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Interfaces entre territorialidade e identidade: analisando as vivências das mães do Grupo Maternati

Interfaces entre territorialidad e identidad: analizando las vivencias de las madres del Grupo Maternati

Resumo

O objetivo neste artigo é analisar as interfaces entre territorialidade e identidade por meio das vivências de mães pertencentes ao Maternati - Grupo de Apoio a Gestantes e Mães de Maringá/PR. Buscamos compreender como as identidades são moldadas pelo pertencimento a um território. Para tal, pautamo-nos principalmente pela dimensão simbólica de território, com enfoque sobre os conceitos de territorialidade e identidade. Para alcance do objetivo proposto, adotamos como estratégia metodológica o estudo de caso único. Com enfoque qualitativo, realizamos observação não participante por doze meses nas atividades do grupo, bem como entrevistas semiestruturadas com mães e coordenadoras que o integram, sendo tais dados trabalhados pela análise crítica do discurso. Como resultado, os dados empíricos demonstraram a influência mútua entre territorialidade e identidade. Por meio da territorialização do Maternati, há também uma conjugação entre identidades reproduzidas e novas identidades construídas que foram sendo incorporadas às práticas de maternidade cotidianas do grupo social. Ao mesmo tempo, a geração dessas novas identidades impactou na territorialidade do espaço. O convívio frequente entre as mulheres propiciou a reprodução das práticas e seu avanço para além do território do Maternati, expandindo-se para outros espaços físicos, territorializando novos espaços e se estendendo para além da área da maternidade.

Palavras-chave:
Território; Territorialidade; Identidade; Maternidade.

Resumen

El objetivo de este artículo es analizar las interfaces entre territorialidad e identidad a partir de las vivencias de madres pertenecientes al Maternati -Grupo de Apoyo a las Gestantes y Madres de Maringá, estado de Paraná. Buscamos entender cómo las identidades se conforman a partir de la pertenencia a un territorio. Para ello, nos basamos principalmente en la dimensión simbólica del territorio, centrándonos en los conceptos de territorialidad e identidad. Para alcanzar el objetivo propuesto, adoptamos como estrategia metodológica el estudio de caso único. Bajo un enfoque cualitativo, durante doce meses, realizamos observación no participante de las actividades del grupo, así como entrevistas semiestructuradas con las madres y coordinadoras que lo integran. Tras la obtención de los datos aplicamos el análisis crítico del discurso. Como resultado, los datos empíricos han demostrado la influencia mutua entre territorialidad e identidad. A través de la territorialización de Maternati, también hay una combinación entre las identidades reproducidas y nuevas identidades construidas que se han incorporado en las prácticas cotidianas de maternidad del grupo social. Al mismo tiempo, la generación de estas nuevas identidades tuvo impacto en la territorialidad del espacio. La interacción frecuente entre las mujeres propició la reproducción de las prácticas y su avance más allá del territorio de Maternati, ampliándose a otros espacios físicos, territorializando nuevos espacios, extendiéndose a áreas distintas de la maternidad.

Palabras clave:
Territorio; Territorialidad; Identidad; Maternidad.

Abstract

The objective of this article is to analyze the interfaces between territoriality and identity based on the experiences of mothers belonging to the Maternati - Support Group for Pregnant Women and Mothers of Maringa/PR. We seek to understand how identities are shaped by belonging to a territory. To this end, we focus mainly on the symbolic dimension of territory, centering on the concepts of territoriality and identity. To reach the proposed goal, we adopted as a methodological strategy a single case study. Under a qualitative approach, a non-participant observation of the activities of the group was conducted for twelve months, and semi-structured interviews were carried out with mothers and coordinators, and this data was analyzed through the critical analysis of the discourse. As a result, the empirical data demonstrated mutual influence between territoriality and identity. Through the territorialization of the Maternati, there is also a conjugation between reproduced identities and new constructed identities that have been incorporated into the daily motherhood practices of the social group. At the same time, the generation of these new identities had an impact on the territoriality of space. The frequent contact among women propitiated the reproduction of practices advancing beyond the territory of the Maternati, expanding into other physical spaces, territorializing new spaces and extending to areas other than motherhood.

Keywords:
Territory; Territoriality; Identity; Motherhood

INTRODUÇÃO

A expressão “território” tem sido amplamente utilizada nas Ciências Sociais. Na segunda metade do século XIX, seu uso estava vinculado à natureza política, destacando-se o papel desempenhado pelo Estado no controle do território, o que representava a potência e a solidez de cada Estado-nação (ANDRADE, 1998ANDRADE, M. C. Territorialidades, desterritorialidades, novas territorialidades: os limites do poder nacional e do poder local. In: SANTOS, M.; SOUZA, M. A. A.; SILVEIRA, M. L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 213-220.; SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.). No entanto, nas últimas décadas, “território” ganhou um sentido mais amplo, compreendendo várias questões concernentes ao controle físico e simbólico de determinada área. A partir dos anos 1980, o conceito de território passou também a ser adotado para compreender movimentos sociais urbanos (IMAS e WESTOM, 2012IMAS, J. M.; WESTON, A. From Harare to Rio de Janeiro: Kukiya-Favela organization of the excluded. Organization, London, v. 19, n. 2, p. 205-207, 2012.; VALVERDE, 2004VALVERDE, R. R. H. F. Transformações no conceito de território: competição e mobilidade na cidade. Geousp - Espaço e Tempo, São Paulo, n. 15, p. 119-126, 2004.) e, recentemente, o campo dos Estudos Organizacionais também tem se apropriado do conceito (SARAIVA, CARRIERI e SOARES, 2014SARAIVA, L. A. S.; CARRIERI, A. P.; SOARES, A. S. Territorialidade e identidade nas organizações: o caso do mercado central de Belo Horizonte. Revista de Administração Mackenzie, v. 15, n. 2, p. 97-126, 2014.).

O território, dessa forma, é concebido com base em várias dimensões, englobando aspectos econômicos, políticos, culturais e naturais (E-P-C-N), que estão intimamente ligados (HAESBAERT, 2004HAESBAERT, R. Des-caminhos e perspectivas do território. In: RIBAS, A. D.; SPOSITO, E. S.; SAQUET, M. A. Território e desenvolvimento: diferentes abordagens. Francisco Beltrão: UNIOESTE, 2004. p. 87-119., 2007HAESBAERT, R. Concepções de território para entender a desterritorialização. In: SANTOS, M.; BECKER, B. K. (Orgs.). Território, territórios: ensaios sobre o ordenamento territorial. 3. ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2007. p. 43-71.; SAQUET, 2005SAQUET, M. A. A relação espaço-tempo e a apreensão do movimento em estudos territoriais. In: ENCONTRO DE GEÓGRAFOS DA AMÉRICA LATINA, 2005, 10. Anais... São Paulo, 2005. , 2009SAQUET, M. A. Por uma abordagem territorial. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 73-94.). Segundo Haesbaert (2007HAESBAERT, R. Concepções de território para entender a desterritorialização. In: SANTOS, M.; BECKER, B. K. (Orgs.). Território, territórios: ensaios sobre o ordenamento territorial. 3. ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2007. p. 43-71.), o território compreende tanto a identificação como a apropriação. Ao habitar um espaço e tomar consciência de sua participação, as pessoas o transformam em um território (ANDRADE, 1998ANDRADE, M. C. Territorialidades, desterritorialidades, novas territorialidades: os limites do poder nacional e do poder local. In: SANTOS, M.; SOUZA, M. A. A.; SILVEIRA, M. L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 213-220.; CARA, 1998CARA, R. B. Territorialidade e identidade regional no Sul da Província de Buenos Aires. In: SANTOS, M.; SOUZA, M.A.A.; SILVEIRA, Maria L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 261-269.). Sua ocupação corresponde a vivências significativas, cujo sentido se faz presente nas ações interligadas que compõem e integram o seu processo de constituição e de formação do movimento social (MEDEIROS, 2009MEDEIROS, R. M. V. Território, espaço de identidade. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 217-227.).

Nesse sentido, o tema da identidade ganha valor com o conceito de territorialidade (CARA, 1998CARA, R. B. Territorialidade e identidade regional no Sul da Província de Buenos Aires. In: SANTOS, M.; SOUZA, M.A.A.; SILVEIRA, Maria L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 261-269.), entendido como “[...] produto de interações recíprocas, de relações no âmbito da E-P-C-N” (SAQUET, 2005SAQUET, M. A. A relação espaço-tempo e a apreensão do movimento em estudos territoriais. In: ENCONTRO DE GEÓGRAFOS DA AMÉRICA LATINA, 2005, 10. Anais... São Paulo, 2005. , p. 13890). O território corresponde a um espaço de identificação (MEDEIROS, 2009MEDEIROS, R. M. V. Território, espaço de identidade. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 217-227.) e as identidades são produto da formação de cada território, contextualizadas nas relações sociais com o ambiente externo à sociedade. Logo, compreendê-las requer sua apreensão em um contexto de formação histórica e como um componente do território (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009SAQUET, M. A. A relação espaço-tempo e a apreensão do movimento em estudos territoriais. In: ENCONTRO DE GEÓGRAFOS DA AMÉRICA LATINA, 2005, 10. Anais... São Paulo, 2005. ), o que não implica, por outro lado, negligenciar os demais elementos fundamentais que constituem o patrimônio de cada território.

