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Influências eurocêntricas no Sistema Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária: pesquisa histórica sob uma perspectiva decolonial

Influencias eurocéntricas en el Sistema Brasileño de Autorregulación Publicitaria: investigación histórica desde una perspectiva decolonial

Resumo

Este estudo tem por objetivo analisar, com base na perspectiva decolonial, processos históricos imperialistas que possibilitaram a incorporação de um modelo eurocêntrico de autorregulamentação na criação do Sistema Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, o SBAP. Para isso, foi realizada uma pesquisa histórica, calcada na óptica crítica em questão, utilizando dados secundários para analisar esse caso específico. A análise mostra que a incorporação de elementos estrangeiros ao sistema brasileiro ocorreu por meio, sobretudo, de três fatores: criação e internacionalização de modelo de autorregulamentação publicitária por meio de processos etnocêntricos e imperiais, formação do setor publicitário brasileiro de acordo com padrões internacionais, em especial estadunidenses, e influência de modelos e organizações internacionais em relação aos autores do SBAP. Mais do que uma discussão focada no poder de empresas sobre consumidores, espera-se que essa visão crítica gere mais conhecimento sobre as relações entre o Norte e o Sul globais, bem como de que maneira o controle imperial se materializa em consumerismo. Processos históricos coloniais e etnocêntricos limitam formas de pensar distintas à lógica neoliberal de defesa do consumidor por meio de livres mercados, ajudando, assim, a manter o domínio eurocêntrico sobre o conhecimento.

Palavras-chave:
Consumerismo; Publicidade; Autorregulamentação; Decolonialismo

Resumen

Este estudio tiene como objetivo analizar, desde una perspectiva decolonial, los procesos históricos imperialistas que hicieron posible la incorporación del modelo de autorregulación eurocéntrico en la creación del Sistema Brasileño de Autorregulación Publicitaria, SBAP. Para ello, se llevó a cabo una investigación histórica, basada en la perspectiva crítica en cuestión, utilizando datos secundarios para analizar este caso específico. El análisis muestra que la incorporación de elementos extranjeros al sistema brasileño se produjo principalmente a través de tres factores: la creación e internacionalización de un modelo de autorregulación publicitaria a través de procesos etnocéntricos e imperiales; la formación del sector publicitario brasileño de acuerdo con los estándares internacionales, especialmente los estadounidenses; y la influencia de modelos y organizaciones internacionales con relación a los autores del SBAP. Más que una discusión centrada en el poder de las empresas sobre los consumidores, se espera que esta visión crítica genere más conocimiento sobre las relaciones entre el Norte Global y el Sur Global y sobre cómo se materializa el control imperial en el consumerismo. Los procesos históricos coloniales y etnocéntricos limitan las formas de pensar distintas de la lógica neoliberal de la protección del consumidor a través de los mercados libres, lo que ayuda a mantener el dominio eurocéntrico sobre el conocimiento.

Palabras clave:
Consumerismo; Publicidad; Autorregulación; Decolonialismo

Abstract

This study aims to analyze, from a decolonial perspective, imperialist historical processes that made possible the incorporation of the Eurocentric self-regulation model adopted in the creation of the Brazilian Advertising Self-Regulation System, SBAP. Ahistorical research was carried out, based on the critical perspective, using secondary data to analyze this specific case. The analysis shows that the incorporation of foreign elements into the Brazilian system occurred mainly through three factors: the creation and internationalization of a model of advertising self-regulation through ethnocentric and imperial processes; the formation of Brazilian advertising sector according to international standards, especially US standards; and the influence of international models and organizations in relation to SBAP authors. In addition to the discussion focused on the power of companies over consumers, this critical view is expected to generate more knowledge about the relations between the Global North and the Global South and how imperial control materializes in consumerism. Colonial and ethnocentric historical processes limit ways of thinking distinct from the neoliberal logic of consumer protection through free markets, thus helping to maintain Eurocentric dominance over knowledge.

Keywords:
Consumerism; Advertising; Self-regulation; Decolonialism

INTRODUÇÃO

De acordo com autores de tradições mais mainstream, consumerismo é um termo usado para representar ondas de movimentos sociais e políticos em defesa de consumidores que inicialmente ocorreram nos Estados Unidos (GLICKMAN, 2009GLICKMAN, L. B. Buying Power: A History of Consumer Activism in America. Chicago/Londres: The University of Chicago Press, 2009.; HILTON, 2008HILTON, M. The Death of a Consumer Society. Transactions of the Royal Historical Society. Cambridge, v. 18, p. 3, Dec. 2008.; ROTFELD, 2010ROTFELD, H. J. Confusions, contexts, and foundations for understanding advertising regulation as related to the research of Jean J. Boddewyn. International Studies of Management & Organization, v. 40, n. 4, p. 94-103, 2010-2011.). O movimento consumerista, como é compreendido hoje, começou em países do Norte durante a Revolução Industrial (HILTON, 2007b) e acabou por universalizar o entendimento e o consumo pela lógica dessas nações (LANDER, 2005LANDER, E. Ciências Sociais: saberes coloniais e eurocêntricos. In: LANDER, E. (Org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Buenos Aires: Clacso, 2005. p. 21-53.). Junto com o consumerismo, surgiram as primeiras entidades de defesa das corporações, que construíram, em suas narrativas, missões de defesa do consumidor, como a Câmara de Comércio Internacional (ICC) (KELLY, 2005KELLY, D. The International Chamber of Commerce. New Political Economy, v. 10, n. 2, p. 259-271, 2005.) e a Associação Internacional de Publicidade (IAA) (ROTFELD, 2011ROTFELD, H. J. Confusions, contexts, and foundations for understanding advertising regulation as related to the research of Jean J. Boddewyn. International Studies of Management & Organization, v. 40, n. 4, p. 94-103, 2010-2011.), ambas formadas por nações do Norte, por membros elitistas desses países, e impondo seus princípios e modelos etnocêntricos a outras partes do mundo (TOMASHOT, 2015TOMASHOT, S. R. Selling Peace: The History of the International Chamber of Commerce, 1919-1925. 2015. Tese (Doutorado em Filosofia). Georgia State University, Atlanta, 2015.; ROTFELD, 2011ROTFELD, H. J. Confusions, contexts, and foundations for understanding advertising regulation as related to the research of Jean J. Boddewyn. International Studies of Management & Organization, v. 40, n. 4, p. 94-103, 2010-2011.).

A consolidação do movimento consumerista, que surgiu com o discurso de que seu objetivo seria proteger consumidores contra abusos empresariais (HILTON, 2009HILTON, M. Prosperity for All: Consumer Activism in an Era of Globalization. Ithaca: Cornell University Press, 2009.), teve o momento de auge após o fim da Segunda Guerra Mundial, quando o mundo eurocêntrico deparou com a ameaça soviética ao seu domínio global, em especial durante a Guerra Fria (GRANDIN, 2010GRANDIN, G. Empire’s Workshop: Latin America, The United States, and the Rise of the New Imperialism. Nova Iorque: Metropolitan Books, 2010.). O objetivo era utilizar consumerismo como ferramenta de convencimento dos “aliados”, especialmente os do Terceiro Mundo, para mostrar quão avançadas eram as economias e as sociedades que adotavam práticas consumeristas-capitalistas, em comparação com seus pares que seguiam o “atrasado” regime comunista (DURAND, 2008DURAND, J. C. G. Formação do campo publicitário brasileiro (1930-1970). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa , 2008.; HILTON, 2009HILTON, M. Prosperity for All: Consumer Activism in an Era of Globalization. Ithaca: Cornell University Press, 2009.). Esse quadro foi reforçado à medida que proliferavam associações de consumidores nos Estados Unidos e na Europa, que também expandiram seus ideais consumeristas-capitalistas a outras regiões não capitalistas (COHEN, 2003COHEN, L. A consumer’s republic: the politics of mass consumption in postwar America. New York: Alfred A. Knopf, 2003.).

Ações que buscavam maior regulamentação para a proteção do consumidor, entretanto, sofreram reações dentro dos Estados Unidos e da Europa, em meio a questionamentos quanto à eficiência de regulamentação estatal (HILTON, 2009HILTON, M. Prosperity for All: Consumer Activism in an Era of Globalization. Ithaca: Cornell University Press, 2009.). A partir dos anos 1970, ideais neoliberais se consolidaram no Norte global, prometendo crescimento para todos - e, consequentemente, proteção a consumidores - por meio de livres mercados (HARVEY, 2011HARVEY, D. A brief history of neoliberalism. Nova Iorque: Oxford University, 2011.). Alinhando-se a tais interesses, organizações consumeristas e corporativistas passaram, então, a ter agendas neoliberais (HILTON, 2008HILTON, M. Social activism in an age of consumption: the organized consumer movement. Social History, Londres, v. 32, n. 2, p. 121-143, 2007.), com a consequente elaboração de normas com conteúdo que garantissem maior liberdade possível de atuação do empresariado (DURAND, 2003DURAND, J. C. G. Formação e internacionalização da sociedade de consumo norte-americana (1870-1930). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa, 2003. e 2008DURAND, J. C. G. Formação do campo publicitário brasileiro (1930-1970). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa , 2008.).

