Acessibilidade / Reportar erro

Gestão de organizações culturais: perspectivas, singularidades e paradoxo como horizonte teórico

Gestión de organizaciones culturales: perspectivas, singularidades y paradojas como horizonte teórico

Resumo

Cada vez mais, as pesquisas sobre a gestão de organizações culturais se destacam, à medida que reconhecemos as contribuições simbólicas e materiais da economia criativa para o desenvolvimento das sociedades contemporâneas. Contudo, carecemos de uma visão integrada e robusta dessa gestão, baseada numa caracterização clara do campo e de suas singularidades. O objetivo deste artigo é descrever a produção acadêmica sobre gestão de organizações culturais e demarcar um horizonte conceitual-teórico fecundo para estimular a pesquisa futura. A metodologia é baseada numa revisão sistemática de produções acadêmicas publicadas nas bases de dados nacionais e internacionais. Os resultados da pesquisa incluem a elaboração de três categorias integradoras da produção acadêmica: perspectivas sobre questões centrais na pesquisa sobre organizações culturais (técnico-operacional e política), as singularidades dessas organizações (hipersensibilidade, hipertensão e hiperincerteza) e o paradoxo como um eixo teórico-conceitual crucial para melhorar o conhecimento sobre as organizações culturais. Os resultados propõem uma agenda para pesquisas futuras com base no conceito de paradoxo.

Palavras-chave:
Organizações culturais; Gestão; Economia criativa; Paradoxos; Singularidades

Resumen

Cada vez más, la investigación sobre la gestión de las organizaciones culturales se destaca al reconocer las contribuciones simbólicas y materiales de la economía creativa al desarrollo de las sociedades contemporáneas. Sin embargo, necesitamos una visión integrada y robusta de esta gestión basada en una clara caracterización del campo y sus singularidades. El propósito de este artículo es caracterizar la producción académica sobre la gestión de las organizaciones culturales y trazar un horizonte conceptual-teórico fructífero para estimular futuras investigaciones. La metodología se basa en una revisión sistemática de publicaciones académicas en bases de datos nacionales e internacionales. Los resultados de la investigación incluyen el desarrollo de categorías que integran la producción académica, que se encuentran en forma de perspectivas de análisis (técnico-operativas y políticas) y singularidades (hipersensibilidad, hipertensión e hiperincertidumbre) de las organizaciones culturales. Los resultados proporcionan una agenda para futuras investigaciones basadas en el concepto de paradoja.

Palabras clave:
Organizaciones culturales; Gestión; Economía creativa; Paradojas; Singularidades

Abstract

Research on the management of cultural organizations is increasingly gaining interest as we recognize the symbolic and material contributions of the creative economy to the development of contemporary societies. However, we lack an integrated and robust vision of such management, a vision based on a clear characterization of the field and its singularities. This article aims to characterize the academic production on the management of cultural organizations and outline a fruitful conceptual-theoretical horizon to stimulate future research. The methodology is based on a systematic review of academic production published in national and international databases. The analysis of the literature revealed the emergence of three categories: the perspectives about the central issues of the research on cultural organizations (from the technical-operational and political viewpoints), these organizations’ singularities (hypersensitivity, hypertension, and hyper-uncertainty), and the paradox as a crucial theoretical-conceptual axis to increase knowledge of cultural organizations. The results provide an agenda for future research based on the concept of paradox.

Keywords:
Cultural organizations; Management; Creative economy; Paradoxes; Singularities

INTRODUÇÃO

As organizações culturais se referem a uma ampla e diversa - naturezas, feições e tipologias - gama de organizações, constituídas em arranjos temporários ou permanentes, envolvidos em processos e atividades relacionados com concepção, produção e distribuição de produtos criativos (Jones, Lorenzen, & Sapsed, 2015Jones, C., Lorenzen, M., & Sapsed, J. (2015). Creative industries: a typology of change. In C. Jones, M. Lorenzen, & J. Sapsed (Eds.), Oxford handbook creative industries. Oxford, UK: Oxford University Press.). Essas organizações apresentam porte - micro, pequeno, médio e grande -, constituição jurídica - pública, privada e no terceiro setor -, forma organizativa - permanente, temporária, por projeto e em rede - e perfil - comunitário, associativo, informal, individual e cooperativado - bastante variados. Algumas têm caráter mais mercadológico, associando-se à noção de consumo de massa (Adorno & Horkheimer, 1985Adorno, T., & Horkheimer, M. (1985). A dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro, RJ: Zahar.) amparada na reprodutibilidade técnica das obras (Benjamin, 1985Benjamin, W. (1985). Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo, SP: Brasiliense.). Outras se voltam para a manutenção e a salvaguarda de patrimônios materiais e imateriais, muito ligados às culturas tradicionais e/ou identitárias, cujo fazer se vincula a um conceito genérico (Bauman, 2012Bauman, Z. (2012). Ensaios sobre o conceito de cultura. Rio de Janeiro, RJ: Zahar .) ou antropológico (Laraia, 2006Laraia, R. B. (2006). Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro, RJ: Zahar.) de cultura, caracterizado pela ideia de cultura como modo de vida.

Há ainda organizações cujo foco é a produção reconhecidamente artística, que se baseia num sistema próprio de legitimação de suas ações e se relaciona com o meio social baseado na noção de capital simbólico e seu efeito distinto (Bourdieu, 2011Bourdieu, P. (2011). A economia das trocas simbólicas. São Paulo, SP: Perspectiva.). Estas naturezas - mercadológica, identitária e estética - podem se apresentar sobrepostas e/ou misturadas numa mesma organização, ilustrando o cenário dinâmico e complexo que caracteriza a realidade de gestão desse campo singular de práticas e teorias.

As organizações culturais constituem a alma da economia criativa. Dependendo da delimitação, das atividades culturais observadas e da base metodológica utilizada, a expressão “economia criativa” pode ser substituída por outras, como “economia da cultura”, “indústrias culturais” e “indústrias criativas” (Valiati, Miguez, Cauzi, & Silva, 2017Valiati, L., Miguez, P., Cauzi, C., & Silva, P. (2017). Economia criativa e da cultura: conceitos, modelos teóricos e estratégias metodológicas. In L. Valiati, & A. L. N. Fialho(Orgs.), Atlas econômico da cultura brasileira: metodologia I. Porto Alegre, RS: Editora da UFRGS.). Trata-se de um conjunto bastante diverso de atividades, desde o entretenimento e a arte - por exemplo, publicação de livros e revistas, artes visuais (pintura e escultura), artes cênicas (teatro, ópera, shows e dança), gravações sonoras, filmes de cinema e TV - até moda, brinquedos e jogos (Caves, 2000Caves, R. (2000). Creative industries: contracts between art and commerce. Cambridge, UK: Harvard University Press.). Embora as terminologias possam variar, todas se preocupam com o crescente papel de fatores imateriais na produção e na demanda de experiência dos consumidores, além da importância dos produtos de conteúdo (Greffe, 2015Greffe, X. (2015). A economia artisticamente criativa. São Paulo, SP: Iluminuras e Itaú Cultural.). A criatividade ocupa um lugar de destaque e é valorizada como acelerador da inovação e da competitividade organizacional (Throsby, 2001Throsby, D. (2001). Economics and culture. Cambridge, UK: Cambridge University Press.), pois produz, a um só tempo, impactos culturais, sociais e econômicos, mobilizando identidades, dinamizando territórios e criando circuitos de trocas econômicas altamente especializados. Assim, as organizações culturais constituem um tema de estudo relevante tanto acadêmica quanto socialmente.

Apesar da relevância, a produção acadêmica sobre a gestão de organizações culturais permanece dispersa e fragmentada. Desconhecemos revisões sistemáticas da produção acadêmica ou análises que forneçam uma visão integrada e consolidada desse campo. Além disso, uma grande parte das pesquisas não enfoca ou considera o que singulariza as organizações culturais. Quando tentam aplicar teorias de gestão ou de organizações genéricas, pesquisadores correm o risco de gerar conhecimentos e práticas inadequados ou pouco efetivos. Por consequência, podem desenvolver uma visão mais integrada e consolidada do campo de pesquisa, destacando as singularidades organizacionais e gerenciais, o que pode ajudar no amadurecimento do campo, levando a uma melhor orientação para pesquisas futuras. Ou seja, entendemos que conhecimentos sobre o que singulariza as organizações culturais e sua gestão poderão orientar escolhas epistemológicas, metodológicas e teóricas mais adequadas para pesquisas futuras, bem como auxiliar os gestores a melhor exercer sua prática de gestão.

O objetivo deste artigo é caracterizar a produção acadêmica sobre gestão de organizações culturais e demarcar um horizonte conceitual-teórico fecundo para estimular trabalhos futuros. A metodologia é baseada numa revisão sistemática de produções acadêmicas publicadas (1990-2020) nas bases de dados nacionais e internacionais, como Spell, SciELO, Sage Publications, Routledge, Periódicos Capes, Library of Congress, Emerald e Academy of Management. A busca foi feita com base nos seguintes descritores: “organizações culturais”, “gestão de organizações culturais”, “economia criativa” (bases brasileiras) e “cultural organizations”, “cultural management”, “cultural organization management” e “arts organization”, “creative industries” (bases internacionais).

A pesquisa localizou 2.969 textos, dos quais 138, entre artigos, livros, capítulos de livros, teses e dissertações, apresentaram relevância de acordo com os parâmetros e o propósito da pesquisa. O processo de busca e seleção de material foi dinâmico e ocorreu em várias etapas. Na primeira, de seleção, foram verificadas as produções consistentes e coerentes que tratam da gestão de organizações culturais. Na segunda, foram mapeadas as referências bibliográficas na busca de outras produções relevantes. Essas referências foram pesquisadas, analisadas e integradas ao repertório da pesquisa. O processo de revisão ocorreu sob uma dinâmica de bola de neve, que chegou ao fim quando nenhuma referência emergia como nova ou relevante.

