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Capitalismo consciente: uma análise netnográfica em grupos da rede social LinkedIn

Capitalismo consciente: un análisis netnográfico en los grupos de la red social Linkedin

Resumo

O capitalismo consciente (CC), estruturado por John Mackey e Raj Sisodia Sisodia, tem base nos princípios do propósito maior, da integração dos stakeholders, da liderança consciente e da cultura e gestão consciente, entendendo que o capitalismo pode ser uma força tanto para a economia e para o bem-estar social quanto para o meio ambiente. Nesse contexto, o objetivo do estudo foi identificar e analisar o conteúdo postado e as interações acerca do tema CC nos grupos da rede social LinkedIn. A pesquisa se caracteriza como qualitativa quanto à abordagem, exploratória e descritiva quanto aos objetivos e netnográfica quanto aos procedimentos, com observação em grupos do LinkedIn. Para realizá-la foi utilizado o modelo de fluxo simplificado de um projeto de investigação netnográfica de Kozinets (2010). Os principais resultados apontam que: a maioria dos idealizadores dos grupos se encontra nos Estados Unidos da América (EUA), país onde o CC nasceu; os grupos foram criados com a finalidade de interagir com temas ligados ao CC; as interações nos grupos ocorrem principalmente por meio de postagens e comentários com assuntos referentes ao CC, no entanto, o número de membros de um grupo não reflete maior quantidade de interações. Por fim, a maior parte dos grupos entende o CC de acordo com a definição estabelecida por seus idealizadores, John Mackey e Raj Sisodia, porém, colocá-lo em prática nas organizações tem sido um desafio.

Palavras-chave:
Capitalismo Consciente; Grupos Sociais; LinkedIn; Netnografia

Resumen

El capitalismo consciente, estructurado por John Mackey y Raj Sisodia, se basa en los principios del propósito mayor, la integración de los stakeholders, el liderazgo consciente y la cultura y la gestión consciente, entendiendo que el capitalismo puede ser una fuerza tanto para la economía y para el bienestar social como para el medio ambiente. En este contexto, el objetivo del estudio fue identificar y analizar el contenido publicado y las interacciones acerca del tema capitalismo consciente en los grupos de la red social Linkedin. La investigación se caracteriza como cualitativa en cuanto al abordaje, exploratorio y descriptivo en cuanto a los objetivos, y netnográfico en cuanto a los procedimientos, con observación en grupos de Linkedin. Para la realización de la investigación, se utilizó el modelo de flujo simplificado de un proyecto de investigación netnográfica de Kozinets (2010). Los principales resultados indican que: la mayoría de los creadores de los grupos está en Estados Unidos, país donde el capitalismo consciente nació; los grupos se crearon con la finalidad de interactuar con temas relacionados con el capitalismo consciente; las interacciones, en los grupos, ocurren principalmente por medio de publicaciones y comentarios con asuntos referentes al capitalismo consciente, sin embargo, se concluye que el número de miembros de un grupo no refleja mayor cantidad de interacciones. Asimismo, la mayoría de los grupos entiende el capitalismo consciente de acuerdo con la definición establecida por sus creadores, John Mackey y Raj Sisodia, sin embargo, ponerlo en práctica en las organizaciones ha sido un desafío.

Palabras clave:
Capitalismo consciente; Grupos sociales; Linkedin; Netnografía

Abstract

The concept of conscious capitalism structured by John Mackey and Raj Sisodia, is based on the principles of higher purpose, stakeholder integration, conscious leadership, and conscious culture and management, understanding that capitalism can be a force for the economy, social welfare, and for the environment. In this context, the objective of the study was to identify and analyze the content posted and the interactions carried out in discussions about conscious capitalism in groups of the social network Linkedin. The research an exploratory and descriptive study, adopting a qualitative approach and netnographic procedures observing groups on Linkedin. The study used a model of simplified flow of a netnographic research project by Kozinets (2010). The main results indicate that: most of the group owners are in the United States, where conscious capitalism was born; the groups were created with the purpose of interacting with themes related to conscious capitalism; the interactions in the groups happen mainly through posts and comments with subjects related to conscious capitalism. However, the number of members of a group does not reflect a higher number of interactions. Finally, most groups understand conscious capitalism according to the definition set by the pioneers, John Mackey and Raj Sisodia, but putting it into practice in organizations has been a challenge.

Keywords:
Conscious Capitalism; Social Groups; Linkedin; Netnography

INTRODUÇÃO

Empresas proativas, por livre-iniciativa, podem trabalhar a partir do capitalismo consciente (CC) como premissa organizacional, criando valor não somente para si, mas para toda a sua rede de relacionamentos e stakeholders (MACKEY e SISODIA, 2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.). Esse movimento inovador busca a prosperidade de modo humanizado, equilibrando resultados financeiros com a sustentabilidade (MACKEY e SISODIA, 2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Conscious capitalism is not an oxymoron. Harvard Business Review, Cambridge, 14 jan. 2013a. Disponível em: <Disponível em: https://hbr.org/2013/01/cultivating-a-higher-conscious >. Acesso em: 10 ago. 2017.
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). O CC apresenta tentativas de reconstruir externalidades sociais e ambientais em termos relacionados ao mercado e baseia-se na afirmação de que as forças de mercado são o mecanismo-chave para a mudança social (FARRELL, 2014FARRELL, N. ‘Conscience capitalism’ and the neoliberalisation of the non-profit sector. New Political Economy, v. 20, n. 2, p. 254-272, 2014.).

Alguns estudos abordaram a temática do CC. Wisler (2018WISLER, J. C. U. S.. CEOs of SBUs in luxury goods organizations: a mixed methods comparison of ethical decision-making profiles. Journal of Business Ethics, v. 149, n. 2, p. 443-518, 2018.) comparou o perfil ético de diretores executivos (chief executive officers - CEOs) na indústria de bens de luxo, para localizar temas que indicam a compatibilidade dos valores e práticas da estratégia de luxo com os princípios e conceitos da liderança responsável e do CC. Eckhardt e Dobscha (2018ECKHARDT, G. M.; DOBSCHA, S. The consumer experience of responsibilization: the case of Panera Cares. Journal of Business Ethics, p. 1-13, 2018. Disponível em: <Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007%2Fs10551-018-3795-4 >. Acesso em 03 set. 2017.
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), com base nos princípios do CC, exploraram se o consumidor estaria disposto a “fazer o bem”, quando tal oportunidade fosse apresentada a ele. Frémeaux e Michelson (2017FRÉMEAUX, S.; MICHELSON, G. The common good of the firm and humanistic management: conscious capitalism and economy of communion. Journal of Business Ethics, v. 145, n. 4, p. 701-709, 2017.) analisaram, a partir dos movimentos “capitalismo consciente” e “economia de comunhão”, como a busca do bem comum, por parte da empresa, pode servir como guia para a gestão humanística. Forléo (2016FORLÉO, C. A. A relação do capitalismo consciente com marketing societal, macromarketing e responsabilidade social corporativa. International Journal of Business & Marketing, v. 1, n. 2, p. 33-44, 2016.) estudou a relação entre capitalismo consciente, marketing societal, macromarketing e responsabilidade social corporativa. Fyke e Buzzanell (2013FYKE, J.; BUZZANELL, P. M. The ethics of conscious capitalism: wicked problems in leading change and changing leaders. Human Relations, v. 66, n. 12, p. 1619-1644, 2013.), a partir de escândalos corporativos, crises organizacionais e irregularidades contáveis, indicam que a ética da liderança passou a ter maior relevância e adotam como objeto de estudo uma empresa de consultoria e desenvolvimento de liderança que considera os princípios do CC como base para o desenvolvimento de líderes. Sisodia (2009SISODIA, R. Doing business in the age of conscious capitalism. Journal of Indian Business Research, v. 1, n. 2-3, p. 188-192, 2009.) buscou descrever o conceito de CC considerando-o uma abordagem nova e mais esclarecida sobre o propósito e a gestão dos negócios.

