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Interação Universidade-Empresa-Governo: o caso do Programa de Cooperação Educacional para Transferência de Conhecimento Brasil-Cingapura

Interacción universidad-empresa-gobierno: el caso del Programa de Cooperación Educativa para Transferencia de Conocimiento Brasil-Singapur

Resumo

As interações universidade-empresa-governo no Brasil refletem a orientação das políticas públicas e modelos adotados pelo Sistema Nacional de Inovação, nos quais a universidade passa a ser um importante ator social no desenvolvimento econômico. Considerando o papel da universidade e, consequentemente, a sua relação com o Estado e o mercado, o objetivo deste estudo foi analisar como ocorre a configuração de um modelo Hélice Tríplice na relação universidade-empresa-governo. O estudo, de natureza qualitativa, faz uso do método de estudo do caso de um programa internacional de cooperação educacional para a transferência de conhecimento. A coleta dos dados foi por meio de documentos, entrevistas em profundidade e analisados com uso da análise de conteúdo. Os resultados demonstram que a configuração da Hélice Tríplice é do tipo laissez-faire, no entanto, apresenta um desequilíbrio na participação dos atores envolvidos. O governo estadual teve uma participação coadjuvante e se limitou a regular e estabelecer a intermediação entre a universidade e a empresa de forma institucional, a empresa protagonizou a relação, se responsabilizando por grande parte das ações que deveriam ser assumidas pelos demais atores. A universidade buscou equilibrar suas finalidades sociais e econômicas implementando princípios da Universidade Empreendedora em sua estrutura e administrando obstáculos interculturais para articular outras parcerias. Entre as ações realizadas estão a criação de um programa de pesquisa e extensão e um curso de doutorado voltado à indústria naval. Isso demonstra que esse tipo de interação é capaz de promover, a longo prazo, a inovação, mesmo que de forma incremental.

Palavras-chave:
Hélice Tríplice; Universidade empreendedora; Interação Universidade-Empresa

Resumen

Las interacciones universidad-empresa-gobierno en Brasil reflejan la orientación de las políticas públicas y los modelos adoptados por el Sistema Nacional de Innovación, en los que la universidad se convierte en un importante actor social en el desarrollo económico. Considerando el papel de la universidad y, en consecuencia, su relación con el Estado y el mercado, el objetivo de este estudio fue analizar cómo se produce la configuración de un modelo de triple hélice en la relación universidad-empresa-gobierno. El estudio cualitativo utiliza el método de estudio de caso de un programa internacional de cooperación educativa para la transferencia de conocimiento. La recolección de datos se realizó a través de documentos y entrevistas en profundidad, que se examinaron mediante análisis de contenido. Los resultados demuestran que la configuración de la triple hélice es del tipo laissez-faire, sin embargo, presenta un desequilibrio en la participación de los actores involucrados. El Gobierno estatal tuvo una participación secundaria y se limitó a regular y establecer la intermediación entre la universidad y la empresa de una manera institucional. La empresa protagonizó la relación al responsabilizarse de la mayoría de las acciones que deberían asumir los otros actores. La universidad buscó equilibrar sus propósitos sociales y económicos implementando los principios de la universidad empresarial en su estructura y manejando los obstáculos interculturales para articular otras asociaciones. Entre las acciones tomadas están la creación de un programa de investigación y extensión y un curso de doctorado enfocado en la industria naval. Esto muestra que este tipo de interacción es capaz de promover la innovación, aunque de forma incremental, a largo plazo.

Palabras clave:
Triple hélice; Universidad empreendedora; Interacción universidad-empresa

Abstract

The university-business-government interactions in Brazil reflect the orientation of public policies and models adopted by the National Innovation System, in which the university becomes an important social actor in economic development. When considering the university’s role and its relationship with the state and the market, this study analyzes how the configuration of a Triple Helix model occurs in the university-business-government relationship. The qualitative approach uses a case study of an international educational cooperation program for knowledge transfer. Data collection occurred through documents and in-depth interviews that were analyzed using content analysis. The results demonstrate that the configuration of the Triple Helix is laissez-faire. However, it presents an imbalance in the participation of the actors involved. The state government offered support and was limited to regulate and establish the intermediation between the university and the company in an institutional way. The company starred the relationship, taking responsibility for most of the actions that should have been taken by the other actors. The university sought to balance its social and economic purposes by implementing Entrepreneurial University principles in its structure and by managing intercultural obstacles to articulate other partnerships. Among the actions taken are the creation of a research and extension program and a doctoral course focused on the naval industry. This shows that this kind of interaction can promote promote innovation, although incrementally, in the long run.

Keywords:
Triple Helix; Entrepreneurial University; University-Business Interaction

INTRODUÇÃO

A partir da crise econômica mundial ocorrida nas décadas de 1970-80, os princípios do New Public Management (NPM), provenientes da reforma gerencial inglesa e dos preceitos gerencialistas de combate à politização da administração pública estadunidense, suscitaram o movimento pela redefinição do papel do Estado. Neste sentido, foi elaborada uma agenda de reformas, em resposta à crise da dívida pública e ao tamanho do Estado (ABRUCIO, 1997ABRUCIO, F. L. O impacto do modelo gerencial na administração pública. Um breve estudo sobre a experiência internacional recente. Brasília, DF: Fundação Escola Nacional de Administração Pública, 1997. (Cadernos ENAP, n. 10).).

Neste contexto, observa-se que alguns princípios do NPM também alcançaram o domínio da política científica de alguns países e certas lógicas de mercado como eficiência, gestão por resultados, empreendedorismo e parcerias passaram a ser incorporadas tanto no discurso acadêmico como nas políticas de ciência e tecnologia (ELZINGA, 2010ELZINGA, A. New public management, science policy and the orchestration of university research: academic science the loser. The Journal for Transdisciplinary Research in Southern Africa, v. 6, p. 307-332, 2010.). Ou seja, as transformações globais associadas às manifestações do NPM, alcançaram o contexto institucional da produção do conhecimento, que passou a ser capitalizada (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.) ou mercantilizada - como outros autores preferem definir (ARMBRUSTER, 2008ARMBRUSTER, C. Research universities: autonomy and self-reliance after the Entrepreneurial University. Policy Futures in Education,v. 6, n. 4, p. 372-389, 2008.; ELZINGA, 2010ELZINGA, A. New public management, science policy and the orchestration of university research: academic science the loser. The Journal for Transdisciplinary Research in Southern Africa, v. 6, p. 307-332, 2010.), engendrando, assim, um debate repleto de posições antagônicas comuns ao meio científico.

Neste contexto, emergiram os pressupostos da tese da Triple Helix (Hélice Tríplice), criada por Etzkowitz e Leydesdorff (1998ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The endless transition: a “triple helix” of university-industry-government relations. Minerva, v. 36, n. 3, p. 203-208, 1998.), que visualiza a universidade como indutora das relações com o governo e com o mercado. Essa perspectiva presume que a interseção entre essas esferas institucionais possibilita um ambiente favorável à inovação por intermédio da formação de redes trilaterais e de organizações híbridas. Assim, a ciência torna-se uma área estratégica para as nações (VELHO, 2011) e a tese da Hélice Tríplice, por congregar a aproximação entre os atores envolvidos, acabou inspirando alguns sistemas nacionais de inovação ao redor do mundo. Seus princípios foram aceitos em muitos países, inclusive no Brasil, influenciando as políticas públicas direcionadas ao sistema nacional de inovação e alterando os arranjos institucionais entre a universidade, o mercado e o governo (DAGNINO, 2003DAGNINO, R. A relação universidade-empresa no Brasil e o argumento da hélice tripla. Revista Brasileira de Inovação, v. 2, n. 2, p. 267-307, 2003.).

Em paralelo à criação de sistemas de inovação, como fonte estratégica nacional para enfrentar a competitividade global, foram observadas no Brasil, a partir de 2004, algumas iniciativas de retomada do crescimento econômico, por meio de programas voltados à aceleração do crescimento, para atrair investimentos externos na tentativa de revitalizar os setores. Soma-se a isso o aprimoramento de políticas de conteúdo local, para garantir que parte da produção fosse destinada às indústrias brasileiras (MACHADO NETO, 2012MACHADO NETO, A. A evolução do conteúdo local. Sinaval, Rio de Janeiro, Jan. 29, 2013. Seção Notícias da Semana.). A indústria naval foi uma dessas iniciativas do governo federal, sustentada, em parte, pela implementação da política pública por um arranjo político-institucional “marcado pelo envolvimento de um conjunto de atores e pela desconcentração de atribuições entre eles” (CAMPOS NETO e POMPERMAYER, 2014CAMPOS NETO, C. A. S.; POMPERMAYER, F. M. Ressurgimento da indústria naval no Brasil (2000-2013). Brasília, DF: Ipea, 2014., p. 101).

Um exemplo disso foi o Programa de Cooperação Educacional para transferência de conhecimento em tecnologia de construção naval entre um Instituto Federal de Ensino (IFE) e um estaleiro - subsidiária de um grupo transnacional que atua no setor naval e off-shore sediado em Cingapura, ambos situados no Sudeste brasileiro e o Governo do Estadual. Trata-se de uma parceria de intercâmbio internacional, de iniciativa privada e uso compartilhado de recursos públicos em que, de um lado, a empresa busca a capacitação em construção naval e transferência de conhecimento da matriz, em Cingapura, para a força de trabalho local da subsidiária no Brasil, e, de outro, o IFE busca formar professores para viabilizar a introdução da tecnologia naval no Estado, incorporando as técnicas inovadoras desenvolvidas fora do país.

Essa parceria torna-se singular pelo fato de o conhecimento ser importado pela universidade e não somente pela empresa, visto que os beneficiários parecem ser tanto a subsidiária brasileira quanto o IFE. Isso diverge da tendência dos países emergentes de industrialização tardia, nos quais geralmente são as empresas que se apropriam da tecnologia de países inovadores e exploram o conhecimento externo por dependerem fortemente de aprendizagem (TORRES, DUTRÉNIT, BECERRA et al., 2011TORRES, A. et al. What are the factors driving university - industry linkages in latecomer firms: evidence from Mexico. Science and Public Policy, v. 38, n. 1, p. 31-42, 2011.). Outro ponto que diferencia esse acordo de cooperação é o financiamento privado, pois a atuação do governo foi restrita à articulação entre os atores sociais, à regulação e o apoio institucional.

Considerando-se a relevância das discussões que envolvem o papel da universidade no desenvolvimento econômico e social e, consequentemente, a sua relação com o Estado e o mercado, o objetivo deste estudo é analisar a configuração do modelo Hélice Tríplice na relação universidade-empresa-governo no referido programa de cooperação. Para alcançar esse objetivo, pretende-se responder as seguintes questões: Como ocorre a relação universidade-empresa-governo no contexto da Hélice Tríplice e da Universidade Empreendedora? Quais os papéis desempenhados pela universidade, pela empresa e pelo governo?