Esse quadro neoliberal criou espaço para o tema de autorregulamentação vir à tona, sobretudo no setor publicitário, que se tornou o assunto da vez entre acadêmicos de marketing (ROTFELD, 2011ROTFELD, H. J. Confusions, contexts, and foundations for understanding advertising regulation as related to the research of Jean J. Boddewyn. International Studies of Management & Organization, v. 40, n. 4, p. 94-103, 2010-2011.). Em contexto favorável à discussão de autorregulamentação, o código de autorregulamentação publicitária criado em 1937 pela ICC - organização criada logo após o fim da Primeira Guerra Mundial, com o objetivo de defender empresas (KELLY, 2005KELLY, D. The International Chamber of Commerce. New Political Economy, v. 10, n. 2, p. 259-271, 2005.) - passa a ser divulgado e implementado internacionalmente (ICC, 2020INTERNATIONAL CHAMBER OF COMMERCE - ICC. Advertising and Marketing Communications Code. 2020. Disponível em: <Disponível em: https://iccwbo.org/publication/icc-advertising-and-marketing-communications-code/ >. Acesso em: 10 jul. 2020.
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).

Os sistemas baseados no modelo da ICC englobam um código de autorregulamentação e um órgão responsável por aplicá-lo (PASQUALOTTO e CAUDURO, 2016PASQUALOTTO, A. S.; CAUDURO, L. K., Sistemas de autorregulamentação da publicidade: um quadro comparativo entre países. Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, Porto Alegre, v. 35, n. esp., p. 207-230, dez. 2016.). Dessa forma, a ICC é a criadora do código que influenciaria diretamente o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (CBAP) (CONAR, 1978CONSELHO NACIONAL DE AUTORREGULAMENTAÇÃO PUBLICITÁRIA - CONAR. Código Nacional de Autorregulamentação Publicitária. Código e Anexos, 1978. Disponível em: <Disponível em: http://www.conar.org.br/codigo/codigo.php >. Acesso em: 10 jul. 2020.
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), o qual seria a base para a atuação do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária, o Conar (SCHNEIDER, 2005). Por outro lado, foi a IAA a responsável pela disseminação do sistema de autorregulamentação ao redor do mundo (ROTFELD, 2011ROTFELD, H. J. Confusions, contexts, and foundations for understanding advertising regulation as related to the research of Jean J. Boddewyn. International Studies of Management & Organization, v. 40, n. 4, p. 94-103, 2010-2011.; IAA, 2020aINTERNATIONAL ADVERTISING ASSOCIATION - IAA. Our History. 2020a. Disponível em:<Disponível em:https://iaaglobal.org/uploads/general/History.pdf >. Acesso em:10 jul. 2020.
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), inclusive no Brasil (CONAR, 2020CONSELHO NACIONAL DE AUTORREGULAMENTAÇÃO PUBLICITÁRIA - CONAR. Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. 2020. Disponível em:<Disponível em:http://www.conar.org.br/ >. Acesso em: 10 jul. 2020.
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). A IAA tem como uma de suas missões a defesa do setor publicitário internacional (IAA 2020bINTERNATIONAL ADVERTISING ASSOCIATION - IAA. Join the most influential Global Marcom Network. 2020b. Disponível em:<Disponível em:https://www.iaaglobal.org/ >. Acesso em: 10 jul. 2020.
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).

No Brasil, o tema de consumerismo aflorou nos anos 1970, tanto por influência externa de organizações e ativistas estrangeiros (CAVALCANTI, 2008CAVALCANTI, A. R. Congressos Brasileiros de Publicidade I, II e III: Versão Compilada. 2008. Disponível em:<Disponível em:http://www.abapnacional.com.br/images/publicacoes/123_congressos.pdf >. Acesso em:10 jul. 2020.
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) quanto, internamente, por conta do desenvolvimento da indústria de bens de consumo no país (DURAND, 2008DURAND, J. C. G. Formação do campo publicitário brasileiro (1930-1970). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa , 2008.). Nesse período, observou-se o aumento de discussões de temas relacionados à proteção do consumidor em jornais, congressos (ZULZKE, 1997ZULZKE, M. L. Abrindo a empresa para o consumidor: a importância de um canal de atendimento. 4. ed. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1997.) e até no Congresso Nacional. As temáticas e as discussões foram pautadas e incentivadas pelos movimentos consumeristas estadunidenses liderados por Ralph Nader (JOVENS, 1970JOVENS JOVENS denunciam poluidores do ar. Folha de S. Paulo, São Paulo, 18 de maio1970, ano XLIX, n. 14.946, p. 16, Primeiro Caderno.), um dos principais ativistas da época, que geraram uma reação negativa de alguns neoliberais brasileiros (BETING, 1971BETING, J. A culpa de todos. Folha de S. Paulo, São Paulo, 18 jul. 1971, ano LI, n. 15.372, p. 24, Seção Terceiro Caderno.), que se referiam a consumerismo como um “mal a ser evitado” (CONSUMERISMO, 1974CONSUMERISMO CONSUMERISMO: um mal a ser evitado. Folha de S. Paulo, São Paulo, 28 ago. 1974, ano LIV, n. 16.605, p. 31, Seção Nova Mulher.). Tal reação é semelhante àquela observada nos Estados Unidos pelos conservadores da New Right (GLICKMAN, 2009GLICKMAN, L. B. Buying Power: A History of Consumer Activism in America. Chicago/Londres: The University of Chicago Press, 2009.).

No contexto internacional, o Brasil era um país fundamental a ser alinhado aos ideais capitalistas de livre mercado, pois poderia servir como modelo a outros da região, num momento marcado pela presença de regimes políticos latino-americanos com inclinações esquerdistas (TOTA, 2000TOTA, A. P. O imperialismo sedutor: a americanização na época da Segunda Guerra. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.; CAVALCANTI e ACALDIPANI, 2016CAVALCANTI, M. F. R.; ALCADIPANI, R. International Development in the Brazilian Context in the 1950s and 1960s: A postcolonial reading of Guerreiro Ramos. Caderno EBAPE.BR, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 12-23, jan./mar.2016.). Para garantir tal êxito, foi feito um apelo específico ao setor publicitário brasileiro durante o 25º Congresso Mundial da IAA, realizado em Buenos Aires, em 1976, com o intuito de incentivar a criação de seu próprio sistema de autorregulamentação publicitária (DOMINGUES, 1978DOMINGUES, C. 1978[Carta] 30 mar. 1978, São Paulo [para] ALONSO, Geraldo, São Paulo. 3f. Exposição de Motivos do relator da Comissão Interassociativa.). O sistema também deveria abranger um órgão que aplicasse o código - no caso brasileiro, o Conar (PASQUALOTTO e CAUDURO, 2016PASQUALOTTO, A. S.; CAUDURO, L. K., Sistemas de autorregulamentação da publicidade: um quadro comparativo entre países. Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, Porto Alegre, v. 35, n. esp., p. 207-230, dez. 2016.).

Estimulados pelos incentivos da IAA e do governo militar, um grupo formado por representantes de entidades publicitárias foi reunido para redigir o código brasileiro, o CBAP (CORRÊA, 1990CORRÊA, P. Da auto-regulamentação publicitária: lineamentos de sua introdução no Brasil. In: BRANCO, R. C.; MARTENSEN, R. L.; REIS, F. (Orgs.). História da Propaganda no Brasil. São Paulo: T. A. Queiroz Editor, 1990. p. 45-54.). O SBAP, sistema brasileiro que engloba o CBAP e a Conar, seria aprovado no III Congresso Brasileiro de Propaganda, em abril de 1978 (AUTORREGULAMENTAÇÃO, 1978AUTORREGULAMENTAÇÃO AUTORREGULAMENTAÇÃO dos publicitários é aprovada. Folha de S. Paulo, São Paulo, 21 abr. 1978, ano 57, n. 17.915, p. 22, Seção Economia.). O secretário-geral da IAA à época fez um discurso em comemoração à aprovação do CBAP, explicando que a recomendação feita ao Brasil serviu de pressão não apenas ao setor privado, como também às autoridades brasileiras (CAVALCANTI, 2008CAVALCANTI, A. R. Congressos Brasileiros de Publicidade I, II e III: Versão Compilada. 2008. Disponível em:<Disponível em:http://www.abapnacional.com.br/images/publicacoes/123_congressos.pdf >. Acesso em:10 jul. 2020.
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). Meses depois, a IAA apresentaria o CBAP no congresso de Copenhague como modelo a ser seguido pelos países que ainda não haviam adotado o sistema (DOMINGUES, 1990DOMINGUES, C. Disciplinar a ética na publicidade não é tarefa fácil. In: BRANCO, R. C.; MARTENSEN, R. L; REIS, F. (Orgs.). História da Propaganda no Brasil. São Paulo: T. A. Queiroz Editor , 1990. p. 39-44.).