À vista disso, neste artigo procuramos explorar a relação entre territorialidade e identidade no contexto da maternidade. A maternidade no Brasil tem passado por várias mudanças, tanto em relação ao sistema obstétrico (tipo de parto, local), quanto às práticas e ao modo de criação dos filhos, sendo observados principalmente dois tipos distintos. O modelo predominante, modelo tecnocrático, é marcado por intensa tecnificação imposta sobre o nascimento e a maternidade. Caracteriza-se pela predominância da cesárea (AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR, 2016AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - ANS. ANS publica resolução para estimular parto normal na saúde suplementar. Agência Nacional de Saúde Suplementar, Rio de Janeiro, 06 jan. 2015. Disponível em: <Disponível em: http://www.ans.gov.br/aans/noticias-ans/consumidor/2718-ministerio-da-saude-e-ans-publicam-resolucao-para-estimular-parto-normal-na-saude-suplementar >. Acesso em: 02 dez. 2016.
http://www.ans.gov.br/aans/noticias-ans/...
), utilização acrítica de tecnologias, incorporação de grande número de intervenções, com predominância da figura do médico (RATTNER, 2009RATTNER, D. Humanização na atenção a nascimentos e partos: breve referencial teórico. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, v. 13, p. 595-602, 2009.), uso de chupetas, mamadeiras, fórmulas, entre outros.

Devido à desaprovação desse modelo e, diante do cenário elevado de cesáreas e intervenções, contrárias às recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), a partir da década de 1980 e mais fortemente nos anos 2000, surge um movimento pela humanização do parto e do nascimento, defendido principalmente por grupos organizados por mulheres (JONES, [2007JONES, R. H. Curso de introdução à humanização do nascimento. {2007} (Apostila).]; MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001MINISTÉRIO DA SAÚDE. Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher. Brasília: Ministério da Saúde, 2001.). Esse movimento, tomando por base diretrizes da OMS (1996)ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE - OMS. Assistência ao parto normal: um guia prático. Brasília: Ministério da Saúde, 1996., reivindica mudanças de conduta e de procedimentos adotados nos serviços de saúde, defendendo um modelo humanista, com maior protagonismo e respeito às decisões da mulher e tratando o parto ativo como um acontecimento fisiológico. Nesse modelo, incentivam-se maior incidência do parto normal, a não medicalização do parto, redução de intervenções desnecessárias (GRIBOSKI e GUILHEM, 2006GRIBOSKI, R. A.; GUILHEM, D. Mulheres e profissionais de saúde: o imaginário cultural na humanização ao parto e nascimento. Texto & Contexto Enferm., v. 15, n. 1, p. 107-114, 2006.; RATTNER, 2009RATTNER, D. Humanização na atenção a nascimentos e partos: breve referencial teórico. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, v. 13, p. 595-602, 2009.), bem como práticas mais naturais na maternidade, como o aleitamento materno. Destaca-se também nesse modelo o retorno do parto domiciliar, no qual enfermeiras obstétricas atuam como as pateiras de antigamente (RATTNER, 2009RATTNER, D. Humanização na atenção a nascimentos e partos: breve referencial teórico. Interface - Comunicação, Saúde, Educação, v. 13, p. 595-602, 2009.).

Em razão das discrepâncias gritantes entre ambos os modelos, diversas mulheres relatam a dificuldade de conseguir o parto e a maternidade que desejam porque diferem do modelo predominante no país. Assim, para tentar contornar ou amenizar essas dificuldades, é comum a participação em grupos de apoio que incentivem o modelo humanizado e o empoderamento da mulher.

Nesse contexto, este artigo tem por objetivo analisar as interfaces entre territorialidade e identidade por meio das vivências de mães pertencentes ao Maternati, um grupo de apoio às gestantes e mães, considerando, assim, a organização como território. Sob esse enfoque, as organizações possibilitam que grupos construam significações culturais e atribuam identidades como forma de controle simbólico sobre o espaço onde atuam (PEREIRA e CARRIERI, 2005PEREIRA, D. C.; CARRIERI, A. P. Movimentos de desterritorialização e reterritorilização na transformação das organizações. RAE eletrônica, v. 4, n. 1, 2005.). Buscamos, desse modo, avançar e contribuir com o corpo de pesquisas em territorialidade e identidade com as seguintes questões: como a identidade organizacional é moldada pela territorialidade? Como a territorialidade se expande para além de fronteiras? E como as práticas de um grupo avançam para além de um espaço definido por meio de sua identificação? É importante destacar, ainda, que as práticas são aqui abordadas porque se referem a padrões de atividades socialmente significativas, cuja coerência estabelece-se por estarem ligadas a significados e entendimentos compartilhados (SMETS, MORRIS e GREENWOOD, 2012SMETS, M.; MORRIS, T.; GREENWOOD, R. From practice to field: a multi-level model of practice-driven institutional change. Academy of Management Journal, v. 55; n. 4, p. 877-904, 2012.), ou seja, de identificação dos sujeitos. São, portanto, relevantes para construção da territorialidade e da identidade.

Para responder essas questões e alcançar o objetivo proposto, realizamos um estudo de caso no Maternati - Grupo de Apoio a Gestantes e Mães de Maringá/PR -, o qual divulga uma maternidade natural (em especial o parto natural) e incentiva e apoia mulheres e casais que optam por esse tipo de maternidade em suas várias etapas. Este estudo ilustra as relações entre territorialidade e identidade no âmbito organizacional, interpretando as identidades das mulheres e mães à medida que elas passam a participar e habitar um novo território.

Território e Territorialidade

O conceito de território é um dos principais adotados para compreender a relação entre a sociedade e seu espaço (HAESBAERT, 2004HAESBAERT, R. Des-caminhos e perspectivas do território. In: RIBAS, A. D.; SPOSITO, E. S.; SAQUET, M. A. Território e desenvolvimento: diferentes abordagens. Francisco Beltrão: UNIOESTE, 2004. p. 87-119.). No Brasil, têm-se reforçado estudos e pesquisas em várias áreas centradas em seu conceito (GOULART, VIEIRA, COSTA et al, 2010GOULART, S. et al. Articulações em rede e acontecimentos no território: subsídios teóricos para a formação de políticas públicas para o desenvolvimento. Cadernos Ebape.BR, Rio de Janeiro, v. 8, n. 3, p. 388-403, 2010.; HAESBAERT, 2007CARA, R. B. Territorialidade e identidade regional no Sul da Província de Buenos Aires. In: SANTOS, M.; SOUZA, M.A.A.; SILVEIRA, Maria L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 261-269.; SAQUET, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.). No entanto, na linguagem cotidiana ainda se confundem frequentemente os termos território e espaço (SANTOS e SILVEIRA, 2006SANTOS, M.; SILVEIRA, M. L. O Brasil: território e sociedade no início do século XXI. 9. ed. Rio de Janeiro: Record, 2006.). A diferenciação entre os termos é muito tênue, mas necessária para não dificultar as leituras e conceituações (SAQUET, 2009SAQUET, M. A. Por uma abordagem territorial. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 73-94.). E, apesar de serem distintos, espaço e território não podem ser dissociados, um está no outro.

O espaço antecede o território e este se forma por meio daquele. O território resulta de uma ação conduzida por um ator que, ao se apropriar de um espaço, o territorializa. Assim, território e espaço são diferentes, o território se apoia no espaço, mas configura-se como uma produção por meio dele. Consequentemente, a territorialização do espaço ocorre por processos de apropriação, seja concreta ou simbólica (RAFFESTIN, 1993RAFFESTIN, C. Por uma geografia do poder. São Paulo: Ática, 1993.). Logo, o espaço é transformado historicamente pelas sociedades mediante sua territorialização (SAQUET, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.).

Dado que o território está ligado ao domínio e à apropriação, tal conceito revela relações marcadas pelo poder (ANDRADE, 1998ANDRADE, M. C. Territorialidades, desterritorialidades, novas territorialidades: os limites do poder nacional e do poder local. In: SANTOS, M.; SOUZA, M. A. A.; SILVEIRA, M. L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 213-220.; RAFFESTIN, 1993RAFFESTIN, C. Por uma geografia do poder. São Paulo: Ática, 1993.). Tais relações são indispensáveis para a efetivação de um território, são elas que o cristalizam (SAQUET, 2013SAQUET, M. A. As relações de poder e os significados do conceito de território. In: SAQUET, M. A. Abordagens e concepções de território. São Paulo: Outras Expressões, 2013. p. 27-35. ). “A territorialidade consiste em uma ação apropriativa de um determinado espaço por um indivíduo ou um grupo de indivíduos que desenvolvem, em relação a um objeto ou símbolo, uma relação de posse” (COIMBRA e SARAIVA, 2013COIMBRA, K. E. R.; SARAIVA, L. A. S. Territorialidade em uma organização-cidade: o movimento quarteirão do soul. Gestão & Regionalidade, v. 29, n. 86, p. 34-46, 2013., p. 35). Assim, o território configura-se como a expressão espacial de tais relações (SOUZA, 2009SOUZA, M. L. “Território” da divergência (e da confusão): em torno das imprecisas fronteiras de um conceito fundamental. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p.57-72.).