As pesquisas foram organizadas conforme as seguintes categorias: concepção da gestão (interpretativista ou positivista), foco da pesquisa (gestão, formação ou política), segmento cultural (teatro, dança, música, patrimônio, audiovisual etc.), área de conhecimento em que foi desenvolvido (administração, ciências socais, comunicação, economia etc.), abordagem metodológica adotada (qualitativa ou quantitativa) e caráter do estudo (empírico ou teórico). O processo se deu com base na tradição da análise de conteúdo (Colbari, 2014Colbari, A. (2014). A análise de conteúdo e a pesquisa empírica qualitativa. In E. M. Souza(Ed.), Metodologias e analíticas qualitativas em pesquisa organizacional. Vitória, ES: Edufes.), com foco interpretativo referente às singularidades das organizações culturais e sua gestão, mas também voltado à geração de categorias integradoras capazes de descrever a produção acadêmica analisada e caracterizar as organizações culturais, além de apontar um horizonte teórico significativo para renovar pesquisas futuras. Assim, mais do que um mapeamento descritivo e linear da produção acadêmica pesquisada, este artigo se concentra num processo reflexivo e propositivo frente aos desafios identificados e às categorias que emergiram de um processo indutivo.

A análise de conteúdo da produção acadêmica mapeada e selecionada permitiu a elaboração de 3 grandes categorias integradoras do campo: perspectivas, singularidades e horizonte. A primeira organiza a produção em 2 grandes eixos de preocupações. A segunda emergiu como categorias em razão do potencial para orientar pesquisas futuras, já que não representam uma preocupação massiva e generalizada das pesquisas existentes. Ou seja, somente alguns pesquisadores exploram, muitas vezes indireta ou implicitamente, o que singulariza as organizações culturais e sua gestão. A terceira categoria emergiu como esforço de propor um horizonte para trabalhos futuros, contribuindo para a consolidação do campo. Em suma, o processo de análise originou 3 tipos de categorias emergentes: perspectivas do que se considera central na pesquisa de organizações culturais, singularidades que sinalizam dinâmicas organizacionais particulares das organizações culturais e paradoxo como um eixo teórico-conceitual indicado como substancialmente relevante para melhorar o conhecimento sobre organizações culturais.

A análise sistemática do conjunto de pesquisas identificadas permitiu um entendimento panorâmico e integrado da produção acadêmica. Além disso, revelou a carência de pesquisas consistentes sobre as singularidades do campo e de esforços de teorização sobre a gestão desse tipo de organização. Este artigo proporciona 3 tipos de contribuições para o avanço das pesquisas sobre organizações culturais: uma visão integrada da produção acadêmica com base em 2 perspectivas organizadoras - técnico-operacional e política -; uma proposta de caracterização do campo baseada em suas singularidades organizacionais - hipersensibilidade, hipertensão e hiperincerteza -; e um horizonte teórico para renovar a pesquisa futura - paradoxo.

GESTÃO DE ORGANIZAÇÕES CULTURAIS: PERSPECTIVAS, SINGULARIDADES E DESAFIOS

Como campo interdisciplinar, a gestão de organizações culturais se relaciona com uma série de disciplinas, incluindo estudos de política, direito, economia, sociologia, educação e administração. Os temas sobre gestão incluem pesquisas em marketing (Botti, 2000Botti, S. (2000). What role for marketing in the arts? An analysis of arts consumption and artistic value. International Journal of Arts Management, 2(3), 14-27.; Medeiros, Alves, & Farah, 2015Medeiros, A., Alves, M., & Farah, M. (2015). Programa Cultura Viva e o campo organizacional da cultura: análise de políticas públicas pela perspectiva institucionalista. Revista de Administração Pública, 49(5), 1215-1235), liderança (Lapierre, 2001Lapierre, L. (2001). Leadership and arts management. International Journal of Arts Management, 3(3), 4-12.), empreendedorismo (Marins & Davel, 2020Marins, S. R., & Davel, E. P. B. (2020). Empreendedorismo cultural e artístico: veredas da pesquisa acadêmica. Pensamento Contemporâneo em Administração, 14(4), 115-140.), finanças (Turbide & Hoskin, 1999Turbide, J., & Hoskin, K. (1999). Managing non-profit arts organizations through management accounting systems: mission possible? International Journal of Arts Management, 1(2), 68-81.), performance (Weinstein & Bukovinsky, 2009Weinstein, L., & Bukovinsky, D. (2009). Use of the balanced scorecard and performance metrics to achieve operational and strategic alignment in arts and culture not-for-profits. International Journal of Arts Management, 11(2), 42-55.) e planejamento estratégico (Daigle & Rouleau, 2010Daigle, P., & Rouleau, L. (2010). Strategic plans in arts organizations: a tool of compromise between artistic and managerial values. International Journal of Arts Management, 12(3), 13-30.). Entre eles, do ponto de vista da teorização, predominam contribuições que mimetizam conceitos e princípios da administração clássica aplicados à gestão de organizações culturais (Byrnes, 2003Byrnes, W. J. (2003). Management and the arts. Burlington, NJ: Elsevier.; Chong, 2002Chong, D. (2002). Arts management. London, UK: Routledge.; Radbourne & Fraser, 1996Radbourne, J., & Fraser, M. (1996). Arts management: a practical guide. St Leonards, Australia: Allen & Unwin.), e poucos são os esforços relevantes na busca por estudar a gestão de organizações com base em suas especificidades (Araújo, Davel & Rentschler, 2020Araújo, B., Davel, E., & Rentschler, R. (2020). Aesthetic consumption in managing art-driven organizations: an autoethnographic inquiry. Organizational Aesthetics, 9(3), 63-84.; Daigle & Rouleau, 2010Daigle, P., & Rouleau, L. (2010). Strategic plans in arts organizations: a tool of compromise between artistic and managerial values. International Journal of Arts Management, 12(3), 13-30.; Lin & Lee, 2014Lin, L., & Lee, T. (2014). Symbolic goods social network experience marketing publishing industry performing arts symbolic economy and creative management: cultural and creative industries urging for new approaches. ENCATC - Journal of Cultural Management and Policy, 4(1), 58-67.).

Do ponto de vista metodológico, predomina uma abordagem qualitativa, sendo uma quantidade significativa das pesquisas baseada em estudos de caso voltados a analisar organizações culturais como teatros (Davel & Vianna, 2012Davel, E., & Vianna, L. G. L. (2012). Gestão-criação: processos indissociáveis nas práticas de um teatro baiano. Revista de Administração Pública, 46(4), 1081-1099.; Leal, 2018Leal, N. (2018). O Teatro Castro Alves: da gestão à visão dos produtores culturais. (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal da Bahia, Salvador, BA.), museus (Boylan, 2004Boylan, P. (2004). Como gerir um museu: manual prático. Paris, France: Icom.; Cândido, 2013Cândido, M. M. D. (2013). Gestão de museus, um desafio contemporâneo: diagnóstico museológico e planejamento. Porto Alegre, RS: Medianiz.; B. Lord & G. D. Lord, 2005Lord, B., & Lord, G. D. (2005). Manual de gestión de museos. Barcelona, España: Ariel.), bibliotecas (Milanesi, 1991Milanesi, L. (1991). A casa da invenção. São Paulo, SP: Edições Siciliano.), grupos artísticos (Souza & Carrieri, 2013Souza, M. M. P., & Carrieri, A. P. (2013). A arte de (sobre)viver coletivamente: estudando a identidade do Grupo Galpão. Revista de Administração, 48(1), 7-20.), ópera (Luonila & Johansson, 2016Luonila, M., & Johansson, T. (2016). Reasons for networking in institutionalized music productions: case studies of an Opera House and a Music Festival. International Journal of Arts Management, 18(3), 50-66.), centros culturais (Dines, 2012Dines, Y. (2012). Cidadelas da cultura no lazer: uma reflexão em antropologia da imagem sobre o Sesc São Paulo. São Paulo, SP: Sesc.; Serapião, 2012Serapião, F. (2012). Centro Cultural São Paulo: espaço e vida. São Paulo, SP: Monolito.), orquestras (Cunha, 2019Cunha, L. (2019). A publicização da Orquestra Sinfônica da Bahia (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal da Bahia, Salvador, BA.), galerias (Foop, 1997Fopp, M. A. (1997). Managing museums and galleries. London, UK: Routledge.), entre outros.

Perspectivas Organizadoras das Pesquisas sobre Gestão de Organizações Culturais

Quanto às perspectivas, as pesquisas analisadas se organizam em 2 grandes eixos: um de caráter técnico-operacional e outro de caráter mais político. O primeiro, voltado a um nível microgerencial, adota um viés normativo e prescritivo, com conteúdos que correm o risco de reduzir a gestão à aplicação de um conjunto de ferramentas e a prática do gestor a um domínio meramente operacional, dando pouca atenção a especificidades organizacionais e contextuais. O segundo eixo adota um olhar que, embora sensível às especificidades do setor cultural e à sua natureza interdisciplinar, se distancia muito dos processos de gestão por se preocupar exclusivamente com um nível macrogerencial e com análises dos efeitos políticos e societais das políticas públicas para a cultura.