As análises recentes deste fenômeno têm sido, em grande parte, orientadas pela teoria da Hélice Tríplice, que, por conseguinte, introduz a universidade no contexto da Universidade Empreendedora. Essa abordagem foi recentemente complementada pelo quadro de intermediação proposto por Todeva (2013TODEVA, E. Governance of innovation and intermediation in triple helix interactions. Industry and higher education, v. 27, n. 4, p. 263-278, 2013.), que adiciona os conceitos de governança e regulamentação aos aspectos estruturais e as relações sistêmicas entre as partes. Com o intuito de evoluir e complementar o modelo de inovação da Hélice Tríplice, outros pesquisadores propuseram o modelo da quadrupla (CARAYANNIS e CAMPBELL, 2009CARAYANNIS, E. G.; CAMPBELL, D. F. J. “Mode 3” and “Quadruple Helix”: toward a 21st century fractal innovation ecosystem. International Journal of Technology Management, v. 46, n. 3/4, p. 201-234, 2009.) e quíntupla hélices (CARAYANNIS, BARTH e CAMPBELL, 2012CARAYANNIS, E. G.; BARTH, T. D.; CAMPBELL, D. F. The Quintuple Helix innovation model: global warming as a challenge and driver for innovation. Journal of Innovation and Entrepreneurship, v. 1, n. 1, p. 2, 2012.), No entanto, a abordagem da Hélice Tríplice continua sendo um dos principais modelos de análise teórico e empírico da relação universidade-empresa-governo, tanto em economias desenvolvidas (CHINTA e SUSSAN, 2018CHINTA, R.; SUSSAN F. A Triple-Helix Ecosystem for Entrepreneurship: A Case Review. In: O’CONNOR et. al. (Orgs). Entrepreneurial Ecosystems: International Studies in Entrepreneurship. New York: Springer, 2018. p. 67-80.), quanto em economias emergentes (GUERRERO e URBANO, 2017GUERRERO, M.; URBANO, D. The impact of Triple Helix agents on entrepreneurial innovations’ performance: An inside look at enterprises located in an emerging economy. Technological Forecasting and Social Change, v. 119, p. 294-309, 2017.); demonstrados também nos resultados teóricos e empíricos da revisão sistemática de literatura de Schmitz, Urbano, Dandolini et al. (2017SCHMITZ, A. et al. Innovation and entrepreneurship in the academic setting: a systematic literature review. International Entrepreneurship and Management Journal, v. 13, n. 2, p. 369-395, 2017.).

A Influência do New Public Management no Paradigma da Universidade Empreendedora

Os desdobramentos da crise nas décadas de 1970-1980, de dimensões sociais, econômicas e administrativas, tiveram um impacto mundial e motivou vários países a moverem-se em direção das reformas orientadas pela proposta do New Public Management (NPM). Nesse período, o papel do Estado como provedor do bem-estar social e da projeção econômica, como ocorreu no Reino Unido, passou a ser questionado em muitos países pela ingovernabilidade, pela escassez de recursos, pela retração do poder das políticas macroeconômicas frente ao avanço do poder das multinacionais (efeitos da globalização e da evolução tecnológica), pela suposta ineficiência do modelo weberiano, etc. (GRUENING, 2001GRUENING, G. Origin and theoretical basis of New Public Management. International Public Management Journal, v. 4, n. 1, p. 1-25, 2001.).

Dentre os preceitos gerenciais desenvolvidos pelo setor privado destacam-se alguns adotados pelo NPM que facilitam a compreensão desse movimento: gestão por resultados com indicadores de desempenho explícitos; dowsizing e descentralização aplicados à divisão de organizações públicas em unidades menores e redução do quadro de funcionários; marketization (mercadização) com a introdução da competição administrada ou do controle por quase-mercados na prestação de serviços; ênfase no controle por resultados; introdução de novos instrumentos de controle e transparência, como a accountability (responsabilização dos gestores) e o empowerment (reduzindo o papel político e ampliando o poder e autonomia dos gestores intermediários); introdução do conceito de entrepreneurism (empreendedorismo) na esfera política, delegando aos gestores o papel de articuladores; e o agenciamento e contratualização, seguindo a lógica agent-principal (HOOD, 1991HOOD, C. A Public management for all seasons? Public Administration, v. 69, n. 1, p. 3-19, 1991.; OSBORNE e GAEBLER, 1992OSBORNE, S. P.; GAEBLER, T. Reinventing government: how the entrepreneurial spirit is transforming the public service. Reading: Addison-Welsey, 1992.; PETERS e PIERRE, 1998PETERS, B. G.; PIERRE, J. Governance without government? Rethinking public administration. Journal of public administration research and theory, v. 8, n. 2, p. 223-243, 1998.).

No Brasil, a reforma gerencial ocorreu a partir de 1995 por meio do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado. Essa reforma centrou-se modernização do aparelho do Estado, com ênfase na eficiência e controle. Apesar do plano fazer uso de alguns instrumentos gerenciais advindos do setor privado, não foi totalmente orientado pela NPM. De fato, houve a adoção de um modelo de governança, em parte pelos processos de desestatização e a consequente aproximação do Estado com o mercado e a sociedade civil (PECI, PIERANTI e RODRIGUES, 2014PECI, A.; PIERANTI, O.; RODRIGUES, S. Governança e new public management: convergências e contradições no contexto brasileiro. Organizações e Sociedade, v. 15, p. 39-55, 2014.), em parte pela reforma ter sido pautada no fortalecimento do Estado Social em contradição à visão neoliberal de Estado mínimo (BRESSER PEREIRA, 2010BRESSER PEREIRA, L. C. Democracy, social state and managerial reform. RAE, v. 50, n. 1, p. 112-116, 2010.).

De acordo com Gibbons, Limoges, Nowotny et al. (1994GIBBONS, M., et al. The new production of knowledge: the dynamics of science and research in contemporary societies. London: SAGE, 1994.), essas transformações afetaram o contexto institucional da produção do conhecimento criando algumas transições nos tipos de conhecimento produzido do Modo 1 para o Modo 2. Os autores definiram como Modo 1 da produção do conhecimento científico os conhecimentos tradicionais, gerados no contexto acadêmico, ou seja, a pesquisa científica disciplinar, desinteressada, básica. O Modo 2 refere-se à produção do conhecimento transdisciplinar em contextos econômicos e sociais mais amplos, ele é fundamentado na pesquisa aplicada e transpassa as fronteiras acadêmicas por meio da interação da universidade com a sociedade, com as empresas e as agências governamentais. Para Etzkowitz e Leydesdorff (1998ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The endless transition: a “triple helix” of university-industry-government relations. Minerva, v. 36, n. 3, p. 203-208, 1998.), surgiu um interesse comum no mundo sobre a chamada “terceira missão da universidade”, isto é, a expansão do seu papel no desenvolvimento econômico e social, além das funções tradicionais de ensino e pesquisa. O termo “novo contrato social” foi incorporado para redefinir as funções sociais da universidade com a sociedade: ensino, pesquisa e desenvolvimento econômico.

Seguindo esta lógica, emergiu o conceito da Universidade Empreendedora, que introduziu o ethos empreendedor na academia (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 1998ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The endless transition: a “triple helix” of university-industry-government relations. Minerva, v. 36, n. 3, p. 203-208, 1998.; GUERRERO e URBANO, 2012GUERRERO, M.; URBANO, D. The development of an entrepreneurial university. The Journal of Technology Transfer, v. 37, n. 1, p. 43-74, 2012.). A Universidade Empreendedora repousa na ideia de que ela é capaz de executar atividades empreendedoras com o intuito de melhorar o desenvolvimento econômico e contribuir para a comercialização e geração de receitas advindas das inovações tecnológicas, produzidas pelas pesquisas acadêmicas (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.; ETZKOWITZ, 2013ETZKOWITZ, H. Anatomy of the entrepeneurial university. Social Science Information, v. 52, n. 3, p. 486-511, 2013.).

De modo a facilitar a compreensão da orientação da universidade em direção ao paradigma empreendedor, Philpott, Dooley, O’Reilly et al. (2011PHILPOTT, K. et al. The entrepreneurial university: examining the underlying academic tensions. Technovation, v. 31, n. 4, p. 161-170, 2011.) apresentam uma série de atividades empreendedoras que uma universidade pode desenvolver num espectro de iniciativas hard e soft, que aproximam ou distanciam as universidades do empreendedorismo, como: criação de parque tecnológico; formação de empresa spin-off; patenteamento e licenciamento; pesquisas contratadas; cursos de formação para a indústria; consultoria; subvenções; resultados de publicações acadêmicas; e produção de graduados de alta qualidade.

No paradigma empreendedor, colocar em uso o conhecimento produzido para fins econômicos significa capitalizar o conhecimento. Para Etzkowitz (2003ETZKOWITZ, H. Studies of science etudes sur la science innovation in innovation : the triple helix of university ± industry ± government relations. Social Science Information, v. 42, n. 3, p. 293-337, 2003.), a capitalização do conhecimento é o processo pelo qual o conhecimento transforma-se em capital por meio da criação de patentes, incubadoras, pesquisas corporativas ou em forma de consórcios, escritórios de transferência de tecnologia, investimentos em capital de risco público e privado, etc.

Embora os estudos sobre a universidade empreendedora sejam proeminentes (ARMBRUSTER, 2008ARMBRUSTER, C. Research universities: autonomy and self-reliance after the Entrepreneurial University. Policy Futures in Education,v. 6, n. 4, p. 372-389, 2008.; GIBB, HASKINS e ROBERTSON, 2013GIBB, A.; HASKINS, G.; & ROBERTSON, I. Leading the entrepreneurial university: Meeting the entrepreneurial development needs of higher education institutions. In: ALTMAN, A.; EBERSBERGER, B. (Eds.). Universities in Change: Managing higher education institutions in the age of globalization. New York: Springer , 2013. p. 9-45.; AUDRETSCH, 2014AUDRETSCH, D. From the entrepreneurial university to the university for the entrepreneurial society. The Journal of Technology Transfer, v. 39, n.3, p. 313-321, 2014.), a literatura apresenta posições antagônicas (MATHIEU, MEYER e POTTERIE, 2008MATHIEU, A.; MEYER, M.; POTTERIE, B. Turning science into business: a case study of a major European research university. Science and Public Policy, v. 35, p. 669-679, 2008.; STYHRE e LIND, 2010STYHRE, A.; LIND, F. The softening bureaucracy: Accommodating new research opportunities in the entrepreneurial university. Scandinavian Journal of Management, v. 26, n. 2, p. 107-120, 2010.; HANNON, 2013HANNON, P. Why is the entrepreneurial university important? Journal of Innovation Management, v. 1, n. 2, p. 10-17, 2013.). Esses autores destacam que essa tendência no campo acadêmico, tem sido impulsionada, sobretudo, por pressões externas como, por exemplo, a redução do financiamento das universidades, a legitimação do desenvolvimento econômico como uma de suas funções e as mudanças na legislação sobre direito de propriedade intelectual (PHILPOTT, DOOLEY, O’REILLY et al., 2011PHILPOTT, K. et al. The entrepreneurial university: examining the underlying academic tensions. Technovation, v. 31, n. 4, p. 161-170, 2011.).

No Brasil, a legitimação de algumas ações voltadas ao empreendedorismo acadêmico se materializou com a Lei de Inovação (Lei nº. 10.973, de 2004BRASIL. Lei n. 10.973, de 02 de dezembro de 2004. Brasília, DF: Diário da União, 2004. Available at: <Available at: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/lei/l10.973.htm >. Accessed on: Nov. 20, 2014.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_at...
, atualizada pela Lei nº. 13.243, de 2016BRASIL. Lei n. 13.243, de 11 de janeiro de 2016. Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação. Brasília, DF: Diário da União , 2016. Available at: <Available at: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13243.htm#art2 >. Accessed on: Feb. 20, 2018.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_At...
), que dispõe sobre incentivos à inovação e pesquisa científica. A quantidade de Incubadoras de empresas e parques tecnológicos criados no Brasil após a regulamentação da lei confirma o esforço do governo na inserção de novos atores e no compartilhamento de responsabilidades (CASTRO, 2011CASTRO, M. H. M. Universidade e inovação: configurações institucionais e terceira missão. Caderno CRH, v. 24, n. 63, p. 555-573, 2011.). Com efeito, “nossas universidades habitam um novo ambiente e muitas estão, hoje, ladeadas por grandes incubadoras e parques tecnológicos, como são os casos da USP e Unicamp, UFRJ, UFRGS, UFSC e UFPE, para citar algumas públicas, e PUC-Rio, PUC-RS e Univap, para citar algumas particulares” (CASTRO, 2011CASTRO, M. H. M. Universidade e inovação: configurações institucionais e terceira missão. Caderno CRH, v. 24, n. 63, p. 555-573, 2011., p. 564). Cabe ressaltar que nos países latino-americanos há uma histórica relação entre políticas públicas de ciência e tecnologia e a pesquisa universitária, em virtude do incipiente investimento em pesquisa e desenvolvimento no âmbito privado (DAGNINO, 2007DAGNINO, R. Ciência e Tecnologia no Brasil: O processo decisório e a comunidade de pesquisa. Campinas: Editora Unicamp, 2007.).