Todavia, isso não quer dizer que outras dimensões não estejam presentes na territorialidade. Além da dimensão política, relações econômicas e culturais também estão intimamente ligadas ao conceito de território (HAESBAERT, 2007HAESBAERT, R. Concepções de território para entender a desterritorialização. In: SANTOS, M.; BECKER, B. K. (Orgs.). Território, territórios: ensaios sobre o ordenamento territorial. 3. ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2007. p. 43-71.; SAQUET, 2005SAQUET, M. A. A relação espaço-tempo e a apreensão do movimento em estudos territoriais. In: ENCONTRO DE GEÓGRAFOS DA AMÉRICA LATINA, 2005, 10. Anais... São Paulo, 2005. ; SOUZA, 2009SOUZA, M. L. “Território” da divergência (e da confusão): em torno das imprecisas fronteiras de um conceito fundamental. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p.57-72.). Haesbaert (2004HAESBAERT, R. Des-caminhos e perspectivas do território. In: RIBAS, A. D.; SPOSITO, E. S.; SAQUET, M. A. Território e desenvolvimento: diferentes abordagens. Francisco Beltrão: UNIOESTE, 2004. p. 87-119.) agrupa as várias noções de território em três dimensões: a) política - relações espaço-poder, em que o território é visto como espaço delimitado e controlado por um determinado poder -; b) cultural ou simbólico-cultural - aspectos mais simbólicos e subjetivos, em que o território é produto de apropriação simbólica de um grupo; e c) econômica - relações econômicas, nas quais o território é fonte de recursos, envolvido em relação capital-trabalho.

Saquet (2005SAQUET, M. A. A relação espaço-tempo e a apreensão do movimento em estudos territoriais. In: ENCONTRO DE GEÓGRAFOS DA AMÉRICA LATINA, 2005, 10. Anais... São Paulo, 2005. , 2009SAQUET, M. A. Por uma abordagem territorial. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 73-94.) acrescenta a essas três dimensões a dimensão natural. O autor propõe uma abordagem histórica, relacional, multidimensional, material e imaterial, em que há uma conjugação entre aspectos da economia, política, cultura e natureza, a abordagem E-P-C-N. Essas dimensões e suas interações subjacentes são responsáveis pelas movimentações que constituem os territórios. Território e territorialidades são fruto e condição de articulações envolvendo diferentes períodos e lugares, aspectos econômicos, políticos, culturais e naturais, mudanças/descontinuidades e permanências/continuidades, unidade e diversidade, remetendo à relação tempo-espaço-território (SAQUET, 2005SAQUET, M. A. A relação espaço-tempo e a apreensão do movimento em estudos territoriais. In: ENCONTRO DE GEÓGRAFOS DA AMÉRICA LATINA, 2005, 10. Anais... São Paulo, 2005. ).

Embora reconheçamos as várias abordagens que tangem o conceito de território e territorialidade, neste artigo optamos por focar em sua dimensão cultural-simbólica. A apropriação de um espaço por meio da territorialização é exercida por formas de poder que levem ao estabelecimento de laços simbólicos, os quais, por sua vez, conferem um sentido de pertencimento àquele território (MISOCZKY, CAMARA, CERQUEIRA et al., 2012MISOCZKY, M. C. et al. Orientação Sexual, classes sociais e territórios de resistência: os conflitos em torno do Centro Nova Olaria - Porto Alegre. Gestão e Sociedade, v. 6, p. 254-279, 2012.), evidenciando aspectos simbólicos inerentes a todo processo de constituição. A apropriação do território é feita socialmente por grupos que produzem e ressignificam um espaço, correspondendo a uma ocupação geográfica e identitária. Assim, nenhum processo de territorialização é neutro. Ao territorializar um espaço, o grupo social “deixa marcas” simbólicas nos membros do grupo (SARAIVA, CARRIERI e SOARES, 2014SARAIVA, L. A. S.; CARRIERI, A. P.; SOARES, A. S. Territorialidade e identidade nas organizações: o caso do mercado central de Belo Horizonte. Revista de Administração Mackenzie, v. 15, n. 2, p. 97-126, 2014.). No entanto, por vezes, sua abrangência tem sido ignorada nos Estudos Organizacionais, sendo o espaço reduzido, em sua predominância, apenas a dimensões econômicas (ALCADIPANI e ALMEIDA, 2000ALCADIPANI, R.; ALMEIDA, A. O. O feitiço incluiu o feiticeiro: uma análise sobre a implementação de um escritório aberto. In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 24., 2003, Florianópolis. Anais... Florianópolis: ANPAD, 2000.; MAC-ALLISTER, 2003MAC-ALLISTER, M. Emergência do espaço organizacional para a gestão social. In: COLÓQUIO INTERNACIONAL SOBRE PODER LOCAL, 9., 2003, Salvador. Anais... Salvador: Escola de Administração - EAUFBA, 2003. ; PEREIRA e CARRIERI, 2005PEREIRA, D. C.; CARRIERI, A. P. Movimentos de desterritorialização e reterritorilização na transformação das organizações. RAE eletrônica, v. 4, n. 1, 2005.), o que reforça a importância do enfoque na dimensão cultural-simbólica.

Desse modo, o território é simultaneamente funcional e simbólico, uma vez que há uma indissociabilidade entre a realização de suas funções e a produção de seus significados. A construção efetiva do território insere-se num sentido simbólico e é definida em referência às relações culturais (HAESBAERT, 2004HAESBAERT, R. Des-caminhos e perspectivas do território. In: RIBAS, A. D.; SPOSITO, E. S.; SAQUET, M. A. Território e desenvolvimento: diferentes abordagens. Francisco Beltrão: UNIOESTE, 2004. p. 87-119., 2007CARA, R. B. Territorialidade e identidade regional no Sul da Província de Buenos Aires. In: SANTOS, M.; SOUZA, M.A.A.; SILVEIRA, Maria L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 261-269.). A cultura, manifesta em crenças e atitudes, interfere no grupo, que, por sua vez, reflete e condiciona a organização espacial e a dinâmica do território (MEDEIROS, 2009MEDEIROS, R. M. V. Território, espaço de identidade. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 217-227.). Assim, de acordo com Haesbaert (2007HAESBAERT, R. Concepções de território para entender a desterritorialização. In: SANTOS, M.; BECKER, B. K. (Orgs.). Território, territórios: ensaios sobre o ordenamento territorial. 3. ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2007. p. 43-71.), o território como dominância simbólica envolve territórios de diferença, de distinção entre comunidades; territórios como símbolo e com valor simbólico; com princípio da multiplicidade, que o dota de múltiplas identidades; territorialidade “sem território”, isto é, sem a necessidade de uma terra fixa. A materialização da territorialidade não é imprescindível para que a territorialização ocorra. Embora todo território seja dotado de uma territorialidade, nem toda territorialidade exige um território no seu sentido material (HAESBAERT, 2009CARA, R. B. Territorialidade e identidade regional no Sul da Província de Buenos Aires. In: SANTOS, M.; SOUZA, M.A.A.; SILVEIRA, Maria L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 261-269.). Sendo assim, é possível conceber o território para além de um aspecto físico e geográfico, transcendendo uma fronteira espacial.

A conquista de um território pode ser vista de diferentes âmbitos, haja vista não mais se configurar apenas pela aquisição de um pedaço de terra ou alimento, mas envolver também a conquista de uma nova identidade, novas relações ou a continuidade de lutas. O território precisa conciliar a identificação de sujeitos e ações em um mesmo espaço (MEDEIROS, 2009MEDEIROS, R. M. V. Território, espaço de identidade. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 217-227.). Dessa forma, estudos mais atuais já reconhecem que os territórios são marcados mais por um movimento contínuo, uma dinâmica construída socialmente, do que por sua fixação em uma terra específica, uma representação estática natural (TEIXEIRA, SARAIVA e CARRIERI, 2015TEIXEIRA, J. C.; SARAIVA, L. A. S; CARRIERI, A. P. Os lugares das empregadas domésticas. Organizações & Sociedade, v. 22, n. 72, 2015.; VALVERDE, 2004VALVERDE, R. R. H. F. Transformações no conceito de território: competição e mobilidade na cidade. Geousp - Espaço e Tempo, São Paulo, n. 15, p. 119-126, 2004.).

Por conseguinte, apesar de serem amplos os modos como os territórios podem ser delimitados, todos sempre terão como plano de fundo aspectos culturais e sociais intrínsecos (COIMBRA e SARAIVA, 2013COIMBRA, K. E. R.; SARAIVA, L. A. S. Territorialidade em uma organização-cidade: o movimento quarteirão do soul. Gestão & Regionalidade, v. 29, n. 86, p. 34-46, 2013.). A territorialização constitui e é substantivada por territorialidades multidimensionais, que são plurais e estão em unidade. Plurais em virtude de desigualdades e diferenças, e unitárias por meio das identidades (SAQUET, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.). A dimensão simbólica, portanto, abrange elementos espaciais, representações e símbolos, que constituem uma identidade territorial (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009SAQUET, M. A. Por uma abordagem territorial. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 73-94.). Esta é “[...] produto da formação de cada território num contexto de relações sociais com o ambiente externo à vida em sociedade” (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009, p. 14), sendo um elemento central do território (SAQUET, 2005SAQUET, M. A. Por uma abordagem territorial. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 73-94.) - o que será retratado na próxima seção.