Os estudos abordam questões sobre o CC e sua relação com empresa ou com o consumidor. Entretanto, nenhum estudo pesquisou o entendimento sobre CC a partir da interação estabelecida em grupos formados em uma rede social com fins profissionais/de negócios. Este estudo parte da premissa de que as redes sociais, por serem canais que integram pessoas e auxiliam na formação de grupos, constituem ambientes propícios para debates relacionados ao CC. Redes sociais são espaços de interação social e evidenciam marcas de culturas (KOZINETS, 2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.). Com isso, tais espaços sociais passaram a ser contextos de análise para pesquisadores em diferentes áreas. A netnografia, definida como “etnografia de grupos on-line, que estuda práticas culturais complexas em ação, dirigindo a atenção a ideias, significados, práticas sociais, relacionamentos, linguagens e sistemas de simbolismo” (KOZINETS, 2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010., p. 25). No campo de estudos brasileiros em administração, a netnografia tem sido reconhecida enquanto recurso metodológico (ADADE, BARROS e COSTA, 2018ADADE, D. R.; BARROS, D. F.; COSTA, A. S. C. Netnografia e a análise do discurso mediada por computador como alternativas metodológicas para investigação de fenômenos em administração. Sociedade, Contabilidade e Gestão, v. 13, n. 1, p. 86-104, 2018.; FREITAS e LEÃO, 2012aFREITAS, G. K. A.; LEÃO, A. L. M. S. concepção da netnografia da comunicação: uma abordagem aplicada à pesquisa em administração. Revista Eletrônica de Gestão Organizacional, v. 10, n. 2, p. 211-228, 2012a.; NOVELI, 2010NOVELI, M. Do off-line para o on-line: a netnografia como um método de pesquisa ou o que pode acontecer quando tentamos levara a etnografia apara a internet? Reflexão entre etnografia e netnografia, refletindo sobre as duas práticas. Organizações em Contexto, v. 6, n. 12, p. 107-133, 2010.) e com aplicabilidade em diversos campos. Por exemplo, estudos netnográficos anteriores foram realizados no Brasil e focaram aspectos como comunidades de marca de produtos (FREITAS e LEÃO, 2012bFREITAS, G. K. A.; LEÃO, A. L. M. S. A elaboração da face em comunidades virtuais de marca: um estudo de caso sobre uma comunidade virtual de consumidores da Coca-Cola, Cadernos EBAPE.BR, Rio de Janeiro, v. 10, n. 1, p. 181-201, 2012b.; LEÃO, CAMARGO e CAVALCANTI, 2015LEÃO, A. L. M. S.; IANATOMI, T.; CAVALCANTI, R. C. T. Diga-me onde andas, que te direi quem és: identidades culturais na comunidade brasileira da marca Johnnie Walker. Revista de Administração (São Paulo), v. 50, n. 3, p. 369-380, 2015.; MORAES e ABREU, 2017MORAES, T. A.; ABREU, N. R. Tribos de consumo: representações sociais em uma comunidade virtual de marca. Organizações & Sociedade, v. 24, n. 81, p. 325-342, 2017.), comportamento de grupo antes do lançamento de um produto (MACHADO, SOUKUP, GALINDO et al., 2015MACHADO, R. et al. A constituição de uma comunidade virtual de marca no lançamento de um produto Revista de Administração Contemporânea, v. 19, n. esp., p. 117-136, 2015.), comunidades de consumo de produtos tecnológicos (BARBOSA e ARRUDA FILHO, 2012BARBOSA, M. N. L.; ARRUDA FILHO, E. J. M. O comportamento do consumidor tecnológico diante dos valores ecologicamente corretos: ideologia verde versus responsabilidade social. Revista Brasileira de Ciências da Comunicação, v. 35, n. 1, p. 157-182, 2012.; FERREIRA e ARRUDA FILHO, 2015FERREIRA, N. S.; ARRUDA FILHO, E. J. M. Usabilidade e preferência de uso na rede social Facebook: uma análise netnográfica dos usuários tecnológicos. Revista de Gestão da Tecnologia e Sistemas de Informação, v. 12, n. 2, p. 415-434, 2015.). Não foram identificados estudos junto a grupos de CC, sendo que somente Barbosa e Arruda Filho (2012BARBOSA, M. N. L.; ARRUDA FILHO, E. J. M. O comportamento do consumidor tecnológico diante dos valores ecologicamente corretos: ideologia verde versus responsabilidade social. Revista Brasileira de Ciências da Comunicação, v. 35, n. 1, p. 157-182, 2012.) focaram novos produtos que integram o fator ecológico no Brasil.

Dessa forma, o objetivo desta pesquisa é identificar e analisar o conteúdo postado e as interações acerca do tema CC em grupos sociais do LinkedIn. Tal objetivo foi traçado para responder a seguinte pergunta de pesquisa:

  • Os grupos sociais criados no LinkedIn, voltados ao capitalismo consciente, mantêm interação com as questões fundamentais do capitalismo consciente?

Trata-se de um estudo qualitativo, netnográfico de observação, realizado por intermédio de dados secundários, coletados em 34 grupos da rede social LinkedIn, identificados com o CC. Para tanto, seguiu-se o modelo de fluxo simplificado de um projeto de investigação netnográfica sugerido por Kozinets (2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.).

Uma das contribuições deste estudo consiste em identificar e apresentar, ao campo da administração e à sociedade, novos elementos que podem redirecionar a forma de fazer negócios tradicionais das empresas, mais voltados à realidade e às necessidades que contemporaneamente se apresentam dentro do paradigma capitalista. Outra contribuição consiste em identificar que as redes sociais, mais especificamente uma delas voltada a questões profissionais, podem contribuir com o aprofundamento de debates e questões voltadas às decisões das empresas. A terceira contribuição consiste no fato de abordar uma metodologia ainda pouco explorada, que apresenta grande potencial de auxílio ao mundo acadêmico para o aprofundamento dos estudos.

Os principais resultados desta pesquisa apontam que a maioria dos criadores dos grupos é dos Estados Unidos da América (EUA), país onde o CC foi criado por John Mackey e Raj Sisodia (MACKEY e SISODIA, 2013aMACKEY, J.; SISODIA, R. Conscious capitalism is not an oxymoron. Harvard Business Review, Cambridge, 14 jan. 2013a. Disponível em: <Disponível em: https://hbr.org/2013/01/cultivating-a-higher-conscious >. Acesso em: 10 ago. 2017.
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). Os grupos foram originados com a finalidade de interagir com os temas ligados ao CC. As interações ocorrem principalmente por meio de postagens e comentários com assuntos referentes ao CC. Os principais temas comentados versam sobre os princípios do CC e sua relação com as pessoas, a sociedade, o meio ambiente e a criação de valores. Também se visualiza que muitos dos grupos não mantêm interação, isto é, foram criados, mas perderam sua força.