Gestão na perspectiva técnico-operacional

A secularização da cultura e sua autonomização como campo social específico é recente. Historicamente, a tarefa de organizar a cultura foi realizada por religiosos ou políticos, e apenas na segunda metade do século XX é que surgiu a demanda de profissionais especializados (L. Rubim, 2005Rubim, L. (2005). Produção cultural. In L. Rubim (Org.), Organização e produção da cultura. Salvador, BA: Edufba .). Assim, a gestão de organizações culturais como prática profissional e saber alvo de interesse reflexivo é um fenômeno muito novo. Frente a isso, os estudos desenvolvidos sob uma visão técnica desempenham um papel relevante ao sistematizar conceitos, práticas e experiências.

É possível identificar esforços que visam à descrição e à conceituação do campo (Coelho, 1989Coelho, T. (1989). O que é ação cultural. São Paulo, SP: Iluminuras., 2014Coelho, T. (2014). Dicionário crítico de política cultural. São Paulo, SP: Iluminuras.). Também identificamos contribuições descritivas sobre a organização no setor (L. Rubim, 2005Rubim, L. (2005). Produção cultural. In L. Rubim (Org.), Organização e produção da cultura. Salvador, BA: Edufba .), mapeamento dos atores que o constituem (Cohn, Luz, Ferron, Herencia, & Savazoni, 2007Cohn, S., Luz, A., Ferron, M. F., Herencia, L. J., & Savazoni, R. (2007). Produção cultural no Brasil. Rio de Janeiro, RJ: Beco do Azougue.; Nussbaumer & Rattes, 2005Nussbaumer, G., & Rattes, P. C. (2005). Equipamentos culturais de Salvador: públicos, políticas e mercados. Recuperado de http://www.gepicc.ufba.br/enlepicc/pdf/GiseleNussbaumer.pdf
http://www.gepicc.ufba.br/enlepicc/pdf/G...
; Nussbaumer, Vinhas, Lins, Leal, Rattes, & Ahmad, 2010Nussbaumer. G., Vinhas, J. V., Lins, L., Leal, N., Rattes, P. C., & Ahmad, S. (2010). Mapa dos teatros de Salvador. Recuperado de http://www.cult.ufba.br/arquivos/mapa_teatros_salvador.pdf
http://www.cult.ufba.br/arquivos/mapa_te...
) e contribuições de caráter generalista para formação ou qualificação profissional (Avelar, 2010Avelar, R. (2010). O avesso da cena: notas sobre produção e gestão cultural. São Paulo, SP: DUO Editorial.; Byrnes, 2003Byrnes, W. J. (2003). Management and the arts. Burlington, NJ: Elsevier.; Cunha, 2007Cunha, M. H. (2007). Gestão cultural: profissão em formação. Belo Horizonte, MG: DUO Editorial.; Olivieri & Natale, 2016Olivieri, C., & Natale, E. (2016). Guia brasileiro de produção cultura: ações que transformam a cidade. São Paulo, SP: Edições Sesc.; Thiry-Cherques, 2006Thiry-Cherques, H. R. (2006). Projetos culturais: técnicas de modelagem. Rio de Janeiro, RJ: FGV.). Há ainda aportes que visam capacitar profissionais em temas específicos, como gestão de projetos culturais (Malagodi & Cesnik, 2000Malagodi, M. E., & Cesnik, F. S. (2000). Projetos culturais: elaboração, administração, aspectos legais e busca de patrocínio. São Paulo, SP: Escrituras.; Santos & Davel, 2018Santos, F. P., & Davel, E. (2018). Gestão de equipamentos culturais com base na identidade territorial. Revista Gestão & Conexões, 7(2), 7-42.) e captação de recursos (Sarkovas, 1998Sarkovas, Y. (1998). Manual de estratégias para captação de patrocínios. São Paulo, SP: Revista Marketing Cultural.). Majoritariamente, esses estudos apresentam um conteúdo prescritivo, por vezes calcado na sistematização de conhecimentos tácitos, nem sempre escapando de simplificações.

Vista por essa óptica, a gestão de organizações culturais é um ato essencialmente operacional, instrumental e técnico. Os aspectos subjetivos, imateriais e políticos envolvidos nesse processo são negligenciados. O gestor aparece como a antítese do artista e se responsabiliza por um conjunto de procedimentos racionais - elaboração de planilhas e checklists, preenchimento de formulários, gestão financeira etc. - que servem de meio para a instância criativa. Subjaz a um entendimento funcionalista e meramente racional da gestão, bem como a uma percepção mecanicista da organização, encorajando a importação de princípios oriundos da administração clássica, sem considerar as especificidades das organizações culturais e seu contexto.

Gestão na perspectiva política

Por outro lado, quando entendida como política, a gestão de organizações culturais é vista na sua complexidade e de um ponto de vista bastante crítico. Contudo, tal abordagem negligencia a dimensão prática, visto que as reflexões que propõe apresentam poucas contribuições efetivas ao cotidiano de gestão das organizações que atuam no campo.

No Brasil, abundam estudos ligados ao mapeamento e à análise crítica das políticas públicas para o segmento baseados em critérios históricos e geográficos (Barros & Oliveira, 2011Barros, J. M., & Oliveira, J. Jr. (2011). Pensar e agir com a cultura: desafios da gestão cultural. Belo Horizonte, MG: Observatório da Diversidade Cultural.; Botelho, 2000Botelho, I. (2000). Romance de formação: Funarte e política cultural (1976-1990). Rio de Janeiro, RJ: Edições Casa de Rui Barbosa., 2016Botelho, I. (2016). Dimensões da cultura: políticas culturais e seus desafios. São Paulo, SP: Edições Sesc.; Calabre, 2009Calabre, L. (2009). Políticas culturais no Brasil: dos anos 1930 ao século XXI. Rio de Janeiro, RJ: FGV.; A. Rubim & Barbalho, 2007Rubim, A. (2007). Políticas culturais no Brasil: tristes tradições. Revista Galáxia, 13, 101-113.; A. Rubim & Rohde, 2008Rubim, A., & Rocha, R. (2010). Políticas culturais para as cidades. Salvador, BA: Edufba .), assim como setoriais e temáticos (Barros &Kauark, 2011Barros, J. M., & Kauark, G. (2011). Diversidade cultural e desigualdade de trocas: participação, comércio e comunicação. São Paulo, SP: Itaú Cultural, Observatório da Diversidade Cultural.; Botelho, 2003Botelho, I. (2003). Os equipamentos culturais na cidade de São Paulo: um desafio para a gestão pública. São Paulo em Perspectiva, 15(2), 73-83.; Leitão & Guilherme, 2014Leitão, C. S., & Guilherme, L. L. (2014). Cultura em movimento: memórias e reflexões sobre políticas públicas e práticas de gestão. Fortaleza, CE: Armazém da Cultura.; A. Rubim & Rocha, 2010Rubim, A., & Rocha, R. (2010). Políticas culturais para as cidades. Salvador, BA: Edufba .). Nas pesquisas internacionais, muitos são os esforços que refletem criticamente sobre o papel do Estado (Radbourne, 2002Radbourne, J. (2002). Social intervention or market intervention? A problem for governments in promoting the value of the arts. International Journal of Arts Management, 5(1), 50-61.), o impacto das indústrias criativas nas cidades (Brooks & Kushner, 2001Brooks, A., & Kushner, R. (2001). Cultural districts and urban development. International Journal of Arts Management, 3(2), 4-15.) e os modelos de mensuração de impacto de investimentos (Turbide & Laurin, 2009Turbide, J., & Laurin, C. (2009). Performance measurement in the arts sector: the case of the performing arts. International Journal of Arts Management, 11(2), 56-70.).

Esse conjunto de pesquisas oferece informações valiosas, capazes de localizar a gestão de organizações culturais num contexto societal muito amplo e estratégico, afirmando sua relevância em diferentes âmbitos. Vista por esse prisma, a gestão de organizações culturais é um ato político. Os aspectos estéticos continuam fora do escopo do trabalho do gestor que permanece como meio, mas de outra forma. Ele agora é o elo de conexão entre a instância criativa e o poder público, cabendo-lhe articular a criação artística com as políticas públicas vigentes e dominar a burocracia estatal.

Singularidades das Organizações Culturais

A análise da produção acadêmica permitiu observar que há uma noção bastante generalizada de que as organizações culturais são singulares e de que isso afeta o cotidiano de seus gestores. Apesar disso, observou-se a carência de pesquisas voltadas a aprofundar o entendimento dessas singularidades de forma a contribuir com os gestores e a adoção de vieses de estudo e teorização adequadas a tais características. Realizamos uma nova análise do material encontrado para tentar sistematizar uma primeira categorização de singularidades que se destacam, mesmo que implícita ou indiretamente, como significativas nas pesquisas.

Hipersensibilidade organizacional

Hipersensibilidade organizacional se refere à preponderância da dimensão simbólica como elemento característico das organizações culturais, uma vez que seus produtos e serviços têm como mola propulsora símbolos que se expressam em práticas culturais diversas, ligadas tanto a uma definição antropológica (traços culturais) quanto estética (expressões artísticas) de cultura. A natureza não utilitária de seus bens aparece como característica central dessas organizações (Lampel, Lant, & Shamsie, 2009Lampel, J., Lant, T., & Shamsie, J. (2009). Equilíbrio em cena: o que aprender com as práticas organizacionais das indústrias culturais. Revista de Administração de Empresas, 19(1), 19-26.). A gestão de uma organização cultural não consiste apenas na produção eficiente de um produto; preocupa-se sobretudo com a criação e a manutenção de uma organização que possa produzir e vender sentido (Lawrence & Phillips, 2002Lawrence, T. B., & Phillips, N. (2002). Understanding cultural industries. Journal of Management Inquiry, 11(4), 430-441.). Trata-se de uma forma de organização que não é nem “intensiva de capital” nem “intensiva de conhecimento”, e sim “intensiva de símbolos” (Lawrence & Phillips, 2002Lawrence, T. B., & Phillips, N. (2002). Understanding cultural industries. Journal of Management Inquiry, 11(4), 430-441., p. 431), em que o valor de uso perde relevância para o valor simbólico (Defillippi, Grabher, & Jones, 2007Defillippi, R. J., Grabher, G., & Jones, C. (2007). Introduction to paradoxes of creativity: managerial and organizational challenges in the cultural economy. Journal of Organizational Behavior, 28, 511-521.).