Territorialidade e Identidade

Assim como o conceito de território, o de identidade tem atraído pesquisadores de diversas áreas de estudo. Ele refere-se a um construto crítico para entender a evolução de interpretações, emoções e ações ao longo do tempo, que restringe o que um indivíduo ou membro interpreta como legítimo e afeta o padrão de ações relacionadas a questões específicas (DUTTON e DUKERICH, 1991DUTTON, J. E.; DUKERICH, J. M. Keeping an eye on the mirror: image and identity in organizational adaptation. Academy of Management Journal, v. 34, n. 3, p. 517-554, 1991.). A identidade também pode ser entendida pela interação social. Viegas (2014VIEGAS, G. C. F. S. Dinâmica urbana e pichação: entre preto fosco e tons de concreto há quem prefira outras cores. 2014. 288f. Dissertação (Mestrado) - Centro de Pós-Graduação e Pesquisas em Administração, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.) defende a ideia de uma identidade em constante movimento, como uma dinâmica coletiva e autônoma de vir a ser. Na visão do autor, a identidade possibilita a subsistência, sobreposição ou até libertação dos indivíduos em face da dominação, por meio do pertencimento de uma coletividade que preserve sua existência e contribua para que os papéis sociais sejam sobrepujados.

No âmbito organizacional, Carrieri, Paula e Davel (2008CARRIERI, A. P.; PAULA, A. P. P.; DAVEL, E. Identidade nas organizações: Múltipla? Fluida? Autônoma? Organizações & Sociedade, v. 15, n. 45, p. 127-144, 2008.) reforçam esse aspecto da coletividade, presente em Viegas (2014VIEGAS, G. C. F. S. Dinâmica urbana e pichação: entre preto fosco e tons de concreto há quem prefira outras cores. 2014. 288f. Dissertação (Mestrado) - Centro de Pós-Graduação e Pesquisas em Administração, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.), propondo a existência de identidades coletivas nas organizações, em virtude da multiplicidade de grupos sociais que nelas existem. A identidade coletiva, assim, é construída por meio da interação entre os membros dos grupos. E, uma vez construída, a identidade molda a interpretação dos membros, serve como ponto de referência e afeta as ações tomadas pelos indivíduos (DUTTON e DUKERICH, 1991DUTTON, J. E.; DUKERICH, J. M. Keeping an eye on the mirror: image and identity in organizational adaptation. Academy of Management Journal, v. 34, n. 3, p. 517-554, 1991.). Isto é, remete ao geral e ao individual, de modo que a identidade coletiva afeta também a individual.

A discussão sobre seu termo adquiriu valor na Geografia com o conceito de territorialidade como aspecto relacional entre espaço e sociedade (CARA, 1998CARA, R. B. Territorialidade e identidade regional no Sul da Província de Buenos Aires. In: SANTOS, M.; SOUZA, M.A.A.; SILVEIRA, Maria L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 261-269.). De igual modo, nas Ciências Sociais, seu conceito tem sido frequentemente abordado como um instrumento poderoso na disputa entre territórios (MATOS, 2005MATOS, M. P. O Rio de Janeiro das escolas de samba: lugar, identidade e imagem urbana. 2005. 165 f. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro.). Segundo Medeiros (2009MEDEIROS, R. M. V. Território, espaço de identidade. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 217-227.), o território é um espaço de identidade ou de identificação. Inicialmente é um espaço cultural de identificação e de pertencimento e só em um segundo momento ocorre sua apropriação.

Saquet e Briskievicz (2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.) apontam que, para Haesbaert, não é o espaço propriamente que forma uma identidade, mas as forças cultural e política dos grupos sociais que nele atuam e reproduzem sua capacidade de produzir uma identidade, sendo esta territorialmente mediada. As identidades, assim, na visão dos autores, são produto da formação de cada território, dos processos históricos e relacionais envolvidos, e formam um patrimônio territorial que os atores devem preservar e valorizar diretamente na sua constituição histórica e por outras pessoas que possam viver esse patrimônio.

O conceito de identidade, dessa forma, se inter-relaciona com o de território, porque este pressupõe uma afirmação identitária (MEDEIROS, 2009MEDEIROS, R. M. V. Território, espaço de identidade. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 217-227.), seu espaço tem sempre incorporado, de alguma forma, uma dimensão identitária (HAESBAERT, 2009HAESBAERT, R. Dilema de conceitos: espaço-território e contenção territorial. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 95-120.). O território “[...] é uma objetivação multidimensional da apropriação social do espaço. A territorialidade, a qualidade subjetiva do grupo social ou do indivíduo que lhe permite, com base em imagens, representações e projetos, tomar consciência de seu espaço de vida” (CARA, 1998CARA, R. B. Territorialidade e identidade regional no Sul da Província de Buenos Aires. In: SANTOS, M.; SOUZA, M.A.A.; SILVEIRA, Maria L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 261-269., p. 262). Logo, à medida que os espaços e seus desdobramentos são permeados pela identidade, eles se convertem em territórios e em realidade que se constrói (SARAIVA, CARRIERI e SOARES, 2014SARAIVA, L. A. S.; CARRIERI, A. P.; SOARES, A. S. Territorialidade e identidade nas organizações: o caso do mercado central de Belo Horizonte. Revista de Administração Mackenzie, v. 15, n. 2, p. 97-126, 2014.).

Por conseguinte, gradualmente, o território vai produzindo seus próprios símbolos, suas próprias significações e identidades. Tais significados vão se multiplicando em um conjunto de ações que demonstram essas identificações (MEDEIROS, 2009MEDEIROS, R. M. V. Território, espaço de identidade. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 217-227.). O território, então, envolve esse patrimônio identitário que pode ser potencializado em projetos e programas de desenvolvimento que visem à sua preservação e valorização. Ele compreende o saber-fazer, as edificações, os monumentos, os museus, os dialetos, as crenças, os arquivos históricos, as relações sociais das famílias, as empresas, as organizações políticas (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.).

Quando um território é habitado, estabelece-se, então, uma relação inconsciente de troca e confiança. E tal território se faz importante na construção e afirmação da identidade pessoal e territorial de cada indivíduo (MATOS, 2005MATOS, M. P. O Rio de Janeiro das escolas de samba: lugar, identidade e imagem urbana. 2005. 165 f. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro.). O sentimento de pertencimento define a territorialidade, bem como territórios de identidade. Os territórios revelam os indivíduos como pertencentes a um grupo (SARAIVA, CARRIERI e SOARES, 2014SARAIVA, L. A. S.; CARRIERI, A. P.; SOARES, A. S. Territorialidade e identidade nas organizações: o caso do mercado central de Belo Horizonte. Revista de Administração Mackenzie, v. 15, n. 2, p. 97-126, 2014.). Consequentemente, os símbolos e imagens que materializam a identidade só possuem valor de uma perspectiva endógena, que possibilita compreender o conceito de identidade em um sentido territorial (CARA, 1998CARA, R. B. Territorialidade e identidade regional no Sul da Província de Buenos Aires. In: SANTOS, M.; SOUZA, M.A.A.; SILVEIRA, Maria L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 261-269.).

Dessa forma, conhecer o território envolve conhecê-lo em parte e no todo, conhecer a si mesmo e também o outro (SILVA, 1998SILVA, A. C. O território da consciência e a consciência do território. In: SANTOS, M.; SOUZA, M. A. A.; SILVEIRA, M. L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 257-260.). As diferenças só existem porque fazem referência a experiências compartilhadas sobre um mesmo território e estas, por sua vez, conferem sentido às diferenças por meio de referências comuns. A identidade compartilhada, portanto, influencia na forma como o indivíduo se vê e se relaciona em um espaço (SARAIVA, CARRIERI e SOARES, 2014SARAIVA, L. A. S.; CARRIERI, A. P.; SOARES, A. S. Territorialidade e identidade nas organizações: o caso do mercado central de Belo Horizonte. Revista de Administração Mackenzie, v. 15, n. 2, p. 97-126, 2014.).

Portanto, território, territorialidade e identidade estão em complementaridade, eles acontecem simultaneamente num condicionamento mútuo entre território, identidade e desenvolvimento. Isto é, dependendo do projeto de desenvolvimento, pode haver preservação ou não dos traços identitários e simbólicos de cada território, como também ocorrer uma conjugação entre permanências e mudanças, em que identidades podem ser reproduzidas e novas identidades incorporadas aos hábitos e comportamentos cotidianos de um grupo social (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.).

Logo, a apropriação e a construção do território geram identidades, as quais, concomitantemente, geram os territórios (SAQUET, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.). Um território, por sua vez, “[...] pode fazer parte de uma organização, o que endereça aos estudos organizacionais elementos para integrar a discussão” (SARAIVA, CARRIERI e SOARES, 2014SARAIVA, L. A. S.; CARRIERI, A. P.; SOARES, A. S. Territorialidade e identidade nas organizações: o caso do mercado central de Belo Horizonte. Revista de Administração Mackenzie, v. 15, n. 2, p. 97-126, 2014., p. 104). Nessa concepção, a territorialidade é resultado do processo de produção de cada território e é fundamental para a construção da identidade da reorganização da vida cotidiana. A identidade se constrói por meio das múltiplas relações com as territorialidades que os indivíduos estabelecem diariamente e envolve, necessariamente, a produção de obras materiais e imateriais (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009SAQUET, M. A. Por uma abordagem territorial. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 73-94.).