A literatura mainstream de marketing pouco discute tais questões geopolíticas relacionadas ao consumerismo. Em geral, a área se restringe a historicamente debater o movimento consumerista por uma óptica que coloca consumidores e empresas numa disputa assimétrica de poder, cabendo a governos interferir nessa relação, a fim de torná-la menos hierarquicamente distorcida (KOTLER, 1972KOTLER, P. What Consumerism means for marketers. Harvard Business Review, v. 50, n. 3, p. 48-57, 1972.). Ao ignorar os aspectos aqui discutidos, o marketing deixa de considerar que consumerismo pode ser interpretado como uma forma de colonialismo por meio da qual o Norte global busca manter controle sobre o Sul (ESCOBAR, 2004ESCOBAR, A. Beyond the Third World: imperial globality, global coloniality and anti-globalization social movements. Third World Quaterly, v. 25, n. 1, p. 207-230, 2004.). No caso específico do Brasil, os efeitos desse processo criaram uma “modernização superficial em que os problemas herdados pelo colonialismo ainda estão presentes na sociedade brasileira” (ROSA e ALCADIPANI, 2013ROSA, A. R.; ALCADIPANI, R. A terceira margem do rio dos estudos críticos sobre administração e organizações no Brasil: (re)pensando a crítica a partir do pós-colonialismo. Revista Administração Mackenzie, São Paulo, v.14, n. 6, p. 185-215, nov./dez. 2013.).

O presente estudo se alinha a tal visão crítica com o objetivo de analisar, sob a perspectiva decolonial, processos históricos imperialistas que possibilitaram a incorporação de modelo eurocêntrico de autocontrole na criação do sistema brasileiros de autorregulamentação, formado pelo CBAP e pelo Conar. A fim de compreender os processos imperialistas que deram origem ao SBAP, a pesquisa também analisou, como objetivos específicos, os processos imperialistas de criação e internacionalização de um modelo supostamente “universal” de autorregulamentação publicitária, apresentando uma breve história de formação da publicidade brasileira, que se deu pelas bases etnocêntricas e coloniais.

A adoção de uma perspectiva decolonial para analisar esse caso em particular busca contribuir com um novo olhar a respeito dos motivos para a adoção de padrões eurocêntricos dentro da realidade nacional (CAVALCANTI e ACALDIPANI, 2016CAVALCANTI, M. F. R.; ALCADIPANI, R. International Development in the Brazilian Context in the 1950s and 1960s: A postcolonial reading of Guerreiro Ramos. Caderno EBAPE.BR, Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 12-23, jan./mar.2016.). Mais do que uma discussão focada no poder de empresas sobre consumidores, espera-se que essa visão crítica gere mais conhecimento sobre as relações entre o Norte e o Sul globais, bem como de que maneira o controle colonial se materializa em consumerismo (QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Rio de Janeiro: Clacso, 2005. p. 227-278. (Coleção Sur Sur).).

O restante do artigo é dividido em outras quatro seções. A próxima apresenta brevemente a perspectiva decolonial, em especial as colonialidades do poder, do saber e do ser. A terceira apresenta as escolhas metodológicas do estudo. Na quarta, é feita a análise, na qual são expostas as principais influências de entidades e modelos estrangeiros, em geral liderados pelos Estados Unidos, no desenvolvimento do SBAP. Por fim, na quinta seção, são tecidas as considerações finais.

ESCLARECENDO O DARK SIDE DA MODERNIDADE: COLONIALIDADE DO PODER, DO SABER E DO SER

A perspectiva decolonial defende que, desde 1492, o mundo eurocêntrico vem expandindo a modernidade como forma de desenvolver o resto do mundo e trazê-lo ao padrão do Norte global. Todavia, ao expandir tais ideais, a modernidade carrega consigo outra faceta, um dark side chamado de “colonialidade”, que avança numa “práxis irracional de violência” (DUSSEL, 2000DUSSEL, E. Europe, Modernity, and Eurocentrism. Nepantla: Views from the South, v. 1, n. 3, p. 465-477, 2000.) como justificativa para a imposição de um tipo de desenvolvimento que historicamente não tem ajudado povos colonizados a saírem do estado de “atraso” a eles atribuído (MIGNOLO, 2011MIGNOLO, W. The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press, 2011.).

A modernidade/colonialidade é feita de forma a criar uma dicotomia entre colonizadores e colonizados (CASTRO-GÓMEZ, 2008CASTRO-GÓMEZ, S. (Post)Coloniality for Dummies: Latin American Perspectives on Modernity, Coloniality, and the Geopolitics of Knowledge. In: MORAÑA, M.; DUSSEL, E.; JÁUREQUI, C. A. (Orgs.). Coloniality at Large: Latin America and the Postcolonial Debate. Durham/Londres: Duke University Press, 2008. p. 259-285.). Por serem culturalmente superiores - considerando a perspectiva eurocêntrica -, os colonizadores, em tese, têm o direto de colonizar povos “inferiores” (DUSSEL, 1993DUSSEL, E. Eurocentrism and Modernity: Introduction to the Frankfurt Lectures. The Post Modern Debate in Latin America, Boundary 2, v. 20, n. 3, p. 65-76, 1993.). Assim, classificam povos inteiros por raças, diferenciando-os entre os evoluídos (do Norte) e os selvagens (do Sul), criando um racismo que define como superior o colonizador (MALDONADO-TORRES, 2018MALDONADO-TORRES, N. Analítica da colonialidade e da decolonialidade: algumas dimensões básicas. In: BERNARDINO-COSTA, J.; MALDONADO-TORRES, N.; GROSFOGUEL, R. (Orgs.). Decolonialidade e pensamento afrodiaspórico. Belo Horizonte: Autêntica, 2018.). Ao colonizado, portanto, somente resta seguir um pensamento linear imposto por seus colonizadores, mas que a ele pouco faz sentido (MIGNOLO e WALSH, 2018MIGNOLO, W.; WALSH, C. On Decoloniality: Concepts, Analytics, Praxis. Durham: Duke University Press, 2018.).

Tal imposição permite que o conhecimento seja expandido globalmente como se fosse universal (CASTRO-GOMÉZ, 2017CASTRO-GÓMEZ, S. ¿Qué hacer con los universalismos occidentales? Revista Ideação, n. 25, p. 39-76, 2017.), transformando o saber em algo superficial e falsamente homogêneo (MALDONADO-TORRES, 2019MALDONADO-TORRES, N. Ethnic studies as decolonial transdisciplinarity. Ethnic Studies Review, 42, n. 2, p. 232-244, 2019.), o que piorou quando a modernidade eurocêntrica passou a aplicar as supostas leis da natureza às leis da sociedade, mais complexas (SANTOS, 2009SANTOS, B. S. Um discurso sobre as ciências. 6. ed.São Paulo: Cortez, 2009.). Todavia, conhecimento eurocêntrico não é universal; está localizado no Norte global e é imposto ao resto do mundo como a única forma de pensamento válido, a fim de minguar quaisquer tentativas de surgimento de conhecimento local que fujam às ideologizações eurocêntricas (MIGNOLO, 2009MIGNOLO, W. Epistemic Disobedience, Independent Thought and Decolonial Freedom. Theory, Culture & Society, v. 26, n. 7-8, p. 159-181, 2009.).

A modernidade, como modelo neutro e universalizável, não passa de um mito; é, em sua origem, uma justificativa que busca a legitimidade de violência e genocídio (DUSSEL, 1993DUSSEL, E. Eurocentrism and Modernity: Introduction to the Frankfurt Lectures. The Post Modern Debate in Latin America, Boundary 2, v. 20, n. 3, p. 65-76, 1993.). Quando o papel central das relações entre os espaços na ascensão do mundo moderno é ignorado, a experiência colonial e o ser colonizado são excluídos da discussão. O colonizado se torna, por consequência, um produto da colonialidade do poder, do saber e do ser (MALDONADO-TORRES, 2008MALDONADO-TORRES, N. A topologia do Ser e a geopolítica do conhecimento: modernidade, império e colonialidade. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 80, 2008.).

Na lógica da colonialidade do poder, o colonizador impõe sua ideia de desenvolvimento e progresso ao colonizado, por meio de dicotomias ideológicas que distinguem racialmente o colonizador, visto como civilizado e avançado, do colonizado, visto como selvagem e atrasado (QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Rio de Janeiro: Clacso, 2005. p. 227-278. (Coleção Sur Sur).). O colonizador, assim, se justifica como legitimado para se impor perante o colonizado por ser mais avançado, civilizado e dotado de conhecimento científico (CASTRO-GÓMEZ, 2005CASTRO-GÓMEZ, S. ¿Qué hacer con los universalismos occidentales? Revista Ideação, n. 25, p. 39-76, 2017.).

Na colonialidade do saber, o Norte global universaliza conhecimento local como se fosse verdade neutra e superior (LANDER, 2005LANDER, E. Ciências Sociais: saberes coloniais e eurocêntricos. In: LANDER, E. (Org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Buenos Aires: Clacso, 2005. p. 21-53.). Para que o Sul consiga alcançar o desenvolvimento e o progresso, precisaria adotar modelos de conhecimento do Norte (DUSSEL, 2019DUSSEL, E. Pedagogics of Liberation: A Latin American Philosophy of Education. Santa Barbara: Punctum Books, 2019.) por meio da perda da identidade local, com reidentificação de acordo com as necessidades do Norte (MIGNOLO, 2018MIGNOLO, W.; WALSH, C. On Decoloniality: Concepts, Analytics, Praxis. Durham: Duke University Press, 2018.). O valor do colonizado se dá à medida que mimetiza o colonizador (QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Rio de Janeiro: Clacso, 2005. p. 227-278. (Coleção Sur Sur).).