Este artigo se divide em 6 seções. Esta introdução apresenta a questão de pesquisa, o site social e os tópicos de investigação, conforme o passo inicial do fluxo de Kozinets (2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.). A seção 2 aborda o CC e o tópico 3 apresenta a metodologia de pesquisa. A seção 4 apresenta a análise de dados e a interpretação iterativa dos achados, que são os passos seguindo do modelo de Kozinets (2010)KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.. A seção 5 relata o passo 5 recomendado por Kozinets (2010)KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.. E, por fim, a seção 6 apresenta as considerações finais do estudo, além de sugerir limitações e indicar novas possibilidades de pesquisa sobre o tema.

CAPITALISMO CONSCIENTE

Em um contexto de contínua e constante mudança, cresce o número de empresas baseadas na ideia de que fazer negócios vai além do lucro. Trata-se de buscar resultados positivos para a empresa e a sociedade como um todo (MACKEY e SISODIA, 2013aMACKEY, J.; SISODIA, R. Conscious capitalism is not an oxymoron. Harvard Business Review, Cambridge, 14 jan. 2013a. Disponível em: <Disponível em: https://hbr.org/2013/01/cultivating-a-higher-conscious >. Acesso em: 10 ago. 2017.
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). Tais empresas passaram a ser mais conscientes com relação aos problemas sociais, ambientais e econômicos que permeiam a sociedade, em detrimento de uma visão baseada unicamente no lucro, como enfatizava o economista Milton Friedman (SISODIA, 2009SISODIA, R. Doing business in the age of conscious capitalism. Journal of Indian Business Research, v. 1, n. 2-3, p. 188-192, 2009.). Nesse sentido surgiu o CC, como um caminho a ser trilhado a partir do princípio de que o capitalismo, como sistema estabelecido, precisa ser reavaliado, de modo a reconstruí-lo de forma mais humana, onde o lucro deixa de ser o único fim (SISODIA, 2009SISODIA, R. Doing business in the age of conscious capitalism. Journal of Indian Business Research, v. 1, n. 2-3, p. 188-192, 2009.; FYKE e BUZZANELL, 2013FYKE, J.; BUZZANELL, P. M. The ethics of conscious capitalism: wicked problems in leading change and changing leaders. Human Relations, v. 66, n. 12, p. 1619-1644, 2013.).

O CC foi estruturado a partir de duas trajetórias diferentes - a empresarial, de John Mackey, e a acadêmica, de Raj Sisodia (SISODIA, 2009SISODIA, R. Doing business in the age of conscious capitalism. Journal of Indian Business Research, v. 1, n. 2-3, p. 188-192, 2009.), que entendem que os negócios e o capitalismo têm imperfeições, mas são bons e éticos. Seu desenvolvimento ocorreu para suprir as lacunas deixadas pela responsabilidade social corporativa, que não atingiu a eficácia esperada pelas empresas (BRADSHAW e ZWICK, 2016BRADSHAW, A.; ZWICK, D. The field of business sustainability and the death drive: a radical intervention. Journal of Business Ethics, v. 136, n. 2, p. 267-279, 2016.; FLEMING e JONES, 2012FLEMING, P.; JONES, M. The end of corporate social responsibility: crisis and critique. Thousand Oaks: Sage, 2012.). Configura-se como bom, ético, nobre e heroico, visto que cria valor, interage com as partes interessadas, dá significado à existência das empresas e cria prosperidade (MACKEY e SISODIA, 2013aMACKEY, J.; SISODIA, R. Conscious capitalism is not an oxymoron. Harvard Business Review, Cambridge, 14 jan. 2013a. Disponível em: <Disponível em: https://hbr.org/2013/01/cultivating-a-higher-conscious >. Acesso em: 10 ago. 2017.
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). Os negócios não ficam restritos à geração de lucro, renda e emprego, mas vão além (SISODIA, 2009SISODIA, R. Doing business in the age of conscious capitalism. Journal of Indian Business Research, v. 1, n. 2-3, p. 188-192, 2009.; FYKE e BUZZANELL, 2013FYKE, J.; BUZZANELL, P. M. The ethics of conscious capitalism: wicked problems in leading change and changing leaders. Human Relations, v. 66, n. 12, p. 1619-1644, 2013.; FORLÉO, 2016FORLÉO, C. A. A relação do capitalismo consciente com marketing societal, macromarketing e responsabilidade social corporativa. International Journal of Business & Marketing, v. 1, n. 2, p. 33-44, 2016.). O CC não nega o sistema econômico capitalista, mas participa dele (SIMPSON, CUNHA e REGO, 2015SIMPSON, A. V.; CUNHA, M. P.; REGO, A. Compassion in the context of capitalistic organizations: evidence from the 2011 Brisbane floods. Journal of Business Ethics, v. 130, n. 3, p. 683-703, 2015.) com o objetivo de integrar princípios holísticos como atenção plena, ética, moralidade e harmonia em toda a empresa (ECKHARDT e DOBSCHA, 2018ECKHARDT, G. M.; DOBSCHA, S. The consumer experience of responsibilization: the case of Panera Cares. Journal of Business Ethics, p. 1-13, 2018. Disponível em: <Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007%2Fs10551-018-3795-4 >. Acesso em 03 set. 2017.
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).

Envolve a preocupação crescente com a degradação ambiental e com a disseminação da miséria, bem como com a conscientização de que a solução desses problemas só será possível com a participação ativa do mundo empresarial (ANNAN, 2003ANNAN, K. Challenges and responsibilities: corporate citizenship in a global society. In: KOCHAN, T. A.; BOOKMARK, R. (Ed.). Management: inventing and delivering its future. Cambridge: The MIT Press, 2003. p. 15-24. (The MIT Sloan School of Management 50th Anniversary).). Reflete um entendimento mais profundo sobre a razão da existência da organização e de como ela pode criar mais valor. É uma prática guiada por quatro pilares balizadores, considerados elementos fundamentais, que estão interligados e reforçam-se mutuamente: propósito maior; integração de stakeholders; liderança consciente; e cultura e gestão consciente (SISODIA, 2009SISODIA, R. Doing business in the age of conscious capitalism. Journal of Indian Business Research, v. 1, n. 2-3, p. 188-192, 2009.; MACKEY e SISODIA, 2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.). O CC entende que o capitalismo, como sistema econômico estabelecido, pode gerar mudanças sociais positivas se utilizado conscientemente (ECKHARDT e DOBSCHA, 2018ECKHARDT, G. M.; DOBSCHA, S. The consumer experience of responsibilization: the case of Panera Cares. Journal of Business Ethics, p. 1-13, 2018. Disponível em: <Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007%2Fs10551-018-3795-4 >. Acesso em 03 set. 2017.
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).