Esse atributo tem relação direta com o processo de autonomização da arte iniciado no período renascentista, quando transformações sociais e econômicas possibilitaram a separação entre artesanato e arte, tornando-a desfrutável e significativa em si mesma (Geffre, 2013Greffe, X. (2013). Arte e mercado. São Paulo, SP: Iluminuras e Itaú Cultural.; Hauser, 2003Hauser, A. (2003). História social da arte e da literatura. São Paulo, SP: Martins Fontes.). Aos poucos, a obra de arte foi se distanciando de uma função social ligada à igreja ou ao Estado e se inserindo num sistema de relações de produção, circulação e consumo de bens simbólicos autônomo e mercantil que, paradoxalmente, lhe confere o status de afirmar a singularidade intelectual e artística que a torna mais que uma mera mercadoria (Bourdieu, 2011Bourdieu, P. (2011). A economia das trocas simbólicas. São Paulo, SP: Perspectiva.).

A hipersensibilidade organizacional se desdobra em duas vertentes: ênfase na dimensão estética de produtos e serviços e ênfase nas relações identitárias. A primeira é uma característica marcante das organizações culturais, tendo em vista que seus produtos e serviços contêm um substancial esforço artístico ou criativo, associados à cultura, às artes ou apenas ao entretimento (Caves, 2000Caves, R. (2000). Creative industries: contracts between art and commerce. Cambridge, UK: Harvard University Press.). Esse esforço corresponde ao apelo aos sentidos, uma vez que os bens culturais obtêm valor por meio das experiências subjetivas geradas, contando com o uso intensivo de símbolos para influenciar a percepção e a emoção (Lampel et al., 2009Lampel, J., Lant, T., & Shamsie, J. (2009). Equilíbrio em cena: o que aprender com as práticas organizacionais das indústrias culturais. Revista de Administração de Empresas, 19(1), 19-26.).

Quanto à ênfase nas relações identitárias, num âmbito mais amplo e societal, ela se expressa no vínculo de produtos e serviços das organizações culturais com a dimensão identitária de grupos e territórios, que têm propriedades estéticas distintas com funções simbólicas que permitem a criação de sentido relacionado com a construção de identidade ou valor social (Peltoniemi, 2015Peltoniemi, M. (2015). Cultural industries: product-market characteristics, management challenges and industry dynamics. British Academy of Management, 17(1), 41-68.). Assim, as organizações culturais estabelecem vínculos com as identidades culturais que sugerem um pertencimento a culturas étnicas, raciais, linguísticas, religiosas e nacionais (Hall, 2014Hall, S. (2014). A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro, RJ: Lamparina.), que, no contexto contemporâneo, se apresentam hibridizadas, pois são fruto de processos socioculturais que recombinam elementos para gerar novas estruturas, objetos e práticas (Canclini, 2003Canclini, N. G. (2003). Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade. São Paulo, SP: Edusp.).

Num âmbito mais específico e intraorganizacional, a organização cultural se expressa na própria relação dos trabalhadores criativos com seu produto, tendo em vista que, nas atividades criativas, o criador se preocupa de maneira vital com a originalidade exibida, com as proezas técnicas manifestadas, a resolução e a harmonia alcançadas no ato criativo (Caves, 2000Caves, R. (2000). Creative industries: contracts between art and commerce. Cambridge, UK: Harvard University Press.). A maioria dos bens culturais incorpora o desejo pessoal dos criadores de se expressar e criar em alinhamento com as próprias preferências intelectuais, identitarias e estéticas, muitas vezes em total desconexão com eventuais expectativas ou demandas de um consumidor (Khaire, 2017Khaire, M. (2017). Culture and commerce: the value of entrepreneurship in creative industries. Stanford, CA: Stanford University Press.).

Hipertensão organizacional

A hipertensão organizacional é uma singularidade que consiste no produto do persistente e marcante contraste entre as dimensões simbólica e econômica, inerente à gestão de organizações culturais. A maioria das organizações opera sob várias lógicas, simultaneamente acionando requisitos que se mostram, às vezes, contraditórios. Nas organizações culturais, as duas principais ações que geram essa tensão são as lógicas do mercado e da instituição artístico-cultural, tornando-as vulneráveis a conflitos e contradições entre lógicas distintas (Kharie, 2017Khaire, M. (2017). Culture and commerce: the value of entrepreneurship in creative industries. Stanford, CA: Stanford University Press.). O surgimento de imperativos conflitantes é uma característica dessas organizações (Hirsch, 1972Hirsch, P. M. (1972). Processing fads and fashions: an organization-set analysis of cultural industry systems. The American Journal of Sociology, 77(4), 639-659.), que, para sobreviver, buscam reconciliar as demandas de produção artística com as do mercado, áreas com naturezas diferentes e em oposição (Lampel et al., 2009Lampel, J., Lant, T., & Shamsie, J. (2009). Equilíbrio em cena: o que aprender com as práticas organizacionais das indústrias culturais. Revista de Administração de Empresas, 19(1), 19-26.).

A relação com o econômico se torna muitas vezes um tabu para artistas e profissionais do setor cultural. O próprio estudo da dimensão econômica das organizações culturais é um campo ainda pouco explorado pela economia, que muitas vezes desconsidera sua relevância frente a indústrias mais tradicionais. Então, resume-se essa dimensão aos subsídios públicos ou à busca por aproximar as escolhas econômicas desse segmento àquelas tidas como padrão (Caves, 2000Caves, R. (2000). Creative industries: contracts between art and commerce. Cambridge, UK: Harvard University Press.).

Muitas são as especificidades econômicas desse campo, sendo que muitas são moldadas pela tensão com a dimensão simbólica. A demanda incerta é uma delas, uma vez que a criação artística não obedece à lei de oferta e procura, e sim a dimensões de caráter mais subjetivo, tanto no âmbito do criador quanto no público (Caves, 2000Caves, R. (2000). Creative industries: contracts between art and commerce. Cambridge, UK: Harvard University Press.). Nos mercados mais tradicionais, essa relação envolve previsibilidade, cálculo e atendimento diligente de expectativas do público, o que não se dá no campo artístico e cultural. A maioria dos artistas que pretendem vender suas obras desconfia das pressões que o mercado acarreta e do potencial correspondente de impacto negativo em sua expressão artística (Khaire, 2017Khaire, M. (2017). Culture and commerce: the value of entrepreneurship in creative industries. Stanford, CA: Stanford University Press.).

Até o entretenimento, em que a relação se aproxima mais dos segmentos econômicos tradicionais, há valores como criatividade, originalidade e surpresa associados à reputação do criador que dinamizam as relações econômicas de maneira particular. Semelhantes a muitas indústrias, as organizações culturais dependem não apenas de novidades para atrair consumidores. Elas precisam de referências familiares para ajudar na compreensão e a estabilizar a demanda por produtos culturais, uma tensão entre criar produtos radicalmente estranhos e gerar receitas consistentes (Jones et al., 2015Jones, C., Lorenzen, M., & Sapsed, J. (2015). Creative industries: a typology of change. In C. Jones, M. Lorenzen, & J. Sapsed (Eds.), Oxford handbook creative industries. Oxford, UK: Oxford University Press.).

No cotidiano de gestão das organizações culturais, a hipertensão organizacional se apresenta na dualidade do criador-produtor e do artista-gestor. No conflito entre esses dois mundos, nasce a necessidade de gerir de maneira a equilibrar o sucesso artístico e o financeiro. Se tomados como dois mundos separados - econômico (gestores) e arte (criadores) - com lógicas completamente distintas, essas organizações são regidas por uma intensa tensão (Khaire, 2017Khaire, M. (2017). Culture and commerce: the value of entrepreneurship in creative industries. Stanford, CA: Stanford University Press.).

Por consequência, muitas tensões são proliferadas: identitárias, criativas, organizativas etc., as quais se desdobram em polaridades que afetam o cotidiano de gestão, demandando dos gestores uma capacidade de equilibrar tensões persistentes: expressar valores artísticos com viabilidade econômica; diferenciar seus produtos sem torná-los irreconhecíveis; analisar e atender à demanda existente, ao mesmo tempo usando a imaginação para expandi-la e transformá-la; concentrar diferentes atividades numa mesma organização, mantendo uma vitalidade criativa por meio de especialização; desenvolver sistemas criativos sem suprimir a inspiração individual (Lampel et al., 2009Lampel, J., Lant, T., & Shamsie, J. (2009). Equilíbrio em cena: o que aprender com as práticas organizacionais das indústrias culturais. Revista de Administração de Empresas, 19(1), 19-26.).