Por último, a colonialidade do ser se deu com o mito da classificação racial, a partir da qual houve hierarquização dos povos. Criou-se, com uma colonialidade disfarçada, a inferioridade dos povos das Américas, por serem menos racionais e maduros que os europeus (MIGNOLO, 2011MIGNOLO, W. The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press, 2011.). Nessa lógica, a raça do colonizador é considerada “naturalmente” superior à do colonizado, e tal mito da modernidade, no capitalismo mundial, se traduz na classificação racial do trabalho (QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Rio de Janeiro: Clacso, 2005. p. 227-278. (Coleção Sur Sur).).

Hoje em dia, os Estados Unidos têm sido o principal idealizador da modernidade, substituindo ingleses, franceses e alemães, que outrora ocuparam tal posição (MIGNOLO, 2011MIGNOLO, W. The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press, 2011.), trazendo colonialidade sobretudo à América Latina. Em meio à americanização do colonizado durante a Guerra Fria, o latino-americano perdeu suas raízes, deixando de ter direito até de se chamar “americano” (GALEANO, 2016GALEANO, E. As veias abertas da América Latina. Porto Alegre: L&PM, 2016., p. 18). Para os Estados Unidos, era importante garantir a qualquer custo que a América, inclusive a do Sul e a Central, não fosse dominada pelo inimigo comunista, o que significava usar sua influência sobre a região para evitar o avanço de governos de inclinação de esquerda (TOTA, 2000TOTA, A. P. O imperialismo sedutor: a americanização na época da Segunda Guerra. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.). Tal pressão sobre a América Latina resultou no alinhamento dos países - e também outros do Terceiro Mundo - aos interesses capitalistas estadunidenses (ESCOBAR, 2004ESCOBAR, A. Beyond the Third World: imperial globality, global coloniality and anti-globalization social movements. Third World Quaterly, v. 25, n. 1, p. 207-230, 2004.).

Em reposta a tamanhos retrocessos, autores decoloniais têm defendido um afastamento do mundo eurocêntrico, num movimento chamado delinking (MIGNOLO, 2007MIGNOLO, W. The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press, 2011.), como única forma de emancipação local, já que, como explicam Abdalla e Faria (2017ABDALLA, M.; FARIA, A. Em defesa da opção decolonial em administração/gestão. Caderno EBAPE.BR, Rio de Janeiro, v. 15, n. 4, out./dez. 2017.), “a hipermodernidade informa não a emancipação sem limites, mas o acirramento do quadro de pobreza e de desigualdade em diversos campos, incluindo a administração/gestão”.

METODOLOGIA

De maneira a alcançar o objetivo do estudo, foi realizada uma pesquisa histórica utilizando uma perspectiva decolonial. A opção decolonial prescreve o desvendamento de um lado colonial a determinados fenômenos ignorados e subalternizados pela modernidade (MIGNOLO, 2011MIGNOLO, W. The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press, 2011.). Ao desenvolver tal tipo de pesquisa, buscou-se contar uma história “alternativa” da criação do Sistema de Autorregulamentação Publicitária, mostrando como influências eurocêntricas se materializaram durante esse processo, com objetivos de manutenção do controle do Norte sobre o Sul global (HEMAIS, 2019HEMAIS, M.; FARIA, A. Highlighting the Darker Side of Liberal Internationalism for a Counter-Colonizing Consumerism. Latin American Business Review, v. 19, n. 3-4, p. 349-373, 2018.).

Questiona-se, dessa forma, a legitimidade na aplicação de modelos criados pelo Norte (e em seu interesse) ao Sul, que tem as próprias necessidades e particularidades, com base na análise crítica da construção histórica e colonizadora da superioridade ocidental e da história consumerista oficial (FARIA e HEMAIS, 2018FARIA, A.; HEMAIS, M., Historicizando o Novo Consumerismo Global Sob uma Perspectiva de Mundos Emergentes. Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro, v. 22, n. 4, p. 577-599, 2018.). A perspectiva decolonialista se adequa ao presente trabalho por seu projeto intrínseco de criticar - e resistir - ao modelo ocidental de poder, ser e saber (PRASAD, 2015PRASAD, A. Crafting Qualitative Research: Working in the Postpositivist Traditions. Nova Iorque: Routledge, 2015.). Conforme defendem Abdalla e Faria (2017ABDALLA, M.; FARIA, A. Em defesa da opção decolonial em administração/gestão. Caderno EBAPE.BR, Rio de Janeiro, v. 15, n. 4, out./dez. 2017.): “Em resposta a um quadro duradouro de assimetria e injustiça no campo de administração/gestão, sustentado pela radicalização da universalização do conhecimento euro-estadunidense e correspondente subalternização de saberes do resto do mundo, analisamos a posição marginal e o potencial da perspectiva decolonial no Brasil”.

Prasad (2015PRASAD, A. Crafting Qualitative Research: Working in the Postpositivist Traditions. Nova Iorque: Routledge, 2015.) defende a adoção de metodologias pós-positivistas para pesquisas qualitativas, porém reconhece o desafio de desenvolver trabalhos de alta qualidade fora das tradições positivistas. Por outro lado, a autora explica que a aplicação de metodologias não positivistas enriquece o campo da pesquisa qualitativa, de forma que expõe ambiguidades, tensões e interconexões de debates relevantes (PRASAD, 2015PRASAD, A. Crafting Qualitative Research: Working in the Postpositivist Traditions. Nova Iorque: Routledge, 2015.).

A pesquisa contou com dados secundários para desvendar essa história alternativa, originários de diferentes fontes. Tais dados foram coletados dos anais do III Congresso Brasileiro de Publicidade; de livros e artigos sobre a história da publicidade brasileira e da autorregulamentação; de matérias jornalísticas sobre fatos e eventos relevantes relacionados ao tema estudado; de documentos encontrados no Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC), da Fundação Getulio Vargas (FGV), que continham entrevistas e depoimentos de figuras-chave no setor publicitário do período estudado; e de artigos escritos pelos principais responsáveis pela formação do sistema brasileiro de autorregulamentação publicitária. O Quadroabaixo descreve, resumidamente, os principais documentos adotados no artigo:

Quadro 1
Principais documentos

A análise dos dados coletados ocorreu em duas etapas. De início, foram organizados cronologicamente, seguindo recomendações de Savitt (1980SAVITT, R. Historical research in marketing. Journal of Marketing, v. 44, n. 4, p. 52-58, 1980.), Golder (2000GOLDER, P. Historical method in marketing research with new evidence on long-term market share stability. Journal of Marketing Research, v. 37, n. 2, p. 156-172, 2000.) e Witkowski e Jones (2006WITKOWSKI, T.; JONES, B. Qualitative historical research in marketing. In: BELK, R. (Ed.). Handbook of Qualitative Research Methods in Marketing. Edward Elgar: Cheltenham, 2006.), assim como de acordo com temas-chave, como ICC e IAA, consumerismo no Brasil, formação do campo publicitário brasileiro e desenvolvimento do SBAP, incluindo CBAP e Conar. Para cada tema, levou-se em consideração: história oficial de marketing, contexto geopolítico da época e perspectiva decolonial originária da América Latina. Esse tipo de organização possibilitou reunir um cronograma de eventos e contextos relacionados às principais entidades e figuras-chave envolvidas na criação do SBAP e como eles ajudaram a moldar a influência eurocêntrica sobre o sistema de autorregulamentação brasileiro. Além disso, o desenvolvimento dessa cronologia permitiu estabelecer se estavam faltando informações relevantes à história alternativa sendo contada e, consequentemente, quais informações seriam necessárias buscar para preencher possíveis lacunas temporais (SAVITT, 1980SAVITT, R. Historical research in marketing. Journal of Marketing, v. 44, n. 4, p. 52-58, 1980.; GOLDER, 2000GOLDER, P. Historical method in marketing research with new evidence on long-term market share stability. Journal of Marketing Research, v. 37, n. 2, p. 156-172, 2000.).

Na segunda etapa da análise, os dados foram analisados e interpretados. Durante esse processo, as informações foram comparadas, a fim de encontrar semelhanças e diferenças entre os dados. Embora a análise fosse de natureza descritiva, a interpretação focou em desvendar aspectos esquecidos da história em análise, com o objetivo de mostrar como ocorreu o processo pós-colonial.

O IMPERIALISMO SEDUTOR: A INFLUÊNCIA EUROCÊNTRICA NO SISTEMA DE AUTORREGULAMENTAÇÃO DO BRASIL

A base normativa do CBAP, o código de autorregulamentação brasileiro, somada ao Conar, forma o SBAP, o sistema de autorregulamentação brasileiro (ROCHA, 2012ROCHA, R. H. M. da, Modelos de regulamentação: reflexões para um eficiente controle jurídico da publicidade no Brasil. Direito & Justiça, Porto Alegre, v. 38, n. 2, p. 200-212, jul./dez. 2012.). Em primeiro lugar, é relevante compreender a origem e os motivos - econômicos e geopolíticos (TOMASHOT, 2015TOMASHOT, S. R. Selling Peace: The History of the International Chamber of Commerce, 1919-1925. 2015. Tese (Doutorado em Filosofia). Georgia State University, Atlanta, 2015.) - que levaram à criação de um modelo de autorregulamentação publicitária e como esse modelo foi internacionalizado (IAA, 2020a, 2020c). O segundo tema a ser estudado nesta análise é focado na extensão da participação e da influência de entidades estrangeiras no setor publicitário brasileiro ao longo da história (RAMOS, 1985RAMOS, R. Do reclame à comunicação: pequena história da propaganda no Brasil. 3. ed. São Paulo: Atual, 1985.). Por último, será estudada a criação do SBAP, com foco em suas influências etnocêntricas, explicitando eventos-chave que ocorreram em especial entre os anos de 1976 e 1980.