Como propósito maior, entende-se a razão da existência da empresa, capaz de mobilizar, de criar elevando grau de engajamento entre todos os públicos interessados, possibilitando a inovação, a criatividade e o comprometimento organizacional (MACKEY e SISODIA, 2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.). Integração de stakeholders significa reconhecer que cada um dos envolvidos com a empresa é importante e está conectado à organização, formando uma rede capaz de criar valor (MACKEY e SISODIA, 2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Conscious capitalism is not an oxymoron. Harvard Business Review, Cambridge, 14 jan. 2013a. Disponível em: <Disponível em: https://hbr.org/2013/01/cultivating-a-higher-conscious >. Acesso em: 10 ago. 2017.
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). A liderança consciente busca trabalhar para gerar, simultaneamente, múltiplos valores. Sem líderes conscientes não há negócios conscientes e, por consequência, não haverá CC. Tais lideranças reprovam a forma de fazer negócios, orientada para trade-offs (MACKEY e SISODIA, 2013b). A cultura da empresa consciente garante força e estabilidade para a organização como um todo. Possuir uma cultura consciente significa evoluir a partir do compromisso da empresa com um propósito maior, com a dependência mútua entre os stakeholders e com a liderança consciente (MACKEY e SISODIA, 2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Conscious capitalism is not an oxymoron. Harvard Business Review, Cambridge, 14 jan. 2013a. Disponível em: <Disponível em: https://hbr.org/2013/01/cultivating-a-higher-conscious >. Acesso em: 10 ago. 2017.
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). O CC tem fundamento no entendimento de que o capitalismo pode ser uma força tanto para a economia quanto para o bem social. Assim, se os negócios são bem executados e centrados em valores, podem contribuir com a humanidade de forma mais tangível do que qualquer outra organização na sociedade (SCHWARTZ, 2013SCHWARTZ, T. Companies that practice ‘conscious capitalism’ perform 10x better. Harvard Business Review, Cambridge, 4 abr. 2013. Disponível em: <Disponível em: https://hbr.org/2013/04/companies-that-practice-conscious-capitalism-perform >. Acesso em: 03 ago. 2017.
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).

As organizações empresariais que trabalham e praticam o CC apresentam características peculiares. Sisodia (2009SISODIA, R. Doing business in the age of conscious capitalism. Journal of Indian Business Research, v. 1, n. 2-3, p. 188-192, 2009.) indica 8:

  1. têm propósito mais importante do que a maximização do lucro - propósito bem pensado é fundamental para infundir paixão e criatividade na organização;

  2. são geridas em benefício de todas as partes interessadas - há reconhecimento da importância de todas as partes envolvidas;

  3. os líderes se esforçam para juntar e alinhar os interesses dessas partes - tais iniciativas buscam, em detrimento do trade-off, chegar a um patamar onde todas as partes possam ganhar. Quando possíveis trade-offs surgem entre as partes interessadas, as empresas conscientes se baseiam na criatividade humana para buscar soluções ganha-ganha. E o fundamento, para que soluções do tipo ganha-ganha sejam geradas, se encontra no terceiro pilar do CC - liderança consciente, que é movida pelo propósito maior da empresa;

  4. não há qualquer tipo de exploração - cada parte é importante e participante do processo e não somente um meio para chegar ao lucro;

  5. trabalham para ajudar a resolver os principais problemas sociais em parceria com governo, outras empresas e ONGs;

  6. o meio ambiente é de suma importância - seu ideal é buscar gerar impacto positivo sobre o meio ambiente;

  7. busca-se elevar ao invés de ignorar os setores mais pobres da sociedade; e

  8. acredita-se que fazer as coisas certas traz bons resultados - o lucro é um resultado natural de fazer as coisas certas e não o fim.

O CC possibilita que as organizações possam reinventar-se, tornando-se agentes que trabalham a partir da criação e da colaboração e contribuindo para a conquista de valores em todas as suas ações. Essas empresas entendem-se e são vistas como influentes e inspiradoras, que têm compromisso com a excelência, detêm a confiança dos stakeholders, são admiradas e respeitadas (MACKEY e SISODIA, 2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.). Garcia (2011GARCIA, S. Capitalismo consciente y capital humano. Claves para solucionar la crisis del sistema capitalista. Capital Humano, v. 24, n. 250, p. 60-63, 2011.) destaca que o CC é possível de ser alcançado e Mackey e Sisodia (2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.) indicam algumas empresas que já o adotam: Whole Foods Market; The Container Store; Patagonia; Eaton; Grupo Tata; Panera Bread; e Southwest Airlines.

O CC também sofre críticas. O’Toole e Vogel (2011)O’TOOLE, J.; VOGEL, D. Two and a half cheers for conscious capitalism. California Managemente Review, v. 53, n. 3, p. 60-76, 2011. indicam que o CC não é capaz de perdurar, não consegue atender aos objetivos de todos os acionistas, apesar de afirmar que consegue, e que não é realista ao afirmar que uma empresa alcançaria uma forma altruísta de capitalismo. O’Toole e Vogel (2011)O’TOOLE, J.; VOGEL, D. Two and a half cheers for conscious capitalism. California Managemente Review, v. 53, n. 3, p. 60-76, 2011. afirmam, ainda, que o CC tende a subestimar o trade-off. Fyke e Buzzanell (2013FYKE, J.; BUZZANELL, P. M. The ethics of conscious capitalism: wicked problems in leading change and changing leaders. Human Relations, v. 66, n. 12, p. 1619-1644, 2013.) indicam que tensões são geradas quando uma empresa implementa o CC, pois os gerentes, apesar de terem as melhores intenções, em alguns momentos acabam colocando maior ênfase no capitalismo propriamente dito (ECKHARDT e DOBSCHA, 2018ECKHARDT, G. M.; DOBSCHA, S. The consumer experience of responsibilization: the case of Panera Cares. Journal of Business Ethics, p. 1-13, 2018. Disponível em: <Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007%2Fs10551-018-3795-4 >. Acesso em 03 set. 2017.
https://link.springer.com/article/10.100...
). Devinney, Auger e Eckhardt (2010DEVINNEY, T. M.; AUGER, P.; ECKHARDT, G. M. The myth of the ethical consumer. London: Cambridge University Press, 2010.) apontam que os consumidores, embora indiquem que desejam empresas socialmente responsáveis, apresentam padrão de gastos que não refletem isso. Então, ainda não se mostra nitidamente como será a reação dos consumidores ao CC, visto que se atribui ao consumidor parte da responsabilidade no processo. Entender o que pensam pessoas de grupos sociais ligados ao CC pode auxiliar no processo de amadurecimento do conceito.

A NETNOGRAFIA COMO METODOLOGIA DE PESQUISA

Atualmente, as redes sociais fazem parte do cotidiano das pessoas, como espaços de interação social (KOZINETS, 2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.). Elas são importantes para interações sociais, proporcionando relações dinâmicas. Segundo Ducci e Teixeira (2011DUCCI, N. P. C.; TEIXEIRA, R. M. As redes sociais dos empreendedores na formação do capital social: um estudo de casos múltiplos em municípios do norte pioneiro no estado do Paraná. Cadernos EBAPE.BR, Rio de Janeiro, v. 9, n. 4, p. 967-997, 2011.), a rede social possibilita que as pessoas tenham acesso a variados recursos que exercerão influência nos resultados alcançados. Com o uso da internet, as redes sociais podem atuar de modo on-line ou off-line (NOVELI, 2010NOVELI, M. Do off-line para o on-line: a netnografia como um método de pesquisa ou o que pode acontecer quando tentamos levara a etnografia apara a internet? Reflexão entre etnografia e netnografia, refletindo sobre as duas práticas. Organizações em Contexto, v. 6, n. 12, p. 107-133, 2010.). Em ambientes on-line, as redes dependem de dispositivos tecnológicos que viabilizam a comunicação e a criação de comunidades. Para Gabriel (2010GABRIEL, M. Marketing digital na era digital. Conceitos, plataformas e estratégias. São Paulo: Novatec, 2010., p. 277), “os dispositivos móveis vão muito além dos telefones celulares e englobam consoles de games, tablets, e-book readers e tendem a incluir cada vez mais dispositivos, como óculos, relógios [...] trazendo ubiquidade computacional e de conexão - internet das coisas”.