Hiperincerteza organizacional

A hiperincerteza organizacional é uma singularidade que remete à atmosfera de imprevisibilidade, marca forte do cotidiano de gestão das organizações culturais, tendo em vista sua constituição hipertensa. Deslocar-se em meio a tantas tensões transforma o artista, o gestor e os profissionais do campo cultural em equilibristas, muitas vezes prosseguindo um equilíbrio dinâmico em ambiente de grande incerteza. No trabalho dos artistas, a incerteza se expressa de diversas formas: atingir um nível de reconhecimento que lhes permita viver de arte, conseguir equalizar uma equipe de criadores em torno de um resultado estético satisfatório, resposta do público, rentabilidade ou sustentabilidade de alguns empreendimentos, possibilidade de a obra gerar um patrimônio com renda em longo prazo por meio de propriedade intelectual (Caves, 2000Caves, R. (2000). Creative industries: contracts between art and commerce. Cambridge, UK: Harvard University Press.).

Nos processos de gestão, a imprevisibilidade se apresenta na dificuldade de identificar e estabelecer claramente padrões de qualidade (Lampel et al., 2009Lampel, J., Lant, T., & Shamsie, J. (2009). Equilíbrio em cena: o que aprender com as práticas organizacionais das indústrias culturais. Revista de Administração de Empresas, 19(1), 19-26.), bem como no desafio de ajustar oferta - produção artística - e demanda - gosto estético, formas de apreciação, disponibilidade de investimento etc. Padrões racionalistas de planejamento que têm como foco minimizar riscos e antever cenários não se encaixam num contexto no qual o conhecimento tácito, o talento, a criatividade e a inovação são recursos cruciais para o sucesso (Jones & Defillippi, 1996Jones, C., & Defillippi, J. (1996). Back to the future in film: combining industry and self-knowledge to meet the career challenges of the 21st century. Academy of Management Executive, 10(4), 89-103.). Esses são recursos amorfos, isto é, não podem ser claramente definidos, que surgem de fontes inesperadas e perdem o valor por motivos não totalmente compreendidos (Lampel et al., 2009Lampel, J., Lant, T., & Shamsie, J. (2009). Equilíbrio em cena: o que aprender com as práticas organizacionais das indústrias culturais. Revista de Administração de Empresas, 19(1), 19-26.). Isso denota o ambiente altamente incerto, dinâmico e complexo das organizações culturais.

No ambiente profissional, a incerteza se apresenta em decorrência do ambiente organizacional altamente flexível e desintegrado, característico de grande parte das organizações culturais. Como consequência, encontramos várias formas de enfrentamento da hiperincerteza: múltiplas ocupações, versatilidade de papéis ocupacionais, diversificação de vínculos empregatícios e dependência de programas de apoio público (Menger, 2014Menger, P. M. (2014). The economics of creativity: art and achievement under uncertainty. Cambridge, MA: Harvard University Press.). Por outro lado, é preciso registrar que o ambiente de hiperincerteza das organizações culturais gera também uma condição propícia para originalidade e inventividade, fator propulsor de inovações e criatividade.

Desafios e Proposições de Pesquisa em Gestão de Organizações Culturais

Com um entendimento integrado quanto às perspectivas de pesquisa e às singularidades organizacionais, é possível refletir melhor sobre os desafios de teorização acerca da gestão de organizações culturais. Um primeiro desafio diz respeito à pouca atenção conferida à dimensão intermediária da gestão, de modo a escapar do pragmatismo pouco crítico da visão técnico-operacional e da abrangência pouco operacionalizável da visão político-estratégica, indo além dos estudos de caso para lançar um entendimento mais amplo, robusto e consistente a respeito desse campo. É necessário construir uma visão articulada e multinível para os processos de gestão nas organizações culturais, um olhar mais holístico que articule as dimensões micro, meso e macro da gestão.

O segundo desafio diz respeito à escassez de esforços de teorização que escapem da simples mimetização de abordagens utilizadas no estudo de outros campos da gestão. Pesquisas futuras precisam enfocar melhor as singularidades das organizações culturais, com vistas a orientar com maior clareza as escolhas epistemológicas, metodológicas e teóricas de pesquisa. Além disso, precisam compreender a gestão de organizações culturais como um processo caracterizado pela simultaneidade e pela interconexão entre os diferentes níveis (individual, grupal e organizacional) e dimensões (operacional, estratégica e societal) que constituem a gestão.

Novos horizontes teóricos para o estudo das organizações precisam fazer frente a esses desafios.

Da análise conjunta das singularidades propostas, o paradoxo se destaca e emerge como eixo analítico para ativar pesquisas futuras. Assim, a condição latente de mudança e transformação advinda de hipertensões, hiperincertezas e hipersensibildiades intrínsecas às organizações culturais é um elemento-chave para aprimorar seu estudo em pesquisas futuras. Essa tríade de singularidades reflete um contexto organizacional de profundas tensões, dilemas, ambiguidades e conflitos, que, por seu caráter contraditório e persistente, podem ser definidos como expressões paradoxais.

PARADOXO: NOVO HORIZONTE PARA A PESQUISA EM GESTÃO DE ORGANIZAÇÕES CULTURAIS

Paradoxos são contradições persistentes envolvendo elementos interdependentes, cuja ocorrência coloca o gestor diante de situações ambíguas ou propriamente contraditórias (Smith & Lewis, 2011Smith, W. K., & Lewis, M. W. (2011). Toward a theory of paradox: a dynamic equilibrium model of organizing. Academy of Management Review, 36(2), 381-403.). Os paradoxos atraem o interesse da humanidade desde a Grécia antiga, e seu estudo remonta aos alicerces do pensamento ocidental e oriental, encontrando ecos em diversas tradições filosóficas, como a lógica aristotélica e a crítica kantiana, o existencialismo de Kierkegaard e a dialética hegeliana; em tradições religiosas do que se costuma chamar de filosofia oriental, como o taoismo, o confucionismo e o budismo; e em outros campos do conhecimento, como a filosofia da linguagem e a filosofia política (Schad, Lewis, Raisch, & Smith, 2016Schad, J., Lewis, M., Raisch, S., & Smith, W. (2016). Paradox research in management science: looking back to move forward. Academy of Management Annals, 10(1), 5-64.).

São descritos como paradoxos organizacionais várias dualidades do tipo “autonomia e conformidade”, “novo e velho”, “aprendizagem e mecanização do trabalho” e “liberdade e vigilância” (Eisenhardt, 2000Eisenhardt, K. M. (2000). Paradox, spirals, ambivalence: the new language of change and pluralism. The Academy of Management Review, 25(4), 703-705.). Os paradoxos se caracterizam pela existência simultânea de dois estados de coisas com qualidades de natureza oposta. A natureza contraditória de seus elementos e sua interdependência (Schad et al., 2016Schad, J., Lewis, M., Raisch, S., & Smith, W. (2016). Paradox research in management science: looking back to move forward. Academy of Management Annals, 10(1), 5-64.) colocam à prova concepções usuais, desafiando a compreensão e a ação humanas. Para os estudiosos do paradoxo, a persistência e a continuidade das tensões entre os opostos é o ponto a ser observado, ao contrário de outras tradições com abordagens de caráter dualista, como os tributários das contribuições de Giddens e Bourdieu, ou daqueles ligados às tradições dialéticas de tradição hegeliana e marxista (Schad et al., 2016Schad, J., Lewis, M., Raisch, S., & Smith, W. (2016). Paradox research in management science: looking back to move forward. Academy of Management Annals, 10(1), 5-64.; Smith & Lewis, 2011Smith, W. K., & Lewis, M. W. (2011). Toward a theory of paradox: a dynamic equilibrium model of organizing. Academy of Management Review, 36(2), 381-403.). Na primeira, o foco recai no caráter mutante, processual e dinâmico das relações. Já na segunda, a ideia de síntese, ainda que temporariamente, pretende apaziguar a tensão. Ambas, de algum modo, apontam para o fim da tensão, enquanto para a teoria dos paradoxos a tensão é o ponto de interesse.

