Acessibilidade / Reportar erro

Comportamento de cidadania organizacional: versão brasileira da escala Comportamentos de Cidadania Organizacional para Trabalhadores do Conhecimento

Comportamientos de Ciudadanía Organizacional: versión brasileña de la escala de comportamientos de ciudadanía organizacional para trabajadores del conocimiento

Resumo

Este estudo consiste na tradução, adaptação transcultural e validação da escala “Comportamentos de Cidadania Organizacional para Trabalhadores do Conhecimento”, desenvolvida por Dekas (2010) e Dekas, Bauer, Welle et al. (2013), para o português do Brasil. Para alcançar esse objetivo, utilizou-se o protocolo sugerido por Beaton, Bombardier, Guillemin et al. (2000), composto pelas etapas de tradução, síntese, retradução, comitê de avaliação, pré-teste de equivalência e submissão e avaliação. Além disso, por meio de um estudo piloto, aplicou-se a versão final do instrumento a uma amostra de 247 indivíduos. Os resultados indicam que a referida escala apresenta validade e índices de confiabilidade adequados, podendo ser utilizada em futuros estudos de Administração e de áreas afins, ampliando a produção de conhecimento científico acerca do tema.

Palavras-chave:
Comportamentos de cidadania organizacional; Tradução; Adaptação transcultural; Validação de escala

Resumen

Este estudio consiste en la traducción al portugués de Brasil, adaptación cultural y validación de la escala de comportamientos de ciudadanía organizacional para trabajadores del conocimiento, desarrollada por Dekas (2010) y Dekas, Bauer, Welle et al. (2013). Para lograr este objetivo se utilizó el protocolo sugerido por Beaton, Bombardier, Guillemin et al. (2000), compuesto por los pasos de traducción, síntesis, retrotraducción, comité de evaluación, pretest de equivalencia y presentación y evaluación. Por otra parte, por medio de un estudio piloto, se aplicó la versión final del instrumento a una muestra de 247 sujetos. Los resultados indican que la mencionada escala presenta índices de validez y fiabilidad adecuados y se puede utilizar en futuros estudios de Administración y campos relacionados, lo que amplía la producción de conocimiento científico sobre el tema.

Palabras clave:
Conductas de ciudadanía organizacional; Traducción; Adaptación transcultural; Validación de escala

Abstract

This study is the translation, cultural adaptation and validation of the scale of Organizational Citizenship Behavior for Knowledge Workers (OCB-KW), developed by Dekas (2010) and Dekas, Bauer, Welle et al. (2013). The protocol suggested by Beaton, Bombardier, Guillemin et al. (2000) was used, composed of the translation stages, synthesis, back-translation, evaluation committee, equivalence of pre-test and submission and appraisal. Furthermore, by means of a pilot study, the final version of the instrument was applied to a sample of 247 individuals. As results, the scale of OCB-KW was validated, presented adequate reliability indices and can be used in future studies in the area of administration, increasing the production of scientific knowledge on the subject.

Keywords:
Organizational Citizenship Behavior; Translation; Cross-cultural adaptation; Scale validation

INTRODUÇÃO

Os comportamentos de cidadania organizacional (CCO) são reconhecidos como uma importante medida do comportamento nas organizações e são considerados essenciais no desempenho dos trabalhadores (PODSAKOFF, PODSAKOFF, MAKENZIE et al., 2014PODSAKOFF, N. et al. Consequences of unit-level organizational citizenship behaviors: a review and recommendations for future research. Journal of Organizational Behavior, v. 35, p. S87-S119, 2014.) e da própria empresa (ORGAN, 2018ORGAN, D. W. Organizational citizenship behavior: recent trends and developments. Annual Review of Organizational Psychology and Organizational Behavior, v.1, n.1, p. 17.1-17.12, 2018.). Nas áreas de Psicologia do Trabalho e Comportamento Organizacional, os CCO constituem um construto multifacetado e em grande expansão nas pesquisas das últimas décadas.

No entanto, os estudos sobre o tema têm priorizado as investigações sobre antecedentes individuais e disposicionais, havendo uma lacuna acerca do efeito do contexto social do trabalho nos CCO. Como sinalizam Estivalete, Costa e Andrade (2014ESTIVALETE, V. F. B.; COSTA, V. F.; ANDRADE, T. Organizational citizenship behavior: a comparative study between Brazilian and international scientific output from 2002 to 2012. Business and Management Review, v. 4, n. 3, p. 427-441, 2014.), poucos estudos internacionais têm avançado no sentido de analisar as interações do contexto social e os CCO (EVANS e DAVIS, 2005EVANS, W. R.; DAVIS, W. D. High-performance work systems and organizational performance: the mediating role of internal social structure. Journal of Management, v. 31, n. 5, p. 758-775, 2005.; VAN DIJKE, CREMER, MAYER et al., 2012VAN DIJKE, M. et al. When does procedural fairness promote organizational citizenship behavior? Integrating empowering leadership types in relational justice models. Organizational Behavior and Human Decision Processes, v. 117, n. 2, p. 235-248, 2012.; WALLUMBVA, LUTHANS, AVEY et al., 2011WALLUMBVA, F. O. et al. Retracted: authentically leading groups - the mediating role of collective psychological capital and trust. Journal of Organizational Behavior, v. 32, n. 1, p. 4-24, 2011.). De modo comparativo, no cenário nacional, uma análise dos estudos sobre o tema evidenciou uma realidade ainda mais crítica, pois há poucos estudos sobre CCO e nenhum deles considerou o contexto social em suas análises (ESTIVALETE, COSTA e ANDRADE, 2014ESTIVALETE, V. F. B.; COSTA, V. F.; ANDRADE, T. Organizational citizenship behavior: a comparative study between Brazilian and international scientific output from 2002 to 2012. Business and Management Review, v. 4, n. 3, p. 427-441, 2014.; ANDRADE, 2017ANDRADE, T. et al. Comportamento de cidadania organizacional: um olhar à luz dos valores e da satisfação no trabalho. Revista Brasileira de Gestão de Negócios, v. 19, n. 64, p. 236-262, 2017.).

Dekas (2010DEKAS, K. H. Citizenship in context: investigating the effects of work group climate on organizational citizenship perceptions and behavior. 287 f. Tese (Ph.D. in Business Administration) - University of Michigan, Ann Arbor, 2010.) destaca que as recentes mudanças na organização do trabalho têm causando mudanças na natureza dos CCO, tornando necessário ampliar as perspectivas do contexto social que permeia tais comportamentos (DEKAS, BAUER, WELLE et al., 2013DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013.).

Considerando a natureza do trabalho na contemporaneidade, os trabalhadores do conhecimento assumem papel de destaque. Nas configurações emergentes de trabalho, os trabalhadores do conhecimento são considerados os indivíduos com motivação e capacidade de criar ideias novas, compartilhando seus conhecimentos e agregando valor à organização (LIN e JOE, 2012LIN, C.; JOE, S. To share or not to share: Assessing knowledge sharing, interemployee helping, and their antecedents among online knowledge workers. Journal of business ethics, v. 108, n. 4, p. 439-449, 2012.). Com uma visão mais abrangente, Dekas, Bauer, Welle et al. (2013DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013.) destacam que, devido à velocidade e competitividade dos negócios na atualidade, todos os trabalhadores modernos que têm como principal produto de capital o conhecimento podem ser considerados trabalhadores do conhecimento.

Partindo desses pressupostos associados às mudanças do contexto social do trabalho, Dekas (2010DEKAS, K. H. Citizenship in context: investigating the effects of work group climate on organizational citizenship perceptions and behavior. 287 f. Tese (Ph.D. in Business Administration) - University of Michigan, Ann Arbor, 2010.) e Dekas, Bauer, Welle et al. (2013)DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013. propõem uma tipologia que originou a escala “Organizational Citizenship Behavior - Knowledge Worker” (OCB-KW), composta pelas dimensões sustentabilidade do empregado, participação social, virtude cívica, voz e ajuda. A escala “Comportamentos de Cidadania Organizacional para Trabalhadores do Conhecimento” (CCO-TC) foi desenvolvida nos Estados Unidos da América (EUA) e foi validada na língua inglesa com o objetivo de avaliar tais comportamentos individuais no contexto laboral. Como destaca Organ (2018)ORGAN, D. W. Organizational citizenship behavior: recent trends and developments. Annual Review of Organizational Psychology and Organizational Behavior, v.1, n.1, p. 17.1-17.12, 2018., há necessidade de novos estudos empíricos em contextos que explorem realidades distintas daquelas dos estudos norte-americanos.