Os dispositivos móveis possibilitam o compartilhamento de comunicação on-line (KOZINETS, 2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.). Esse compartilhamento resulta na formação de comunidades on-line, as quais se pressupõe que não se encontrem fisicamente, mas que imprimam marcas de culturas (KOZINETS, 2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.). Essas comunidades representam um vasto campo para estudos e a netnografia é um recurso para tal finalidade. Inicialmente utilizada por pesquisadores de marketing, a netnografia tem por foco uma variedade de tópicos como identidade, relações sociais, aprendizado e criatividade (KOZINETS, 2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.). Ainda para Kozinets (2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.), o pesquisador netnográfico parte do pressuposto de que os membros de uma comunidade on-line atuam com honestidade, reciprocidade e confiança entre os membros do grupo, sendo que os relacionamentos entre eles criam um senso de grupo, na medida em que os membros conservam certo tipo de permanência ou de contatos repetidos. Constrói-se, então, um senso de familiaridade entre os membros da comunidade, que se reconhecem como pertencentes a um grupo particular. A inserção dos membros na comunidade começa com uma curiosidade inicial a respeito de algum tema e vai progressivamente criando uma identidade e uma cultura entre os membros do grupo, que passam a adotar as normas sociais e a construir uma coesão cultural e grupal, além de realizar trocas e assumir compromissos, os quais contribuem com a formação da identidade de comunidade.

A netnografia tem origem na etnografia. Na netnografia, a imersão do pesquisador ocorre no grupo ou na comunidade virtual. De acordo com Bowler Junior (2010BOWLER JUNIOR, G. M. Netnography: a method specifically designed to study cultures and communities online. The Qualitative Report, v. 15, n. 5, p. 1270-1275, 2010., p. 1270) a netnografia constitui uma “série de métodos de pesquisa on-line relacionados que se adaptam ao estudo das comunidades e culturas criadas por meio de interação social mediada por computador”. A netnografia, portanto, é um estudo observacional participante, que tem base no trabalho de campo on-line, isto é, utiliza dados oriundos de comunicações, debates e aprendizagens realizadas por meio de grupos criados em redes sociais on-line, buscando compreender determinado fenômeno em estudo (KOZINETS, 2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.).

A análise de conversas em comunidades on-line, de acordo com Kozinets (2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010., p. 56), “combina opções que são naturalistas e discretas”. A netnografia utiliza a observação participante e pode incluir outras técnicas, como “entrevistas, estatísticas descritivas, coleta de dados arquivísticos, análise de caso histórica extensa, videografia, técnicas projetivas como colagens, análises semióticas e uma variedade de outras técnicas” (KOZINETS, 2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010., p. 60). Ela representa um desafio ao pesquisador, pois reduz a capacidade de informação não verbal, como a voz, a acentuação, a expressão facial, a postura, a linguagem e o movimento (KOZINETS, 2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.).

O estudo netnográfico pode ser estruturado por meio de 5 etapas, conforme Kozinets (2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010., p. 61):

  1. definição das questões de pesquisa, sites sociais ou tópicos de investigação;

  2. identificação e seleção das comunidades;

  3. c) observação (engajamento, imersão) e coleta de dados;

  4. análise de dados e interpretação iterativa de achados; e

  5. escrita, informe e relato dos resultados de pesquisa e/ou implicações teóricas e/ou implicações políticas.

Como formas de observação e de coleta de dados, Kozinets (2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.) menciona as possibilidades de entrevistas em profundidade, os grupos focais e a observação participante. Por sua vez, a análise de dados de redes sociais tem o compromisso de desvendar os atores e os relacionamentos, identificar as fronteiras da rede, bem como identificar diferentes conexões entre os membros do grupo (KOZINETS, 2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.). É importante que o pesquisador identifique quais informações são partilhadas, como são as interações no grupo (fortes ou fracas) e como se configura a centralidade da rede em termos de poder e de influência.

Um dos resultados que pesquisadores apresentam em análises netnográficas consiste em tipologias de participantes. Nesse sentido, Kozinets (2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010., p. 34) identificou 4 tipologias:

  1. novatos, os que não têm laços fortes no grupo e mantêm apenas superficial interesse na comunidade, apresentando fracas habilidades;

  2. sociáveis, os que mantêm laços fraternos com as comunidades, apresentam fortes laços pessoais com os membros da comunidade, mas são superficialmente interessados na comunidade;

  3. devotos, os que têm laços sociais superficiais com os membros da comunidade, mas mantêm um foco e entusiasmo no tema da comunidade, assim como habilidades e conhecimento refinados sobre a questão;

  4. iniciados, os que apresentam laços sociais fortes com a comunidade on-line, assim como profunda identificação com tais laços,e compreensão da atividade do grupo.

Outras tipologias foram apresentadas por Leão, Ianatomi e Cavalcanti (2015LEÃO, A. L. M. S.; CAMARGO, T. I.; CAVALCANTI, R. C. T. Identidades culturais de consumidores da Pitú em sua comunidade de marca: uma netnografia da comunicação. Revista de Gestão Organizacional, v. 8, n. 2, p. 60-81, 2015.), analisando a comunidade virtual brasileira de consumidores da marca Johnnie Walker, visando a estabelecer as identidades de seus participantes, eles identificaram 16 identidades, que foram organizadas em 3 grupos identitários mais amplos denominados Boêmios, Uncools e Carismáticos. Estudos netnográficos também podem explicar como integrantes de comunidades on-line apresentam identificação com a temática da comunidade. Esse aspecto foi explorado por Moraes e Abreu (2017MORAES, T. A.; ABREU, N. R. Tribos de consumo: representações sociais em uma comunidade virtual de marca. Organizações & Sociedade, v. 24, n. 81, p. 325-342, 2017.), que mostraram como o conjunto de representações sociais dos membros de uma comunidade on-line construiu o efeito do sentimento de tribo a partir de representações sociais que remetiam à tribalização, de acordo com Kozinets (2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.).

Por fim, é importante salientar que o pesquisador netnográfico precisa observar procedimentos éticos, explicando sua forma de engajamento e de imersão e coleta de dados. O pesquisador precisa inserir-se no grupo e apresentar um senso de pertencimento. Todos os dados da pesquisa, como notas de campo e outros, precisam ser arquivados (KOZINETS, 2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.).

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para atingir o objetivo principal deste estudo foi utilizada uma metodologia qualitativa de procedimento netnográfico. Devido à natureza investigativa, optou-se por abordagem participativa e observacional. O tipo de pesquisa foi exploratório e descritivo, por proporcionar maior familiaridade com o problema e o objeto de estudo. O estudo também é descritivo, pois relata as características de grupos sociais por intermédio de observação sistemática e descreve opiniões, atitudes e crenças dessa população.

O universo deste estudo foi delimitado a partir de características comuns dos grupos sociais que abordam o tema CC. A população consistiu em 34 grupos, mas a interação foi possível somente com 21 desses grupos. Quanto aos procedimentos técnicos, utilizou-se pesquisa documental, sendo os dados extraídos, com os 21 grupos do LinkedIn que abordaram o tema CC, com os quais um dos autores interagiu por 30 dias. Esse foi o passo 3 sugerido por Kozinets (2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.), quando um dos autores é participante e observador da coleta dos dados diretamente na interação em cada grupo. Kozinets (2010)KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010. salienta que a pesquisa netnográfica é uma observação participante e os dados podem assumir 3 formas:

  1. coletados diretamente pelo pesquisador;

  2. a partir da interação com comunidades on-line, são coletados e registrados; e

  3. por meio de notas de campo, os dados são esboçados pelo pesquisador.