No campo dos estudos organizacionais, paradoxos têm sido crescentemente estudados por permitirem a análise de situações complexas. As primeiras pesquisas remontam aos anos 1980, e seu interesse vem ganhando escala nas últimas décadas, com foco nos mais diferentes temas: enfrentamento de situações problemáticas (Beech, Burns, Caestecker, Macintosh, & Maclean, 2004Beech, N., Burns, H., Caestecker, L., Macintosh, R., & Maclean, D. (2004). Paradox as invitation to act problematic change situations. Human Relations, 57(10), 1313-1332.), construção de sentido (Lüscher & Lewis, 2008Lüscher, L., & Lewis, M. (2008). Organizational change and managerial sensemaking: working through paradox. Academy of Management Journal, 51(2), 221-240.), pluralismo (Eisenhardt, 2000Eisenhardt, K. M. (2000). Paradox, spirals, ambivalence: the new language of change and pluralism. The Academy of Management Review, 25(4), 703-705.), gestão de pessoas (I. F. G. Vasconcelos, Mascarenhas, & F. C. Vasconcelos, 2006Vasconcelos, I. F. G., Mascarenhas, A., & Vasconcelos, F. C. (2006). Gestão do paradoxo “passado versus futuro”: uma visão transformacional da gestão de pessoas. RAE-eletrônica, 5(1), 1-25.) e participação (O’connor, 1995O’Connor, E. S. (1995). Paradoxes of participation: textual analysis and organizational change. Organization Studies, 16(5), 769-803.), diversidade (Basset-Jones, 2005Bassett-Jones, N. (2015). The paradox of diversity management, creativity and innovation. Creativity and Innovation Management, 14(2), 169-175.), criatividade (Stierand, Boje, Vlad, Dorfler, & Feuls, 2019Stierand, M., Boje, D., Vlad, G., Dorfler, V., & Feuls, M. (2019). Paradoxes of creativity: examining the creative process through an antenarrative lens. Journal of Creative Behavior, 53(2), 165-170.; Townley & Beech, 2010Townley, B., & Beech, N. (2010). Managing creativity: exploring the paradox. Cambridge, UK: Cambridge University Press .), identidade (Fiol, 2002Fiol, M. (2002). Capitalizing on paradox: the role of language in transforming organizational identities. Organization Science, 13(6), 653-666.; Gotsi, Andriopoulos, Lewis & Ingram, 2010Gotsi, M., Andriopoulos, C., Lewis, M. W., & Ingram, A. E. (2010). Managing creatives: paradoxical approaches to identity regulation. Human Relations, 63(6), 781-805.; Kosmala, 2007Kosmala, K. (2007). The identity paradox: reflections on fluid identity of female artist. Culture and Organization, 13(1), 37-53.), governança (Michaud, 2013Michaud, V. (2013). Mediating the paradoxes of organizational governance through numbers. Organization Studies, 35(1), 75-101.), liderança (Storey & Salaman, 2009Storey, J., & Salaman, G. (2009). Managerial dilemmas: exploiting paradox of strategic leadership. West Sussex, UK: John Wiley Editorial.; Rego & Cunha, 2020Rego, A., & Cunha, M. P. (2020). Paradoxos da liderança: gerir contradições, dilemas e tensões da vida organizacional. Lisboa, Portugal: Edições Sílabo.), controle (Streatfield, 2001Streatfield, P. J. (2001). The paradox of control in organizations. London, UK: Routledge.), autonomia (Trevelyan, 2001Trevelyan, R. (2001). The paradox of autonomy: a case of academic research scientists. Human Relations, 54(4), 495-525.), sucesso (Cunha & Putnam, 2017Cunha, M. H. (2007). Gestão cultural: profissão em formação. Belo Horizonte, MG: DUO Editorial.), rede (Keller, 2020Keller, J., Wong, S. S., & Liou, S. (2020). How social networks facilitate collective responses to organizational paradoxes. Human Relations, 73(3), 401-428.) e gestão (Clegg, Cunha, & Pina, 2002Clegg, S. R., Cunha, J. V., & Pina, M. (2002). Management paradoxes: a relational view. Human Relations, 55(5), 483-503.; Putnam, Fairhust, & Banghart, 2016Cunha, M., & Putnam, L. (2019). Paradox theory and the paradox of success. Strategic Organization, 17(1), 95-106.).

No que tange à gestão de organizacionais culturais, as pesquisas focam em tensões em organizações baseadas em projeto (Defillippi & Arthur, 1998Defillippi, R. J., & Arthur, M. B. (1989). Paradox in projetc-based enterprise: the case of film making. California Management Review, 40(2), 125-139.), tensões entre uma identidade criativa e uma gerencial no setor (Gotsi et al., 2010Nussbaumer. G., Vinhas, J. V., Lins, L., Leal, N., Rattes, P. C., & Ahmad, S. (2010). Mapa dos teatros de Salvador. Recuperado de http://www.cult.ufba.br/arquivos/mapa_teatros_salvador.pdf
http://www.cult.ufba.br/arquivos/mapa_te...
; Kosmala, 2007Kosmala, K. (2007). The identity paradox: reflections on fluid identity of female artist. Culture and Organization, 13(1), 37-53.), tensões entre amadorismo e profissionalismo na gestão de carreiras criativas (Bendassolli & Wood, 2010Bendassolli, P. F., & Wood, T. J. (2010). O paradoxo de Mozart: carreiras nas indústrias criativas. Organizações & Sociedade, 17(53), 259-277.), tensões entre criação e mercado nas organizações (Lampel et al., 2009Lampel, J., Lant, T., & Shamsie, J. (2009). Equilíbrio em cena: o que aprender com as práticas organizacionais das indústrias culturais. Revista de Administração de Empresas, 19(1), 19-26.; Davel & Vianna, 2012Davel, E., & Vianna, L. G. L. (2012). Gestão-criação: processos indissociáveis nas práticas de um teatro baiano. Revista de Administração Pública, 46(4), 1081-1099.) e tensões ligadas à promoção da diversidade cultural (Alves, 2009Alves, A. (2009). Identidade e diversidade cultural: paradoxos e articulações para uma política pública (Dissertação de Mestrado). Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Minas Gerais/ MG,.). Por ser ainda incipiente, a produção acadêmica carece de novos esforços que aprofundem o que as pesquisas atuais apenas apontam ou insinuam.

Tipos de Paradoxos

Os paradoxos podem aparecer em 4 grandes grupos (Smith & Lewis, 2011Smith, W. K., & Lewis, M. W. (2011). Toward a theory of paradox: a dynamic equilibrium model of organizing. Academy of Management Review, 36(2), 381-403.): de aprendizagem - relativos ao conhecimento organizacional em torno de tensões como estabilidade versus mudança -, de organização - relacionados com os processos organizacionais, envolvendo tensões como colaboração versus controle -, de desempenho - ligados aos objetivos organizacionais, como financeiros versus sociais - e de pertencimento - referentes às dinâmicas identitárias, como indivíduo versus coletivo. A produção acadêmica sobre organizações culturais não aponta tipologias sistematizadas, mas sinaliza polaridades próprias desse campo, como (Lampel et al., 2009Lampel, J., Lant, T., & Shamsie, J. (2009). Equilíbrio em cena: o que aprender com as práticas organizacionais das indústrias culturais. Revista de Administração de Empresas, 19(1), 19-26.):

  • valores artísticos versus entretenimento de massa, que representa a luta dessas organizações por se manterem fiéis aos seus valores artísticos ao mesmo tempo que conseguem viabilizar economicamente suas atividades no mercado;

  • diferenciação de produtos versus inovação de mercado, que representa lidar com o fato de os consumidores de seus bens desejarem ser surpreendidos, mas sem perder contato com um universo simbólico reconhecível;

  • análise de demanda versus construção de mercado, que se relaciona com as tensões ligadas ao consumo cultural e sua imprevisibilidade diante do fato de esse estar imerso num sistema de valores muito amplo e difícil de prever ou controlar;

  • integração vertical versus especialização flexível, que diz respeito às tensões entre expansão de atividades e competências organizacionais ou especialização;

  • inspiração individual versus sistemas criativos, tensão entre a ideia de um gênio criativo e a concepção da criatividade como um fenômeno social.

Para além da tentativa de limitar o entendimento dos paradoxos ao enquadrá-los compulsoriamente em categorizações preexistentes, essas proposições buscam ajudar a aguçar a percepção dos pesquisadores quanto à diversidade de contradições que se apresenta no dia a dia de gestão das organizações culturais.

Gestão de Paradoxos

Os paradoxos acionam nos gestores um instinto de busca de resolução. Esse mecanismo instintivo emerge da ideia do paradoxo como disfunção organizacional. Contudo, um olhar mais atento identificará que a realidade é, por si, paradoxal. Desse modo, as organizações são intrinsecamente paradoxais. Os paradoxos são inerentes e subjacentes às práticas cotidianas de gestão, e não uma exceção que possa ser evitada ou aniquilada (Clegg et al., 2002Clegg, S. R., Cunha, J. V., & Pina, M. (2002). Management paradoxes: a relational view. Human Relations, 55(5), 483-503.). Nem anomalia nem ferramenta de gestão: os paradoxos são mais bem integrados à dinâmica organizacional quando entendidos como processos constituintes da organização e da gestão, na qual estão entranhados e da qual não podem ser removidos (Rego & Cunha, 2020Rego, A., & Cunha, M. P. (2020). Paradoxos da liderança: gerir contradições, dilemas e tensões da vida organizacional. Lisboa, Portugal: Edições Sílabo.).

Num primeiro impulso, a ideia de gerir um paradoxo pode parecer o mesmo que resolvê-lo. Esse impulso parte da percepção de que paradoxos são problemas e de que uma abordagem racional dá conta de solvê-los. Contudo, quando entendemos paradoxos como oportunidades, as pesquisas trazem algumas aprendizagens. Os estudos mais contemporâneos convidam os gestores a encarar os paradoxos como potencialidades, e não como problemas (Schad et al., 2016Schad, J., Lewis, M., Raisch, S., & Smith, W. (2016). Paradox research in management science: looking back to move forward. Academy of Management Annals, 10(1), 5-64.). Para enfrentá-los, gestores são convidados a evitar escolhas do tipo “ou isso ou aquilo” e a privilegiar uma postura do tipo “e também”.

Outro caminho para pensar a gestão de paradoxos é buscar se distanciar de uma lógica calculista e cognitiva, encarando-a como uma oportunidade de ação mais vocacionada ao jogo ou à brincadeira. Ou seja, uma postura gerencial focada no desejo e na emoção, na recriação de regras baseada na criatividade, na exploração de multiplicidade de sentidos e no desafio às barreiras comportamentais usuais (Beech et al., 2004Beech, N., Burns, H., Caestecker, L., Macintosh, R., & Maclean, D. (2004). Paradox as invitation to act problematic change situations. Human Relations, 57(10), 1313-1332.). De acordo com Poole e Ven (1989Poole, M. S., & Ven, A. H. Van. (1989). Using paradox to build management and organization theories. Academy of Management Review, 14(4), 562-578.), os gestores podem adotar diferentes posturas para gerir paradoxos: aceitação - a organização aceita ou instiga a existência de opostos -, separação no tempo - a organização foca um polo de cada vez -, separação no espaço - a organização coloca processos opostos em espaços distintos - e síntese - a organização busca combinar criativamente os polos, transcendendo-os.