A Colonialidade do Poder: ICC, IAA e a Autorregulamentação Publicitária

A industrialização transformou a natureza das empresas, que se tornaram grandes corporações, e também do trabalho, que deixou de ser rural e passou a ser urbana, criando uma classe proletária (LANDER, 2005LANDER, E. Ciências Sociais: saberes coloniais e eurocêntricos. In: LANDER, E. (Org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Buenos Aires: Clacso, 2005. p. 21-53.). A mão de obra assalariada seria fundamental para garantir a expansão do mercado de consumo de massa (FURTADO, 1973FURTADO, C. A. Hegemonia dos Estados Unidos e o subdesenvolvimento da América Latina. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1973.). Foi nesse contexto de crescimento da indústria, por um lado, e da busca de seu controle pelo Estado, por outro, que a ICC nasceu. Ao analisar atas, discursos e procedimentos das reuniões nas quais foi definida e organizada a fundação da ICC, em particular as que ocorreram em 1919 e 1920, percebe-se um discurso colonialista, eurocêntrico e racista (TOMASHOT, 2015TOMASHOT, S. R. Selling Peace: The History of the International Chamber of Commerce, 1919-1925. 2015. Tese (Doutorado em Filosofia). Georgia State University, Atlanta, 2015.). A entidade, usando o poder das poucas nações do Norte que a compunham para se legitimar universalmente, quis impor a “ideia de raça como instrumento de dominação” (QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Rio de Janeiro: Clacso, 2005. p. 227-278. (Coleção Sur Sur)., p. 269).

Desde o início, a entidade defende a ideia de que o progresso da humanidade parte do comércio das nações “avançadas”, “civilizadas” (FAHEY, 1920FAHEY, J. H. Response by Mr. John H. Fahey. In: INTERNATIONAL CHAMBER OF COMMERCE. Organization Meeting of the International Chamber of Commerce: Paris, France June 23 to 30, 1920. Paris: International Chamber of Commerce, 1920. p. 19-21., p. 21). Desenvolve-se, dessa forma, uma estrutura de poder homogênea e eurocêntrica, reiterando a colonialidade de dominação e exploração entre povos brancos e não brancos (QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Rio de Janeiro: Clacso, 2005. p. 227-278. (Coleção Sur Sur).). A lógica do consumo de massa, essencial às corporações do Norte global, é dependente da lógica colonialista, a qual, por sua vez, depende da consolidação da ideia de que as nações do Norte, superiores e proprietárias da verdade universal, são as salvadoras que levarão progresso ao Sul, selvagem e irracional (DURAND, 2003DURAND, J. C. G. Formação e internacionalização da sociedade de consumo norte-americana (1870-1930). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa, 2003.; MIGNOLO, 2011MIGNOLO, W. The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press, 2011.).

Uma “verdade universal” criada pelo discurso oficial dos empresários é a de que o grande empecilho da prosperidade mundial é a quantidade de leis que lhes é imposta pelas suas respectivas nações (FAHEY, 1921FAHEY, J. H. The International Chamber of Commerce. The Annals of the American Academy of Political and Social Science. The International Trade Situation, v. 94, p. 126-130, mar. 1921.). A mentalidade de desregulamentação do setor privado se fortaleceu durante o período entre guerras, quando a ICC desenvolveu seu código de autorregulamentação publicitária de 1937 (ABOUT, 2019ABOUT ABOUT us: ICC and the Code. Codescentre for Advertising and Marketing. Disponível em:<Disponível em:https://www.codescentre.com/about-us/ >. Acesso em:10 jul. 2020.
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). Nas palavras da instituição, “os fundadores da ICC agiram com a convicção de que o setor privado está mais bem qualificado para definir padrões globais para os negócios” (ICC, 2020a, tradução nossa).

A expansão de adoção do código de 1937 se deu graças à parceria entre a ICC e a IAA (CELEBRATING, 2020CELEBRATING CELEBRATING 80 years of the ICC Marketing Code. New York: USCIB, 2017. Disponível em: <Disponível em: https://www.uscib.org/celebrating-80-years-of-the-icc-marketing-code/ >. Acesso em: 10 jul. 2020.
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), que guardam semelhanças uma com a outra. Seu discurso oficial alega se tratar de uma associação global, com milhares de membros em dezenas de países (JONES, 2000JONES, J. P. (Ed.). Advertising Organizations and Publications: A Resource Guide. Thousand Oaks: Sage Publications, 2000.). No entanto, sua criação contou com participação restritiva e ocorreu num clube exclusivo de Nova Iorque, o Harvard Club, na presença de doze executivos (IAA, 2020dINTERNATIONAL ADVERTISING ASSOCIATION - IAA. For the Record. 2020d. Disponível em: <Disponível em: https://iaaglobal.org/ uploads/general/Past-WPs-Chairmen-Con-and-ConferencesUPDATED_180906_164142.pdf >. Acesso em: 10 jul. 2020.
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).

A defesa do modelo de autorregulamentação é uma das grandes prioridades da IAA (JONES, 2000JONES, J. P. (Ed.). Advertising Organizations and Publications: A Resource Guide. Thousand Oaks: Sage Publications, 2000.). O sistema de autorregulamentação publicitária se explica pelo receio de intervenção estatal, visto como ameaça de empresas no mercado concorrencial (ROCHA, 2012ROCHA, R. H. M. da, Modelos de regulamentação: reflexões para um eficiente controle jurídico da publicidade no Brasil. Direito & Justiça, Porto Alegre, v. 38, n. 2, p. 200-212, jul./dez. 2012.). A fim de legitimar o movimento neoliberal, ele recebe uma roupagem de ciência neutra, silenciando discussões relevantes, como proteção de interesses coletivos, econômicos, culturais e sociais. Mascara-se o interesse de lucro das corporações com evidências pretensamente científicas e discursos tecnocráticos, com argumentos positivistas que privilegiam conhecimentos do Norte global (RAMSAY, 1992RAMSAY, I. O controle da publicidade em um mundo pós-moderno. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, v. 4, n. esp., p. 26-41, 1992.), fortalecendo a missão estadunidense de internacionalizar sua visão econômica de mundo, focada no neoliberalismo (GRANDIN, 2010GRANDIN, G. Empire’s Workshop: Latin America, The United States, and the Rise of the New Imperialism. Nova Iorque: Metropolitan Books, 2010.).

A defesa da universalidade desse modelo máscara os interesses de nações e entidades que o internacionalizaram. Tal valorização do endógeno é elemento constituinte de um movimento colonizador mais amplo, em que historicamente o Norte impõe ao Sul suas premissas socioeconômicas por interesses geopolíticos, com a justificativa de que está proporcionando modernidade à região, mesmo que, em conjunto, também imponha a colonialidade e sua violência (MIGNOLO, 2011MIGNOLO, W. The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press, 2011.).

Na primeira metade dos anos 1970, Ralph Nader, um dos maiores consumeristas estadunidenses da época, passou a criticar duramente a atuação das multinacionais do Norte em relação à sua atuação no Sul em geral, particularmente na América Latina (RALPH, 1973RALPH RALPH Nader critica as multinacionais. Folha de S. Paulo, 14 set.1973, ano LIII, n. 16.158, p. 25, Seção Economia., p. 25). Todavia, os chamados “direitos internacionais” dos consumidores respondiam aos anseios de consumidores do Norte. A corrente neoliberal afirma que o consumo é indispensável ao progresso e à democracia. Mascara-se a face geopolítica desse discurso e o fato de que a democracia que ele defende se aplica a homens brancos e colonizadores do Norte (DURAND, 2003DURAND, J. C. G. Formação e internacionalização da sociedade de consumo norte-americana (1870-1930). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa, 2003.; GRANDIN, 2010GRANDIN, G. Empire’s Workshop: Latin America, The United States, and the Rise of the New Imperialism. Nova Iorque: Metropolitan Books, 2010.).