Assim, os objetivos deste estudo consistem em: a) traduzir e realizar a adaptação transcultural da escala CCO-TC para o português do Brasil; e b) realizar a validação da referida escala no contexto brasileiro. Como recomendam Epstein, Santo e Guillemin (2015EPSTEIN, J.; SANTO, R. M; GUILLEMIN, F. A review of guidelines for cross-cultural adaptation of questionnaires could not bring out a consensus. Journal of Clinical Epidemiology, v. 68, n. 4, p. 435-441, 2015.), se o questionário está disponível em outro idioma, os pesquisadores devem adaptá-lo e validá-lo ao invés de criar um novo, pois a adaptação transcultural é mais rápida e assume que irá produzir medida equivalente. Para tanto, mostra-se importante que o instrumento seja traduzido para o idioma do país onde será utilizado, adaptando-se às características socioculturais da população investigada e possibilitando uma avaliação fidedigna (BARBOSA e GAVIÃO, 2011BARBOSA, T. S.; GAVIÃO, M. B. D. Qualidade de vida e saúde bucal em crianças - parte II: versão brasileira do Child Perceptions Questionnaire. Ciência & Saúde Coletiva, v. 16, n. 7, p. 3267-3276, 2011.).

REFERENCIAL TEÓRICO

Comportamentos de cidadania organizacional

Os estudos pioneiros sobre comportamentos de cidadania nas organizações agregaram os pilares difundidos por Barnard (1938BARNARD, C. The function of the executive. Cambridge: Harvard University Press, 1938.) e Katz e Kahn (1978KATZ, D.; KAHN, R. L. Psicologia social das organizações. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1978.). Segundo Barnard (1938)BARNARD, C. The function of the executive. Cambridge: Harvard University Press, 1938., as organizações podem ser definidas como sistemas de cooperação operados pelos recursos humanos e não apenas como um produto da engenharia mecânica, como difundido pela Escola de Administração Científica. Já Katz e Kahn (1978)KATZ, D.; KAHN, R. L. Psicologia social das organizações. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1978. defendem que ser membro de uma organização também implica ser cidadão na comunidade em que esta existe.

A partir dessas concepções teóricas, a noção de CCO foi abordada pelos estudos de Dennis W. Organ e seus colaboradores (Bateman e Organ, 1983BATEMAN, T. S.; ORGAN, D. W. Job satisfaction and the good soldier: the relationship between affect and employee “citizenship”. Academy of Management Journal, v. 26, n. 4, p. 587-595, 1983.; Organ, 1988ORGAN, D. W. Organizational citizenship behavior: the good soldier syndrome. Lexington: Lexington, 1988.; 1997ORGAN, D. W. Organizational citizenship behavior: its construct clean-up time. Human Performance, v. 10, p. 85-97, 1997.). Organ (1988)ORGAN, D. W. Organizational citizenship behavior: the good soldier syndrome. Lexington: Lexington, 1988. define a cidadania organizacional como um comportamento individual, discricionário, não explicitamente reconhecido pelo sistema formal de recompensa, que contribui para o funcionamento eficaz da organização; para o autor, esses comportamentos individuais e discricionários não podem nem ser impostos como obrigações das funções nem induzidos pela garantia de uma recompensa formal. Nasra e Heilbrunn (2015NASRA, M. A.; HEILBRUNN, S. Transformational leadership and organizational citizenship behavior in the Arab educational system in Israel: the impact of trust and job satisfaction. Educational Management Administration & Leadership, v. 43, n. 1, p. 1-17, 2015.) sinalizam, ainda, que a vontade dos trabalhadores de cumprir seu papel não assegura a eficácia organizacional, sendo os aspectos voluntários associados ao CCO importantes para a melhoria dos indicadores de eficácia.

Após algumas críticas, Organ (1997ORGAN, D. W. Organizational citizenship behavior: its construct clean-up time. Human Performance, v. 10, p. 85-97, 1997.) propôs alterações na definição de CCO, passando a entendê-la como sendo o desempenho contextual que sustenta o ambiente social e psicológico no qual ocorre o desempenho da tarefa. Essa formulação associa o CCO ao construto de desempenho contextual apresentado por Borman e Motowidlo (1997BORMAN, W. C.; MOTOWIDLO, S. J. Task performance and contextual performance: The meaning for personnel selection research. Human Performance, v. 10, n. 2, p. 99-109, 1997.), definido como o conjunto de comportamentos interpessoais e voluntários que suportam o contexto social e motivacional onde o trabalho organizacional é desempenhado.

As categorias comportamentais que integram o desempenho contextual compreendem: a) persistir com entusiasmo e esforço extra quando necessário para executar com sucesso as próprias tarefas; b) voluntariar-se para executar tarefas não prescritas para o cargo; c) ajudar e cooperar com os outros; d) cumprir as regras e procedimentos organizacionais mesmo quando isso é pessoalmente inconveniente; e) apoiar e defender os objetivos organizacionais (BORMAN e MOTOWIDLO, 1997BORMAN, W. C.; MOTOWIDLO, S. J. Task performance and contextual performance: The meaning for personnel selection research. Human Performance, v. 10, n. 2, p. 99-109, 1997.; REGO, 2002REGO, A. Climas éticos e comportamentos de cidadania organizacional. Revista de Administração de Empresas, v. 42, p. 50-63, 2002.). Para Meynhardt, Brieger e Hermann (2018MEYNHARDT, T.; BRIEGER, S. A.; HERMANN, C. Organizational public value and employee life satisfaction: the mediating roles of work engagement and organizational citizenship behavior. The International Journal of Human Resource Management, v. 40, n. 3, p. 1-34, 2018.), os trabalhadores que têm uma experiência positiva em relação ao trabalho tendem a se envolver em CCO, refletindo efeitos positivos que ultrapassam a esfera profissional, podendo contribuir em sua vida pessoal.