Alguns riscos permeiam o processo de gestão dos paradoxos, como se fixar num dos polos - a organização se sente mais confortável com um polo e acaba por esquecer ou negligenciar o outro. Outros riscos se referem ao processo de gerar movimentos oscilatórios - a organização alterna a atenção ora a um polo, ora ao outro - e de empacar no meio - a organização se compromete com soluções que não abordam satisfatoriamente nenhum dos polos (Rego & Cunha, 2020Rego, A., & Cunha, M. P. (2020). Paradoxos da liderança: gerir contradições, dilemas e tensões da vida organizacional. Lisboa, Portugal: Edições Sílabo.). Ao lidar com os riscos, uma gestão orientada ao paradoxo permite melhor compreendê-los, buscando abarcar a complexidade da dinâmica organizacional, e não a reduzi-la a simplificações. Desse modo, considera plenamente a inter-relação e interdependência entre polos opostos, propondo uma abordagem sinérgica ou holística que aposte não na resolubilidade, e sim na compreensão da interdependência desses polos como chave para práticas mais condizentes com os desafios cotidianos.

Paradoxos como Processo

Os paradoxos são persistentes no tempo, mas também emergentes (Farjoun, 2018Farjoun, M. (2018). Contradictions dialetics and paradoxes. In A. Langley, & H. Tsoukas (Ed.), The sage handbook of process organization studies. London, UK: Sage Publications.). Eles se transformam, se reconfiguram e não cessam. A condição latente, recursiva e, por vezes, cíclica da tensão provocada pelo paradoxo ocasiona uma dinâmica constante que pode alternar momentos de acirramento e de síntese temporária, dependendo da conjuntura específica. Eles podem passar períodos de saliência, em que são mais evidentes, e de latência, em que não estão num estado ativo de contradição e, portanto, são menos fáceis de observar.

Adormecidos, despercebidos ou ignorados, os paradoxos podem mudar de um estado para outro em momentos diferentes ou em diferentes partes de uma organização ou sistema (Jarzabkowski, Bednarek, & Lê, 2018Jarzabkowski, P., Bednarek, R., & Lê, J. K. (2018). Studying paradox as process and practice identifying and following moments of salience and latency. In M. Farjoun, W. Smith, A. Langley& H. Tsoukas(Ed.), Dualities, dialectics, and paradoxes in organizational life. Oxford, UK: Oxford University Press.). Assim, paradoxos organizacionais oferecem um ponto de partida fértil para o estudo dos processos organizacionais (Farjoun, 2018Farjoun, M. (2018). Contradictions dialetics and paradoxes. In A. Langley, & H. Tsoukas (Ed.), The sage handbook of process organization studies. London, UK: Sage Publications.), tendo em vista que sua condição fundamentalmente temporal (persistência no tempo) e experiencial (condição ativa) cria pontes entre o estudo dos paradoxos e o de processo no campo das pesquisas organizacionais (Langley & Tsoukas, 2017Langley, A., & Tsoukas, H. (2017). The sage handbook of process organization studies. London, UK: Sage Publications.).

GESTÃO CULTURAL COMO PROCESSO PARADOXAL: UMA PROPOSTA DE AGENDA DE PESQUISA

Apreendida como processo, a gestão de organizações culturais pode ser entendida de forma mais holística e plena, pois privilegia uma visão baseada na temporalidade e na emergência do fluxo da gestão. Tributários de tradições filosóficas metafísicas, as pesquisas sobre processo animam os estudos organizacionais e abordam as organizações pela óptica da mudança e da transformação ocasionadas pelo tempo e por sua sucessão de acontecimentos (Langley & Tsoukas, 2017Langley, A., & Tsoukas, H. (2017). The sage handbook of process organization studies. London, UK: Sage Publications.). O enfoque no processo de gestão pode abrir caminhos para conhecermos melhor o âmbito da prática organizacional das organizações culturais, já que a maioria dos estudos se concentram nos âmbitos técnico-operacional e político. Além disso, esse enfoque processual pode oferecer um elo de integração entre esses dois âmbitos e proporcionar uma visão mais holística e integrada da gestão, explicitando como esses âmbitos se articulam mutualmente.

O paradoxo é uma chave interpretativa central para a compreensão processual da organização cultural com base em suas singularidades: hipersensibilidade, hipertensão e hiperincerteza. Ao concebermos a gestão de organizações culturais como um processo paradoxal, estabelecemos horizontes promissores para a pesquisa futura. Essa concepção permite aos pesquisadores focar no que torna a organização cultural singular e, com isso, contribuir tanto para uma melhor compreensão quanto para a prática dessas organizações. Assim, o enfoque nos paradoxos ajuda a identificar e compreender alguns conjuntos de situações paradoxais que marcam tais organizações, promovendo avanços na sua teorização e nas suas práticas de gestão.

Por exemplo, podemos destacar 3 tipos de paradoxos que aparecem em abundância no contexto das organizações culturais: criatividade, identidade e autonomia. Os primeiros se relacionam com a tensão fundamental entre o simbólico e o econômico, a qual se expressa nos conflitos entre autenticidade artística e alcance de público e de mercado (Davel & Vianna, 2012Davel, E., & Vianna, L. G. L. (2012). Gestão-criação: processos indissociáveis nas práticas de um teatro baiano. Revista de Administração Pública, 46(4), 1081-1099.; Greffe, 2015Greffe, X. (2015). A economia artisticamente criativa. São Paulo, SP: Iluminuras e Itaú Cultural.; Parush & Koivunen, 2014Parush, T., & Koivunen, N. (2014). Paradoxes, double binds, and the construction of ‘creative’ managerial selves in art-based leadership development. Scandinavian Journal of Management, 30(1), 104-113.). Os segundos englobam tensões ligadas tanto ao processo de criação quanto ao de geração de valor simbólico e identificação próprios da cultura em sua relação com a identidade (Alves, 2009Alves, A. (2009). Identidade e diversidade cultural: paradoxos e articulações para uma política pública (Dissertação de Mestrado). Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Minas Gerais/ MG,.; Bendassolli, & Wood, 2010Bendassolli, P. F., & Wood, T. J. (2010). O paradoxo de Mozart: carreiras nas indústrias criativas. Organizações & Sociedade, 17(53), 259-277.; Gotsi et al., 2010Gotsi, M., Andriopoulos, C., Lewis, M. W., & Ingram, A. E. (2010). Managing creatives: paradoxical approaches to identity regulation. Human Relations, 63(6), 781-805.; Kosmala, 2007Kosmala, K. (2007). The identity paradox: reflections on fluid identity of female artist. Culture and Organization, 13(1), 37-53.). Tradição e inovação, diversidade e uniformidade, autenticidade e apropriação cultural, purismo e hibridismos estão em jogo aqui. Por último, paradoxos de autonomia englobam a tensão entre controle e colaboração, centralização e descentralização (Defillippi & Arthur, 1998Defillippi, R. J., & Arthur, M. B. (1989). Paradox in projetc-based enterprise: the case of film making. California Management Review, 40(2), 125-139.; Defillippi et al., 2007; Hoffmann & Dellagnelo, 2009Hoffmann, S., & Dellagnelo, E. (2009). Teatro: a configuração estrutural de grupos teatrais. In T. J. Wood, P. F. Bendassolli, C. Kirschbaum, & M. P. Cunha (Eds.), Indústrias criativas no Brasil. São Paulo, SP: Ed. Atlas.). Hierarquização e liberdade, formalização e informalidade, arranjos efêmeros e burocratização, criação coletiva e gêneros criados são as tensões postas aqui.

Outros direcionamentos de pesquisa são possíveis. Por exemplo, estudar de forma mais detalhada como os paradoxos se manifestam no contexto de organizações com linguagens artríticas específicas, como teatro, música, dança, cinema etc., pode revelar novas compreensões sobre o papel dos paradoxos como chave conceitual para explicar a dinâmica de gestão das organizações culturais. Outro caminho possível é estudar os paradoxos não apenas na dimensão intraorganizacional, mas também interorganizacional. Compreender o impacto dos paradoxos nas relações entre as organizações culturais pode dar pistas, por exemplo, sobre como fortalecer projetos, redes e arranjos de cooperação entre organizações.

Tendo em vista que um dos grandes desafios do gestor de organizações culturais é a promoção do equilíbrio com vistas a criar mercado, construir alianças entre criador e gestor, bem como criar e manter reputação (Khaire, 2017Khaire, M. (2017). Culture and commerce: the value of entrepreneurship in creative industries. Stanford, CA: Stanford University Press.), outra agenda de pesquisa prioritária é entender como os paradoxos são geridos nas organizações culturais. Uma forma promissora de gerir paradoxos consiste em desenvolver uma mentalidade paradoxal (Liu, Xu, & Zhang, 2020Liu, Y., Xu, S., & Zhang, B. (2020). Thriving at work: how a paradox mindset influences innovative work behavior. The Journal of Applied Behavioral Science, 56(3), 347-366.; Miron-Spektor et al., 2017Miron-Spektor, E., Ingram, A., Keller, J., Smith, W., & Lewis, M. (2017). Microfoundations of organizational paradox: paradox mindset, limited resources and tensions. Academy of Management Annual Meeting Proceedings, 61(1), 1-50.), que corresponde a tomar as tensões e seu contexto cheio de incertezas como um processo inerente às organizações. A mentalidade paradoxal permite reconhecer oportunidades, para o desenvolvimento do potencial criativo e inovador ou para uma melhor integração dos multiníveis - individual, organizacional e societal -, que compõem a prática organizacional. Diante disso, pesquisas futuras poderão investigar como se pode desenvolver esse tipo de mentalidade nas organizações culturais e quais seriam seus impactos.