À medida que movimentos consumeristas, semelhantes àqueles que ocorriam nos Estados Unidos, passaram a ganhar protagonismo na mídia latino-americana (RALPH, 1973RALPH RALPH Nader critica as multinacionais. Folha de S. Paulo, 14 set.1973, ano LIII, n. 16.158, p. 25, Seção Economia.) e agências de publicidade estadunidenses se consolidavam na região (DURAND, 2003DURAND, J. C. G. Formação e internacionalização da sociedade de consumo norte-americana (1870-1930). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa, 2003.), a IAA intensificou sua atuação na América Latina (IAA, 2020aINTERNATIONAL ADVERTISING ASSOCIATION - IAA. Our History. 2020a. Disponível em:<Disponível em:https://iaaglobal.org/uploads/general/History.pdf >. Acesso em:10 jul. 2020.
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, 2020cINTERNATIONAL ADVERTISING ASSOCIATION - IAA. Advertising Self-Regulation, the New ICC Marketing Code, and the IAA. 2020c. Disponível em:<Disponível em:https://iaaglobal.org/leadership/advertising-self-regulation-the-new-icc-marketing-code-and-the-iaa >. Acesso em:10 jul. 2020.
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). Em 1976, realizaria seu Congresso Mundial em Buenos Aires, em resposta aos movimentos consumeristas que estavam em evidência na região, fazendo convite à guerra contra os ativistas consumeristas e a regulamentação estatal (O MUNDO, 1976MIGNOLO, W. The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press, 2011.). Os esforços da IAA na região latino-americana ao longo dos anos 1970 renderam frutos. Entre os anos 1970 e 1980, foram criados seis conselhos, câmaras e comissões de autorregulamentação publicitária na América do Sul, além de México e El Salvador, nos moldes importados pela ICC e pela IAA (CONAR, 2020CONSELHO NACIONAL DE AUTORREGULAMENTAÇÃO PUBLICITÁRIA - CONAR. Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária. 2020. Disponível em:<Disponível em:http://www.conar.org.br/ >. Acesso em: 10 jul. 2020.
http://www.conar.org.br/...
).

O modelo de autorregulamentação, de fundamento neoliberal, advoga pela defesa da liberdade de expressão para os publicitários e da liberdade de escolha para os consumidores (JONES, 2000JONES, J. P. (Ed.). Advertising Organizations and Publications: A Resource Guide. Thousand Oaks: Sage Publications, 2000.), com foco na expansão do consumo de massa de produtos e serviços do Norte global. Conforme explicam Hemais e Faria (2018HEMAIS, M.; FARIA, A. Highlighting the Darker Side of Liberal Internationalism for a Counter-Colonizing Consumerism. Latin American Business Review, v. 19, n. 3-4, p. 349-373, 2018., p. 360, tradução nossa), “o consumo de massa deve ser incentivado globalmente, e o American way of life é o padrão de vida desejado por todos. Ao expandir esse modelo consumista por todo o mundo, os Estados Unidos dificultaram a criação de outro tipo de desenvolvimento por meio do consumo e da proteção do consumidor, enunciados no Terceiro Mundo”.

As Colonialidades do Saber e do Ser: a Formação da Publicidade Brasileira

A história da propaganda no Brasil é influenciada por modelos estrangeiros bem antes da criação do SBAP, caminhando de mãos dadas com a chegada de marcas e modelos comerciais internacionais, em especial dos Estados Unidos, a partir do início do século XX (OBERLAENDER, 1984). A importação de conhecimento eurocêntrico de propaganda foi essencial para a construção das práticas da propaganda brasileira (COELHO, 2005COELHO, E. E. Edeson Ernesto Coelho (depoimento, 2004). Rio de Janeiro: CPDOC, Associação Brasileira de Propaganda, Souza Cruz, 2005.), além de moldar os maiores publicitários do Brasil (RAMOS, 1985RAMOS, R. Do reclame à comunicação: pequena história da propaganda no Brasil. 3. ed. São Paulo: Atual, 1985.). Diversos desses publicitários se tornariam, posteriormente, figuras-chave para a criação do SBAP (DUAILIBI, 2005DUAILIBI, R. Roberto Duailibi (depoimento, 2004). Rio de Janeiro, CPDOC, Associação Brasileira de Propaganda, Souza Cruz, 2005.).

A exportação da publicidade e do marketing estadunidense ocorreu em decorrência da previsão de saturação do mercado, o que levou diversas corporações estadunidenses, junto com as agências publicitárias que trabalhavam para elas, a se internacionalizar (DURAND, 2008DURAND, J. C. G. Formação do campo publicitário brasileiro (1930-1970). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa , 2008.). Por meio da inferiorização dos conhecimentos locais e da imposição de novas identidades e paradigmas do Norte global (ESCOBAR, 2004ESCOBAR, A. Beyond the Third World: imperial globality, global coloniality and anti-globalization social movements. Third World Quaterly, v. 25, n. 1, p. 207-230, 2004.), houve uma valorização dos profissionais estrangeiros de publicidade, levando à importação de “talentos” caros, com a finalidade de treinar equipes nacionais das agências estadunidenses no Brasil (SIMÕES, 2006SIMÕES, R. A propaganda no Brasil: evolução histórica. São Paulo: ESPM, 2006.). Alguns publicitários, como Sarmento (1990SARMENTO, A. M. As agências estrangeiras trouxeram modernidade, as nacionais aprenderam depressa. In: BRANCO, R. C.; MARTENSEN, R. L.; REIS, F. (Org.). História da Propaganda no Brasil. São Paulo: T. A. Queiroz Editor , 1990. p. 20-24.), defendem que o know-how estadunidense foi indispensável para o “progresso” da publicidade no país.

Nesse período, sobretudo durante a Segunda Guerra Mundial, reforçou-se o americanismo como paradigma na região, com a idealização do American Way of Life (COELHO, 2005COELHO, E. E. Edeson Ernesto Coelho (depoimento, 2004). Rio de Janeiro: CPDOC, Associação Brasileira de Propaganda, Souza Cruz, 2005.), como forma de mitigar a influência germânica presente no Brasil, em especial no sul do país. Empresas estadunidenses também foram incentivadas a fazer propagandas com um apelo de apoio aos Aliados (TOTA, 2000TOTA, A. P. O imperialismo sedutor: a americanização na época da Segunda Guerra. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.). O período foi igualmente marcado pela instalação no Brasil de diversas corporações norte-americanas, como a Coca-Cola (SIMÕES, 2006SIMÕES, R. A propaganda no Brasil: evolução histórica. São Paulo: ESPM, 2006.). Durante essa época, com incentivos do governo estadunidense, empresas desse país aumentaram os anúncios de seus produtos na América Latina de tal forma que se tornaram responsáveis pela maior parte da receita dos periódicos publicados no Brasil (DURAND, 2008DURAND, J. C. G. Formação do campo publicitário brasileiro (1930-1970). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa , 2008.).

Com o avanço da Guerra Fria, cimentou-se a bipolarização ideológica do mundo (GRANDIN, 2010GRANDIN, G. Empire’s Workshop: Latin America, The United States, and the Rise of the New Imperialism. Nova Iorque: Metropolitan Books, 2010.). O Brasil se aliou ao Bloco Ocidental, com predominância da geopolítica estadunidense (HEMAIS e FARIA, 2018HEMAIS, M.; FARIA, A. Highlighting the Darker Side of Liberal Internationalism for a Counter-Colonizing Consumerism. Latin American Business Review, v. 19, n. 3-4, p. 349-373, 2018.). Nessa época, a propaganda foi verdadeiramente massificada, tornando-se uma máquina usada para formar opiniões e controlar a informação. As maiores agências de publicidade eram multinacionais, que trabalhavam para empresas igualmente estrangeiras e geravam conteúdos descolados da realidade brasileira (OBERLAENDER, 1984). Muros entre o Ocidente e o resto do mundo eram cada vez maiores, e os Estados Unidos se sentiram legitimados para realizar uma nova caça às bruxas, sob o discurso de países malévolos (MALDONADO-TORRES, 2008MALDONADO-TORRES, N. A topologia do Ser e a geopolítica do conhecimento: modernidade, império e colonialidade. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 80, 2008.) - nesse caso, representados pelos comunistas (TOTA, 2000TOTA, A. P. O imperialismo sedutor: a americanização na época da Segunda Guerra. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.).

As agências de capital nacional só cresceriam a partir da ditadura civil-militar (SIMÕES, 2006SIMÕES, R. A propaganda no Brasil: evolução histórica. São Paulo: ESPM, 2006.). Entretanto, a mentalidade eurocêntrica já fazia parte dos profissionais do setor. De acordo com o publicitário Celso Japiassu, da Denilson, nessa época era difícil identificar a nacionalidade de uma agência pelo nome, pois era prática comum darem nomes em inglês a agências publicitárias com capital cem por cento brasileiro. Publicitários queriam evitar que soubessem de sua origem nacional; temiam ser considerados incompetentes, incapacitados ou amadores para os clientes, em sua maioria multinacionais do Norte, uma vez que “a empresa [...] de origem estrangeira tinha um profundo desprezo pelos nativos e suas manifestações”.

Criou-se, portanto, um setor “montado num inglês tropicalizado” (JAPIASSU, 1973JAPIASSU, C. A criatividade de sabor tropical. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 01 dez. 1973, ano LXXXIII, n. 237, p. 4, Caderno B.), fortalecendo a ideia de superioridade do Norte e de inferioridade do Sul (MIGNOLO, 2011MIGNOLO, W. The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press, 2011.). A classificação racional eurocêntrica entre os evoluídos (europeus) e os selvagens (não europeus) é, no fim, uma classificação racial e, em seu núcleo, racista, estabelecida por aqueles que se colocaram no patamar superior (QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Rio de Janeiro: Clacso, 2005. p. 227-278. (Coleção Sur Sur).).