Torna-se importante, portanto, aprofundar essa relação no campo dos Estudos Organizacionais, uma vez que permite um fluxo contínuo e dinâmico entre duas extremidades, atores sociais e território, bem como considera as identidades como um fenômeno social. Ao se apropriar do espaço e transformá-lo em território, sentimentos de pertencimento são despertados, cristalizando identidades coletivas e individuais (SARAIVA, CARRIERI e SOARES, 2014SARAIVA, L. A. S.; CARRIERI, A. P.; SOARES, A. S. Territorialidade e identidade nas organizações: o caso do mercado central de Belo Horizonte. Revista de Administração Mackenzie, v. 15, n. 2, p. 97-126, 2014.; TEIXEIRA, SARAIVA e CARRIERI, 2015TEIXEIRA, J. C.; SARAIVA, L. A. S; CARRIERI, A. P. Os lugares das empregadas domésticas. Organizações & Sociedade, v. 22, n. 72, 2015.), fenômeno que propomos pesquisar empiricamente e que será descrito na sequência.

Percurso Metodológico

Tendo em vista os objetivos e as premissas delimitadas nesta pesquisa, optamos por um estudo qualitativo. Para Denzin e Lincoln (2005DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. S. Introdução: a disciplina e a prática da pesquisa qualitativa. In: DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. S. (Orgs.). O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e abordagens. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2005. p. 15-41.), isso implica ênfase nas qualidades das entidades, bem como em processos e significados que não podem ser medidos em termos quantitativos - o que está em consonância com a dimensão simbólica do território adotada como base teórica. Ainda, considerando a importância de um aprofundamento histórico para a temática, adotamos como abordagem temporal o recorte seccional com perspectiva longitudinal (VIEIRA, 2004VIEIRA, M. M. F. Por uma boa pesquisa (qualitativa) em administração. In: VIEIRA, M. M. F.; ZOUAIN, D. M. (Orgs.). Pesquisa qualitativa em administração. Rio de Janeiro: FGV, 2004. p.13-28.) em dados coletados no ano de 2015. Nossa análise busca, assim, descrever os dois processos, territorialização e formação de identidades, desenhando um longo decurso de tempo.

A estratégia metodológica adotada foi o estudo de caso, tendo como unidade de análise o Maternati - Grupo de Apoio às Mães e Gestantes. Este grupo tem por objetivo proporcionar acompanhamento a gestantes, mães, pais e famílias, oferecendo um espaço de convivência e conscientização que possibilite experiência ativa e transformadora do processo, com incentivo a maior naturalidade dos vários aspectos da maternidade. A estratégia metodológica mostrou-se adequada, pois, de acordo com Yin (2001YIN, R. K. Estudo de Caso: planejamento e métodos. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.), permite lidar com as condições contextuais nas quais um fenômeno contemporâneo encontra-se inserido.

Adicionalmente, a coleta de dados foi baseada em três fontes, a fim de possibilitar maior proximidade com a territorialização e identificação das mães e, assim, permitir traçar uma linha convergente de pesquisa entre os diversos dados coletados (YIN, 2001YIN, R. K. Estudo de Caso: planejamento e métodos. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.). A primeira, investigação documental, abrangeu artigos, livros, dissertação, matérias de blogs e site do grupo que retratassem experiências e relatos de membros do Maternati ou práticas e crenças valorizadas por elas. Buscamos, com isso, aprofundar a análise tanto para um escopo maior de participantes que compõem o grupo em estudo, tendo por base diferentes períodos de tempo além do abrangente, quanto para refletir que, apesar de relativos a um caso específico, o Maternati, os achados fazem parte de um movimento nacional mais amplo de humanização do parto e nascimento.

Sequencialmente, iniciamos a pesquisa de campo. Nesta, a primeira autora do artigo realizou, por meio de inserção no grupo, observação não participante em todo o período de coleta dos dados. Esse envolvimento consistiu de acompanhamento presencial de sete tipos de atividade do Maternati, dentre elas cursos, reuniões de mães, rodas de conversa, seminário e confraternizações. Acompanhamos também, de modo virtual, a interação das participantes por meio das redes sociais (grupos de Facebook e WhatsApp). Após acompanhamento de cada observação, as respectivas notas eram registradas em um diário de campo, resultando em 1313 páginas transcritas.

O acompanhamento das atividades e das interações entre o grupo consistiu em uma etapa muito rica por possibilitar maior aprofundamento nas vivências dos diversos atores e, portanto, na identificação dos processos de análise. A inserção no cotidiano dos atores permitiu alcançar uma melhor compreensão dessas relações complexas e de significação do mundo e, com isso, dar base para a condução do próximo instrumento de coleta de dados.

Assim, entrevistas foram conduzidas após cinco meses de observação no intuito de adensar aspectos já identificados. Sua natureza semiestruturada propiciou ocasião para que as profissionais e mães participantes do Maternati se expressassem de maneira minuciosa, exprimindo o contexto social e pessoal de suas crenças, valores e práticas (SELLTIZ, JAHODA, DEUTSCH et al., 1975SELLTIZ, C. et al. Métodos de pesquisa nas relações sociais. Edição revista e nova tradução de Dante Moreira Leite. 5. reimpressão. São Paulo: E.P.U., 1975. ). Os respectivos roteiros contavam com dez questões que abordavam problemáticas relativas às práticas e significações da maternidade, à escolha por formar/participar e continuar no grupo, bem como aos vínculos construídos. Foram realizadas sete entrevistas, sendo três com psicólogas responsáveis pelo Grupo, todas doulas (profissionais que oferecem à gestante informação e apoio físico e emocional, antes, durante e após o nascimento), e quatro com mães participantes.

A escolha pelo primeiro grupo, doulas, ocorreu em virtude de, além de se tratar também de mulheres que já têm ou planejam ter suas maternidades pautadas nos mesmos valores, estão à frente do grupo na condução das atividades e relacionam-se fortemente com a construção do território e da identidade das mães do Maternati. Já a seleção das mães entrevistadas, intencionou abranger diferentes períodos de participação, experiências de parto e envolvimento no grupo. Tal escolha foi delimitada pela saturação das respostas, uma vez que novas entrevistas não iriam trazer mais nenhuma variedade significante que pudesse ser agregada à pesquisa (BAUER e AARTS, 2013BAUER, M. W.; AARTS, B. A. construção do corpus: um princípio para a coleta de dados qualitativos. In: BAUER, Martin W.; GASKELL, George. (Orgs.). Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um guia prático. 11. ed. Petrópolis: Vozes, 2013. p. 39-63.). A participação foi de caráter voluntário e a adesão foi total entre as participantes. Reforça-se ainda que nesta etapa optou-se por não incluir os pais/esposos, pois, além da visão destes ter sido contemplada nas observações, como algumas atividades do grupo eram de participação exclusiva das mulheres, o enfoque foi concentrado nelas.

Assim, com a utilização de procedimentos variados para obtenção dos dados, foi empregada a estratégia de triangulação, na qual eles foram cruzados a fim de estabelecer um encadeamento de evidências (DENZIN e LINCOLN, 2005DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. S. Introdução: a disciplina e a prática da pesquisa qualitativa. In: DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. S. (Orgs.). O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e abordagens. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2005. p. 15-41.; YIN, 2001YIN, R. K. Estudo de Caso: planejamento e métodos. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.). A organização e sistematização dos dados foi realizada com auxílio do Software NVivo 10. Esses, então, foram analisados por meio da Análise Crítica do Discurso. De acordo com Fairclough (2001FAIRCLOUGH, N. Discurso e mudança social. Brasília: Universidade de Brasília, 2001.), o discurso contribui para a constituição de diversas dimensões da estrutura social, tanto como prática de representação quanto de significação do mundo. Ele contribui para a reprodução da sociedade, de suas relações e identidades sociais, sistemas de conhecimento e crenças, e também para sua transformação. É adequado, portanto, ao presente estudo.

Por conseguinte, os depoimentos coletados foram analisados considerando três diretrizes inter-relacionadas propostas por Fairclough (2001FAIRCLOUGH, N. Discurso e mudança social. Brasília: Universidade de Brasília, 2001.): textos, prática discursiva e prática social - conforme ilustrado e exemplificado no Quadro 1. A primeira dimensão reflete a escolha dos atores quanto ao uso das palavras e dos significados expressos por meio delas. Abrange as relações estabelecidas entre os elementos do texto, entre o explícito e o implícito evidenciados nas escolhas dos sujeitos sobre como se manifestar. A prática discursiva, por sua vez, envolve processos cognitivos de produção e interpretação textual, baseando-se em estruturas e convenções sociais interiorizadas, isto é, corresponde a como as pessoas produzem e compreendem os textos embasadas em procedimentos partilhados de senso comum. Assim, demanda referência aos ambientes econômicos, políticos e institucionais, nos quais o discurso é gerado e acentua historicidade, consistindo em respostas a outros textos.

Quadro 1
Diretrizes para Análise de Dados

Por fim, as práticas sociais articulam o discurso juntamente com outros elementos não discursivos, tais como ação e interação, relações sociais, pessoas com suas crenças, atitudes e histórias, identificando as relações e efeitos de um no outro. Envolvem também o discurso no que diz respeito às relações de poder, ideologias e lutas hegemônicas, isto é, como contribui tanto para produção e reprodução, quanto para transformação das relações de dominação (FAIRCLOUGH, 2001FAIRCLOUGH, N. Discurso e mudança social. Brasília: Universidade de Brasília, 2001.).