No entanto, para seguir a cartilha determinada pelo Consenso de Washington, Geuna e Muscio (2009GEUNA, A.; MUSCIO, A. The governance of university knowledge transfer: a critical review of the literature. Minerva, v. 47, n. 1, p. 93-114, 2009.) observam que um dos fatores determinantes da afirmação da institucionalização das atividades de transferência de conhecimento das universidades foi a redefinição do papel do Estado e a consequente redução do seu papel na economia, que acabou resultando nas restrições orçamentárias que afetaram as fontes de financiamento das universidades. Em alguns países, as universidades sofreram fortes pressões políticas para angariar fundos da indústria para pesquisas e, assim, contribuir ativamente para o desenvolvimento econômico (LEISNER, 2006LIESNER, A. Education or service? Remarks on teaching and learning in the entrepreneurial university. Educational Philosophy and Theory, v. 38, n. 4, p. 483-495, 2006.; HARRISON e LEITCH, 2010HARRISON, R; LEITCH, C. Voodoo institution or entrepreneurial university? Spin-off companies, the entrepreneurial system and regional development in the UK. Regional Studies, v. 44, n. 9, p. 1241-1262, 2010.). O que conecta com o movimento de reformas gerenciais, em que é possível identificar, de forma sistemática, traços da NPM nas perspectivas teóricas do Modo 2 da produção do conhecimento e da universidade empreendedora (TOLOFARI, 2005TOLOFARI, S. New public management and education. Policy Futures in Education, v. 3, n. 1, p. 75-89, 2005.; LORENZ, 2012LORENZ, C. If you’re so smart, why are you under surveillance? Universities, neoliberalism, and new public management. Critical Inquiry, v. 38, n. 3, p. 599-629, 2012.). Uma saída recorrente para ampliar o acesso aos recursos foi a adoção de parcerias envolvendo as universidades, as empresas e os governos.

Hélice Tríplice: Um Modelo Teórico e Empírico das Interações Universidade-Empresa-Governo (U-E-G)

Tida como modelo dominante, a teoria da Hélice Tríplice foi proposta pela primeira vez em 1996, por Henry Etzkowitz e Loet Leydesdorff, que defendiam a colaboração sistêmica e crescente entre as três esferas institucionais, na formação de redes onde cada esfera institucional da relação universidade-empresa-governo deveria atuar de forma harmônica em relação às outras (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 1998ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The endless transition: a “triple helix” of university-industry-government relations. Minerva, v. 36, n. 3, p. 203-208, 1998.; ETZKOWITZ, 2011ETZKOWITZ, H. (2011). The triple helix model. Innovation, v. 1, n. 4, p. 5-10.). Assim, a teoria apresenta as três configurações existentes nos modelos de interação universidade-empresa-governo (U-E-G), de acordo com a evolução dos sistemas de inovação. Essas configurações tornaram-se modelos aplicáveis que permitem compreender os estágios do processo de inovação, as formas nas quais se dão as relações entre as três esferas institucionais, a dinâmica de cada esfera institucional ao colocar a ciência e tecnologia trabalhando para a inovação, bem como os potenciais conflitos existentes nessas relações (SARPONG, ABDRAZAK, ALEXANDER et al., 2017SARPONG, D. et al. Organizing practices of university, industry and government that facilitate (or impede) the transition to a hybrid triple helix model of innovation. Technological Forecasting and Social Change, v. 123, p. 142-152, 2017.).

Essa evolução dos modelos da Tríplice-Hélice é representada por três configurações. A Hélice Tríplice I é uma configuração cujo modelo de interação é estatista, no qual o Estado abrange a indústria e a academia, dirigindo as relações entre ambas. Esse modelo top-down, centrado no Estado, é considerado falho porque não estimula a inovação, tendo em vista que possui pouco espaço para interações do tipo bottom-up, o que limita a capacidade dos demais atores de inovar. A configuração estatista possui um caráter normativo e institucional mais amplo que os demais modelos, baseada em políticas e normas que direcionam o sistema de inovação, sem se preocupar com a interação universidade-empresa (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.; ETZKOWITZ, 2003ETZKOWITZ, H. Studies of science etudes sur la science innovation in innovation : the triple helix of university ± industry ± government relations. Social Science Information, v. 42, n. 3, p. 293-337, 2003.; RANGA e ETZKOWITZ, 2013RANGA, M.; ETZKOWITZ, H. Triple Helix systems: an analytical framework for innovation policy and practice in the knowledge society. Industry and Higher Education, v. 27, n. 4, p. 237-262, 2013.).

A Hélice Tríplice II é definida como modelo “laissez-faire”, no qual as esferas institucionais possuem fronteiras bem definidas e separadas entre os atores. Ou seja, a interação entre os atores ainda é modesta e representa uma redução do papel do Estado na economia. A indústria é a força motriz dessa configuração, onde o governo tende a atuar na regulação de mecanismos econômicos e sociais e a universidade como fornecedora de conhecimento por meio da pesquisa e da formação de capital humano. Desta forma, governo e universidade são tidos como estruturas de apoio, exercendo papéis limitados na inovação. Importante frisar que o modelo “laissez-faire” possibilita a interação entre as esferas institucionais, porém como as fronteiras são bem definidas, a interação geralmente ocorre mediante a ação de um intermediário (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.; ETZKOWITZ, 2003ETZKOWITZ, H. Studies of science etudes sur la science innovation in innovation : the triple helix of university ± industry ± government relations. Social Science Information, v. 42, n. 3, p. 293-337, 2003.; RANGA e ETZKOWITZ, 2013RANGA, M.; ETZKOWITZ, H. Triple Helix systems: an analytical framework for innovation policy and practice in the knowledge society. Industry and Higher Education, v. 27, n. 4, p. 237-262, 2013.).

A Hélice Tríplice III é um modelo balanceado que introduz uma noção de sobreposição das relações de trocas entre as esferas institucionais, com o intuito de gerar uma nova forma de infraestrutura de conhecimento, por meio da inter-relação entre os diversos atores sociais envolvidos. A interseção entre as esferas institucionais é recursiva e tem por objetivo proporcionar um ambiente favorável à inovação através da formação de redes trilaterais e das organizações híbridas. O hibridismo refere-se aos novos formatos organizacionais que emergem da interação U-E-G, como spin-off acadêmicos, incubadoras, parques tecnológicos, startups, empresas de capital de risco, etc. Além desses novos formatos, alianças estratégicas entre empresas, laboratórios acadêmicos e governamentais de pesquisa trabalham em conjunto, formando redes de iniciativas trilaterais para a produção do conhecimento baseado no desenvolvimento econômico (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.; ETZKOWITZ, 2003ETZKOWITZ, H. Studies of science etudes sur la science innovation in innovation : the triple helix of university ± industry ± government relations. Social Science Information, v. 42, n. 3, p. 293-337, 2003.; RANGA e ETZKOWITZ, 2013RANGA, M.; ETZKOWITZ, H. Triple Helix systems: an analytical framework for innovation policy and practice in the knowledge society. Industry and Higher Education, v. 27, n. 4, p. 237-262, 2013.).

Essa configuração é tida como balanceada, porque as instituições são mais autônomas e podem assumir o papel uma das outras, tornando as relações mais simétricas, recíprocas e cooperativas. A cooperação aumenta a interação U-E-G, fazendo surgir novas estratégias de desenvolvimento e práticas de inovação. O governo assume o papel de articulador, conduzindo as regras sociais do jogo para estimular a formação de parcerias e disponibilizando capital de risco para apoiar empreendimentos voltados à produção de novas tecnologias (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.; ETZKOWITZ, 2003ETZKOWITZ, H. Studies of science etudes sur la science innovation in innovation : the triple helix of university ± industry ± government relations. Social Science Information, v. 42, n. 3, p. 293-337, 2003.; LEYDESDORFF, 2013LEYDESDORFF, L. (2013). The Triple Helix of University-Industry-Government Relations In: CARAYANNIS, E. (Ed.). Encyclopedia of Creativity, Innovation, and Entrepreneurship. New York: Springer. p. 1844-18516.). Em contrapartida, as universidades e outras instituições de conhecimento podem assumir a liderança em iniciativas conjuntas tendo o governo como suporte (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.; RANGA e ETZKOWITZ, 2013RANGA, M.; ETZKOWITZ, H. Triple Helix systems: an analytical framework for innovation policy and practice in the knowledge society. Industry and Higher Education, v. 27, n. 4, p. 237-262, 2013.).

Embora Etzkowitz (2003ETZKOWITZ, H. Studies of science etudes sur la science innovation in innovation : the triple helix of university ± industry ± government relations. Social Science Information, v. 42, n. 3, p. 293-337, 2003.) assegure que a tese da Hélice Tríplice abarca as dimensões históricas, analíticas e normativas, contribuindo para a compreensão do contexto e a consequente adaptação dos sistemas de inovação em função da transformação da ciência, de acordo com a interpretação da realidade local, a literatura apresenta alguns dissensos. Amir e Nugroho (2013AMIR, S.; NUGROHO, Y. Beyond the triple helix: framing STS in the developmental context. Bulletin of Science, Technology & Society, v. 33, n. 3-4, p. 115-126, 2013.) levantam algumas críticas e limitações, dentre elas, a abordagem mecanicista do modelo, por ter sido transformada em um quadro de referência ou até mesmo uma diretriz política em alguns países. Cai (2014CAI, Y. Implementing the Triple Helix model in a non-Western context: an institutional logics perspective. Triple Helix, v. 1, n. 1, p. 1-20, 2014.) chama atenção para a escassez de evidências empíricas sobre a aplicabilidade da Hélice Tríplice em contextos não ocidentais. Cooke (2005COOKE, P. Regionally asymmetric knowledge capabilities and open innovation: exploring “globalisation 2” - a new model of industry organisation. Research Policy, v. 34, n. 8, p. 1128-1149, 2005., p. 1129) argumenta que a Hélice Tríplice é passível de crítica “[...] por enfatizar os aspectos de consenso de relações entre comunidades epistêmicas distintivas e uma visão um pouco cibernética da inovação em conformidade”.

Apesar dessas limitações, Amir e Nugroho (2013AMIR, S.; NUGROHO, Y. Beyond the triple helix: framing STS in the developmental context. Bulletin of Science, Technology & Society, v. 33, n. 3-4, p. 115-126, 2013.) admitem que a ampla difusão dos pressupostos da Hélice Tríplice, por meio de conferências, workshops e eventos de pesquisa a transformaram num quadro de referência para as políticas de desenvolvimento e para a elaboração das políticas públicas de ciência, tecnologia e inovação de vários países desenvolvidos ou em desenvolvimento.

Embora dois novos modelos tenham sido propostos posteriormente, adicionando mais “hélices” relativas à sociedade e ao meio ambiente, o modelo da Hélice Tríplice ainda se reafirma enquanto mainstream na literatura e nas políticas de C&T dos países, em específico, os de economia emergente. Esses novos modelos são o da Quádrupla Hélice (CARAYANNIS e CAMPBELL, 2009CARAYANNIS, E. G.; CAMPBELL, D. F. J. “Mode 3” and “Quadruple Helix”: toward a 21st century fractal innovation ecosystem. International Journal of Technology Management, v. 46, n. 3/4, p. 201-234, 2009.) que adiciona a hélice do público baseado em mídia e cultura, e o da Quíntupla Hélice (CARAYANNIS, BARTH e CAMPBELL, 2012CARAYANNIS, E. G.; BARTH, T. D.; CAMPBELL, D. F. The Quintuple Helix innovation model: global warming as a challenge and driver for innovation. Journal of Innovation and Entrepreneurship, v. 1, n. 1, p. 2, 2012.), que amplia o número de redes de relações, como também acrescenta a quinta hélice - a do ambiente natural - numa perspectiva de análise multidisciplinar. Dito de outro modo, o modelo de Hélice Tríplice centra nas relações universidade-indústria-governo não considerando a esfera social de um modo mais amplo, sendo predominante na análise das interações em ambientes de inovação e desenvolvimento de políticas públicas, principalmente em países de economia emergente (GUERRERO e URBANO, 2017GUERRERO, M.; URBANO, D. The impact of Triple Helix agents on entrepreneurial innovations’ performance: An inside look at enterprises located in an emerging economy. Technological Forecasting and Social Change, v. 119, p. 294-309, 2017.; WONGLIMPIYARAT e KHAEMASUNUN, 2015WONGLIMPIYARAT, J.; KHAEMASUNUN, P. China ’ s innovation financing system : Triple Helix policy perspectives. Triple Helix, v. 2, n. 5, p. 1-18, 2015.).