Ao longo da formação da publicidade brasileira, que ocorreu principalmente entre os anos 1910 e 1970 (DURAND, 2008DURAND, J. C. G. Formação do campo publicitário brasileiro (1930-1970). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa , 2008.), houve enaltecimento do modelo estadunidense, em detrimento da produção local. A consequência disso é que todo o modelo brasileiro de propaganda “é americano nas regras, na formação, no desenvolvimento, na grandeza, na história, na cronologia, na antecedência. [...] A contribuição hispânica é praticamente nenhuma” (COELHO, 2005COELHO, E. E. Edeson Ernesto Coelho (depoimento, 2004). Rio de Janeiro: CPDOC, Associação Brasileira de Propaganda, Souza Cruz, 2005.). A marginalização de conhecimento do chamado Terceiro Mundo decorre de um processo que padronizou de forma universal o capitalismo colonial moderno e hierarquizou o poder mundial de acordo com a classificação racial (QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Rio de Janeiro: Clacso, 2005. p. 227-278. (Coleção Sur Sur).).

O SBAP como Produto “Natural” de Colonialidades

Com a missão específica de criar o sistema de autorregulamentação publicitária do Brasil, a Comissão Interassociativa da Publicidade Brasileira foi criada em 1977 (CORRÊA, 1990CORRÊA, P. Da auto-regulamentação publicitária: lineamentos de sua introdução no Brasil. In: BRANCO, R. C.; MARTENSEN, R. L.; REIS, F. (Orgs.). História da Propaganda no Brasil. São Paulo: T. A. Queiroz Editor, 1990. p. 45-54.). O código usado como base para o CBAP foi o primeiro modelo de autorregulamentação publicitária nos moldes modernos, o código da ICC de 1937 (CORRÊA, 1990DURAND, J. C. G. Formação e internacionalização da sociedade de consumo norte-americana (1870-1930). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa, 2003.). Modelos hegemônicos foram criados para atender a desejos e necessidades de europeus brancos (ESCOBAR, 2004ESCOBAR, A. Beyond the Third World: imperial globality, global coloniality and anti-globalization social movements. Third World Quaterly, v. 25, n. 1, p. 207-230, 2004.), transformados em sinônimo de superioridade de conhecimento e de sociedade mais avançada (QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Rio de Janeiro: Clacso, 2005. p. 227-278. (Coleção Sur Sur).).

O anteprojeto do CBAP escrito pela Comissão Interassociativa foi redigido por Mauro Salles e Caio Domingues (DOMINGUES, 1978DOMINGUES, C. 1978[Carta] 30 mar. 1978, São Paulo [para] ALONSO, Geraldo, São Paulo. 3f. Exposição de Motivos do relator da Comissão Interassociativa.). Desde o início, os relatores buscaram incorporar o conhecimento adquirido com códigos adotados em outros países (CAVALCANTI, 2008CAVALCANTI, A. R. Congressos Brasileiros de Publicidade I, II e III: Versão Compilada. 2008. Disponível em:<Disponível em:http://www.abapnacional.com.br/images/publicacoes/123_congressos.pdf >. Acesso em:10 jul. 2020.
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). A questão central aqui é que a aplicação do modelo etnocêntrico de autorregulamentação publicitária a realidades do Sul global gera uma tensão contínua entre a formulação de modelos originados de um local e aplicados ao redor do mundo e a necessidade de respeitar culturas e realidades locais (BROHMAN, 1995BROHMAN, J. Universalism, eurocentrism, and ideological bias in development studies: from modernization to neoliberalism. Third World Quaterly, v. 16, n. 1, p. 121-140, 1995.). Em outras palavras, no lugar de uma pretensa verdade neutra e absoluta, há uma representação hegemônica do mundo pelo prisma do Norte (ESCOBAR, 2004ESCOBAR, A. Beyond the Third World: imperial globality, global coloniality and anti-globalization social movements. Third World Quaterly, v. 25, n. 1, p. 207-230, 2004.). De um lado, há o Norte mantendo seu controle sobre o Sul por meio de mecanismos socioeconômicos; de outro, o colonizado que segue à risca o modelo do colonizador por ter sido taxado historicamente de atrasado (MIGNOLO, 2011MIGNOLO, W. The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press, 2011.).

A comissão reuniu publicitários brasileiros influentes da época, entre eles Renato Castelo Branco, Geraldo Alonso, Luiz Macedo, Carlos Alberto do Carmo, Roberto Duailibi, José Alcântara Machado e Oriovaldo Vargas Löfler (CORRÊA, 2005DUAILIBI, R. Roberto Duailibi (depoimento, 2004). Rio de Janeiro, CPDOC, Associação Brasileira de Propaganda, Souza Cruz, 2005.). Cabe ressaltar a formação da mentalidade estadunidense dos membros dessa comissão ao longo de suas carreiras (RAMOS, 1985RAMOS, R. Do reclame à comunicação: pequena história da propaganda no Brasil. 3. ed. São Paulo: Atual, 1985.).

Caio Domingues, por exemplo, é descrito como “americano demais” para alguns (COELHO, 2005COELHO, E. E. Edeson Ernesto Coelho (depoimento, 2004). Rio de Janeiro: CPDOC, Associação Brasileira de Propaganda, Souza Cruz, 2005.) e foi formado na agência de publicidade estadunidense J.W. Thompson (RAMOS, 1972RAMOS, R. História da propaganda no Brasil. São Paulo: Universidade de São Paulo - Escola de Comunicações e Artes, 1972.). Situação semelhante é a de Renato Castelo Branco, que trabalhou com famosos nomes da publicidade na Ayer (SIMÕES, 2006SIMÕES, R. A propaganda no Brasil: evolução histórica. São Paulo: ESPM, 2006.), os quais foram, por sua vez, introduzidos aos modelos da propaganda estadunidense no famoso departamento de publicidade da GM, desde o início do século XX (REIS, 1990REIS, F. São Paulo e Rio: a longa caminhada. In: BRANCO, R.; MARTENSEN, R. L.; REIS, F. (orgs.) História da propaganda no Brasil. São Paulo: T. A. Queiroz Editor , 1990. p. 1-6.). Outros participantes da comissão interassociativa também iniciaram suas carreiras no meio publicitário em agências estadunidenses, que serviram como escolas. Foi o caso de Petrônio Corrêa (2005CORRÊA, P. Petrônio Corrêa (depoimento, 2004). Rio de Janeiro: CPDOC, Associação Brasileira de Propaganda, Souza Cruz , 2005.) e Luiz Macedo (2005MACEDO, L. V. G. Luiz Macedo (depoimento, 2004). Rio de Janeiro, CPDOC, Associação Brasileira de Propaganda, Souza Cruz , 2005.), que trabalharam juntos na Grant Advertising, entre os anos 1940 e 1950.

A colonialidade do ser começa pela classificação mundial da raça. Tal mito da modernidade, no capitalismo mundial, se traduz na classificação racial do trabalho. Assim, o bom publicitário é o publicitário “americanizado”, formado pelos padrões estadunidenses de conhecimento (QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Rio de Janeiro: Clacso, 2005. p. 227-278. (Coleção Sur Sur).; DURAND, 2008DURAND, J. C. G. Formação do campo publicitário brasileiro (1930-1970). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa , 2008.). A mimetização, em especial de técnicas estadunidenses ao longo de décadas, auxiliou a naturalização de importação de modelos estrangeiros, sem levar em conta as necessidades locais, priorizando interesses geopolíticos neoliberais, com base em políticas imperialistas mascaradas pelo discurso de progresso (CASTRO-GÓMEZ, 2005CASTRO-GÓMEZ, S. ¿Qué hacer con los universalismos occidentales? Revista Ideação, n. 25, p. 39-76, 2017.).

O código redigido pela comissão interassociativa foi apresentado no III Congresso Brasileiro de Propaganda (CORRÊA, 1990CORRÊA, P. Da auto-regulamentação publicitária: lineamentos de sua introdução no Brasil. In: BRANCO, R. C.; MARTENSEN, R. L.; REIS, F. (Orgs.). História da Propaganda no Brasil. São Paulo: T. A. Queiroz Editor, 1990. p. 45-54.), que contou com diversos participantes internacionais e teve como um de seus apoiadores oficiais a IAA (CAVALCANTI, 2008CAVALCANTI, A. R. Congressos Brasileiros de Publicidade I, II e III: Versão Compilada. 2008. Disponível em:<Disponível em:http://www.abapnacional.com.br/images/publicacoes/123_congressos.pdf >. Acesso em:10 jul. 2020.
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). O código brasileiro também foi submetido ao 26º Congresso Mundial da IAA (DOMINGUES, 1990DOMINGUES, C. 1978[Carta] 30 mar. 1978, São Paulo [para] ALONSO, Geraldo, São Paulo. 3f. Exposição de Motivos do relator da Comissão Interassociativa.), que ocorreu apenas um mês após o evento brasileiro (IAA, 2020d). O código foi aprovado no congresso mundial, e a IAA o recomendou a países participantes que ainda não haviam implementado os próprios sistemas de autorregulamentação (DOMINGUES, 1990DOMINGUES, C. Disciplinar a ética na publicidade não é tarefa fácil. In: BRANCO, R. C.; MARTENSEN, R. L; REIS, F. (Orgs.). História da Propaganda no Brasil. São Paulo: T. A. Queiroz Editor , 1990. p. 39-44.).

A forte influência de entidades internacionais e estrangeirismos pode ser observada também no considerando do CBAP, em que se verifica as principais fontes usadas para seu desenvolvimento.