No entanto, pesquisas mais recentes (MARINOVA, MOON e VAN DYNE, 2010MARINOVA, S.; MOON, H.; VAN DYNE, A. L. Are all good soldier behaviors the same? Supporting multidimensionality of organizational citizenship behaviors based on rewards and roles. Human Relations, v. 63, n. 10, p. 1463-1485, 2010.; PODSAKOFF, WHITING, PODSAKOFF et al., 2009PODSAKOFF, N. P. et al. Individual- and organizational-level consequences of organizational citizenship behaviors: a meta-analysis. Journal of Applied Psychology, v. 94, p. 122-141, 2009.; PODSAKOFF, PODSAKOFF, MAKENZIE et al., 2014PODSAKOFF, N. et al. Consequences of unit-level organizational citizenship behaviors: a review and recommendations for future research. Journal of Organizational Behavior, v. 35, p. S87-S119, 2014.) indicam os benefícios potenciais de uma abordagem mais sutil quanto à sua conceituação, considerando dois aspectos distintos. Primeiro, os trabalhadores diferem na medida em que percebem o CCO como parte do exercício de seu papel ou extrapapel nas organizações (VAN DYNE, ANG e KOH, 2008VAN DYNE, L.; ANG, S.; KOH, C. Development and validation of the CQS: the cultural intelligence scale. In: ANG, S.; VAN DYNE, L. (Ed.). Handbook on cultural intelligence: theory, measurement and applications. New York: M. E. Sharpe, 2008. p. 16-38.; Yaghoubi, YAZDANI e KHORNEGAH, 2011YAGHOUBI, N. M.; YAZDANI, B. O.; KHORNEGAH, K. The relationship between organizational citizenship behavior (OCB) and social capital (SC). American Journal of Scientific Research, v. 24, p. 121-126, 2011.). Segundo, o CCO às vezes é percebido como recompensado ​​pelas organizações, por meio de avaliações de desempenho, promoções ou reconhecimento (MARINOVA, MOON e VAN DYNE, 2010MARINOVA, S.; MOON, H.; VAN DYNE, A. L. Are all good soldier behaviors the same? Supporting multidimensionality of organizational citizenship behaviors based on rewards and roles. Human Relations, v. 63, n. 10, p. 1463-1485, 2010.). Os resultados de estudos empíricos indicam a necessidade de teorias adicionais que poderiam explicar com maior profundidade os CCO (Salamon e DeutSch, 2006SALAMON, S. D.; DEUTSCH, Y. OCB as a handicap: an evolutionary psychological perspective. Journal of Organizational Behavior, v. 27, n. 2, p. 185-199, 2006.; ANDRADE, 2017ANDRADE, T. et al. Comportamento de cidadania organizacional: um olhar à luz dos valores e da satisfação no trabalho. Revista Brasileira de Gestão de Negócios, v. 19, n. 64, p. 236-262, 2017.; ANDRADE, COSTA, ESTIVALETE et al., 2017COSTA, V. F.; ESTIVALETE, V. F. B.; ANDRADE, T. Comportamento de cidadania organizacional: as visões de colaboradores e de gestores de uma indústria de eletrodomésticos. Revista Eletrônica de Administração, v. 23, n. spe., p. 262-261, 2017.; ORGAN, 2018ORGAN, D. W. Organizational citizenship behavior: recent trends and developments. Annual Review of Organizational Psychology and Organizational Behavior, v.1, n.1, p. 17.1-17.12, 2018.). Como destacam Chow, Lai e Loi (2015CHOW, C. W. C.; LAI, J. Y. M.; LOI, R. Motivation of travel agents’ customer service behavior and organizational citizenship behavior: the role of leader-member exchange and internal marketing orientation. Tourism Management, v. 48, p. 362-369, 2015.), existem inúmeros aspectos relacionados ao tema ainda pouco explorados e também não há consenso na literatura acerca das dimensões do construto CCO (ANDRADE, COSTA, ESTIVALETE et al., 2017ANDRADE, T. Antecedentes contextuais dos comportamentos de cidadania organizacional. 189 f. Tese (Doutorado em Administração) U- niversidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2017.; COSTA, ESTIVALETE e ANDRADE, 2017ANDRADE, T. et al. Comportamento de cidadania organizacional: um olhar à luz dos valores e da satisfação no trabalho. Revista Brasileira de Gestão de Negócios, v. 19, n. 64, p. 236-262, 2017.). Além disso, como afirmam Dekas, Bauer, Welle et al. (2013DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013.), o mundo do trabalho mudou e, fundamentalmente com tal mudança, a natureza dos CCO para os trabalhadores modernos também se alterou.

Com a intenção de aprofundar os estudos sobre o mundo do trabalho e sua interação com CCO, Dekas, Bauer, Welle et al. (2013DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013.) propõem uma nova lente, através da qual se pode ver esse comportamento, aproximando o foco para o contexto social. A autora advoga que um “cidadão organizacional” é um tipo de papel de trabalho definido e limitado por fatores contextuais ao invés de uma caricatura de um indivíduo que se engaja no mesmo conjunto de comportamentos fixos em todos os contextos de trabalho.

Considerando que a natureza do trabalho passou por inúmeras transformações, Dekas, Bauer, Welle et al. (2013DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013.) propõem um novo modelo para os CCO, considerando os trabalhadores do conhecimento. Ao analisar os modelos de CCO existentes na literatura (BATEMAN e ORGAN, 1983BATEMAN, T. S.; ORGAN, D. W. Job satisfaction and the good soldier: the relationship between affect and employee “citizenship”. Academy of Management Journal, v. 26, n. 4, p. 587-595, 1983.; KATZ e KAHN, 1978KATZ, D.; KAHN, R. L. Psicologia social das organizações. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1978.; ORGAN, 1988ORGAN, D. W. Organizational citizenship behavior: the good soldier syndrome. Lexington: Lexington, 1988.; 1997ORGAN, D. W. Organizational citizenship behavior: its construct clean-up time. Human Performance, v. 10, p. 85-97, 1997.; PODSAKOFF, MACKENZIE, PAINE et al., 2000PODSAKOFF, P. M. et al. Organizational citizenship behaviors: a critical review of the theoretical and empirical literature and suggestions for future research. Journal of Management, v. 26, n. 3, p. 513-563, 2000.). Dekas (2010)EPSTEIN, J.; SANTO, R. M; GUILLEMIN, F. A review of guidelines for cross-cultural adaptation of questionnaires could not bring out a consensus. Journal of Clinical Epidemiology, v. 68, n. 4, p. 435-441, 2015. e Dekas, Bauer, Welle et al. (2013)DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013., constataram que algumas dimensões, como obediência, poderiam não apresentar adequação ao contexto social dos trabalhadores do conhecimento.

Assim, os autores, tendo por base tais estudos, avaliaram essas dimensões e propuseram uma tipologia que originou a escala OCB-KW, composta pelos fatores apresentados no Quadro 1.

Quadro 1
Fatores da escala Organizational Citizenship Behavior - Knowledge Worker

A escala OCB-KW foi replicada em inúmeras amostras e sua confiabilidade foi satisfatória, com valores alfa de Cronbach entre 0,78 e 0,88 (DEKAS, 2010DEKAS, K. H. Citizenship in context: investigating the effects of work group climate on organizational citizenship perceptions and behavior. 287 f. Tese (Ph.D. in Business Administration) - University of Michigan, Ann Arbor, 2010.; DEKAS, BAUER, WELLE et al., 2013DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013.). Destas categorias, 3 se alinham com as dimensões de cidadania existentes na literatura: virtude cívica, voz e ajuda. Outras 2 categorias, sustentabilidade do colaborador e participação social, foram dimensões propostas no modelo desenvolvido por Dekas, Bauer, Welle et al. (2013DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013.). Para os referidos autores, tais dimensões emergiram no contexto social contemporâneo, exigindo dos trabalhadores do conhecimento um novo perfil, com postura proativa e participativa na esfera social.

A escala OCB-KW representa um avanço nos estudos sobre CCO, ao incluir as dimensões sustentabilidade do colaborador e participação social, sinalizando as mudanças no mundo do trabalho e no perfil dos trabalhadores do conhecimento. Tais aspectos motivaram a escolha dessa escala para a realização deste estudo.

MÉTODO

Este estudo consiste na tradução, adaptação transcultural e validação da escala CCO-TC, a qual visa a identificar a perspectiva desses trabalhadores sobre os CCO praticados no contexto laboral.

A escala é baseada nos estudos desenvolvido por Dekas (2010DEKAS, K. H. Citizenship in context: investigating the effects of work group climate on organizational citizenship perceptions and behavior. 287 f. Tese (Ph.D. in Business Administration) - University of Michigan, Ann Arbor, 2010.) e Dekas, Bauer, Welle et al. (2013)DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013., que resultaram em uma versão revisada de 23 itens, validados por Dekas, Bauer, Welle et al. (2013)DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013. em inglês. Os itens estão divididos em 5 dimensões: Sustentabilidade do Empregado (4 itens), Participação Social (4 itens), Virtude Cívica (5 itens), Voz (4 itens) e Ajuda (6 itens). Os respondentes desse instrumento são solicitados a classificar seu grau de concordância com os itens, por meio de uma escala do tipo Likert de 5 pontos, que varia de 1 (discordo totalmente) a 5 (concordo totalmente).

O processo de tradução e adaptação transcultural foi realizado a partir do protocolo sugerido por Beaton, Bombardier, Guillemin et al. (2000Beaton, D. E. et al. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine, v. 5, n. 24, p. 3186-3191, 2000.), composto por 6 etapas: a) tradução; b) síntese; c) retradução; d) comitê de avaliação; e) pré-teste de equivalência; f) submissão e avaliação.