Dagnino (2003DAGNINO, R. A relação universidade-empresa no Brasil e o argumento da hélice tripla. Revista Brasileira de Inovação, v. 2, n. 2, p. 267-307, 2003.) ressalta o amplo questionamento que a teoria da Hélice Tríplice sofreu acerca da relação entre a efetividade dos arranjos institucionais de vinculação universidade-empresa e o aumento da competitividade no Brasil. Apesar das recentes mudanças no marco legal que favoreceram a aproximação da universidade com outros setores (BRASIL, 2016BRASIL. Lei n. 13.243, de 11 de janeiro de 2016. Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação. Brasília, DF: Diário da União , 2016. Available at: <Available at: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13243.htm#art2 >. Accessed on: Feb. 20, 2018.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_At...
; MACULAN e MELLO, 2011MACULAN, A.; MELLO, J. A new regulatory framework for the relationship between university and industry: the Brazilian experience. In: SAAD, M.; ZAWDIE, G. (Eds.). Theory and Practice of the Triple Helix Model in Developing Countries: Issues and challenges. London: Routledge , 2011. p. 68-82.) e de que algumas experiências analisadas no contexto brasileiro mostraram esta aproximação por meio do modelo da Tríplice Hélice (e.g. ALMEIDA, TERRA e MONTSERRAT, 2011ALMEIDA, M.; TERRA, B.; MONTSERRAT, M. The incubator movement: A comparative analysis of Brazil and Mexico. In: SAAD, M.; ZAWDIE, G. (Eds.). Theory and Practice of the Triple Helix Model in Developing Countries: Issues and challenges. London: Routledge, 2011. p. 192-205.; AMARAL, FERREIRA e TEODORO, 2011AMARAL, M.; FERREIRA, A.; TEODORO, P. Building an Entrepreneurial University in Brazil: the role and potential of university-industry linkages in promoting regional economic development. Industry and Higher Education, v. 25, n. 5, p. 383-395, 2011.; ARMANDO, BOAVENTURA, TODEVA et al., 2017ARMANDO, E. et al. Triple Helix influence on competitiveness factors: Comparison between wine clusters in Brazil and Chile, Review of International Business, v. 12, n. 3, p. 43-60, 2017.; PARANHOS e HASENCLEVER, 2011PARANHOS, J.; HASENCLEVER, L. Is Industry-University Interaction Promoting Innovation in the Brazilian Pharmaceutical Industry? Industry and Higher Education, v. 25, n. 5, p. 397-407, 2011.; ZAWISLAK e DALMARCO, 2011ZAWISLAK, P.; DALMARCO, G. The Silent Run: New Issues and Outcomes for University-Industry Relations in Brazil. Journal of Technology Management & Innovation, Santiago, v. 6, n. 2, p. 66-82, 2011.; ZOUAIN e PLONSKI, 2015ZOUAIN, D.; PLONSKI, G. Science and Technology Parks: laboratories of innovation for urban development-an approach from Brazil. Triple Helix, v. 2, n. 1, p. 1-22, 2015.), estudos apontam que o país ainda está muito aquém daqueles mais avançados e dos emergentes asiáticos, ou seja, os arranjos institucionais e o comportamento dos atores na relação universidade-empresa ainda não são significativos como de outros países (YE, YU e LEYDESDORFF, 2013YE, F; YU, S.; LEYDESDORFF, L. The Triple Helix of university-industry-government relations at the country level and its dynamic evolution under the pressures of globalization. Journal of the American Society for Information Science and Technology, v. 64, n. 11, p. 2317-2325, 2013.; CHOI, YANG e PARK, 2015CHOI, S., YANG, J., & PARK, H. The triple helix and international collaboration in science. Journal of the Association for Information Science and Technology, v. 66, n. 1, p. 201-212, 2015.).

No caso de Cingapura, os indicadores que medem a relação em Tríplice Hélice mostram que o país, desde 2002, já aparece na frente do Brasil e entre as melhores posições entre os asiáticos (PARK, HONG e LEYDESDORFF, 2005PARK, H.; HONG LEYDESDORFF, L. A comparison of the knowledge-based innovation systems in the economies of South Korea and the Netherlands using Triple Helix indicators. Scientometrics, v. 65, n. 1, p. 3-27, 2005.). Parte desta vantagem de Cingapura advém do processo de desenvolvimento do país, que muito cedo optou pela abertura de mercado convidando multinacionais estrangeiras que possuíam a tecnologia e o conhecimento que o novo Estado precisava (HUFF, 1995HUFF, W. What is the Singapore model of economic development? Cambridge Journal of Economics, v. 19, n. 6, p. 735-759, 1995.), seguido de uma ampla estruturação do ensino superior que adotou o modelo de universidade empreendedora (WONG, HO e SINGH, 2007WONG, P.; HO, Y.; SINGH, A. Towards an “entrepreneurial university” model to support knowledge-based economic development: the case of the National University of Singapore. World Development, v. 35, n. 6, p. 941-958, 2007.; MOK, 2015MOK, K. The quest for global competitiveness: promotion of innovation and entrepreneurial universities in Singapore. Higher Education Policy, v. 28, n. 1, p. 91-106, 2015.). Isso que permitiu reconfigurar as relações U-E-G e desenvolver as diretrizes prevista no National Innovation System (NIS) estabelecido pelo país com o objetivo claro de promover a capacidade tecnológica através do aprimoramento da inovação de processos durante os estágios iniciais da inovação de produtos (PARAYIL, 2005PARAYIL, G. From “Silicon Island” to “Biopolis of Asia”: innovation policy and shifting competitive strategy in Singapore. California Management Review, v. 47, n. 2, p. 50-73, 2005.).

Pelas razões apresentadas, o presente estudo focou na Teoria da Hélice Tríplice (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.) e as adequações propostas por Todeva (2013TODEVA, E. Governance of innovation and intermediation in triple helix interactions. Industry and higher education, v. 27, n. 4, p. 263-278, 2013.), no sentido de abarcar outras instituições e órgãos públicos que também participam da formação das hélices e da governança. Sobretudo, porque Ranga e Etzkowitz (2013ETZKOWITZ, H. Studies of science etudes sur la science innovation in innovation : the triple helix of university ± industry ± government relations. Social Science Information, v. 42, n. 3, p. 293-337, 2003.) consideram o caráter híbrido das instituições de ensino brasileiras de acordo com a Lei de Inovação de 2004, por associarem ensino, pesquisa e extensão à laboratórios públicos e privados e até mesmo fundações acadêmicas.

METODOLOGIA DA PESQUISA

O presente artigo é fruto de uma pesquisa mais ampla, de natureza qualitativa e do tipo exploratória e descritiva, que utilizou a estratégia de estudo de caso único, ex-post-facto e corte transversal. O estudo de caso é um método amplamente utilizado nas pesquisas empíricas quando se deseja compreender fenômenos específicos, políticos ou sociais complexos, que depreenda uma análise mais aprofundada do contexto real a partir de diferentes fontes de dados (YIN, 2005YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman, 2005.). Esta opção metodológica também é frequentemente adotada para investigar a relação universidade-empresa-governo (RAPINI, 2007RAPINI, M. S. O diretório dos grupos de pesquisa do CNPq e a interação universidade-empresa no Brasil: uma proposta metodológica de investigação. Revista de Economia Contemporânea, v. 11, n. 1, p. 99-117, 2007.). A unidade de análise foi a experiência da parceria para a concepção e execução do Programa de Cooperação Educacional para a transferência de conhecimento em tecnologia naval (YIN, 2005YIN, R. K. Estudo de caso: planejamento e métodos. Porto Alegre: Bookman, 2005.).

A coleta de dados foi composta de entrevistas e pesquisa documental. Inicialmente, foram conduzidas duas entrevistas em profundidade e não-estruturadas, com os gestores da parceria (um gestor da empresa e um do IFE). O intuito dessas entrevistas foi o de oferecer maior liberdade aos sujeitos para discorrerem sobre o contexto que envolveu a formação da parceria (GODOI e MATTOS, 2010GODOI, C. K.; MATTOS, P. L. C. L. Entrevista qualitativa: instrumento de pesquisa e evento dialógico. In: SILVA, A. B.; GODOI, C. K.; MELO, R. B. (Orgs.). Pesquisa qualitativa em estudos organizacionais: paradigmas, estratégias e métodos. 2. ed. São Paulo, 2010. p. 301-323.). Essas ocasiões também foram oportunas para obter as permissões para a condução da pesquisa de campo e o acesso de documentos para subsidiar a pesquisa documental (CRESWELL e CLARCK, 2013CRESWELL, J. W.; CLARCK, D. Projeto de pesquisa: Métodos mistos. Porto Alegre: Artmed, 2013.).

Os demais entrevistados foram selecionados como sujeitos da pesquisa inicialmente com base na participação direta ou indireta no Programa de Cooperação e nas funções desempenhadas nas respectivas instituições. Ao adentrar no campo e fazer as entrevistas semiestruturadas iniciais, novos sujeitos foram indicados pelos primeiros entrevistados, caracterizando-se como o efeito “bola de neve” (GODOI e MATTOS, 2010GODOI, C. K.; MATTOS, P. L. C. L. Entrevista qualitativa: instrumento de pesquisa e evento dialógico. In: SILVA, A. B.; GODOI, C. K.; MELO, R. B. (Orgs.). Pesquisa qualitativa em estudos organizacionais: paradigmas, estratégias e métodos. 2. ed. São Paulo, 2010. p. 301-323.). Nesta segunda leva foram realizadas 24 entrevistas semiestruturadas, totalizando - com as duas iniciais - 26 entrevistas (representadas neste trabalho por E 1, E 2... E n) gravadas em áudio e posteriormente transcritas.

No IFE foram conduzidas dez entrevistas na reitoria e em quatro campi, sendo duas com um assessor para implantação de polos de inovação (gestor da parceria), além de três diretores de unidades, dois coordenadores de curso e três professores que participaram do Programa de Cooperação Educacional. Na empresa, de um total de quatorze entrevistas, duas foram efetuadas com o gestor de recursos humanos, uma com o coordenador do intercâmbio, duas com os coordenadores das áreas responsáveis pela recepção das equipes anuais de trainees, além de oito alunos e egressos do IFE. No governo do estado, foram efetuadas duas entrevistas com o subsecretário de desenvolvimento responsável pelas parcerias internacionais para o fomento da indústria local.

A pesquisa documental foi um importante recurso utilizado para compor e enriquecer a análise do objeto investigado, por permitir situar o Programa de Cooperação Educacional numa cronologia de eventos e a identificar convergências e divergências na sobreposição dos dados (GIBBS, 2008GIBBS, G. Análise de dados qualitativos. Porto Alegre: Artmed , 2008.). Esses dados secundários foram obtidos de diversas fontes, como: documentos oficiais disponibilizados pela empresa; documentos oficiais de domínio público disponíveis na internet; sítios eletrônicos oficiais; revistas; jornais; leis; decretos e relatórios que, de alguma forma, possuíam conteúdos relacionados ao contexto em que se deu o Programa de Cooperação Educacional. Ressalta-se que essa pesquisa compreendeu o período entre 2008 a 2017, devido aos contatos iniciais entre a empresa, o governo do estado e a universidade terem iniciado no ano de 2008.