Maternati: Território e Identidade de uma Maternidade Natural

Fundado em 2013, o Maternati surgiu em meio ao contexto do movimento da humanização do parto e do nascimento. O objetivo era abrir um espaço que abrigasse um olhar da Psicologia para as mães e gestantes, que pudesse acompanhar e acolhê-las nesse momento de transformação da mulher. Na época da pesquisa, sua equipe era formada por três psicólogas.

O grupo oferece diversas atividades - abertas ao público e fechadas em grupos particulares - voltadas para gestantes e cônjuges, mães e crianças. Nas atividades realizadas, alguns tópicos específicos eram comumente discutidos e já demonstravam o posicionamento do grupo. Os principais eram a gestação, tipos de parto e o contexto obstétrico atual do Brasil, que evidenciam, por um lado, o desejo comum pelo parto natural, livre de intervenções e, por outro, a dificuldade em consegui-lo.

Outro tema igualmente frequente eram as práticas de uma maternidade mais natural: amamentação exclusiva e prolongada em livre demanda; alimentação mais saudável, ausente de produtos industrializados e doces; utilização de fraldas de pano e colar de âmbar; criação com apego; uso de slings; cama compartilhada; brincadeiras livres de aparelhos eletrônicos, com brinquedos pedagógicos e montessorianos, dentre outras.

À vista do desejo por essas práticas, que diferem das predominantes no país, as vivências compartilhadas ilustram que o grupo se via como integrante de uma contracultura, sempre diante de lutas para alcançar a naturalidade em sua gestação, nascimento e criação. Relatos do grupo faziam referência também, de acordo com a prática discursiva, a outras vozes e contextos, destacando que indivíduos externos as denominavam de “loucas”, dentre outros motivos, por desejar “em pleno século XXI sentirem dor” (Diário de Campo). Também remetiam à prática social, ao realçar as relações de hegemonia entre práticas dominantes e reprimidas. Assim, a compreensão desse contexto de formação histórica fez-se essencial como um componente do território para compreender a territorialização (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.) do Maternati. A dimensão política, presente nesse cenário de lutas (SAQUET, 2005SAQUET, M. A. Por uma abordagem territorial. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 73-94.), foi fundamental para o início da territorialização dessa organização.

Em virtude das dificuldades relatadas e presenciadas pelas doulas, a formação do grupo intencionava ser um espaço de acolhimento - conforme pode ser visto na fala abaixo e nas informações do grupo (site, redes sociais). A finalidade era proporcionar um lugar onde as integrantes pudessem expor suas vontades sem críticas e rejeição, discutir desejos em comuns, pautados em valores que se identificavam, e receber o apoio que muitas vezes não tinham em outros ambientes. O fragmento discursivo abaixo evidencia isso ao destacar, de acordo com a dimensão de práticas discursivas, a relação com outras vozes:

Então, um espaço em comum, onde elas podem ser aceitas por elas mesmas, pela gente, onde não tem essa crítica imposta, numa rejeição [...] isso é muito necessário, porque é um momento muito desamparador da sociedade. (Entrevista profissional2).

Essa dimensão simbólica era expressa também na vinculação do Maternati a uma casa, tanto pelas profissionais quanto pelos participantes, conforme os trechos a seguir:

Foi surgindo essa ideia do Maternati como um espaço para essas mães e para essas gestantes, como uma casa e que pudesse ter também outras atividades, e que pudessem acompanhá-las não só na gestação, mas depois. (Entrevista profissional1).

Eu e o [marido] participamos da nossa primeira roda de conversa do Maternati. Ao chegar lá, percebi que estava em casa. O grupo tinha os mesmos pensamentos que eu. Todas desejavam o curso natural do nascimento! Era a mesma vibração! Descobri ali um tesouro escondido em uma cidade tão cesarista e desinformada. (Relato de Parto - Mãe1).

A correspondência do Maternati a uma casa, de acordo com a prática textual, ocorre numa dimensão simbólica, ao transmitir um sentido de proximidade e pessoalidade, local de se sentir “à vontade”. Ao qualificar o grupo como uma casa, os membros evidenciam esse pertencimento, no aspecto de lar, um lugar de segurança para se exporem e se sentirem acolhidas. Ao mesmo tempo, essa correspondência também evoca a relação espaço-tempo (SAQUET, 2005SAQUET, M. A. A relação espaço-tempo e a apreensão do movimento em estudos territoriais. In: ENCONTRO DE GEÓGRAFOS DA AMÉRICA LATINA, 2005, 10. Anais... São Paulo, 2005. ), distinguindo entre a maternidade de “dentro” - Maternati, o “eu” - como acolhedora, pessoal, explícita na escolha do vocábulo; e a de “fora”, implícita - o modelo predominante, o “outro” - como impessoal, intervencionista, desamparadora. Desse modo, conhecer o território do Maternati também implica conhecer o outro (SILVA, 1998SILVA, A. C. O território da consciência e a consciência do território. In: SANTOS, M.; SOUZA, M. A. A.; SILVEIRA, M. L. (Orgs.). Território, globalização e fragmentação. São Paulo: Hucitec, 1998. p. 257-260.). A legitimidade do Maternati como esse território acolhedor se faz pelo conhecimento de outros territórios como contrastantes.

Ademais, distinguir o território implica também distinguir seu patrimônio identitário (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.). A relação dialética (BERGER e LUCKMAN, 2004BERGER, P. L.; LUCKMANN, T. A construção social da realidade: tratado de sociologia do conhecimento. 24. ed. Petrópolis: Vozes, 2004.; VASCONCELOS e VASCONCELOS, 2000VASCONCELOS, I. F. G.; VASCONCELOS, F. C. Identidade e mudança: o passado como ativo estratégico. In: ENCONTRO DE ESTUDOS ORGANIZACIONAIS - ENEO, 52., 2000, Curitiba. Anais... Curitiba: Cromos, 2000. ) presente na construção da identidade fica nítida na fala abaixo, na qual as diferenças entre o “eu” e o “não eu” mostram-se interdependentes à identidade (VIEGAS, 2014VIEGAS, G. C. F. S. Dinâmica urbana e pichação: entre preto fosco e tons de concreto há quem prefira outras cores. 2014. 288f. Dissertação (Mestrado) - Centro de Pós-Graduação e Pesquisas em Administração, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.) do grupo, refletidos na escolha dos textos, no que está presente nele, e também nas ausências do texto:

Para viver a maternidade plenamente, nos retiramos um pouco do meio social costumeiro e nos voltamos para nossa casa. Esta se torna nosso mundo. No nosso caso: Mães Ativas, este mundo é feito de pesquisa, slings, fraldas de pano, leitinho cheio de amor, muito colo, colares de âmbar, homeopatia, brinquedos feitos em casa, respeito à infância, parceria e apoio ilimitado 24h por dia, no mais belo estilo uma mãe suporta a outra [...] Mas no momento de nos voltarmos para fora de nossas casas, nos deparamos com um mundo acinzentado aguardando nossos preciosos bebês: feito de mamadeiras, fórmulas industrializadas, alimentos pobres, preconceito, medicalização, negligenciamento comodismo, consumismo, desamor [...] (Grupo do Facebook - mãe2).

Os termos adotados - nosso mundo, voltarmos pra fora - conforme a prática textual - reforçam o caráter simbólico da territorialização, uma vez que, apesar de reconhecidas as fronteiras estabelecidas entre dentro e fora, estas são imateriais. A demarcação do território avança para além de espaços físicos e o território aparece como símbolo, valor simbólico (HAESBAERT, 2007HAESBAERT, R. Concepções de território para entender a desterritorialização. In: SANTOS, M.; BECKER, B. K. (Orgs.). Território, territórios: ensaios sobre o ordenamento territorial. 3. ed. Rio de Janeiro: Lamparina, 2007. p. 43-71.). Logo, ao construir um território distinto do outro, elas também estreitam essas fronteiras implicitamente, enunciando que a maternidade mais natural é possível e, ali dentro, cercada das demais participantes, ela é mais suave, colorida e os obstáculos possíveis de serem superados.

Desse modo, com a participação no grupo, algumas mulheres passaram a visualizar suas experiências passadas - cesárea, leite artificial, intervenções no parto; contrárias às práticas desejadas - como desnecessárias e constatar que, se estivessem diante de uma equipe humanizada e/ou de apoio de um grupo como o Maternati, poderiam ter revertido a situação. Isto é, a partir do momento que essas mães começam a pertencer a um novo território, as suas próprias interpretações de práticas e acontecimentos e, consequentemente, suas identidades, passam a ser moldadas pela territorialização, sendo concebidas de forma diferente do que eram.

Tal influência era nítida em mulheres que começaram a participar do Maternati depois do primeiro filho. Os relatos demonstravam que não apenas o parto dos filhos foi diferente, mas também a própria criação. A participação em um território novo influenciou a construção de uma nova identidade como mães, que as conduziu, por sua vez, a desempenhar uma nova maternidade. Assim, a construção de uma identidade organizacional como grupo levava também à construção de uma nova identidade individual como mãe. Essa mudança era tão forte que alguns relatos evidenciavam culpa por um filho ter recebido uma criação melhor em comparação ao outro. Os fragmentos discursivos evocados, como o abaixo, expressavam, de acordo com a dimensão de prática social, relação com a ação e, em muitos casos, cruzamento de fronteiras, possibilitando novas combinações (FAIRCLOUGH, 2001FAIRCLOUGH, N. Discurso e mudança social. Brasília: Universidade de Brasília, 2001.), isto é, novas práticas e nova maternidade.