Na primeira etapa foi realizada a tradução inicial da escala, do inglês para a língua-alvo (português do Brasil), por 2 profissionais da área de Administração, independentes, fluentes na língua inglesa, tendo como língua-mãe o português. Um dos tradutores foi informado dos objetivos e conceitos subjacentes ao estudo, visando a evitar ambiguidades e significados inesperados nos itens originais. Como sugerem Beaton, Bombardier, Guillemin et al. (2000Beaton, D. E. et al. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine, v. 5, n. 24, p. 3186-3191, 2000.), um dos tradutores foi informado dos objetivos e conceitos subjacentes ao estudo, sendo um profissional da área investigada com conhecimentos prévios sobre o tema. O outro tradutor não foi informado sobre os conceitos estudados na referida pesquisa e também não detém conhecimentos especializados sobre o assunto (tradutor ingênuo) (BEATON, BOMBARDIER, GUILLEMIN et al., 2000Beaton, D. E. et al. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine, v. 5, n. 24, p. 3186-3191, 2000.).

Com as 2 traduções concluídas (tradução 1 = T1 e tradução 2 = T2), os tradutores e 1 das autoras do estudo reuniram-se para realizar a etapa de síntese. Nesse momento ocorreu a síntese dos resultados das 2 traduções, comparando-as ao instrumento original. Como recomendado por Beaton, Bombardier, Guillemin et al. (2000Beaton, D. E. et al. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine, v. 5, n. 24, p. 3186-3191, 2000.), nessa etapa foi produzido um relatório escrito para documentar o processo, incluindo os problemas ocorridos e como eles foram resolvidos.

Na terceira fase, a primeira versão foi retraduzida para o inglês por 1 tradutor nativo (que possui o inglês como língua-mãe), que desconhecia os objetivos iniciais do estudo e a versão original, gerando a segunda versão. Beaton, Bombardier, Guillemin et al. (2000Beaton, D. E. et al. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine, v. 5, n. 24, p. 3186-3191, 2000.) sugerem a realização da retradução por 2 profissionais. No entanto, neste estudo, optou-se por realizar esse procedimento por 1 tradutor, do mesmo modo como executado em alguns estudos da área de Psicologia (GONÇALVES e PILLON, 2009GONÇALVES, A. M. S.; PILLON, S. C.Adaptação transcultural e avaliação da consistência interna da versão em português da Spirituality Self Rating Scale (SSRS). Revista de Psiquiatria Clínica, v. 36, n. 1, p. 10-15, 2009.; GOLDFELD, WIETHAEUPER, TERRA et al., 2007GOLDFELD, P. R. M. et al. Adaptação transcultural do Inventory of Countertransference Behavior (ICB) para o português brasileiro. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, v. 29, n. 1, p. 56-62, 2007.).

Após esse processo, iniciou-se a quarta etapa, realizada por um comitê de avaliação, formado por 4 pesquisadores bilíngues e especialistas nas áreas de Administração e Educação, que avaliaram a segunda versão e os instrumentos originais. Esse comitê analisou se existiam discrepâncias entre as versões originais, a primeira versão em português e a retradução.

Como destacam Guillemin, Bombardier e Beaton (1993GUILLEMIN, F.; BOMBARDIER, C.; BEATON, D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. Journal of Clinical Epidemiology, v. 46, n. 12, p. 1417-1432, 1993.) e Beaton, Bombardier, Guillemin et al. (2000)Ghisi, G. L. D. M. et al. Desenvolvimento e validação da versão em português da Escala de Barreiras para Reabilitação Cardíaca. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 98, n. 4, p. 344-352, 2012., o comitê de avaliação deve avaliar as seguintes equivalências: a) equivalência semântica, associada à equivalência do significado das palavras, analisando se existem dificuldades gramaticais ou de vocabulário; b) equivalência idiomática, relacionada à equivalência de expressões e coloquialismos traduzidos a outros idiomas; c) equivalência experiencial, a qual deve ser considerada quando situações evocadas ou retratadas na versão original devem estar de acordo com o contexto cultural-alvo; d) equivalência conceitual, a qual se refere à validade do conceito explorado e dos acontecimentos vividos por pessoas na cultura-alvo, uma vez que itens podem ser equivalentes em significado semântico, mas não conceitualmente equivalentes.

Em seguida, na quinta etapa, foi realizado um pré-teste, com a aplicação do questionário a um grupo de 30 integrantes da população-alvo. Nessa fase, Beaton, Bombardier, Guillemin et al. (2000Beaton, D. E. et al. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine, v. 5, n. 24, p. 3186-3191, 2000.) indicam que a aplicação do questionário deve ser seguida de uma entrevista com o respondente, visando a realizar uma sondagem para identificar o que o indivíduo entende sobre cada item do questionário e cada resposta escolhida. Neste estudo, os questionários foram respondidos pelos integrantes da população-alvo, sem intervenção do pesquisador, não sendo realizada entrevista. Optou-se por acrescentar a cada uma das 23 questões a alternativa “não entendi”, com a finalidade de identificar questões não compreendidas. Nessa etapa, não ocorreram dificuldades de compreensão das questões elaboradas ou dos termos utilizados pela maioria dos respondentes (90%). Como esse número estava de acordo com o limite estabelecido de concordância igual ou superior a 80% (GUILLEMIN, BOMBARDIER e BEATON, 1993GUILLEMIN, F.; BOMBARDIER, C.; BEATON, D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. Journal of Clinical Epidemiology, v. 46, n. 12, p. 1417-1432, 1993.), não houve necessidade de nova avaliação por parte do comitê.

Por fim, na sexta etapa se realizou a submissão e avaliação da documentação utilizada no processo de tradução e adaptação transcultural da escala pelo comitê de avaliação. Nessa fase, o comitê avaliou os relatórios e formulários elaborados nas diferentes fases, realizando uma espécie de auditoria, como sugerido por Beaton, Bombardier, Guillemin et al. (2000Beaton, D. E. et al. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine, v. 5, n. 24, p. 3186-3191, 2000.). Os referidos autores também sugerem que, nessa fase, havendo possibilidade de contato com o autor do instrumento original, a referida documentação poderá ser encaminhada para sua avaliação. Neste estudo, realizou-se contato com a autora do instrumento original (DEKAS, 2010DEKAS, K. H. Citizenship in context: investigating the effects of work group climate on organizational citizenship perceptions and behavior. 287 f. Tese (Ph.D. in Business Administration) - University of Michigan, Ann Arbor, 2010.) - a qual não constatou necessidade de envio da documentação referente ao processo de tradução e adaptação transcultural da escala.

A Figura 1 ilustra as etapas do trabalho de tradução e adaptação da escala.

Figura 1
Etapas para tradução e adaptação transcultural da escala Comportamentos de Cidadania Organizacional para Trabalhadores do Conhecimento e estudo piloto

Assim, após a realização do pré-teste foi gerada a versão final do instrumento, aplicada em um estudo piloto a uma amostra de 247 indivíduos. A análise dos dados do estudo piloto foi realizada com o apoio do programa computacional SPSS para os testes estatísticos. Inicialmente, procedeu-se à análise fatorial exploratória; em seguida, utilizou-se o indicador de consistência interna do valor alfa de Cronbach, com o propósito de verificar a confiabilidade dos construtos teóricos.

RESULTADOS

Tradução e adaptação transcultural da Escala Comportamentos de Cidadania Organizacional para Trabalhadores do Conhecimento

Na primeira etapa foi realizada a tradução para o português da escala CCO-TC por 2 profissionais da área de Administração - fluentes na língua inglesa e independentes um do outro.

Ao realizar a tradução de modo independente, os pesquisadores comparam cada tradução para identificar discrepâncias que podem ser discutidas entre os tradutores em uma fase posterior (Beaton, Bombardier, Guillemin et al., 2000Beaton, D. E. et al. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine, v. 5, n. 24, p. 3186-3191, 2000.). Tal técnica é altamente recomendada por muitos investigadores, para alcançar a maior equivalência de tradução possível (Brislin, 1970BRISLIN, R. W. Back-translation for cross-cultural research. Journal of Cross-Cultural Psychology, v. 1, n. 3, p. 185-216, 1970.; TAKARA, BEECHER, OKISHI et al., 2015TAKARA, R. et al. Translation of the Outcome Questionnaire-45 (OQ) into Japanese: a cultural adaptation. Psychotherapy Research, v. 27, n. 2p. 1-13, 2015.).