Como a pesquisa baseou-se na teoria da Hélice Tríplice e no paradigma da Universidade Empreendedora para analisar a relação U-E-G, algumas categorias a priori foram definidas (BARDIN, 2006BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2006.). Entretanto, no decorrer da análise de conteúdo, outros temas emergiram do processo sistemático de releitura dos dados. Ou seja, alguns conjuntos de códigos revelaram outras subcategorias que foram definidas a posteriori (BARDIN, 2006BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2006.). Essas categorias e subcategorias foram interpretadas e confrontadas com as perspectivas teóricas abordadas, de acordo com o objetivo proposto.

O Caso do Programa de Cooperação Educacional para Transferência de Conhecimento Brasil-Cingapura

O caso estudado refere-se ao Programa de Cooperação Educacional celebrado entre três organizações: (1) IFE, (2) Instituto Politécnico Internacional de Ensino e (3) Estaleiro localizado na região Sudeste - empresa subsidiária de um grupo transnacional no mercado de construção naval, com sede em Cingapura; além da participação do Governo do estado. Esse Programa de Cooperação é, na verdade, um intercâmbio profissional entre a Cidade-Estado, que qualifica alunos, egressos e professores para a transferência de conhecimento em tecnologia naval.

A consolidação do Programa de Cooperação Educacional foi efetivada em abril de 2012. O protocolo de intenções foi assinado pelo pró-reitor de extensão do IFE, pelo governador do estado, pelo presidente da subsidiária do estaleiro no Brasil, pelo diretor de recursos humanos do grupo transnacional e pelo diretor da divisão de engenharia mecânica do Instituto Politécnico Internacional. Participaram também deste ato o secretário de Estado de Desenvolvimento, o secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação, Educação Profissional e Trabalho, o secretário de Estado da Educação e o prefeito do município onde o empreendimento está localizado.

As negociações para a formação da parceria para a cooperação iniciaram em 2008, quando o governo do Estado, por meio da Secretaria de Desenvolvimento fez a intermediação do contato dos representantes do Grupo com a instituição de ensino disposta a embarcar na iniciativa de formação profissional proposta pelo estaleiro. A atuação do governo do Estado nesta parceria teve um caráter institucional e político, ao articular os atores sociais para o desenho e implementação do Programa de Cooperação Educacional, sendo tal iniciativa uma das contrapartidas do Grupo para a implantação de um estaleiro no Estado.

O Programa de Cooperação Educacional objetiva qualificar estudantes e egressos do IFE para formar a força de trabalho local nos padrões internacionais de tecnologia naval para o Estaleiro, e capacitar docentes para desenvolver e fornecer um novo curso de tecnologia naval e oceânica no estado. Ou seja, transferir a tecnologia diretamente de Cingapura, um dos líderes mundiais em construção naval, por meio de um treinamento na área naval no Instituto Politécnico de referência internacional em tecnologia naval e oceânica, seguido de um treinamento on the job na matriz do Grupo.

O intuito do estaleiro com a implementação deste Programa foi capacitar e aperfeiçoar a força de trabalho local de nível intermediário para a operação do empreendimento, inserindo alunos (estudantes e egressos) do IFE, já contratados após a aprovação no processo seletivo como trainees, na cultura do Grupo. A capacitação dos docentes, por sua vez, deveu-se à intenção do IFE em formar multiplicadores que seriam responsáveis por desenvolver um novo currículo para um curso de tecnologia naval e oceânica (a ser criado) no município em que o estaleiro está inserido, de modo que, findos os cinco anos de vigência do Programa, o Instituto estivesse apto a ministrar cursos in home para efetuar a transferência de conhecimento para os funcionários do estaleiro e para a sociedade.

O Programa contou com o investimento de cerca de US$ 4 milhões do Estaleiro para subsidiar todo o processo seletivo, logística, infraestrutura e treinamento a todos os participantes do intercâmbio. O IFE cedeu as instalações para o processo seletivo e operacionalizou, pela sua fundação, as bolsas para os docentes participarem do intercâmbio. A vigência do Programa foi de cinco anos - iniciado em abril de 2012 - com previsão anual de envio de 25 a 30 alunos e de três professores. O cronograma de treinamento para os alunos foi composto por três etapas com permanência em Cingapura durante um período médio de 14 meses, enquanto para os professores foi prevista uma etapa com permanência no período de cinco meses.

Foram selecionados no primeiro ano do intercâmbio, em 2013, 23 alunos e 2 professores. Nesta primeira turma, foram aprovados oito alunos da unidade A (município da subsidiária do Estaleiro), cinco alunos da unidade B e nove alunos da unidade C (capital do Estado). No segundo ano, em 2014, 27 alunos e 2 professores. Como seis unidades do IFE participaram da seleção, a segunda turma foi composta por três alunos da unidade A, oito alunos da unidade B, 10 alunos da unidade C, três alunos da unidade D, um aluno da unidade e dois alunos da Unidade F. No terceiro ano, em 2015, as seis unidades participaram novamente do processo seletivo, sendo a terceira turma composta por 30 alunos e 3 professores: sete da unidade A; sete da unidade B; 10 da unidade C; três da unidade D; três da unidade E; e a unidade F não teve alunos aprovados.

No ano de 2016, sete unidades do IFE participaram do processo seletivo, pois a demanda do Estaleiro envolveu cursos técnicos em Automação Industrial, Eletromecânica, Eletrotécnica, Mecânica e Metalurgia. 18 alunos foram selecionados para a quarta turma. A quinta turma foi composta por 11 alunos, que foram selecionados no final de 2017 e embarcaram em janeiro de 2018 para iniciar o treinamento em Cingapura. Ressalta-se que o intercâmbio se estendeu para além do período acordado, como também foi ampliado ao abarcar engenheiros do estaleiro, juntamente com os alunos e professores. Isso se deu devido à importância dos resultados técnicos e interculturais obtidos ao longo da parceria pela subsidiária, como também o interesse da matriz preservar as relações com o instituto politécnico, independente do cenário econômico e político brasileiro.

A Relação U-E-G e as Condições para a Configuração do Modelo “Laissez-Faire”

O caso surgiu num contexto de tentativa de expansão e modernização da capacidade produtiva do setor naval brasileiro, para atender a demanda advinda do crescimento das atividades petrolíferas offshore e a descoberta de grandes volumes de óleo na chamada camada pré-sal, como também recuperar a defasagem tecnológica frente aos líderes mundiais de fabricação de embarcações e tentar reverter o quadro de baixa produtividade brasileira.

Para estimular o setor de construção naval, o governo federal, em conjunto com a Marinha, a Petrobrás e a sua subsidiária Transpetro desenvolveram uma série ações, incentivos fiscais e programas para executar a nova política industrial do setor. Dentre esses, um dos programas mais difundidos foi o Programa de Modernização e Expansão da Frota (Promef) da Transpetro, ratificou esses estímulos ao setor, tendo como premissas: a construção de navios no Brasil, com índice de nacionalização inicialmente superior a 65% (produção de conteúdo local); a busca por competitividade internacional (BRASIL, 2015aBRASIL. Ministério das Relações Exteriores. República de Cingapura: informações ostensivas. Brasília, DF: Senado Federal, 2015b. Available at:<Available at:http://www.senado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=181487&tp=1 >. Accessed on: Nov. 28, 2015.
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). O Programa foi divido em duas fases denominadas Promef I e Promef II, sendo a segunda adequada pela Petrobrás, no ano de 2010, devido às descobertas da chamada camada pré-sal.

Para atender a demanda de encomendas, 10 novos estaleiros entraram em operação no Brasil a partir de 2013. Destes, cinco foram implementados somente para atender a carteira de encomendas de sondas pré-sal. Oito Estados foram contemplados com investimentos em torno de R$ 10 bilhões ao todo, sendo três estaleiros na região Sudeste do país, a qual concentra o maior número de estaleiros devido à logística favorável (MORAIS, 2013MORAIS, J. M. Petróleo em águas profundas: uma história tecnológica da Petrobras na exploração e produção offshore. Brasília, DF: Ipea : Petrobras, 2013.). O caso analisado insere-se nessa conjuntura a partir de 2007, na qual deu-se início a uma sucessão de novas descobertas na camada pré-sal, devido às limitações tecnológicas para prospecção de petróleo em águas profundas (MORAIS, 2013MORAIS, J. M. Petróleo em águas profundas: uma história tecnológica da Petrobras na exploração e produção offshore. Brasília, DF: Ipea : Petrobras, 2013.). Face às recentes descobertas, organizações do setor de óleo e gás de Cingapura começaram a sondar o estado em busca de oportunidades.

Em maio de 2008, o governo do estado, representado pelo governador e pelo secretário de Desenvolvimento, realizou uma visita a Cingapura e fez reuniões de prospecção em duas grandes corporações, duas das maiores construtoras mundiais de plataformas que atuam no Brasil desde 2000 no formato de Joint Ventures. Na ocasião da visita, o então governador, teve a oportunidade de presenciar profissionais brasileiros fazendo um curso de operação de plataforma, tendo acesso à tecnologia de ponta por treinamentos feitos no formato de cooperação acadêmica nas escolas politécnicas de referência mundial. De acordo com o E 24, “ele [governador] voltou encantado com essa experiência e [...] nos pontuou muito que devemos trazer projetos para cá que incluam o [estado]. Como a gente vai incluir o [estado] numa cadeia em que o Brasil está tão deficiente?”.

O resultado destas visitas resultou no Programa de Cooperação Educacional envolvendo o IFE, a Estaleiro e o Governo Estadual. Cada um destes atores cumpriu papéis específicos que serão explorados a seguir com uma síntese acerca do programa de cooperação, no que tange aos papéis de cada ator considerando os pressupostos da Hélice Tríplice (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 1998ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The endless transition: a “triple helix” of university-industry-government relations. Minerva, v. 36, n. 3, p. 203-208, 1998., 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.).

O Estado: um papel reduzido na relação?

De acordo com o modelo instituído pelo Governo Federal, uma das formas de legitimação do papel do Estado, no setor de construção naval, se dá por meio do processo de licenciamento ambiental para a execução do projeto de implantação. Neste tipo de licenciamento, uma profunda avaliação das condições socioambientais, bem como a definição e deliberação das condicionantes para liberação das licenças prévias e de instalação para a execução da obra, que não ficam restritas aos órgãos ambientais federais ou estaduais de meio ambiente.

Os acordos bilaterais firmados na esfera acadêmica e outras incursões dos grupos cingapurianos no Estado culminaram na assinatura, em agosto de 2008, de um protocolo de intenções junto a um grupo transnacional de Cingapura. Em virtude da falta de profissionais qualificados para a indústria naval, que até então, era praticamente inexistente no estado, esse protocolo de intenções já versava sobre o compromisso da empresa com a capacitação de força de trabalho local que seria absorvida pelo estaleiro.

Quanto a responsabilidade sobre esta capacitação, embora o governo federal tenha anunciado o Planseq Naval, contemplando alguns municípios com recursos que foram direcionados à qualificação de mão de obra local, esse plano não alcançou o setor de construção naval do estado. De acordo com o E 4, “o Planseq passou longe porque o [estado] não estava incluído nesse pacote [...], foi uma questão de estratégia empresarial virem para cá”. Deste modo, coube, tão somente, à empresa essa capacitação, responsabilidade imputada pelo governo estadual no processo de Licenciamento Ambiental, como umas das condicionantes do processo.

Esse foi o instrumento utilizado pelo governo do estado para conjugar os interesses dos atores sociais que estavam envolvidos na implantação de um empreendimento de significativo impacto socioambiental, no sentido de mitigar os impactos negativos e potencializar os impactos positivos para promover o desenvolvimento, na medida do possível, sustentável para o território. Para compreender a priorização e a capacitação da mão de obra local, o estaleiro formulou no Estudo de Impacto Ambiental / Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), em dezembro de 2009, o programa de mobilização, seleção e qualificação de mão de obra.