É bem diferente com ele [...] Eu me sinto muito culpada de não ter feito com ela o jeito que faço com ele [...] acho que agora eu encontrei a minha maternidade que eu devia ter começado com ela. (Entrevista mãe3).

Além da identificação com as práticas citadas anteriormente, o território do Maternati envolve seu próprio patrimônio identitário (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.) manifestado em outros aspectos também. As crenças na naturalidade do parto e da maternidade como algo melhor, mais saudável, a valorização da natureza; os objetos constantemente empregados (fralda de pano/sling/colar de âmbar), que caracterizavam as mulheres e seus filhos notoriamente como um grupo distinto (“Meu marido quando vê uma mulher com sling já fala: ‘vi aquelas suas amigas lá’” (Curso de Mães- mãe4)); os relatos de parto e de amamentação; e dialetos próprios evidenciam esse patrimônio particular.

O emprego de dialetos/vocabulários comuns aos membros, como prática textual, era fortemente característico, reforçando a autoidentificação e a autodiferenciação dos membros como um grupo. A autorreferência à “índia” é o principal desses termos; a busca por essa maternidade natural, focada na feminilidade, na autonomia da mulher, e na facilidade de parir e amamentar, é representada na figura da “índia”, que é motivo de orgulho para elas. “As amigas índias”, “índias parideiras”, “está parecendo índia” eram falas comuns que representavam os valores do grupo e um reconhecimento de sua identidade. Já atitudes de displicência, falhas ou outras que fogem ao seu ideal de maternidade são denominadas “menas mãe”. Os filhos, por sua vez, são frequentemente tratados como “crias”, vocábulo que faz referência à natureza, ao ser mamífero - valores estimados pelo grupo. O “empoderamento” é outro termo muito citado, representativo de uma estratégia de enfrentamento perante as dificuldades entre as mulheres: “se empoderar”, “mulheres empoderadas”. Já diante de um nascimento, os votos comuns eram por uma linda “lua de leite”, incentivando com isso a amamentação exclusiva e em livre demanda.

Ademais, observou-se que, ao mesmo tempo que a apropriação e a construção do território geravam a identidade do grupo, esta concomitantemente gerava sua territorialização e expansão (SAQUET, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.). Muitas vezes, as mulheres novatas chegavam buscando informações sobre o parto e, em alguns casos, ainda com dúvidas ou medos. Mas com a convivência com outras mulheres mais antigas no grupo e com trocas interativas de experiências e de apoio, reforçavam o desejo e a escolha por esta e outras práticas naturais.

Ao começar a participar de outras atividades e fora e dentro destas cunhar um vínculo entre as integrantes, essas mulheres criavam também identificações que levavam a acréscimos de práticas semelhantes à sua maternidade, com as quais não haviam tido contato até então. As trocas constantes de informação e experiência expandiam os assuntos e as dúvidas geradas no cotidiano da maternidade e permitiam a difusão de práticas estabelecidas a respeito dos valores em comum, gerando o compartilhamento de suas experiências e a multiplicação do emprego de novas práticas. A maternidade, desse modo, estava sempre em processo de construção e identificação entre o grupo, de forma que o Maternati representava não apenas um espaço de apoio e acolhimento, mas também de construção de novas identificações e, consequentemente, de novas práticas, conforme trecho a seguir:

Vocês abriram as portas para um mundo novo, de apego, de livre demanda, de tantas coisas lindas que sem vocês talvez eu teria feito tudo diferente. (Grupo de WhatsApp - mãe5).

Por conseguinte, a territorialização desse espaço gerava um sentimento de pertencimento ao grupo, que ia se fortalecendo ao longo do tempo (MATOS, 2005MATOS, M. P. O Rio de Janeiro das escolas de samba: lugar, identidade e imagem urbana. 2005. 165 f. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-Graduação em Geografia, Universidade Estadual Paulista, Rio Claro.), de modo que mesmo após ter seus filhos, elas desejavam permanecer ligadas ao grupo, e assim o faziam, participando de outras atividades oferecidas pelo Maternati. Era muito frequente após a realização do curso de gestantes, as mulheres participarem também dos grupos de mães, musicalização, oficinas oferecidas e confraternizações. O convívio frequente das integrantes também gerava laços de amizades entre elas, que direcionavam a organização de reuniões pelas próprias mulheres. Mesmo quando o grupo de mães se encerrava no Maternati (o grupo consiste de oito reuniões), elas permaneciam se encontrando ocasionalmente, em suas casas, parques, cafés ou nas comemorações de aniversário, tanto das mães como dos bebês. Isso se estendia também à construção de laços entre os respectivos maridos, que igualmente passavam a conviver uns com os outros em virtude desses encontros.

Há, assim, uma expansão da territorialização para além dos seus limites geográficos, envolvendo todos os espaços que o grupo vivencia e (re)-cria (COIMBRA e SARAIVA, 2013COIMBRA, K. E. R.; SARAIVA, L. A. S. Territorialidade em uma organização-cidade: o movimento quarteirão do soul. Gestão & Regionalidade, v. 29, n. 86, p. 34-46, 2013.). Essa expansão incluía espaços públicos - como parques e a Catedral da cidade, onde organizavam piqueniques, slingadas (caminhada com o bebê no sling), mamaço (evento em prol da amamentação) - e também novos territórios físicos. Um exemplo desses novos territórios é a implantação da casa de cuidados coletivos ou cooperativa de mães. Diante da necessidade de retorno ao trabalho e desejando que a criação dos filhos se mantivesse pautada sobre os mesmos valores, um grupo de mães implantou uma creche parental, na qual os pais se revezam nos cuidados dos filhos, seguindo valores em comuns.

Ademais, a forte identificação por meio da territorialização do Maternati gerava marcas simbólicas nos membros (SARAIVA, CARRIERI e SOARES, 2014SARAIVA, L. A. S.; CARRIERI, A. P.; SOARES, A. S. Territorialidade e identidade nas organizações: o caso do mercado central de Belo Horizonte. Revista de Administração Mackenzie, v. 15, n. 2, p. 97-126, 2014.), que se estendiam a outras redes de contato e avançavam para além do campo da maternidade. Observou-se que a territorialização do grupo, com o tempo, estendia-se também aos familiares e amigos dos membros. Por meio do convívio com essas integrantes - mesmo não participando do grupo ou exercendo essa maternidade natural -, mães, pais, irmãos e amigos dos membros passavam a se interessar e a ajudar na difusão do grupo e do movimento pela humanização do parto e do nascimento, indicando-o a conhecidos seus. Relatos expostos pelas integrantes evidenciam indicações de práticas naturais ou da própria adesão ao grupo por pessoas não envolvidas diretamente, mas que auxiliavam na expansão da territorialização do Maternati.

Complementarmente, esse envolvimento se estende também para outras áreas além da maternidade, refletindo em suas vidas profissionais e redes de negócio. Algumas mulheres, após o parto, passam a se envolver na prestação de serviços e venda de produtos relacionados à dimensão materna, indicativo que mostra a interligação entre as dimensões simbólica e econômica apontadas por Saquet (2005SAQUET, M. A. A relação espaço-tempo e a apreensão do movimento em estudos territoriais. In: ENCONTRO DE GEÓGRAFOS DA AMÉRICA LATINA, 2005, 10. Anais... São Paulo, 2005. ) e Haesbaert (2004HAESBAERT, R. Des-caminhos e perspectivas do território. In: RIBAS, A. D.; SPOSITO, E. S.; SAQUET, M. A. Território e desenvolvimento: diferentes abordagens. Francisco Beltrão: UNIOESTE, 2004. p. 87-119.). A venda de fraldas de pano, bodies de bebês, babadores, brinquedos sensoriais, docinhos sem açúcar e conservantes, e também a formação e atuação como doula são alguns casos observados durante a coleta de dados. É frequente o vínculo a grupos de incentivo à amamentação, os quais, apesar de consistirem num trabalho voluntário, dedicam vários períodos à assistência online e presencial. É comum, também, pelos laços estabelecidos, a contratação de serviços entre as integrantes de acordo com a profissão de cada uma.

O estabelecimento de vínculos entre elas, dessa forma, girava muito mais em torno dessas identificações e compartilhamentos simbólicos do que de aproximação ou convívio presencial. O contato majoritário era virtual, mas, ainda assim, considerado como algo baseado em amizades e sentimentos profundos. Assim, mesmo sem a exigência da materialidade do território a todo o momento, a territorialização simbólica impactava e influenciava a identidade e a maternidade dessas mulheres.

Por conseguinte, ao mesmo tempo que cada uma delas tem sua própria história - marcada por especificidades distintas -, também se identificam por buscas em comum, as quais são individuais a cada uma, mas também vistas como um direito coletivo de todas. A conquista do território do Maternati pode ser vista, então, tanto pela nova identidade construída quanto pela continuidade de uma luta maior (MEDEIROS, 2009MEDEIROS, R. M. V. Território, espaço de identidade. In: SAQUET, M. A.; SPOSITO, E. S. (Orgs.). Territórios e territorialidades: teorias, processos e conflitos. São Paulo: Expressão Popular, 2009. p. 217-227.). Ao participar do Maternati, essas mulheres se envolviam também no movimento nacional em prol da humanização, em uma busca por mudanças no cenário de nascimentos do país.