Considerando:

[...]

- as recomendações das Câmaras de Comércio Internacionais (ICC - International Chamber of Commerce) e as diretrizes do Código Internacional da Prática Publicitária, editado originalmente em 1937 e revisto em 1949, 1955 e 1966 e, finalmente, em 1973 durante o Congresso realizado no Rio de Janeiro e cujos termos foram adotados pelo Brasil e 250 entidades de mais de 40 países;

- as diretrizes da Associação Internacional de Propaganda (IAA - International Advertising Association) e seus Congressos Mundiais, especialmente as que constam de seu estudo “Effective Advertising Self Regulation”, publicado em 1974, e as recomendações do XXV Congresso Mundial de Propaganda realizado em Buenos Aires em 1976 (CONAR, 1978CONSELHO NACIONAL DE AUTORREGULAMENTAÇÃO PUBLICITÁRIA - CONAR. Código Nacional de Autorregulamentação Publicitária. Código e Anexos, 1978. Disponível em: <Disponível em: http://www.conar.org.br/codigo/codigo.php >. Acesso em: 10 jul. 2020.
http://www.conar.org.br/codigo/codigo.ph...
).

O setor publicitário, formado de acordo com ideias e técnicas dos Estados Unidos (DURAND, 2008DURAND, J. C. G. Formação do campo publicitário brasileiro (1930-1970). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa , 2008.), consolidando colonialismo do saber da ciência considerada superior (LANDER, 2005LANDER, E. Ciências Sociais: saberes coloniais e eurocêntricos. In: LANDER, E. (Org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Buenos Aires: Clacso, 2005. p. 21-53.), adotou também o linguajar usado pelo Norte, que diferencia colonizador de colonizado por meio da ideia de que desenvolvimento e progresso somente são alcançados seguindo os modelos da “raça” superior (QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Rio de Janeiro: Clacso, 2005. p. 227-278. (Coleção Sur Sur).). Ao falar do CBAP, Geraldo Alonso, presidente da comissão interassociativa, alega que se trata de projeto “traduzido pelo anseio e pela necessidade dos chamados povos desenvolvidos” (ALONSO, 1978ALONSO, G. 1ª Sessão Plenária, realizada em 17 de abril de 1978: Comissão Especial de Autoregulamentação e Painéis de Criação. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE PUBLICIDADE, 3., 1978, São Paulo. Anais... São Paulo: Arquivo do CONAR, 1978. p. 15-16.). Ideias imperialistas, de supervalorização do Norte e consequente subvalorização do Sul (LANDER, 2005), estão presentes ao longo de todo o desenvolvimento do SBAP.

O Quadro 2 abaixo explica, resumidamente, os principais processos coloniais na criação do SBAP:

Quadro 2
Resumo dos processos coloniais na criação do SBAP

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo teve como objetivo analisar, sob a perspectiva decolonial, como ocorreu a incorporação do modelo eurocêntrico de autocontrole na criação do SBAP, formado pelo CBAP e pelo Conar. Para isso, foi feita uma pesquisa histórica, que se valeu de dados secundários, a fim de apresentar uma história relacionada à criação desse sistema ainda pouco discutido pela literatura de marketing, em geral, e de consumerismo, em particular.

Mesmo que atualmente o processo de controle eurocêntrico sobre o Sul global, em especial o Brasil, não faça uso de uma violência franca - conforme ocorreu durante o período de colonização -, tal processo consegue atingir seu objetivo por meio de uma fúria velada, que restringe formas de pensamento que divirjam daquela do Norte (MIGNOLO, 2011MIGNOLO, W. The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press, 2011.). No caso apresentado, parece que nenhuma alternativa de controle à publicidade no Brasil - a não ser a de autorregulamentação, de acordo com os moldes estabelecidos pelo Norte - foi considerada pelo setor publicitário quando discussões a esse respeito vinham ocorrendo.

Faz-se presente, no caso analisado, a colonialidade em suas três principais representações: do poder, do saber e do ser (QUIJANO, 2005QUIJANO, A. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER, E. (org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latino-americanas. Rio de Janeiro: Clacso, 2005. p. 227-278. (Coleção Sur Sur).). Qualquer tipo de emancipação do setor publicitário, portanto, fica comprometido, pois a dominação eurocêntrica parece ser feita de forma a coibir quaisquer tentativas de criação de uma publicidade, de fato, brasileira - ou mesmo latino-americana. Esse quadro, todavia, é um reflexo de um plano maior, no qual grande parte da prática consumerista realizada no Brasil parece sofrer de tal dominação eurocêntrica (DURAND, 2003DURAND, J. C. G. Formação e internacionalização da sociedade de consumo norte-americana (1870-1930). São Paulo: Eaesp GV Pesquisa, 2003.; HEMAIS e FARIA, 2018HEMAIS, M.; FARIA, A. Highlighting the Darker Side of Liberal Internationalism for a Counter-Colonizing Consumerism. Latin American Business Review, v. 19, n. 3-4, p. 349-373, 2018.). Consumidores brasileiros, desse modo, acabam sendo defendidos por um consumerismo que pouco foi pensado para atender às suas necessidades frente a abusos empresariais, o que leva a questionamentos sobre se realmente estamos sendo protegidos.

A literatura de marketing que se dedica a pesquisar consumerismo pouco atenta em tais discussões geopolíticas relacionadas à defesa do consumidor. Uma explicação para tal quadro pode ser porque a área se abstém de questionamentos que coloquem em xeque a validade de seus conhecimentos (FIRAT, 2010FIRAT, A. Commentaries on the state of journals in marketing. Marketing Theory, v. 10, n. 4, p. 437-455, 2010.), dado que eles seriam universais, assim como todo conhecimento cuja origem vem do mundo eurocêntrico (MIGNOLO, 2009MIGNOLO, W. Epistemic Disobedience, Independent Thought and Decolonial Freedom. Theory, Culture & Society, v. 26, n. 7-8, p. 159-181, 2009.). Discutir questões que mostram um lado mais escuro da história de marketing, portanto, iria contra esses princípios e requereria repensar a área e o que a constitui, além do seu passado. Em vez de seguir esse caminho, o marketing parece preferir esquecer “deliberadamente” determinados eventos históricos mais “problemáticos” (PATTERSON, BRADSHA e BROWN, 2008PATTERSON, A.; BRADSHAW, A.; BROWN, S. ‘Don’t forget the fruit gums, chum’: marketing under erasure and renewal. Marketing Theory, v. 8, n. 4, p. 449-463, 2008.) e criar uma “história oficial” que coloca em dúvida “histórias alternativas” (SAUERBRONN e FARIA, 2009SAUERBRONN, F.; FARIA, A. A utilização do método histórico em pesquisa acadêmica de marketing. Estratégia e Negócios, v. 2, n. 2, p. 78-95, 2009.).

A percepção de que há uma geopolítica de dominação por trás de ações consumeristas, entretanto, é mais fácil de ser enxergada por aqueles que vivenciam sua violência, em especial povos colonizados do Sul global. Cabe a pesquisadores desse locus de enunciação, portanto, discutir tais problemas, a fim de criar espaços que nos permitam externar nossas preocupações. Todavia, para que tais discussões avancem da forma como de fato precisam, não devem ser externadas somente no Sul. É importante que também cheguem ao Norte, levados por nós, para que possamos estabelecer diálogos com nossos pares daquele locus, com o objetivo de criar alternativas à ordem eurocêntrica, numa tentativa de validar conhecimentos feitos no resto do mundo. Não se busca, com isso, uma substituição da modernidade por outra forma de modernidade; o que se deseja é fomentar condições de possibilidades para a criação de um mundo onde muitos mundos possam coexistir (MIGNOLO, 2011MIGNOLO, W. The Darker Side of Western Modernity: Global Futures, Decolonial Options. Durham: Duke University Press, 2011.).

Embora se entenda como relevante, o presente estudo traz uma pequena contribuição na tentativa de melhor entender o fenômeno sob análise. Pesquisas futuras que queiram aprofundar as discussões apresentadas são incentivadas. Dado que o foco da análise desenvolvida aqui se deu pelo viés histórico, um caminho a ser explorado seria realizar um estudo sobre o Conar, a fim de verificar se hoje em dia essa organização ainda segue padrões eurocêntricos de autorregulamentação e como esse processo ocorre.

Por fim, cabe destacar que a perspectiva decolonial adotada no presente estudo deveria ser mais utilizada por pesquisadores no Brasil para explorar outras realidades ignoradas pela literatura de marketing, mas que fazem parte da nossa história. Pesquisas que queiram fazer uso dessa visão crítica e continuar a analisar o consumerismo brasileiro poderiam, por exemplo, estudar como outras instituições consumeristas locais foram influenciadas por organizações internacionais a adotar princípios eurocêntricos em suas práticas. Espera-se, entretanto, que o uso da perspectiva decolonial vá além de discussões consumeristas, recontando diversas outras histórias brasileiras e latino-americanas esquecidas, as quais dificilmente serão lembradas por pesquisadores do Norte, cabendo àqueles do Sul resgatar e valorizar passados que fazem parte de nossa essência.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    18 Dez 2020
  • Data do Fascículo
    Nov 2020

Histórico

  • Recebido
    27 Jan 2020
  • Aceito
    09 Set 2020
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