Em novembro de 2010 foi emitida a licença de instalação, na qual o governo apresentou as 93 condicionantes a serem monitoradas periodicamente pelo Estado e pela comissão de acompanhamento. Dentre elas, a condicionante de número 16 refere-se à execução do programa de mobilização, seleção e qualificação de mão de obra. Para atender a condicionante, a subsidiária do estaleiro apresentou o programa de mobilização com estratégias de integração e cooperação mútua, visando priorizar o trabalhador local e os candidatos da população jovem, tendo como medidas mitigadoras desenvolver ações no sentido de contratar força de trabalho local e estimular ações de qualificação e requalificação local.

Essa cronologia apresenta, resumidamente, os fatos que antecederam o estabelecimento da parceria para o Programa de Cooperação Educacional para a transferência de tecnologia, bem como retrata o licenciamento ambiental como um instrumento de controle político, burocrático e legal utilizado pelo estado para fomentar ações orientadas ao desenvolvimento e retomada do setor de construção naval. O governo do Estado fez uso da sua legitimidade para impor que o licenciamento ambiental abarcasse as questões sociais e a inclusão do cidadão como força de trabalho qualificada no empreendimento. Conforme enfatiza o E 24:

O licenciamento também teve um papel fundamental, [...] o fato do [estaleiro] ter vindo para o Brasil foi o conteúdo local. A forma como ele está se relacionando com a sociedade, que não é perfeita, mas teve avanços, foi partindo do licenciamento. O que a gente tentou fazer nessa nossa década de influência é que o território já fosse incluído nos planos da empresa.

No entanto, houve divergência entre o posicionamento da subsidiária do estaleiro e do IFE quanto ao postulado pelo estado, acerca da associação do licenciamento ambiental com a criação do Programa de Cooperação Educacional. Para ambos, não há uma relação direta entre a condicionante de número 16, do licenciamento ambiental, com o referido Programa, pois esse está vinculado à estratégia global do Grupo de povoamento profissional dos empreendimentos. Ou seja, tal condicionante não abarcava a formação de profissionais de nível intermediário, as exigências impostas no licenciamento ambiental poderiam ser atendidas, tão somente, pelas modalidades de capacitação constituídas no Programa de Educação Profissional para a fase de operação da subsidiária do estaleiro. Para o E 4, o Programa:

...não é uma fatia da condicionante, é uma estratégia da empresa, essa estratégia está relacionada a quê? A necessidade da empresa de ter a força de trabalho mais avançada, os grupos capazes de produzir os navios sondas, o navio sonda de perfuração marítima é um navio muito complexo.

O escopo do programa, na verdade, foi constituído a partir das práticas internacionais já vivenciadas pelo grupo transnacional em outras subsidiárias espalhadas pelo mundo. Ele é considerado “um dos sustentáculos da estratégia de povoamento do empreendimento” (E 12), delineado pelo presidente do grupo transnacional, que também preside o Comitê Consultivo do Centro de Inovação Tecnológica Marinha e Offshore, do Instituto Politécnico Internacional, em Cingapura.

Portanto, após os trâmites do licenciamento ambiental, o papel que o estado exerceu na parceria limitou-se ao acompanhamento de um cronograma de ações para a execução das condicionantes ambientais e, sobretudo, a intermediação do contato pela Secretaria de Desenvolvimento com as instituições de ensino e o acompanhamento das ações que resultaram na consolidação do programa. O papel coadjuvante do governo do estado na formalização da parceria foi justificado pelo E 24, pois a atuação direta implicaria no atraso do processo de formalização do Memorando de Entendimento, devido aos trâmites burocráticos necessários. Desta forma, a assinatura do Memorando de Entendimento na Casa Civil do Governo do Estado foi um ato simbólico para o E 4, no qual o governador exerceu o papel político-institucional articulado pela Secretaria de Desenvolvimento e pelo IFE, ao assinar como testemunha o protocolo de intenções.

A partir desse momento, a relação passou a ser basicamente universidade-empresa. A Secretaria de Desenvolvimento do Estado ressaltou a importância de sair de cena no momento oportuno, para o E 4, a não-participação ativa na parceria “é o preço pago pelo alto custo burocrático do envolvimento do governo, melhor se manter distante do que espantar as parcerias”.

A empresa: uma estratégia privada ou pública de atuação no Brasil?

A subsidiária do estaleiro instalada no estado faz parte do grupo cingapuriano com mais de 50 anos, que atualmente é líder global de soluções integradas para engenharia naval e oceânica e possui aproximadamente 30% do capital do Fundo Soberano Estatal. O grupo, por conseguinte, possui uma rede global composta de subsidiárias e demais unidades de negócios na China, Estados Unidos, Índia, Indonésia e Reino Unido. Com a implementação da subsidiária no Brasil, em 2010, o propósito do Grupo foi ampliar a sua participação no continente americano e tornar-se referência em construção de embarcações e estruturas de exploração de petróleo.

De acordo com Ordoñez (2014ORDOÑES, R. Após estaleiros, Cingapura quer investir em engenharia no Brasil. Jornal O Globo, Rio de Janeiro, Sept. 06, 2014. Available at: <Available at: http://oglobo.globo.com/economia/negocios/aposestaleiroscingapuraquerinvestiremengenharianobrasil13851316 >. Accessed on: Nov. 23, 2015.
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, p. 2), o interesse de Cingapura no desenvolvimento do setor de óleo e gás, especialmente na exploração e produção na camada pré-sal, não se restringe à construção naval, mas objetiva também incrementar a venda de equipamentos e materiais para o setor e “promover a entrada no país de empresas de engenharia para atender ao crescimento da demanda prevista para o pré-sal”. Mesmo diante dos efeitos diretos da crise no setor petrolífero, em específico o corte nos investimentos em sondas pré-sal, o estaleiro foi um dos poucos que seguiram operando e ampliando o seu portfólio de serviços e clientes, para além da construção de navios e sondas de perfuração.

Desse modo, o interesse da atuação no Brasil não é de um grupo empresarial, mas do governo de Cingapura. Tanto, que em paralelo às negociações iniciadas para a implementação de uma subsidiária no estado, ocorreu à expansão das relações bilaterais entre o Brasil e Cingapura. Embora as relações diplomáticas tenham iniciado no ano de 1967, somente a partir do ano 2000 a agenda bilateral ampliou o foco de atuação, antes restrita ao campo comercial, para “novas áreas, como construção naval, ciência e tecnologia, cooperação acadêmica e logística portuária e aeroportuária” (BRASIL, 2015a, p. 6). A estratégia de ampliação das relações bilaterais com o Brasil coaduna com uma visão de longo prazo de investimentos já realizados e a serem feitos no país pelo governo de Cingapura, por intermédio da agência do governo e das empresas as quais possui participação acionária.

Segundo o Ministério das Relações Exteriores, “Cingapura é hoje o quarto maior investidor asiático no Brasil, atrás de Japão, China e Coréia do Sul. No momento, existem 60 empresas cingapurianas operando no Brasil” (BRASIL, 2015a). O país detém uma das mais avançadas tecnologias em prospecção de petróleo em águas profundas. Além das subsidiárias e unidades de negócio no Brasil, o governo de Cingapura possui dois fundos soberanos e duas agências de prospecção de oportunidades de negócios, com escritórios em São Paulo.

Portanto, parece tratar-se de uma estratégia pública de investimentos, isto é, o governo de Cingapura possui um planejamento de atuação a longo-prazo no Brasil. Na verdade, a implementação de uma subsidiária do estaleiro no Brasil é uma das frentes do governo de Cingapura. O Programa de Cooperação Educacional, por sua vez, é uma forma de popular a subsidiária com profissionais capacitados e inseridos na cultura empresarial asiática.

A gente trouxe estrangeiros que trabalham com eles [trainees], gerentes, mas eles estão colados ali falando dessa transferência do que aprenderam e do que continuam aprendendo, porque é um processo de aprendizado. Em 14 meses não aprende tudo o que é preciso. Os trainees que se tornaram gerentes estão aqui, estão continuando. No futuro a gente quer que esses gerentes [cingapurianos] voltem para lá, até porque o visto deles é um visto de trabalho durante dois anos e que os [trainees] estão crescendo na empresa (E 12).

Eles tinham o conhecimento que faltava no Brasil, esse know-how no sentido tecnológico mesmo. Então foi uma visão da empresa de fazer a transferência desse know-how de Cingapura para o Brasil, porque eles sabem que custaria muito caro reaprender isto aqui. A curva de aprendizagem tem um tempo e tem um custo, então era mais rápido trazer via pessoal treinado esse know-how para o Brasil, treinando nos politécnicos que formam esse perfil deles lá, e com os estágios do pessoal daqui nos estaleiros lá (E 4).

A subsidiária do estaleiro, já em operação no estado, tem mantido o compromisso com a carteira de encomendas, apesar da grande depressão do preço do petróleo e da crise na Petrobrás. De acordo com o E 4, nas conversações com o presidente da subsidiária, ficou clara a posição do governo de Cingapura em relação a estratégia de investimentos no Brasil, ou seja,

Tem muita estratégia deles e não simplesmente fazer o que o governo daqui induzia ou queria. Ao contrário, eles tentaram ficar o mais longe possível do governo dentro das possibilidades que eles tinham de ficar equidistantes do governo. A minha visão é que eles queriam ter muita independência. Em relação a qualquer decisão de governo aqui, a qualquer tentativa de influência ou coisa parecida e que ao final e ao cabo parece que eles sabiam bem o que estavam fazendo.

Não obstante, a Subsidiária conta com o investimento direto do Grupo para financiar duas das sete sondas encomendadas e não possui, até então, financiamentos oriundos do FMM. Até o início de 2016, apesar da indústria naval perder mais de 12.000 postos de trabalhos, a Subsidiária apresentou o menor número de demissões do Sudeste. Ela tem mantido o ritmo de produção e o cronograma de entrega das sondas, mesmo que tenha sido reduzido face a crise, assim como tem preservado o investimento e as ações previstos no Programa de Cooperação Educacional. Além disso, desenvolveu outros projetos com o IFE - a Rede de Cooperação em Estudos, Extensão e Pesquisa sobre Ambientes Costeiros e marinhos (RECEPAC) e o projeto de pesquisa para o desenvolvimento de uma placa de ferro mais coerente para a construção de navios.

A universidade: empreendedorismo como modelo institucional?

Conforme já apontado anteriormente, coube à Secretaria de Desenvolvimento a intermediação dos contatos do grupo transnacional com as universidades do Estado. Embora as universidades tenham sido acionadas pela Secretaria de Desenvolvimento, a instituição que se predispôs de imediato a estabelecer uma parceria para a capacitação da força de trabalho foi o IFE. De acordo com o E 24:

A universidade federal nos recebeu bem, mas foi muito burocrática. O SENAI se prontificou, mas naquela gama de cursos que eles tinham. Quando a gente foi visitar o [IFE], eles já tinham desenhado mais ou menos o que seria a parceria porque esse instituto já possuía experiência em acordos de cooperação técnica para a transferência de conhecimento, nacionais e internacionais.

Essa experiência do IFE relaciona-se à longa trajetória de cooperação com o mercado, de relações estabelecidas com a indústria desde a década de 1970 (E 4). Esse contexto é concernente com o projeto de descentralização do desenvolvimento no Brasil, na mesma década. Nesta época, grandes empresas instalaram-se no país, ampliando a demanda de fabricação de peças, acessórios e a prestação de serviços desmontagem e manutenção industrial no segmento metalmecânico (VILLASCHI e LIMA, 2000VILLASCHI, A. F.; FELIPE, E. S. Políticas estaduais para arranjos produtivos locais no Espírito Santo: evolução e perspectivas. In: CAMPO, R. R. et al. (Orgs.). Políticas estaduais para arranjos produtivos locais no sul, sudeste e centro-oeste do Brasil. Rio de Janeiro: E-Papers, 2010. p. 257-288.).