Na etapa posterior (síntese), as 2 traduções - identificadas como T1 e T2 - foram comparadas pelos profissionais e por 1 autora do estudo. As divergências entre as versões foram apontadas e discutidas junto com os respectivos pesquisadores, então, foram adotadas modificações na versão inicial, a partir de consenso, resultando na primeira versão em português. Para atingir tal consenso, os profissionais basearam-se em dois critérios: sentido que o instrumento original estava mensurando; e uso coloquial da língua portuguesa empregada no ambiente de trabalho a ser pesquisado.

O Quadro 2 apresenta os itens da versão original, um resumo avaliando as traduções realizadas, sendo as 2 iguais (T1 = T2), as 2 semelhantes (T1 ≈ T2) ou as 2 diferentes, havendo a necessidade de um consenso para estabelecer a tradução final (T3) - que resultou na primeira versão em português.

Quadro 2
Versão original, traduções e 1ª versão em português da escala Comportamento de Cidadania Organizacional para Trabalhadores do Conhecimento

Nas questões da escala CCO-TC, os 2 tradutores e 1 autora do trabalho optaram por alterar o verbo na terceira pessoa do singular para o verbo na primeira pessoa do singular, tendo em vista que os CCO avaliados se referem aos comportamentos dos próprios respondentes. Como se observa no Quadro 2, para a referida escala, na maioria das questões, houve consenso dos tradutores, sendo as traduções semelhantes (T1 ≈ T2) ou iguais (T1 = T2).

Em alguns casos, apesar dos termos utilizados estarem corretos sob o ponto de vista da tradução literal, optou-se por uma versão que considerou as equivalências semântica, idiomática, experiencial e conceitual, visando ao melhor entendimento pela população estudada. Como afirmam Epstein, Santo e Guillemin (2015EPSTEIN, J.; SANTO, R. M; GUILLEMIN, F. A review of guidelines for cross-cultural adaptation of questionnaires could not bring out a consensus. Journal of Clinical Epidemiology, v. 68, n. 4, p. 435-441, 2015.) a adaptação transcultural pode apresentar algumas particularidades. Em primeiro lugar, a tradução pode envolver problemas linguísticos porque os 2 idiomas podem ter palavras que não são equivalentes ou expressões idiomáticas. Em segundo lugar, a própria adaptação para outra cultura pode constituir um problema, pois um item pode ter um significado muito diferente ou nenhum significado em outro contexto cultural específico (EPSTEIN, SANTO e GUILLEMIN, 2015EPSTEIN, J.; SANTO, R. M; GUILLEMIN, F. A review of guidelines for cross-cultural adaptation of questionnaires could not bring out a consensus. Journal of Clinical Epidemiology, v. 68, n. 4, p. 435-441, 2015.).

Assim, na questão 5, para o termo personal basis se optou por “vida pessoal”, ao invés de “nível pessoal”. Na questão 8, o termo playful foi traduzido como “divertido” e não “brincalhão”. A expressão improve processes for getting work done, da questão 16, foi traduzida como “melhorar os processos de trabalho”, ao invés de “melhorar o processo em obter o trabalho feito”. Na questão 19, a expressão willingly helps foi traduzida como “ajudo com prazer” e não como “ajudo de boa vontade”. Além disso, a expressão to lend a helping hand, da questão 20, foi traduzida como “pronto para ajudar”, em detrimento de “estender a mão”.

Da mesma forma, no estudo desenvolvido por Prudêncio, Messias, Mamade et al. (2015PRUDÊNCIO, P. S. et al. The cultural and linguistic adaptation to Brazilian Portuguese and content validity of the patient expectations and satisfaction with prenatal care instrument. Journal of Transcultural Nursing, v. 27, n. 5, p. 1-9, 2015.), o qual realizou a adaptação transcultural e validação para o contexto brasileiro de um instrumento sobre expectativas e satisfação com cuidados no pré-natal, os responsáveis pela tradução realizaram a análise semântica e propuseram alterações na tradução literal, considerando os aspectos culturais, visando à maior compreensão do público-alvo.

Na segunda fase, a primeira versão foi retraduzida para o inglês por 1 professor de inglês, nativo de língua inglesa, natural dos EUA e residente no Brasil, gerando a segunda versão em inglês. Como destacam Guillemin, Bombardier e Beaton (1993GUILLEMIN, F.; BOMBARDIER, C.; BEATON, D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. Journal of Clinical Epidemiology, v. 46, n. 12, p. 1417-1432, 1993.), esse passo ajuda a melhorar a qualidade do resultado da adaptação definitiva. A retradução, quando bem conduzida, pode sinalizar problemas nas traduções, resultando em uma discussão mais aprofundada e, consequentemente, uma melhor adaptação transcultural.

Após esse processo, iniciou-se a quarta etapa, realizada por um comitê de avaliação, formado por 4 pesquisadores bilíngues e especialistas nas áreas de Administração e Educação, que avaliaram a segunda versão e o instrumento original. A quarta etapa proposta por Beaton, Bombardier, Guillemin et al. (2000Beaton, D. E. et al. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine, v. 5, n. 24, p. 3186-3191, 2000.) pode estar associada à validade de conteúdo, a qual permite o refinamento do instrumento por meio da análise de especialistas. Considerando que esse instrumento não foi aplicado na realidade brasileira, torna-se necessária a validação de conteúdo - que consiste em uma avaliação sistemática e subjetiva para verificar se o instrumento de fato mede o que deve medir (HAIR, MONEY, BABIN et al., 2005HAIR, J. F. et al. Fundamentos de métodos de pesquisa em administração. Porto Alegre: Bookman, 2005.).

O comitê analisou a existência de discrepâncias entre a retradução, a versão original e a primeira versão em português, estabelecendo, por fim, a segunda versão em português. Como afirmam Epstein, Santo e Guillemin (2015EPSTEIN, J.; SANTO, R. M; GUILLEMIN, F. A review of guidelines for cross-cultural adaptation of questionnaires could not bring out a consensus. Journal of Clinical Epidemiology, v. 68, n. 4, p. 435-441, 2015.), o papel de um comitê de especialistas é crucial para rever as traduções, tomar decisões críticas, chegar a um consenso sobre qualquer discrepância e consolidar a versão final do questionário.

Em um primeiro momento, a retradução (R) e a versão original (VO) foram comparadas pelos membros do comitê. Nos casos de divergência foram feitas modificações até obter um consenso quanto à tradução, gerando a segunda versão em português. O Quadro 3 apresenta os itens da retradução, a avaliação dos membros do comitê, a segunda versão em português, bem como um resumo comparativo entre as traduções (primeira versão em português e segunda versão em português).

Quadro 3
Retradução, avaliação e 2ª versão em português da escala Comportamento de Cidadania Organizacional para Trabalhadores do Conhecimento

Considerando a retradução da escala CCO-TC e a versão original, foram necessários ajustes em algumas sentenças. Na questão 8, o termo retraduzido cheerful, descrito na versão original como playful, traduzido na primeira versão como “divertido”, foi alterado na segunda versão em português para “animado”. Na questão 12, a expressão retraduzida knowledge exchange, originalmente descrita como knowledge sharing, traduzida inicialmente como “troca de conhecimento”, foi modificada na segunda versão para “compartilhamento de conhecimento”, por estar mais adequada à versão original. Na questão 21, a expressão retraduzida to avoid, traduzida primeiramente como “prevenir”, foi alterada para “evitar”, por estar mais adequada à expressão da versão original to prevent.