Procedeu-se à análise do conteúdo, com “pré-análise (organização do material); descrição analítica dos dados (codificação, classificação, categorização); interpretação referencial (tratamento e reflexão)” (TRIVIÑOS, 1987TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 1987., p. 161). Com base em Kozinets (2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.), apresentamos o passo 4 (análise dos dados) a seguir.

Identificação dos grupos, análise de dados e interpretação interativa de achados

Para realizar este estudo, os dados foram coletados nos grupos que se identificavam com o CC cadastrados no LinkedIn. Primeiro, acessamos a rede social para encontrar esses grupos. Com os termos “capitalismo consciente” e “conscious capitalism” foram identificados 34 grupos (Quadro 1).

Quadro 1
Grupos que se identificavam com o capitalismo consciente na rede social LinkedIn entre junho de 2016 e junho de 2017

Observando o indicado por Spradley (1980SPRADLEY, J. P. Participant observation. Orlando: Harcourt Brace Jovanovich College, 1980.), procedeu-se a uma pesquisa participante. Assim, um dos autores entrou em contato com o titular de cada grupo, enviando um InMail direto do LinkedIn. O pesquisador fez uma breve apresentação, informou sobre o estudo e seu objetivo. Solicitou autorização para participar do grupo e perguntou sobre a possibilidade do titular responder questões sobre o CC.

Dos 34 titulares, 7 não se pronunciaram quanto às questões; 6 responderam que criaram o grupo, mas não estavam mais ativos; restaram 21 grupos, com os quais o autor interagiu por 30 dias. Destes, 10 autorizaram a participação como membros, mas não se pronunciaram quanto às perguntas; 9 autorizaram a participação e prontificaram-se a responder as perguntas - mas não responderam; 2 autorizaram a participação no grupo e indicaram a possibilidade de responder as questões - e responderam. Os questionamentos versavam sobre a data, o local, o idealizador e a motivação para a criação do grupo. E, também, sobre o articulador, a quantidade e a participação dos membros, além do que entendia sobre CC e como foi o primeiro contato com o tema.

Assim, o objeto de análise deste estudo consiste nas informações coletadas junto aos grupos sociais criados na rede LinkedIn com alguma ligação com o CC. Quanto aos 21 grupos com os quais 1 dos autores interagiu, realizou-se um recorte temporal nos debates existentes. Nesse caso, o conteúdo extraído se refere ao período entre 06/06/2016 a 05/06/2017. As postagens e comentários foram copiados e colados no programa computacional Microsoft Word, gerando 980 páginas de conteúdo. A leitura atenta de cada postagem e de cada comentário possibilitou identificar categorias de análise, como ilustra a Figura 2. As categorias possibilitaram aprofundar a análise crítica sobre o CC.

RESULTADOS E ANÁLISES DA PESQUISA

Seguindo Kozinets (2010KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010.), o passo seguinte é a apresentação dos resultados. Dentre os grupos apresentados no estudo, alguns têm maior número de membros do que outros. O Quadro 2 apresenta os 10 maiores grupos. Entende-se que quanto mais membros, maior será a chance de existir postagens, debates e interações. Entretanto, independente do número de membros, esperava-se que todos os grupos, por estarem ligados ao CC, apresentassem debates e postagens sobre o assunto.

Quadro 2
Os 10 grupos do LinkedIn sobre capitalismo consciente com maior número de integrantes entre junho de 2016 e junho de 2017

Ao analisar a quantidade de interações, percebe-se que os dois grupos com maior número de participantes também foram os que mais postagens realizaram. Contudo, ter grande número de participantes não garante participação efetiva dos membros. Verificou-se que, embora com expressivo número de membros e muitas interações, poucos foram os participantes que contribuíram com as discussões e postagens. Isto é, na maioria das vezes, as postagens e os comentários foram feitos pelas mesmas pessoas. Tal atitude pode revelar que os membros estão participando do grupo, mas não têm interesse em debater sobre o CC ou mesmo que têm dificuldade para entender o assunto.

Buscou-se identificar onde os grupos foram criados, isto é, em qual parte do mundo se encontra a “sede” do grupo. Houve dificuldades para identificar o lugar de criação de cada grupo. Considerou-se, então, o local de origem do idealizador dos grupos, como apresenta a Figura 1.

Figura 1
Localização (país) dos titulares dos grupos do LinkedIn sobre capitalismoconsciente e quantidade por localização entre junho de 2016 e junho de 2017

Destaca-se que o maior quantitativo de titulares se encontra nos EUA. No território estadunidense, o estado do Texas conta com 5 líderes de grupos, seguido pelos estados de Maryland, New York e California, com 4 cada. Illinois tem 3, Colorado e Massachusetts, 2 cada e o estado do Arizona, 1. Os grupos estão em partes distintas dos EUA, em localidades que contam com a presença de líderes e grupos voltados às questões do CC. Tal realidade vem ao encontro das origens do CC, uma vez que seus fundadores, John Mackey e Rejendra Sisodia, atuam nos EUA. Enquanto o primeiro é empresário, cofundador do WholeFoodsMarket, com sede no estado do Texas, o segundo é professor na Universidade de Bentley, no estado de Massachusetts (FRÉMEAUX e MICHELSON, 2017FRÉMEAUX, S.; MICHELSON, G. The common good of the firm and humanistic management: conscious capitalism and economy of communion. Journal of Business Ethics, v. 145, n. 4, p. 701-709, 2017.).

Também se procedeu à análise do conteúdo postado na apresentação inicial de cada grupo. Tais informações foram analisadas sob 3 aspectos: finalidade do grupo; definição de CC; características do CC. Quanto à finalidade da criação, 8 grupos não fizeram menção ao CC. Os outros 24 apresentaram uma ou mais finalidades para sua existência (Quadro 3).

Quadro 3
Finalidades dos grupos sobre capitalismo consciente no LinkedIn entre junho de 2016 e junho de 2017

Muitas das finalidades apresentadas no Quadro 3 estão diretamente relacionadas ao CC, preconizadas por alguns autores: resolver problemas sociais e ambientais do mundo; negócios éticos (SISODIA, 2009SISODIA, R. Doing business in the age of conscious capitalism. Journal of Indian Business Research, v. 1, n. 2-3, p. 188-192, 2009.), princípios do CC; inspirar uns aos outros; negócios conscientes; pensamento consciente; ir além do lucro (MACKEY e SISODIA, 2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.), locais de trabalho; engajar, educar e inspirar líderes (RICE, 2013RICE, G. Book review: Conscious capitalism reflects the ascendancy of the Athena doctrine. Global Business and Organizational Excellence, v. 32, n. 4, p. 83-87, 2013.), liderança; compartilhamento de ideias e experiências; criar valor entre as partes interessadas (ECKSCHMIDT, GAIARIM, MERLINA et al., 2017ECKSCHMIDT, T. et al. Fundamentos do capitalismo consciente: liberando o espírito empreendedor para o bem. Curitiba: Voo, 2017.). Todavia, percebe-se a falta de aproximação com questões relevantes do CC, indicadas por Mackey e Sisodia (2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.), tais como interdependência dos stakeholders, parcerias com fornecedores, compartilhamento de riquezas, cidadania local, produção sustentável, relacionamento com sindicatos, entre outros. A seleção de alguns assuntos pode decorrer da formação ou da preferência dos participantes.