Para o E 2, trata-se de uma “vocação” do Instituto, por possuir uma “essência extensionista”. Segundo o E 4, a missão do Instituto foi permeada por “essa visão de conectividade, de integração com a realidade do mundo das organizações, com o mundo do trabalho [...]. Isso nos levou a ser buscado pelas empresas para treinar os seus funcionários” e o transformou num vetor de desenvolvimento local.

A extensão é uma via importante para transpor “os muros da universidade e compreender o mundo do trabalho” (E 2). Além disso, a interiorização que ocorreu nas últimas três décadas permitiu à instituição conhecer e entender contextos e necessidades distintos, de acordo com as localidades do Estado. O fato de o Instituto ser organizado em uma estrutura multicampi, orientada para a interiorização, torna as suas fronteiras mais abertas do que as observadas em uma universidade tradicional. Conforme afirma o E 2, há “uma permeabilidade maior nas fronteiras e isto faz com que nós começamos a entender melhor o mundo do trabalho lá fora, as necessidades das empresas e as necessidades das comunidades”. Essa mudança de paradigma, segundo o E 4:

Foi para dentro da própria gestão, a visão empreendedora da gestão. Isso que vem a se configurar hoje como a visão da inovação, começa a se configurar como empreendedora. Não existe inovação sem empreendedorismo. E a própria instituição, o modelo do [Instituto] hoje, se a gente for caracterizar, o modelo institucional é de uma universidade empreendedora.

Essas ações podem ser consideradas um esforço de institucionalização do paradigma da universidade empreendedora, no IFE (ETZKOWITZ, 2013ETZKOWITZ, H. Anatomy of the entrepeneurial university. Social Science Information, v. 52, n. 3, p. 486-511, 2013.; RANGA e ETZKOWITZ, 2013RANGA, M.; ETZKOWITZ, H. Triple Helix systems: an analytical framework for innovation policy and practice in the knowledge society. Industry and Higher Education, v. 27, n. 4, p. 237-262, 2013. ). Para atuar nas frentes orientadas ao empreendedorismo, há uma pró-reitoria de extensão, composta de uma diretoria de relações empresariais e extensão comunitária, responsável pelas relações institucionais com o governo e com o mercado, e de uma diretoria de extensão tecnológica, a qual está vinculada a Agência de Inovação do Instituto.

Observou-se que este modelo institucional foi desenhado para as relações com o mercado, porém ainda se mostra deficiente, por atuar somente na esfera institucional e não se desdobrar em ações de gestão e acompanhamento das atividades empreendedoras. De acordo com os E 2, 4, 5 e 6, não existe na estrutura organizacional do IFE uma equipe operacional para apoiar a condução das atividades empreendedoras e de gestão das parcerias, convênios e acordos firmados. O E 4 admite:

Nós temos a diretoria de relações empresariais, por que tem essa coisa de saber com quem falar, em qual porta bater e com quem conversar? Não vou dizer que é muito bom e funciona. Que é uma maravilha, pois não é. Temos deficiências diversas, mas é mais fácil para a indústria ter essa aproximação com a gente por conta dessa história. No nosso modelo isso é extensão, isso é muito claro para nós.

As ações estão concentradas na pró-reitoria de Extensão e ocorrem de forma top-down no nível institucional que, por sua vez, não possui uma retaguarda com estrutura e corpo técnico que permitam, não somente, a gestão das atividades empreendedoras. Sobretudo, uma maior capilaridade e descentralização das demais ações. Essa abordagem no âmbito top-down, observada no Brasil e na América Latina, deve-se aos esforços de institucionalização do Sistema Nacional de Inovação, em parte, influenciado pelos pressupostos da Hélice Tríplice (DAGNINO, 2003DAGNINO, R. A relação universidade-empresa no Brasil e o argumento da hélice tripla. Revista Brasileira de Inovação, v. 2, n. 2, p. 267-307, 2003.; SUTZ, 2000SUTZ, J. The university - industry - government relations in Latin America. Research Policy, v. 29, p. 279-290, 2000.).

A Formação da Parceria: Eliminando as Fronteiras para a Colaboração

Ao analisar o papel de cada ator no Programa de Cooperação Educacional, foi possível seguir os passos que conduziram à concepção da relação U-E-G segundo a teoria da Hélice Tríplice. Ou seja, o caso estudado assemelha-se à configuração da Hélice Tríplice II (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.), também conhecida como modelo “laissez-faire”, no qual as fronteiras entre a Universidade, a Empresa e o Governo são bem definidas e geralmente há a necessidade da atuação de outros atores sociais para intermediar as interações entre ambos.

A rigidez dessas fronteiras tende a moderar a interação entre o IFE, o estaleiro e o governo do estado, o que implica: (1) no papel limitado do governo atendo-se basicamente à regulação e à intermediação; (2) na participação limitada da universidade na produção da inovação; e (3) no protagonismo da empresa na coordenação das ações do Programa sem obter expectativa de suporte das partes (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 1998ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The endless transition: a “triple helix” of university-industry-government relations. Minerva, v. 36, n. 3, p. 203-208, 1998., 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.; RANGA e ETZKOWITZ, 2013RANGA, M.; ETZKOWITZ, H. Triple Helix systems: an analytical framework for innovation policy and practice in the knowledge society. Industry and Higher Education, v. 27, n. 4, p. 237-262, 2013.).

Em um primeiro momento, o papel do IFE foi fornecer alunos altamente capacitados e professores para participar do Programa de Cooperação Educacional e, posteriormente, promover a transferência do conhecimento em tecnologia naval adquirido em Cingapura. No entanto, além formar alunos altamente qualificados (que seria um primeiro estágio de atividades empreendedoras), ao oferecer cursos de formação industrial com ênfase na área naval, o Instituto também está direcionando as suas ações para o paradigma empreendedor, conforme o espectro de atividades empreendedoras definido por Philpott, Dooley, O’Reilly et al. (2011PHILPOTT, K. et al. The entrepreneurial university: examining the underlying academic tensions. Technovation, v. 31, n. 4, p. 161-170, 2011.), posicionando-se entre as atividades hards e softs.

De acordo com Philpott, Dooley, O’Reilly et al. (2011PHILPOTT, K. et al. The entrepreneurial university: examining the underlying academic tensions. Technovation, v. 31, n. 4, p. 161-170, 2011.), a adoção de um modelo de universidade empreendedora pode ser ideal para universidades que operam em contextos tecnológicos específicos. Isso corrobora o contexto do IFE que, apesar de estar distribuído em 21 unidades pelo Estado, possui uma orientação tecnológica voltada para setor metalmecânico, o que facilita a gestão de conhecimento em direção à implantação de atividades mais hards, como a produção de patentes. Essas atividades demonstram que o IFE, além de formar profissionais, está desempenhando atividades que contribuem para o desenvolvimento social, econômico e tecnológico do país (IPIRANGA, FREITAS e PAIVA, 2010IPIRANGA, A. S. R.; FREITAS, A. A. F.; PAIVA, T. A. O empreendedorismo acadêmico no contexto da interação universidade - empresa - governo. Cadernos EBAPE.BR, v. 8, n. 4, p. 676-693, 2010.).

Posto isso, após situar a parceria no contexto histórico e social como preconizado por (ETZKOWITZ, 2003ETZKOWITZ, H. Studies of science etudes sur la science innovation in innovation : the triple helix of university ± industry ± government relations. Social Science Information, v. 42, n. 3, p. 293-337, 2003.), apresentando os respectivos papéis das instituições envolvidas na relação universidade-empresa-governo, foi possível delinear, na Figura 1, a configuração Hélice Tríplice, cujo Programa de Cooperação Educacional para a Transferência de tecnologia se enquadra. Tendo como referência o modelo proposto por Todeva (2013TODEVA, E. Governance of innovation and intermediation in triple helix interactions. Industry and higher education, v. 27, n. 4, p. 263-278, 2013.), o diagrama abaixo representa a configuração da Hélice Tríplice II da parceria estudada, ou seja, o modelo “laissez-faire” (ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.). Todeva (2013) amplia o modelo da Hélice Tríplice, ao explorar a conexão entre a produção da inovação nas universidades, a criação de riqueza no mercado e a liderança normativa e política do governo. A autora postula que a integração dos fatores de produção, de inovação e de controle normativo é viabilizada por intermediadores instituídos pelo governo ou pelo mercado.

Figura 1
Diagrama da Hélice Tríplice II - modelo “laissez-faire” da relação U-E-G

Os intermediadores podem atuar de forma direta ou indireta na distribuição de recursos, suporte ou controle dos processos de inovação (TODEVA, 2013TODEVA, E. Governance of innovation and intermediation in triple helix interactions. Industry and higher education, v. 27, n. 4, p. 263-278, 2013.). No Programa de Cooperação Educacional, as práticas de intermediação ficaram inicialmente a cargo da Secretaria de Desenvolvimento e da Secretaria de Meio Ambiente, sendo responsáveis pela regulação do licenciamento. A Secretaria de Tecnologia, Inovação e Trabalho atuou somente de forma institucional ao participar da assinatura do Memorando de Entendimento.

Por parte do IFE, a fundação foi responsável por intermediar o repasse dos recursos relativos à logística e a bolsa dos professores, pagas pelo estaleiro. De acordo com o E 4, “a empresa passa esse recurso para a nossa fundação e a gente contrata a bolsa com a fundação. O professor é bolsista da fundação, o dinheiro é da empresa mas o professor é bolsista da fundação para atender essas exigências da lei”. A Agência Governamental de Cingapura, por sua vez, foi responsável por intermediar o contato do grupo transnacional com o governo do estado e com o IFE. Importa saber também que o grupo transnacional possui 30% de participação do Fundo Soberano Estatal de Cingapura. Ressalta-se que o Instituto Politécnico Internacional, embora tenha assinado o Memorando de Entendimento como parte no Programa de Cooperação Educacional, é uma instituição privada, contratada pelo estaleiro, para prestar os serviços de teste de nivelamento em inglês, imersão em inglês técnico e os demais treinamentos voltados à construção naval.

Como pode ser observado na figura 1, o governo faz uso da liderança política para exercer os papéis de regulação e controle normativo (ETZKOWITZ, 2003ETZKOWITZ, H. Studies of science etudes sur la science innovation in innovation : the triple helix of university ± industry ± government relations. Social Science Information, v. 42, n. 3, p. 293-337, 2003.; ETZKOWITZ e LEYDESDORFF, 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.), enquanto os demais órgãos e agências atuam como intermediários institucionais e/ou financeiros junto ao mercado, nas práticas de intermediação e como canais de intermediação para a transferência de conhecimento e tecnologia junto à universidade (TODEVA, 2013TODEVA, E. Governance of innovation and intermediation in triple helix interactions. Industry and higher education, v. 27, n. 4, p. 263-278, 2013.). Dessa forma, a identificação de outros atores sociais que facilitaram a criação e execução do Programa, elucidou a leitura sobre a importância do papel intermediário do governo na relação, mesmo que, nesse caso, tenha sido aparentemente tão reduzido.

O governo do estado optou por uma participação indireta no Programa e focou na regulamentação governamental, o que para a literatura que postula a Hélice Tríplice deveria ser o “último recurso” (ETZKOWITZ, 2003ETZKOWITZ, H. Studies of science etudes sur la science innovation in innovation : the triple helix of university ± industry ± government relations. Social Science Information, v. 42, n. 3, p. 293-337, 2003., p. 306). Todavia, para Etzkowitz (2003ETZKOWITZ, H. Studies of science etudes sur la science innovation in innovation : the triple helix of university ± industry ± government relations. Social Science Information, v. 42, n. 3, p. 293-337, 2003.), o modelo “laissez-faire” não é liberal a ponto de desestimular a interação entre universidade-empresa-governo, mas como as fronteiras são fortes, essa inter-relação geralmente ocorre pela ação de um intermediário. A regulação, de certo modo, influenciou o desenvolvimento de competências da força de trabalho local no nível básico, por meio dos treinamentos orientados para a construção naval, um importante passo para a competitividade da indústria nacional e uma contribuição para o desenvolvimento econômico (PHILPOTT, DOOLEY, O’REILLY et al., 2011PHILPOTT, K. et al. The entrepreneurial university: examining the underlying academic tensions. Technovation, v. 31, n. 4, p. 161-170, 2011.).