Mesmo considerando a semelhança entre a retradução e a versão original, o comitê de avaliação percebeu a necessidade de pequenas alterações nas questões 3, 6, 9, 10 e 13. Na questão 3, a expressão “fazer sua saúde e seu bem-estar”, utilizada na primeira versão, foi substituída na segunda versão em português pela expressão “fazer de sua saúde e de seu bem-estar”. Na questão 6, o termo “celebro” da primeira versão foi alterado na segunda versão para “comemoro”. Na questão 9, a expressão “mas ajudam a comunidade da empresa” foi alterada na segunda versão em português para “mas que ajudam a comunidade da empresa”. Da mesma forma, na questão 10, a expressão “mas são consideradas importantes” foi alterada na segunda versão para “mas que são consideradas importantes”. Além disso, na questão 13, considerou-se necessária a inclusão da expressão “voluntariamente”, visando a adequar a tradução à versão original.

Procedimentos semelhantes foram adotados por Barbosa e Gavião (2011BARBOSA, T. S.; GAVIÃO, M. B. D. Qualidade de vida e saúde bucal em crianças - parte II: versão brasileira do Child Perceptions Questionnaire. Ciência & Saúde Coletiva, v. 16, n. 7, p. 3267-3276, 2011.), ao traduzir e adaptar um questionário sobre qualidade de vida e saúde bucal para uso no Brasil. Apesar das similaridades entre a retradução e a versão original, os referidos autores optaram por alterar alguns termos considerados insatisfatórios para a compreensão dos respondentes.

Além disso, a segunda versão em português foi analisada por 2 profissionais da área de Educação e 3 profissionais da área de Administração, os quais não efetuaram alterações na versão proposta pelo comitê.

Na quinta etapa foi realizado um pré-teste, com aplicação do questionário a um grupo de 30 integrantes da população-alvo. Os respondentes tinham entre 19 e 43 anos e sua escolaridade variou do Ensino Médio completo à Pós-Graduação. Os questionários foram respondidos por esses indivíduos sem a intervenção do pesquisador. Nessa etapa não foram verificadas dificuldades de compreensão das questões elaboradas ou dos termos utilizados pela maioria dos respondentes (27 indivíduos, totalizando 90%). Assim, após a realização do pré-teste foi gerada a versão final do instrumento.

Por fim, realizou-se a sexta etapa, que consistiu na submissão e avaliação dos documentos e relatórios gerados durante o processo ao comitê de avaliação. Nesse momento, os participantes do comitê revisaram as etapas anteriores, reavaliando cada fase executada.

Concluídas essas etapas, a versão final do instrumento foi aplicada em um estudo piloto a uma amostra de 247 indivíduos de 2 organizações do setor educacional, sendo submetida a validação estatística, por meio de análise fatorial exploratória, cujos resultados são apresentados na próxima seção.

Validação da escala Comportamentos de Cidadania Organizacional para Trabalhadores do Conhecimento

Os testes iniciais da fatorial incluíram o Kaiser-Meyer-Olkin measure of sampling adequacy (KMO), o qual deve ser maior ou igual a 0,6 para que a correlação entre cada par de variáveis seja explicada pelas demais variáveis do estudo (LATIF, 1994LATIF, S. A. A análise fatorial auxiliando a resolução de um problema real de pesquisa de marketing. Caderno de Pesquisas em Administração, São Paulo, v. 0, n. 0, p. 1-10, 1994.), e o teste de esfericidade de Bartlet, que visa a examinar a hipótese de que as variáveis não sejam correlacionadas na população (MALHOTRA, 2006MALHOTRA, N. K. Pesquisa de Marketing: Uma Orientação Aplicada. 4. ed.Porto Alegre: Bookman, 2006.). Os resultados dos testes de adequação e especificidade da amostra foram satisfatórios, sendo que o KMO apresentou um coeficiente de 0,809 e o teste de Bartlett apresentou resultado significativo (sig 0,000).

Em relação às comunalidades, que representam a proporção da variância explicada pelo fator, e que, por regra prática, deve ser maior que 0,5 (LATIF, 1994LATIF, S. A. A análise fatorial auxiliando a resolução de um problema real de pesquisa de marketing. Caderno de Pesquisas em Administração, São Paulo, v. 0, n. 0, p. 1-10, 1994.), constatou-se que nenhuma variável da escala avaliada apresentou valor inferior a 0,5.

Posteriormente, na etapa de extração dos fatores, utilizou-se o critério dos autovalores (eingenvalues), que representa a quantidade de variância nas variáveis originais que está associada a um fator, considerando-se apenas variáveis com valor acima de 1,0 (HAIR, BLACK, BABIN et al., 2009HAIR, J. F. et al. Análise multivariada de dados. 6. ed. Porto Alegre: Bookman, 2009.). Outro critério utilizado refere-se à porcentagem da variância explicada pelos fatores, cujo nível satisfatório deve concentrar-se em torno de 60%, segundo Malhotra (2006)MALHOTRA, N. K. Pesquisa de Marketing: Uma Orientação Aplicada. 4. ed.Porto Alegre: Bookman, 2006.. A escala CCO-TC obteve a explicação de 27,2% da variância pelo primeiro fator, sendo que, em conjunto, os sete fatores obtidos explicaram 65,6% de toda a variância.

Para analisar a confiabilidade dos fatores, utilizou-se o teste de confiabilidade do valor alfa de Cronbach, que, segundo Hair, Black, Babin et al. (2009HAIR, J. F. et al. Análise multivariada de dados. 6. ed. Porto Alegre: Bookman, 2009.), pode apresentar um coeficiente variando de 0 a 1, sendo que os valores superiores a 0,6 indicam confiabilidade satisfatória da consistência interna (MALHOTRA, 2006MALHOTRA, N. K. Pesquisa de Marketing: Uma Orientação Aplicada. 4. ed.Porto Alegre: Bookman, 2006.). Considerando esse critério, um fator da escala CCO-TC foi excluído (fator 7). Esse fator congregava a variável 3 (Apoio o esforço dos outros em fazer de sua saúde e de seu bem-estar uma prioridade), pertencente a dimensão Sustentabilidade do empregado, e a variável 17 (Incentivo outros do grupo a emitirem opiniões relacionadas a assuntos que afetem o grupo), pertencente à dimensão Voz. A Tabela 1 ilustra os fatores da escala e os valores alfa de Cronbach.

Tabela 1
Valores alfa de Cronbach dos fatores da escala Comportamentos de Cidadania Organizacional para Trabalhadores do Conhecimento

Assim, como resultado final da análise fatorial, encontraram-se 6 dimensões ou fatores da referida escala. Ressalta-se, ainda, que todas as variáveis que compõem os fatores têm uma carga fatorial superior a 0,40, indicando representatividade adequada, sendo que quanto maior a carga fatorial, melhor o item (AVRICHIR e DEWES, 2006AVRICHIR, I; DEWES, F. Construção e validação de um instrumento de avaliação do desempenho docente. Revista Eletrônica de Ciência Administrativa, v. 5, n. 2, p. 1, 2006.). Uma análise mais detalhada de cada fator permite avaliar suas variáveis componentes, a dimensão correspondente ao modelo original, a carga fatorial para cada um dos itens, bem como a nomeação para os fatores obtidos, como ilustra a Tabela 2.

Tabela 2
Cargas Fatoriais das dimensões obtidas com rotação Varimax e fatores originais correspondentes à escala Comportamentos de Cidadania Organizacional

O fator 1 da escala CCO-TC, proposta por Dekas, Bauer, Welle et al. (2013DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013.), congregou todos os itens da dimensão original “Virtude cívica”, relacionada a ações e responsabilidades que indicam o reconhecimento de ser parte de um todo maior. No fator 2 se agruparam 3 variáveis da dimensão “Voz”, relacionada à participação e sugestão de melhorias para aspectos da organização (DEKAS, 2010DEKAS, K. H. Citizenship in context: investigating the effects of work group climate on organizational citizenship perceptions and behavior. 287 f. Tese (Ph.D. in Business Administration) - University of Michigan, Ann Arbor, 2010.).

