA: Blackwell, 2003. p.204-223.
  • SHIELDS, R. Spatial stress and resistance: social meanings of spatialization. In: BENKO, G.; STROHMAYER, U. Space and social theory: interpreting modernity and postmodernity. Oxford: Blackwell, 1997. p.186-202.
  • STROHMAYER, U. Belonging: spaces of meandering desire. In: BENKO, G.; STROHMAYER, U. Space and social theory: interpreting modernity and postmodernity, Oxford: Blackwell, 1997. p.163-185.
  • VAN LOON, J. Social spatialization and everyday life. Space & Culture, v.5, n.2, 2002.
  • WEICK, K. E. Sensemaking in organizations London: Sage, 1995.
  • *
    Trabalho desenvolvido com apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq, por meio de projeto de pesquisa na área de Ciências Humanas, Sociais e Sociais Aplicadas (processo 401416/2004-6).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Jul 2012
    • Data do Fascículo
      Dez 2007

    Histórico

    • Recebido
      Out 2006
    • Aceito
      Dez 2006
    Fundação Getulio Vargas, Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas Rua Jornalista Orlando Dantas, 30 - sala 107, 22231-010 Rio de Janeiro/RJ Brasil, Tel.: (21) 3083-2731 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: cadernosebape@fgv.br