Por mais que o primeiro contato com o grupo decorra do desejo individual de alcançar o parto e a maternidade desejados para si, quando começam a pertencer ao novo território e a construir novas identidades (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.), também passam a defender e apoiar mudanças no modelo obstétrico e de maternidade atual, integrando, desse modo, a atuação do grupo Maternati - impacto local - ao movimento nacional de humanização. Isso reflete tanto a dimensão de prática social, uma vez que o discurso se relaciona com lutas de poder e desafia ordens já existentes - no caso um sistema obstétrico tecnocrático -, quanto também de prática discursiva, visto que o discurso é legitimado pela permeabilidade a outros discursos de âmbito maior.

Eu acho que essas reuniões que a gente faz que vão fazer a diferença. O que vai fazer mudar é isso aqui, a gente se juntar. (Curso de Gestantes - esposo1).

Eu espero fazer parte de um movimento que seja pequeno, mas que mude esse pensamento das pessoas e que a gente possa incentivar outras pessoas. Vai lá no Maternati, se informa, se empodera, você é capaz. Quero fazer parte desse movimento. (Curso de Gestantes - gestante1).

Destarte, território, territorialidade e identidade ocorreram simultaneamente. Houve uma conjugação entre identidades reproduzidas e novas identidades construídas que eram incorporadas aos hábitos e práticas cotidianos (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.) do Maternati. Esse patrimônio envolve aspectos materiais e imateriais, que se expandem e avançam pouco a pouco para além desse território, integrando concomitantemente a luta de um movimento maior em prol de mudanças no contexto brasileiro geral.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste artigo retratamos a relação entre territorialidade e identidade no âmbito organizacional inserido no contexto da maternidade. Partimos da premissa de que território e territorialidade acontecem também por intermédio de ações sociais e que estas podem orientar o redimensionamento de relações de poder, valorizando identidades simbólico-culturais que são construídas concomitantemente à sua territorialização (SAQUET e BRISKIEVICZ, 2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.).

Os dados empíricos demonstraram a influência mútua entre territorialidade e identidade. À medida que as integrantes passavam a pertencer ao território do Maternati, suas identidades iam sendo moldadas de acordo com os valores simbólicos territorializados. Assim, uma nova identidade era construída e as levava a exercer uma nova maternidade. No caso das mães que passaram a frequentar o Maternati na gestação do segundo filho, isso era ainda mais evidente, uma vez que o pertencimento a este território gerou uma mudança de identidade e a adoção de novas práticas, evidenciando duas maternidades diferentes entre os filhos.

Na dimensão simbólica, nesse caso, houve uso de elementos materiais (espaço físico, objetos utilizados) e também representações e símbolos imateriais (crenças, dialetos, laços construídos) que possibilitaram a construção de uma identidade territorial. A construção dessa identidade e o sentimento de pertencimento ao grupo possibilitaram, então, a apropriação do território do Maternati, bem como sua distinção com o “outro”, visto que, por mais que tal distinção não estivesse separada por fronteiras materiais, fez-se bem delimitada por meio de práticas, discursos e valores contrastantes, numa dimensão simbólica. Desse modo, a construção da identidade do grupo também se manifestou como possibilidade de subsistência e luta ante uma dominação que não lhes agradava (VIEGAS, 2014VIEGAS, G. C. F. S. Dinâmica urbana e pichação: entre preto fosco e tons de concreto há quem prefira outras cores. 2014. 288f. Dissertação (Mestrado) - Centro de Pós-Graduação e Pesquisas em Administração, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.). O pertencimento a uma coletividade marcada por afirmações identitárias próprias permitiu ao grupo uma identidade que expressava a capacidade de superar o tipo de parto e maternidade que muitas vezes lhes eram impostos, segundo relatos, mas que não eram de sua vontade.

Assim, a participação continuada no grupo levou a uma reprodução e extensão dessas identidades que avançaram tais fronteiras. As integrantes passaram a assumir essas identidades como uma luta em prol da mudança de contexto, e como conscientização e empoderamento de outras mulheres. Dessa forma, a apropriação do território para as integrantes manifestava-se não apenas na construção de uma nova identidade, mas também na continuidade de uma luta coletiva.

Complementarmente, a geração de novas identidades impactava simultaneamente na territorialidade do espaço. Sua constituição sofre influência do território, tendo em vista que os processos de socialização estão situados em uma espacialidade. A dinâmica identitária dos atores, assim, é permeada por um espaço, de dimensão material e simbólica, que se reflete em suas identificações (CORREA e LOURENÇO, 2016CORREA, M. V. P.; LOURENÇO, M. L. A constituição da identidade dos professores de pós-graduação stricto sensu em duas instituições de ensino superior: um estudo baseado nas relações de poder e papéis em organizações. Cadernos Ebape.BR, Rio de Janeiro, v. 14, n. 4, p. 858-871, 2016.). Complementarmente, nosso estudo, além de ratificar tais argumentos, avança ao evidenciar que identidade e território extrapolam para além das fronteiras organizacionais e do território físico.

Ao considerar o Maternati como território (PEREIRA e CARRIERI, 2005PEREIRA, D. C.; CARRIERI, A. P. Movimentos de desterritorialização e reterritorilização na transformação das organizações. RAE eletrônica, v. 4, n. 1, 2005.), nosso estudo contribui teoricamente evidenciando o avanço da dimensão espacial no processo de territorialização. O convívio frequente entre as mulheres propiciava a reprodução das práticas que avançavam para além do território do Maternati, envolvendo a adesão de novas entrantes; a expansão para outros espaços físicos - públicos e privados -; a territorialização de novos espaços - creche parental -; a expansão para outros indivíduos não ligados ao grupo, que eram influenciados e passavam a disseminar o grupo também; e a extensão para outras áreas além da maternidade - profissão/negócios. Implicando, por conseguinte, a não restrição da territorialização de um espaço e a concomitante constituição da identidade a limites organizacionais, mas seu avanço para além destas fronteiras.

É ainda importante ressaltar que a compreensão e formação do patrimônio identitário do grupo só se fez inteligível, conforme Berger e Luckman (2004BERGER, P. L.; LUCKMANN, T. A construção social da realidade: tratado de sociologia do conhecimento. 24. ed. Petrópolis: Vozes, 2004.), com sua localização no universo simbólico em que estava inserido, isto é, no território em que foi construído. Portanto qualquer estudo que foque nessas manifestações identitárias deverá abranger simultaneamente o contexto histórico espaço-temporal em que está fundamentado.

Por conseguinte, ao evidenciar a conjugação entre território, territorialidade e identidade, nosso estudo busca apoiar-se em Saquet e Briskievicz (2009SAQUET, M. A.; BRISKIEVICZ, M. Territorialidade e identidade: um patrimônio no desenvolvimento territorial. Caderno Prudentino de Geografia, v. 1, n. 31, p. 3-16, 2009.). Por meio da territorialização do Maternati, identidades reproduzidas e novas identidades construídas se ligam e são incorporadas às práticas de maternidade cotidianas do grupo social e, pouco a pouco, são multiplicadas em outras entrantes e outros territórios, reforçando e estendendo, consequentemente, a territorialização do grupo e inserindo-o num contexto mais amplo de luta social.

O estudo contribuiu, ainda, ao demonstrar a inter-relação entre as dimensões territoriais, política, econômica e simbólica. Mesmo com o foco sobre a última, foi possível perceber a interligação entre as demais. A territorialização do espaço Maternati iniciou-se com a influência da dimensão política, na qual lutas de poder contrastavam dois modelos obstétricos e de maternidade e a predominância do modelo contrário ao desejado por essas mulheres dificultava o parto e a maternidade pretendidos. Assim, aliando-se ao aspecto simbólico, que valoriza essa naturalidade e a concebe como mais saudável, a territorialização do Maternati foi se constituindo e expandindo, proporcionando a construção de um patrimônio identitário que possibilitou fazer avançar o território do grupo. Essa territorialização, por conseguinte, expande-se para além das fronteiras, alcançando aspectos econômicos também, que envolveram o âmbito profissional e financeiro dessas mulheres, com o estabelecimento de fontes de renda e de novos negócios relacionados à maternidade e vinculados simultaneamente às identificações simbólicas.

Portanto, em conjunto, territorialidade e identidade contribuem para uma abordagem mais complexa sobre territorialização ao evidenciar como os conceitos estão ligados, uma vez que a apropriação do território pressupõe manifestações identitárias também. À medida que as integrantes passam a pertencer a um novo território e o preenchem com uma identidade territorial, a territorialização se desdobra em novos espaços, novas práticas e novos integrantes.

Consideramos como limitação do estudo a não imersão no movimento social de Humanização do Parto e Nascimento. Por mais que reconheçamos ser de grande relevância e ter implicação significativa na expansão da territorialização do Maternati, e tentarmos captar sua atuação, devido à sua amplitude nacional e internacional, sua compreensão foi possível apenas de uma visão externa, tendo uma concentração maior sobre o ponto de vista do grupo. Fica assim, como sugestão, futuras pesquisas que abranjam outros movimentos sociais por meio de vivências internas, bem como analisem as relações aqui investigadas em outros grupos de apoio às mães e às gestantes e também em outros campos de pesquisa, para verificação e avanço das conclusões tratadas aqui.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2018
  • Data do Fascículo
    Dez 2018

Histórico

  • Recebido
    20 Mar 2017
  • Aceito
    17 Abr 2018
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