Quanto ao fator 3, predominaram as assertivas associadas à dimensão “Ajuda” do modelo original, sendo esta denominada “Altruísmo aos colegas”, por incluir variáveis associadas a atos voluntários de trabalhadores para auxiliar os colegas na prevenção ou superação de dificuldades na realização de seu trabalho (MARINOVA, MOON e VAN DYNE, 2010MARINOVA, S.; MOON, H.; VAN DYNE, A. L. Are all good soldier behaviors the same? Supporting multidimensionality of organizational citizenship behaviors based on rewards and roles. Human Relations, v. 63, n. 10, p. 1463-1485, 2010.). Para Moon et al. (2005MOON, H.; VANDYNE, L.; WROBEL, K. The Circumplex Model and the Future of Organizational Citizenship Research. In: TURNIPSEED, D. (Ed.) A Handbook on Organizational Citizenship Behavior: A Review of ‘Good Soldier ’ Activity in Organizations. New York: Nova Science, 2005.) a dimensão “Ajuda” pode ser considerada interpessoal e de promoção, estando associada a dimensão “Altruísmo” proposta por Podsakoff, Mackenzie, Paine et al. (2000).

No fator 4, predominaram as assertivas associadas ao Fator “Sustentabilidade do empregado” do modelo OCB-KW, o qual congrega itens associados à participação de atividades para manutenção e prevenção da saúde e bem-estar individual e coletivo (DEKAS, 2010DEKAS, K. H. Citizenship in context: investigating the effects of work group climate on organizational citizenship perceptions and behavior. 287 f. Tese (Ph.D. in Business Administration) - University of Michigan, Ann Arbor, 2010.), bem como uma variável do fator “Participação social”, que inclui itens relacionados à participação em atividades sociais que não são diretamente relacionadas ao trabalho (DEKAS, BAUER, WELLE et al., 2013). Assim, mesmo sendo constatada a existência de variáveis de dimensões distintas do modelo proposto por Dekas, Bauer, Welle et al. (2013DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013.), percebe-se que o sentido do fator 4 compreende o conteúdo da dimensão “Sustentabilidade do empregado”, sendo que a interpretação da variável 8 (“Sou animado nas interações do ambiente de trabalho”), também pode estar associada ao conteúdo desse fator.

Em relação ao fator 5, predominaram as variáveis da dimensão original “Ajuda”, sendo utilizada a mesma denominação. Ressalta-se que na escala CCO-TC, proposta por Dekas, Bauer, Welle et al. (2013DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013.), o fator “Ajuda” compreende seis variáveis, sendo que neste estudo, os itens deste fator foram divididos nos fatores 3 e 5.

Já no fator 6, denominado “Participação social” predominaram 3 variáveis associadas à dimensão original de mesmo nome e uma variável da dimensão “Voz”. Assim, mesmo pertencendo à dimensão original da OCB-KW, a variável 17 (“Incentivo outro a emitirem opiniões relacionadas a assuntos que afetam o grupo”) também pode ter sido interpretada e relacionada à participação em atividades sociais não diretamente relacionadas ao trabalho (DEKAS, 2010DEKAS, K. H. Citizenship in context: investigating the effects of work group climate on organizational citizenship perceptions and behavior. 287 f. Tese (Ph.D. in Business Administration) - University of Michigan, Ann Arbor, 2010.), o que justifica sua inclusão no fator “Participação social”.

De modo geral, observa-se que foram mantidas todas as dimensões propostas por Dekas, Bauer, Welle et al. (2013DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013.), embora 2 variáveis tenham sido excluídas devido à confiabilidade e outras 2 reagrupadas. Além disso, mesmo havendo a alocação dessas variáveis em fatores distintos dos originais, houve coerência entre estas e o sentido do fator. Os resultados obtidos por meio de análise fatorial exploratória e do valor alfa de Cronbach evidenciaram que a escala CCO-TC, mostrou-se relativamente estável para ser utilizada em pesquisas que vislumbrem analisar a perspectiva individual acerca desse construto.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escala CCO-TC, desenvolvida por Dekas (2010DEKAS, K. H. Citizenship in context: investigating the effects of work group climate on organizational citizenship perceptions and behavior. 287 f. Tese (Ph.D. in Business Administration) - University of Michigan, Ann Arbor, 2010.) e Dekas, Bauer, Welle et al. (2013), apresentou uma proposta diferenciada para análise dos CCO O modelo considera as dimensões sustentabilidade do empregado, participação social, virtude cívica, voz e ajuda, ampliando as perspectivas teóricas e empíricas acerca do construto.

O objetivo deste artigo foi traduzir, adaptar culturalmente e validar a escala para o português do Brasil. Esses processos seguiram rigorosamente os procedimentos recomendados por Beaton, Bombardier, Guillemin et al. (2000Beaton, D. E. et al. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine, v. 5, n. 24, p. 3186-3191, 2000.), visando a garantir a cientificidade, a validade e a qualidade da versão brasileira dessa escala. Após a redação da versão final da escala, ela foi aplicada a uma amostra composta por 247 indivíduos, sendo evidenciada a confiabilidade dos 6 fatores obtidos, sendo excluídas apenas 2 variáveis do instrumento original.

Acredita-se que esta pesquisa representa um avanço dos estudos sobre CCO que apresenta uma escala pioneira para avaliar a perspectiva dos próprios indivíduos acerca de tais comportamentos, a partir das configurações emergentes de trabalho que permeiam os trabalhadores do conhecimento no cenário nacional. Os resultados apresentados neste artigo indicam que a escala CCO-TC apresenta validade e índices de confiabilidade adequados. Assim, a referida escala pode ser utilizada em futuros estudos da área de Administração e afins, ampliando a produção de conhecimento científico acerca do tema, e também pode ser aliada de estudos relacionados a outras temáticas.

Embora este estudo tenha utilizado com rigor os métodos que podem ser aplicados na tradução, adaptação e validação de outros instrumentos, deve-se apontar algumas limitações. A primeira delas se refere à não utilização de entrevistas na etapa de pré-teste, recorrendo-se à opção “não entendi” após a escala do tipo Likert com as opções de respostas. Outra limitação se refere à aplicação da escala a uma amostra restrita a 247 respondentes que, mesmo atendendo as exigências estatísticas para a validação do instrumento, deve ser ampliada em pesquisas futuras.

Assim, sugere-se a replicação da referida escala a outras amostras, por meio de pesquisas quantitativas, também combinando o uso de análises estatísticas que possibilitem confrontar os resultados obtidos neste estudo, como, por exemplo, a análise fatorial confirmatória. Recomenda-se, ainda, a aplicação da referida escala em diferentes organizações, bem como sua utilização em estudos que vislumbrem avaliar os CCO como antecedentes, consequentes ou relacionados a outros construtos.