Infere-se, pelo caso estudado, que parece haver um longo caminho a ser percorrido em direção ao ideal de sobreposição das inter-relações entre as esferas institucionais, de modo a ocorrer uma recursividade de ações que conduzam a um ambiente favorável à inovação na construção naval. O governo também atuou como articulador por meio de missão oficial do Governador à Cingapura e do acompanhamento dos representantes da Secretaria de Desenvolvimento em todas as tratativas iniciais, estimulando a formação da parceria para o Programa de Cooperação Educacional. Todavia, o programa se limita à transferência de conhecimento em tecnologia naval, não se trata da produção de novas tecnologias, que poderá ocorrer somente a longo prazo. Com efeito, o caso não reflete ainda a evolução tecno-científica presumida pela Hélice Tríplice. Embora seja possível identificar uma série de elementos da Hélice Tríplice intrínsecos na regulação e institucionalização pelo governo, pela universidade e até mesmo pelas iniciativas do estaleiro para a formação da parceria, a abordagem parece não alcançar as especificidades e a dimensão das questões históricas, sociais e econômicas locais (AMIR e NUGROHO, 2013AMIR, S.; NUGROHO, Y. Beyond the triple helix: framing STS in the developmental context. Bulletin of Science, Technology & Society, v. 33, n. 3-4, p. 115-126, 2013.; COOKE, 2005COOKE, P. Regionally asymmetric knowledge capabilities and open innovation: exploring “globalisation 2” - a new model of industry organisation. Research Policy, v. 34, n. 8, p. 1128-1149, 2005.).

Se o IFE passar a fornecer a transferência de conhecimento para o estaleiro, os recursos financeiros obtidos pelo pagamento dos treinamentos poderão, por exemplo, serem revertidos para a educação, como também possibilitarão novas atividades empreendedoras (PHILPOTT, DOOLEY, O’REILLY et al., 2011PHILPOTT, K. et al. The entrepreneurial university: examining the underlying academic tensions. Technovation, v. 31, n. 4, p. 161-170, 2011.). Essas novas frentes de trabalho podem impulsionar, mesmo que timidamente, o IFE a introduzir pontualmente na indústria naval possíveis inovações incrementais (CASTRO, 2011CASTRO, M. H. M. Universidade e inovação: configurações institucionais e terceira missão. Caderno CRH, v. 24, n. 63, p. 555-573, 2011.). Nesta seara, o IFE acredita que o relacionamento, a longo prazo, possibilitará a inovação incremental. O E 4 assegura que “a abordagem na inovação tecnológica está embarcada no processo, mas é uma perspectiva de longo prazo adquirir algumas capacidades dinâmicas de desenvolvimento de projeto, inovação tecnológica, com o tempo”. De fato, essa inovação incremental parece possível de ser alcançada a partir das novas parcerias como a continuidade do intercâmbio, o RECEPAC e o projeto de doutorado tendo como objeto de pesquisa o desenvolvimento de chapas de ferro voltadas as especificidades da construção naval.

Muito embora a literatura da Hélice Tríplice defenda a incorporação do contexto histórico e normativo (ETZKOWITZ, 2000ETZKOWITZ, H.; LEYDESDORFF, L. The dynamics of innovation: from national systems and “mode 2” to a triple helix of university-industry-government relations. Research Policy, v. 29, n. 2, p. 109-123, 2000.; RANGA e ETZKOWITZ, 2013RANGA, M.; ETZKOWITZ, H. Triple Helix systems: an analytical framework for innovation policy and practice in the knowledge society. Industry and Higher Education, v. 27, n. 4, p. 237-262, 2013.), a análise dessas dimensões são superficiais e tendem a não aprofundar a forma como as relações universidade-empresa-governo são socialmente construídas, bem como “o próprio conteúdo do conhecimento também são socialmente, culturalmente e politicamente formados e condicionados” (AMIR e NUGROHO, 2013AMIR, S.; NUGROHO, Y. Beyond the triple helix: framing STS in the developmental context. Bulletin of Science, Technology & Society, v. 33, n. 3-4, p. 115-126, 2013., p. 123). No Brasil, em específico, os estudos comumente centram-se nas barreiras e facilitadores da relação (FERREIRA, AMARAL e LEOPOLDI, 2013FERREIRA, A.; AMARAL, M.; LEOPOLDI, M. A. Análise da interação universidade-empresa sob a perspectiva do corpo docente: um estudo de caso em uma universidade pública. RACE Unoeste v. 12, n. 2, p. 677-708, 2013.; IPIRANGA, FREITAS e PAIVA, 2010IPIRANGA, A. S. R.; FREITAS, A. A. F.; PAIVA, T. A. O empreendedorismo acadêmico no contexto da interação universidade - empresa - governo. Cadernos EBAPE.BR, v. 8, n. 4, p. 676-693, 2010.; NOVELI e SEGATTO, 2012NOVELI, M.; SEGATTO, A. P. Processo de cooperação universidade empresa para a inovação tecnológica em um parque tecnológico: evidências empíricas e proposição de um modelo conceitual. Review of Administration and Innovation (RAI), v. 9, n. 1, p. 81-105, 2012.), mas não se atentam ao cerne das divergências existentes nas universidades e entre os atores sociais, para compreender quais são os obstáculos que dificultam as interações com o Estado, com o mercado e com a sociedade civil para promover a inovação e o desenvolvimento econômico e social.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo estabeleceu como objetivo analisar a configuração do modelo Hélice Tríplice na relação universidade-empresa-governo no Programa de Cooperação Educacional delineado e executado por meio da parceria estabelecida entre um IFE, uma subsidiária de um estaleiro com sede em Cingapura e o governo do estado. Para atender ao objetivo proposto foi necessário inicialmente situar no contexto histórico-social, não somente, o Programa de Cooperação Educacional, como também as instituições envolvidas na relação universidade-empresa-governo. Dessa forma, foi possível seguir o percurso que levou à formação da parceria para identificar a configuração Hélice Tríplice, a qual a relação, de acordo com o Programa estudado, se enquadra. Constatou-se que a interação universidade-empresa-governo se assemelha à configuração da Hélice Tríplice II, conhecida como modelo “laissez-faire”, na qual as fronteiras entre a universidade, a empresa e o governo são bem definidas e a relação tende a ser orientada pelo mercado.

Verificou-se que o papel do estado foi tão somente deliberar sobre a regulação e a mediação, que ficaram a cargo de outros órgãos, enquanto intermediadores da relação. Em contraste, o IFE demonstrou estar orientado aos pressupostos da Hélice Tríplice, tanto que o paradigma da Universidade Empreendedora foi institucionalizado pela gestão e uma série de atividades empreendedoras tem sido desenvolvida pelo IFE, além daquelas identificadas no caso analisado. O estaleiro, por conseguinte, protagonizou a relação ao atuar como o financiador do Programa e intermediador da relação entre o IFE e o Instituto Politécnico Internacional (em Cingapura) para celebrar o acordo de cooperação internacional.

Inferiu-se, pelo caso estudado, que parece haver um longo caminho a ser percorrido em direção ao ideal de sobreposição das inter-relações entre as esferas institucionais, de modo que venha a ocorrer uma recursividade de ações que conduzam a um ambiente favorável à inovação na construção naval. Ou seja, o caso analisado, não reflete ainda a evolução tecno-científica presumida pela Hélice Tríplice. Todavia, verificou-se que os pressupostos da NPM e da Hélice Tríplice influenciaram a orientação das políticas de Ciência e Tecnologia, voltadas à inovação, a abertura do mercado, à competitividade e a redução do orçamento nas universidades.

Essas pressões impulsionaram o IFE a institucionalizar algumas ações orientadas ao paradigma da Universidade Empreendedora. A mudança de paradigma, por conseguinte, revelou a coexistência paradoxal da chamada “marketização” do ensino, da postura empreendedora - porém, de certa forma, social e humanizada - dos docentes e gestores, preocupados com a transformação do sujeito e do entorno, e os conflitos de interesses inerentes às posições contraditórias dos acadêmicos e gestores, em relação ao modelo empreendedor. Percebeu-se que a gestão do IFE parece estar equacionando, de alguma forma, esses paradoxos, pois os resultados desvendam uma conjugação equilibrada das suas funções sociais. O IFE, atualmente, é referência nacional na educação e na formação de parcerias, em acordos de cooperação nacionais e internacionais para o desenvolvimento de atividades empreendedoras. A exemplo da continuidade do intercâmbio mesmo após o término de cooperação do RECEPAC, do projeto de doutorado tendo como objeto de pesquisa a inovação em placas de ferro para construção naval. Outros exemplos orientados à gestão da inovação tecnológica são as ações direcionadas à gestão do centro de inovação estadual em parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa em Inovação Industrial - EMBRAPII e o desenvolvimento de projetos de formação continuada, transferência de tecnologia e desenvolvimento de produtos e serviços em parceria com as indústrias locais e multinacionais.

Por fim, considerando a contribuição à pertinente temática e diante das possibilidades que interação entre a universidade, a empresa e o governo podem possibilitar alternativas para o desenvolvimento de pesquisa e desenvolvimento; é salutar promover essa discussão em tempos de recursos escassos e questões sociais, econômicas e ambientais cada vez mais complexas. Ademais, face às adversidades impostas ao ambiente universitário brasileiro na contemporaneidade, devido, em parte, às pressões do neoliberalismo enquanto paradigma econômico vigente, algumas questões são colocadas para reflexão, discussão e proposição para estudos futuros: se não somente há a institucionalização do modelo nos Sistemas de Inovação nacionais, mas se a implementação acordos de cooperação tem se expandido em termos territoriais para a promoção do desenvolvimento alcançando os países do eixo sul; se a comunidade acadêmica vem concentrando os seus esforços na perseguição de objetivos mais amplos para resolver problemas do mundo em desenvolvimento, a despeito somente da produção de lucros financeiros por meio de pesquisas aplicadas e produção de patentes (AMIR e NUGROHO, 2013AMIR, S.; NUGROHO, Y. Beyond the triple helix: framing STS in the developmental context. Bulletin of Science, Technology & Society, v. 33, n. 3-4, p. 115-126, 2013.); se a inclusão de novos atores sociais, como os das propostas das Quadrupla e Quíntupla Hélices têm possibilitado a implantação de um modelo mais horizontal e democrático nas nações, transbordando as limitadas fronteiras da institucionalização de forma top-down, conforme ocorreu em muitos países da América Latina, inclusive no Brasil (DAGNINO, 2003DAGNINO, R. A relação universidade-empresa no Brasil e o argumento da hélice tripla. Revista Brasileira de Inovação, v. 2, n. 2, p. 267-307, 2003., 2007DAGNINO, R. Ciência e Tecnologia no Brasil: O processo decisório e a comunidade de pesquisa. Campinas: Editora Unicamp, 2007.; SUTZ, 2000SUTZ, J. The university - industry - government relations in Latin America. Research Policy, v. 29, p. 279-290, 2000.). Finalmente, até que ponto poderemos iniciar o debate sobre o “Modo 3” de produção na América Latina e no Brasil, considerando que há um movimento de concentração da pesquisa e desenvolvimento nas matrizes das indústrias multinacionais e que as universidades ainda estão se posicionando entre o “Modo 1” e o “Modo 2” de produção em suas ilhas epistêmicas de ensino, pesquisa e extensão?

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  • O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Jan 2020
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2019

Histórico

  • Recebido
    30 Abr 2018
  • Aceito
    22 Out 2019
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