Cada grupo apresenta peculiaridades, o que é aceitável, visto que são de distintos lugares do mundo com culturas também distintas. Enquanto alguns aprofundaram princípios do capitalismo - “agir de acordo com os 4 princípios” -, outros não parecem preocupar-se com os princípios, mantendo maior atenção às questões atuais - “trabalhar para uma mudança positiva no mundo”. Nesse sentido, os 4 princípios do CC podem ser estudados, debatidos, visualizados e assumidos pelos grupos sociais e pelas organizações em graus diferentes.

É importante destacar que uma organização poderá ser consciente mesmo que esteja vivenciando os pilares em formas e intensidades diferentes (ECKSCHMIDT, GAIARIM, MERLINA et al., 2017ECKSCHMIDT, T. et al. Fundamentos do capitalismo consciente: liberando o espírito empreendedor para o bem. Curitiba: Voo, 2017.). Eles são elementos essenciais e interdependentes da filosofia empresarial do CC (PILLAY e SISODIA, 2011PILLAY, S. S.; SISODIA, R. A case for conscious capitalism: conscious leadership through the lens of brain science. Ivey Business Journal, v. 75, p. 1-4, 2011.; MACKEY e SISODIA, 2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.). Tal realidade se revelou nas postagens de alguns grupos, pois mesmo aqueles que tinham por finalidade 1 ou 2 princípios, para suas discussões, acabaram apresentando conteúdos compartilhados que abarcavam questões relativas aos 4 princípios.

Quanto à definição de CC, é perceptível uma unidade em torno dos entendimentos apresentados, pois a maioria dos grupos elencou aspectos relacionados a um ou mais princípios do CC. De maneira geral, as definições dos grupos, estão próximas da definição apresentada por Mackey e Sisodia (2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.): um paradigma voltado aos negócios que ainda está em desenvolvimento e que pode criar simultaneamente valores financeiros, espirituais, físicos, sociais, culturais e emocionais, entre outros, para as partes interessadas.

Quanto à caracterização do CC, observa-se que os grupos se aproximam das definições de Mackey e Sisodia (2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.) e que têm os 4 pilares. As categorias identificadas foram: objetivo superior; liderança consciente; orientação aos stakeholders; cultura e gestão consciente; desafio para repensar porque as organizações existem; proporcionar a avaliação dos papéis da empresa na sociedade; ter potencial para melhorar o desempenho corporativo; proporcionar qualidade de vida às pessoas; voltar-se ao planeta e às pessoas; sustentabilidade consciente; e proporcionar confiança, responsabilidade, transparência, integridade, aprendizagem e igualdade para e nas organizações. A caracterização feita pelos grupos reflete uma realidade que possibilita entender que o CC consiste em uma forma diferente de fazer negócios, corroborando Simpson, Cunha e Rego (2015SIMPSON, A. V.; CUNHA, M. P.; REGO, A. Compassion in the context of capitalistic organizations: evidence from the 2011 Brisbane floods. Journal of Business Ethics, v. 130, n. 3, p. 683-703, 2015.). Outras características apontadas pelos grupos também são identificadas com o CC, tais como preocupação com as pessoas e com o meio ambiente, qualidade de vida, sustentabilidade consciente e desempenho corporativo (MACKEY e SISODIA, 2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.).

De modo a sintetizar os dados da análise, a Figura 2 evidencia as principais premissas do CC, a partir da literatura. Também apresenta as categorias de análise, oriundas das interações realizadas pelos grupos. A terceira parte da Figura 2 é composta por convergências e divergências identificadas pelos autores, comparando as premissas do CC às categorias identificadas nas interações.

Figura 2
Convergências e divergências entre as interações a partir dos grupos do LinkedIn e as premissas do capitalismo consciente

Os membros dos grupos participantes da pesquisa, interagiram sobre vários temas, sendo a maior parte referente a questões voltadas ao CC. Algumas poucas interações questionavam a possibilidade de sucesso do CC. Vale destacar que as redes sociais possibilitam intensa troca de informações e posicionamento entre as pessoas a respeito de determinado assunto. Em uma rede como o LinkedIn, assuntos referentes a profissionais e empresas tendem a ter maior atenção. Como indica Forléo (2016FORLÉO, C. A. A relação do capitalismo consciente com marketing societal, macromarketing e responsabilidade social corporativa. International Journal of Business & Marketing, v. 1, n. 2, p. 33-44, 2016.), as redes sociais permitem que as pessoas se posicionem sobre assuntos e empresas, que, por sua vez, estão mais atentas àquilo que é comentado nas redes sociais (CARRIGAN e ATALLA, 2001CARRIGAN, M.; ATTALLA, A. The myth of the ethical consumer: do ethics matter in purchase behaviour? Journal of Consumer Marketing, v. 18, n. 7, p. 560-578, 2001.).

A maior parte das postagens não foi comentada pelos membros, embora outras tenham recebido muitos comentários. Nota-se que as postagens que tratavam sobre a integração dos stakeholders eram as que recebiam mais atenção dos membros, apresentando maior número de interações. Quando um membro de algum grupo realizava uma postagem, a participação nos debates/comentários se restringia, na maioria das vezes, às mesmas pessoas. O idealizador do grupo e/ou os moderadores se mostraram mais participantes e, em certos momentos, outros membros também expressavam sua opinião. A pouca participação dos membros dos grupos e, a falta de profundidade nas interações sobre capitalismo consciente, revela que o tema ainda necessita de amadurecimento. Nesse sentido, Garcia (2011GARCIA, S. Capitalismo consciente y capital humano. Claves para solucionar la crisis del sistema capitalista. Capital Humano, v. 24, n. 250, p. 60-63, 2011.), expressa que para colocar o CC em prática é preciso ter menos inércia e medo e mais atenção, cooperação, generosidade e participação das pessoas e empresas.

A partir das categorias definidas, percebe-se, ainda, que os discursos, de maneira generalista, estão alinhados com os conceitos do CC e com os pressupostos teóricos de Mackey e Sisodia (2013aMACKEY, J.; SISODIA, R. Conscious capitalism is not an oxymoron. Harvard Business Review, Cambridge, 14 jan. 2013a. Disponível em: <Disponível em: https://hbr.org/2013/01/cultivating-a-higher-conscious >. Acesso em: 10 ago. 2017.
https://hbr.org/2013/01/cultivating-a-hi...
), enquanto ético, nobre e heroico, interagindo com as partes interessadas sobre a temática. Questões sobre lucratividade acabam sendo discutidas superficialmente, visto que os grupos têm maior interesse em assuntos alinhados ao próprio CC, liderança, stakeholders e pessoas, meio ambiente, sociedade e interação. Esses foram os assuntos que mais apareceram, considerando as interações realizadas nos grupos, como identifica a Figura 3. Tais conteúdos estão voltados aos 4 pilares fundamentais descritos por Sisodia (2009)KOZINETS, R. V. Netnography: Doing Ethnographic Research Online. Los Angeles: Sage, 2010. e Mackey e Sisodia (2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Conscious capitalism is not an oxymoron. Harvard Business Review, Cambridge, 14 jan. 2013a. Disponível em: <Disponível em: https://hbr.org/2013/01/cultivating-a-higher-conscious >. Acesso em: 10 ago. 2017.
https://hbr.org/2013/01/cultivating-a-hi...
). Vale destacar que, como indicam Eckschmidt, Gaiarim, Melina et al. (2017ECKSCHMIDT, T. et al. Fundamentos do capitalismo consciente: liberando o espírito empreendedor para o bem. Curitiba: Voo, 2017.), cada pilar tem razão e importância na estruturação do CC.