  • ANDRADE, T. Antecedentes contextuais dos comportamentos de cidadania organizacional. 189 f. Tese (Doutorado em Administração) U- niversidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, 2017.
  • ANDRADE, T. et al. Comportamento de cidadania organizacional: um olhar à luz dos valores e da satisfação no trabalho. Revista Brasileira de Gestão de Negócios, v. 19, n. 64, p. 236-262, 2017.
  • AVRICHIR, I; DEWES, F. Construção e validação de um instrumento de avaliação do desempenho docente. Revista Eletrônica de Ciência Administrativa, v. 5, n. 2, p. 1, 2006.
  • BARBOSA, T. S.; GAVIÃO, M. B. D. Qualidade de vida e saúde bucal em crianças - parte II: versão brasileira do Child Perceptions Questionnaire. Ciência & Saúde Coletiva, v. 16, n. 7, p. 3267-3276, 2011.
  • BARNARD, C. The function of the executive. Cambridge: Harvard University Press, 1938.
  • BATEMAN, T. S.; ORGAN, D. W. Job satisfaction and the good soldier: the relationship between affect and employee “citizenship”. Academy of Management Journal, v. 26, n. 4, p. 587-595, 1983.
  • Beaton, D. E. et al. Guidelines for the process of cross-cultural adaptation of self-report measures. Spine, v. 5, n. 24, p. 3186-3191, 2000.
  • BORMAN, W. C.; MOTOWIDLO, S. J. Task performance and contextual performance: The meaning for personnel selection research. Human Performance, v. 10, n. 2, p. 99-109, 1997.
  • BRISLIN, R. W. Back-translation for cross-cultural research. Journal of Cross-Cultural Psychology, v. 1, n. 3, p. 185-216, 1970.
  • CHOW, C. W. C.; LAI, J. Y. M.; LOI, R. Motivation of travel agents’ customer service behavior and organizational citizenship behavior: the role of leader-member exchange and internal marketing orientation. Tourism Management, v. 48, p. 362-369, 2015.
  • COSTA, V. F.; ESTIVALETE, V. F. B.; ANDRADE, T. Comportamento de cidadania organizacional: as visões de colaboradores e de gestores de uma indústria de eletrodomésticos. Revista Eletrônica de Administração, v. 23, n. spe., p. 262-261, 2017.
  • DEKAS, K. H. Citizenship in context: investigating the effects of work group climate on organizational citizenship perceptions and behavior. 287 f. Tese (Ph.D. in Business Administration) - University of Michigan, Ann Arbor, 2010.
  • DEKAS, K. H. et al. Organizational Citizenship Behavior, version 2.0: a review and qualitative investigation of OCBs for knowledge workers at Google and beyond. The Academy of Management Perspectives, v. 27, n. 3, p. 219-237, 2013.
  • EPSTEIN, J.; SANTO, R. M; GUILLEMIN, F. A review of guidelines for cross-cultural adaptation of questionnaires could not bring out a consensus. Journal of Clinical Epidemiology, v. 68, n. 4, p. 435-441, 2015.
  • ESTIVALETE, V. F. B.; COSTA, V. F.; ANDRADE, T. Organizational citizenship behavior: a comparative study between Brazilian and international scientific output from 2002 to 2012. Business and Management Review, v. 4, n. 3, p. 427-441, 2014.
  • EVANS, W. R.; DAVIS, W. D. High-performance work systems and organizational performance: the mediating role of internal social structure. Journal of Management, v. 31, n. 5, p. 758-775, 2005.
  • Ghisi, G. L. D. M. et al. Desenvolvimento e validação da versão em português da Escala de Barreiras para Reabilitação Cardíaca. Arquivos Brasileiros de Cardiologia, v. 98, n. 4, p. 344-352, 2012.
  • GOLDFELD, P. R. M. et al. Adaptação transcultural do Inventory of Countertransference Behavior (ICB) para o português brasileiro. Revista de Psiquiatria do Rio Grande do Sul, v. 29, n. 1, p. 56-62, 2007.
  • GONÇALVES, A. M. S.; PILLON, S. C.Adaptação transcultural e avaliação da consistência interna da versão em português da Spirituality Self Rating Scale (SSRS). Revista de Psiquiatria Clínica, v. 36, n. 1, p. 10-15, 2009.
  • GUILLEMIN, F.; BOMBARDIER, C.; BEATON, D. Cross-cultural adaptation of health-related quality of life measures: literature review and proposed guidelines. Journal of Clinical Epidemiology, v. 46, n. 12, p. 1417-1432, 1993.
  • HAIR, J. F. et al. Fundamentos de métodos de pesquisa em administração. Porto Alegre: Bookman, 2005.
  • HAIR, J. F. et al. Análise multivariada de dados. 6. ed. Porto Alegre: Bookman, 2009.
  • KATZ, D.; KAHN, R. L. Psicologia social das organizações. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1978.
  • LATIF, S. A. A análise fatorial auxiliando a resolução de um problema real de pesquisa de marketing. Caderno de Pesquisas em Administração, São Paulo, v. 0, n. 0, p. 1-10, 1994.
  • LIN, C.; JOE, S. To share or not to share: Assessing knowledge sharing, interemployee helping, and their antecedents among online knowledge workers. Journal of business ethics, v. 108, n. 4, p. 439-449, 2012.
  • MALHOTRA, N. K. Pesquisa de Marketing: Uma Orientação Aplicada. 4. ed.Porto Alegre: Bookman, 2006.
  • MARINOVA, S.; MOON, H.; VAN DYNE, A. L. Are all good soldier behaviors the same? Supporting multidimensionality of organizational citizenship behaviors based on rewards and roles. Human Relations, v. 63, n. 10, p. 1463-1485, 2010.
  • MEYNHARDT, T.; BRIEGER, S. A.; HERMANN, C. Organizational public value and employee life satisfaction: the mediating roles of work engagement and organizational citizenship behavior. The International Journal of Human Resource Management, v. 40, n. 3, p. 1-34, 2018.
  • MOON, H.; VANDYNE, L.; WROBEL, K. The Circumplex Model and the Future of Organizational Citizenship Research. In: TURNIPSEED, D. (Ed.) A Handbook on Organizational Citizenship Behavior: A Review of ‘Good Soldier ’ Activity in Organizations. New York: Nova Science, 2005.
  • NASRA, M. A.; HEILBRUNN, S. Transformational leadership and organizational citizenship behavior in the Arab educational system in Israel: the impact of trust and job satisfaction. Educational Management Administration & Leadership, v. 43, n. 1, p. 1-17, 2015.
  • ORGAN, D. W. Organizational citizenship behavior: the good soldier syndrome. Lexington: Lexington, 1988.
  • ORGAN, D. W. Organizational citizenship behavior: its construct clean-up time. Human Performance, v. 10, p. 85-97, 1997.
  • ORGAN, D. W. Organizational citizenship behavior: recent trends and developments. Annual Review of Organizational Psychology and Organizational Behavior, v.1, n.1, p. 17.1-17.12, 2018.
  • PODSAKOFF, P. M. et al. Organizational citizenship behaviors: a critical review of the theoretical and empirical literature and suggestions for future research. Journal of Management, v. 26, n. 3, p. 513-563, 2000.
  • PODSAKOFF, N. P. et al. Individual- and organizational-level consequences of organizational citizenship behaviors: a meta-analysis. Journal of Applied Psychology, v. 94, p. 122-141, 2009.
  • PODSAKOFF, N. et al. Consequences of unit-level organizational citizenship behaviors: a review and recommendations for future research. Journal of Organizational Behavior, v. 35, p. S87-S119, 2014.
  • PRUDÊNCIO, P. S. et al. The cultural and linguistic adaptation to Brazilian Portuguese and content validity of the patient expectations and satisfaction with prenatal care instrument. Journal of Transcultural Nursing, v. 27, n. 5, p. 1-9, 2015.
  • REGO, A. Climas éticos e comportamentos de cidadania organizacional. Revista de Administração de Empresas, v. 42, p. 50-63, 2002.
  • SALAMON, S. D.; DEUTSCH, Y. OCB as a handicap: an evolutionary psychological perspective. Journal of Organizational Behavior, v. 27, n. 2, p. 185-199, 2006.
  • TAKARA, R. et al. Translation of the Outcome Questionnaire-45 (OQ) into Japanese: a cultural adaptation. Psychotherapy Research, v. 27, n. 2p. 1-13, 2015.
  • VAN DIJKE, M. et al. When does procedural fairness promote organizational citizenship behavior? Integrating empowering leadership types in relational justice models. Organizational Behavior and Human Decision Processes, v. 117, n. 2, p. 235-248, 2012.
  • VAN DYNE, L.; ANG, S.; KOH, C. Development and validation of the CQS: the cultural intelligence scale. In: ANG, S.; VAN DYNE, L. (Ed.). Handbook on cultural intelligence: theory, measurement and applications. New York: M. E. Sharpe, 2008. p. 16-38.
  • WALLUMBVA, F. O. et al. Retracted: authentically leading groups - the mediating role of collective psychological capital and trust. Journal of Organizational Behavior, v. 32, n. 1, p. 4-24, 2011.
  • YAGHOUBI, N. M.; YAZDANI, B. O.; KHORNEGAH, K. The relationship between organizational citizenship behavior (OCB) and social capital (SC). American Journal of Scientific Research, v. 24, p. 121-126, 2011.
  • Agradecimento ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio recebido para a execução desta pesquisa.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2018
  • Data do Fascículo
    Set 2018

Histórico

  • Recebido
    16 Set 2016
  • Aceito
    26 Abr 2018
Fundação Getulio Vargas, Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas Rua Jornalista Orlando Dantas, 30 - sala 107, 22231-010 Rio de Janeiro/RJ Brasil, Tel.: (21) 3083-2731 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernosebape@fgv.br