Figura 3
Termos encontrados sobre capitalismo consciente nas principais interações nos grupos do LinkedIn entre junho de 2016 e junho de 2017

O conteúdo das interações realizadas (Figura 3) se refere a todos os 21 grupos nos quais um dos pesquisadores se tornou membro. No entanto, nem todos mantiveram o mesmo nível de postagens, comentários, discussões e curtidas. Os grupos Conscious Capitalism Australia, Conscious Capitalism Movement e Conscious Capilalism - Chicago Chapter foram os que mantiveram maior número de interações. Os membros desses 3 grupos mantiveram postagens diárias, destacando-se os assuntos referentes a liderança, CC e stakeholders/pessoas, sendo este último o assunto que mais envolveu curtidas. Isso vai ao encontro do exposto por Eckschmidt, Gaiarim, Melina et al. (2017ECKSCHMIDT, T. et al. Fundamentos do capitalismo consciente: liberando o espírito empreendedor para o bem. Curitiba: Voo, 2017.), quando afirmam que os pilares do CC não são considerados com a mesma força e intensidade ao mesmo tempo e em todos os lugares. Demonstra-se, assim, que os grupos mais ativos estão preocupados com questões referentes ao CC e consideram mais as interações sobre alguns dos pilares. Ao considerar mais o pilar da orientação aos stakeholders, os grupos se mostraram preocupados com um ativo de fundamental importância nas organizações: as relações. A criação de valor em uma empresa passa pelas pessoas e pelo modo com que estas se posicionam, formando outro pilar do CC que é a cultura consciente (MACKEY e SISODIA, 2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.).

Em relação às questões encaminhadas ao idealizador de cada grupo, as respostas indicaram que os grupos foram criados para interação entre as pessoas, sobre a relação entre poluição e o impacto na vida das pessoas, abordando a poluição industrial nos países considerados potências e sobre a falta de controle com o lixo, a escassez da água e, ainda, sobre o CC propriamente dito. São todos assuntos ligados ao CC, como explicado por Mackey e Sisodia (2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.). A participação dos membros nos grupos é baixa, visto que de 8% a 15% dos membros interagem, postando ou comentando. Os líderes entendem que seus grupos têm conteúdo original e uma fonte de textos inéditos.

Os autores deste estudo, ao analisar as informações, identificaram que os grupos criados no LinkedIn voltados ao CC, mesmo que com baixa participação dos membros, estão atingindo sua finalidade. Contudo, muitos procuram ser membros, porque o assunto é novo, instigante e causa curiosidade, mas interagem pouco ou nada. Os líderes, que foram os idealizadores dos grupos, na maioria das vezes parecem dispostos a compartilhar e debater os temas e conseguem envolver alguns dos membros a fazer o mesmo. O tema CC ainda pode ser explorado e debatido mais profundamente nesses grupos.

CONCLUSÃO

O propósito deste estudo foi identificar os grupos sociais criados no LinkedIn, voltados ao CC, e analisar sua interação com o tema. Os resultados demonstram que a maioria dos idealizadores dos grupos (73,5%) se encontra em vários lugares dos EUA. Os grupos têm a finalidade de interagir, de alguma forma, com os princípios do CC e entendem o sentido do CC, visto que aqueles que apresentam alguma descrição o fazem de acordo com a definição estabelecida pelos idealizadores John Mackey e Raj Sisodia. Ademais, boa parte dos grupos conta com número significativo de membros. No entanto, os princípios demonstrados e a quantidade de participantes não se reflete nas interações. Em alguns, somente o idealizador e alguns poucos membros acabam participando efetivamente. Além disso, alguns líderes, ao ser contatados pelos pesquisadores, responderam que o grupo não estava mais ativo e que não aceitavam novos membros.

Observa-se, todavia, que os grupos ativos de CC estudados se baseiam nos 4 princípios ou pilares balizadores: propósito maior; integração de stakeholders; liderança consciente; e cultura e gestão consciente (SISODIA, 2009SISODIA, R. Doing business in the age of conscious capitalism. Journal of Indian Business Research, v. 1, n. 2-3, p. 188-192, 2009.; MACKEY e SISODIA, 2013bMACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. São Paulo: HSM, 2013b.), pois suas postagens e os debates gerados estão relacionados aos temas, alguns de forma direta, outros de forma indireta.

Considerando o conceito e os princípios do CC, destacados, em detalhes ao longo deste artigo e, a existência de grupos que discutem o tema em redes sociais on-line, entende-se que há espaço para as organizações se reinventarem. Elas podem se tornar agentes preocupados com a sociedade, com as pessoas e com o meio ambiente, contribuindo para criar valores alinhados com os princípios do CC, em todas as suas ações.

A principal contribuição deste estudo foi propor uma reflexão sobre a formação dos grupos voltados ao CC na rede social LinkedIn. Ao mesmo tempo que analisa as interações dos membros sobre o assunto, também contribui à medida que identifica as redes sociais como canais que permitem congregar pessoas, debater assuntos e aprofundar entendimentos, sendo as redes sociais fundamentais na geração e disseminação de conhecimento e diálogo sobre diversos assuntos ligados às empresas e, nesse caso, o CC.

O estudo também contribui com a reflexão e a prática, trazendo para a discussão questões que envolvem organizações e pessoas, na perspectiva do CC, por meio de seus princípios e premissas. Ao debater o tema, tanto as pessoas ligadas à academia quanto aquelas ligadas às organizações têm a possibilidade de entender e aprofundar o entendimento sobre o assunto, passando a ter a possibilidade de aderir ao CC.

Há a expectativa de que este estudo venha a ser gerador de outros que possam abordar a netnografia, e/ou o CC e/ou, ainda, os grupos/as redes sociais. No entanto, reconhecemos como limitação do estudo a impossibilidade dos autores serem membros de todos os grupos. Caso um dos pesquisadores tivesse acesso a todos os grupos do CC, uma maior abrangência de interações poderia ter sido analisada. Além disso, um estudo longitudinal pode apresentar a evolução da temática. Ainda assim, a visualização de resultados possibilitou a formulação de algumas questões para futuros estudos:

  1. O local de origem dos idealizadores de teorias, temas e assuntos relevantes para a sociedade influencia o local de origem dos grupos sociais on-line?

  2. A participação dos membros dos grupos sociais on-line, nas interações, está direta e positivamente relacionada à participação dos idealizadores (líderes) dos grupos?

  3. O CC é um movimento para empresas de economias emergentes, em desenvolvimento, ou não há distinção?

  4. Qual é a produção científica existente sobre o tema CC?

Essas são sugestões que podem basear outros estudos. Certamente, os leitores e estudiosos poderão encontrar, aqui, outras ideias para suas pesquisas. Nosso propósito é apontar caminhos para continuar e ampliar o debate sobre o CC.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Maio 2019
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2019

Histórico

  • Recebido
    01 Out 2017
  • Aceito
    22 Out 2018
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