DISCUSSÃO E CONCLUSÃO

Com base numa revisão crítica de uma extensa produção acadêmica voltada à gestão de organizações culturais, nossa pesquisa demonstrou que, entre o pragmatismo pouco crítico da visão técnico-operacional e a abrangência pouco operacionalizável da visão política, se fazem necessários avanços teóricos que lancem uma visão articulada e multinível aos processos de gestão nas organizações culturais. Outra necessidade é a contemplação das singularidades dessas organizações - hipersensibilidade, hipertensão e hiperincerteza - na escolha de aportes teóricos efetivamente adequados ao estudo do campo. Para avançar a pesquisa sobre organizações culturais e sua gestão, precisamos considerar melhor a preponderância da dimensão simbólica como elemento característico, a atmosfera de imprevisibilidade que marca seu cotidiano de gestão e, sobretudo, o contraste entre as dimensões simbólica e econômica. Assim, as tensões permanentes e estruturantes entre arte-comércio engendram um composto de tensões de dotam a gestão de organizações culturais de um caráter profundamente paradoxal.

Os resultados desta pesquisa buscam gerar 2 tipos de contribuições para o avanço dos estudos futuros no campo da gestão de organizações culturais. O primeiro é de caráter teórico, ao destacar que organizações culturais constituem um campo promissor para a aplicação da teoria de processos e paradoxos, oriundos dos estudos organizacionais. Ou seja, estudar processos e paradoxos nesse contexto organizacional específico pode gerar novos conhecimentos para os estudos organizacionais. Além disso, esse enfoque processual e paradoxal pode contribuir para pavimentar uma base teórica-conceitual mais coerente e adequada para captar e considerar complexidades e especificidades das organizações culturais. Por consequência, contribuímos para o avanço mais consolidado do campo de pesquisa voltado às organizações culturais e sua gestão.

O segundo tipo de contribuição é de caráter socioprático. Entendemos que dar visibilidade e inteligibilidade às singularidades do contexto organizacional das organizações culturais ajuda educadores a melhor integrar esse conteúdo em suas formações e, com isso, melhorar a formação de gestores culturais. Seja pela formação, seja pelo contato com o conhecimento deste artigo, entendemos que gestores culturais poderão melhor apreender e qualificar sua ação. Uma melhor compreensão acerca dos paradoxos inerentes ao seu campo de prática lhes proporcionará uma consciência e consistência aprimorada quanto às dinâmicas que envolvem suas organizações, reforçando sua capacidade de gestão.

REFERÊNCIAS

  • Adorno, T., & Horkheimer, M. (1985). A dialética do esclarecimento Rio de Janeiro, RJ: Zahar.
  • Alves, A. (2009). Identidade e diversidade cultural: paradoxos e articulações para uma política pública (Dissertação de Mestrado). Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Minas Gerais/ MG,.
  • Araújo, B., Davel, E., & Rentschler, R. (2020). Aesthetic consumption in managing art-driven organizations: an autoethnographic inquiry. Organizational Aesthetics, 9(3), 63-84.
  • Avelar, R. (2010). O avesso da cena: notas sobre produção e gestão cultural São Paulo, SP: DUO Editorial.
  • Barros, J. M., & Kauark, G. (2011). Diversidade cultural e desigualdade de trocas: participação, comércio e comunicação São Paulo, SP: Itaú Cultural, Observatório da Diversidade Cultural.
  • Barros, J. M., & Oliveira, J. Jr. (2011). Pensar e agir com a cultura: desafios da gestão cultural Belo Horizonte, MG: Observatório da Diversidade Cultural.
  • Bassett-Jones, N. (2015). The paradox of diversity management, creativity and innovation. Creativity and Innovation Management, 14(2), 169-175.
  • Bauman, Z. (2012). Ensaios sobre o conceito de cultura Rio de Janeiro, RJ: Zahar .
  • Beech, N., Burns, H., Caestecker, L., Macintosh, R., & Maclean, D. (2004). Paradox as invitation to act problematic change situations. Human Relations, 57(10), 1313-1332.
  • Bendassolli, P. F., & Wood, T. J. (2010). O paradoxo de Mozart: carreiras nas indústrias criativas. Organizações & Sociedade, 17(53), 259-277.
  • Benjamin, W. (1985). Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura São Paulo, SP: Brasiliense.
  • Botelho, I. (2000). Romance de formação: Funarte e política cultural (1976-1990) Rio de Janeiro, RJ: Edições Casa de Rui Barbosa.
  • Botelho, I. (2003). Os equipamentos culturais na cidade de São Paulo: um desafio para a gestão pública. São Paulo em Perspectiva, 15(2), 73-83.
  • Botelho, I. (2016). Dimensões da cultura: políticas culturais e seus desafios São Paulo, SP: Edições Sesc.
  • Botti, S. (2000). What role for marketing in the arts? An analysis of arts consumption and artistic value. International Journal of Arts Management, 2(3), 14-27.
  • Bourdieu, P. (2011). A economia das trocas simbólicas São Paulo, SP: Perspectiva.
  • Boylan, P. (2004). Como gerir um museu: manual prático Paris, France: Icom.
  • Brant, L. (2009). O poder da cultura São Paulo, SP: Peirópolis.
  • Brindle, M., & DeVereaux, C. (2011). The arts management handbook: new directions for students and practitioners London, UK: Routledge.
  • Brooks, A., & Kushner, R. (2001). Cultural districts and urban development. International Journal of Arts Management, 3(2), 4-15.
  • Byrnes, W. J. (2003). Management and the arts Burlington, NJ: Elsevier.
  • Calabre, L. (2009). Políticas culturais no Brasil: dos anos 1930 ao século XXI Rio de Janeiro, RJ: FGV.
  • Canclini, N. G. (2003). Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da modernidade São Paulo, SP: Edusp.
  • Cândido, M. M. D. (2013). Gestão de museus, um desafio contemporâneo: diagnóstico museológico e planejamento Porto Alegre, RS: Medianiz.
  • Caves, R. (2000). Creative industries: contracts between art and commerce Cambridge, UK: Harvard University Press.
  • Cezário, H. B. M., & Davel, E. (2018). A mobilização museológica técnica na gestão de museus comunitários: a força da participação comunitária e da identidade territorial. Revista Eletrônica Gestão e Sociedade, 12(32), 2392-2422.
  • Chong, D. (2002). Arts management London, UK: Routledge.
  • Clegg, S. R., Cunha, J. V., & Pina, M. (2002). Management paradoxes: a relational view. Human Relations, 55(5), 483-503.
  • Coelho, T. (1989). O que é ação cultural São Paulo, SP: Iluminuras.
  • Coelho, T. (2014). Dicionário crítico de política cultural São Paulo, SP: Iluminuras.
  • Cohn, S., Luz, A., Ferron, M. F., Herencia, L. J., & Savazoni, R. (2007). Produção cultural no Brasil Rio de Janeiro, RJ: Beco do Azougue.
  • Colbari, A. (2014). A análise de conteúdo e a pesquisa empírica qualitativa. In E. M. Souza(Ed.), Metodologias e analíticas qualitativas em pesquisa organizacional Vitória, ES: Edufes.
  • Cunha, L. (2019). A publicização da Orquestra Sinfônica da Bahia (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal da Bahia, Salvador, BA.
  • Cunha, M., & Putnam, L. (2019). Paradox theory and the paradox of success. Strategic Organization, 17(1), 95-106.
  • Cunha, M. H. (2007). Gestão cultural: profissão em formação Belo Horizonte, MG: DUO Editorial.
  • Daigle, P., & Rouleau, L. (2010). Strategic plans in arts organizations: a tool of compromise between artistic and managerial values. International Journal of Arts Management, 12(3), 13-30.
  • Davel, E., & Vianna, L. G. L. (2012). Gestão-criação: processos indissociáveis nas práticas de um teatro baiano. Revista de Administração Pública, 46(4), 1081-1099.
  • Defillippi, R. J., & Arthur, M. B. (1989). Paradox in projetc-based enterprise: the case of film making. California Management Review, 40(2), 125-139.
  • Defillippi, R. J., Grabher, G., & Jones, C. (2007). Introduction to paradoxes of creativity: managerial and organizational challenges in the cultural economy. Journal of Organizational Behavior, 28, 511-521.
  • Dines, Y. (2012). Cidadelas da cultura no lazer: uma reflexão em antropologia da imagem sobre o Sesc São Paulo São Paulo, SP: Sesc.
  • Eikhof, D. R., & Haunschild, A. (2007). For art’s sake! Artistic and economic logics in creative production. Journal of Organizational Behavior, 28(5), 523-538.
  • Eisenhardt, K. M. (2000). Paradox, spirals, ambivalence: the new language of change and pluralism. The Academy of Management Review, 25(4), 703-705.
  • Farjoun, M. (2018). Contradictions dialetics and paradoxes. In A. Langley, & H. Tsoukas (Ed.), The sage handbook of process organization studies London, UK: Sage Publications.
  • Fiol, M. (2002). Capitalizing on paradox: the role of language in transforming organizational identities. Organization Science, 13(6), 653-666.
  • Fopp, M. A. (1997). Managing museums and galleries London, UK: Routledge.
  • Gadelha, R. (2015). Produção cultural: conformações, configurações e paradoxos Fortaleza, CE: Armazém da Cultura.
  • Gotsi, M., Andriopoulos, C., Lewis, M. W., & Ingram, A. E. (2010). Managing creatives: paradoxical approaches to identity regulation. Human Relations, 63(6), 781-805.
  • Greffe, X. (2013). Arte e mercado São Paulo, SP: Iluminuras e Itaú Cultural.
  • Greffe, X. (2015). A economia artisticamente criativa São Paulo, SP: Iluminuras e Itaú Cultural.
  • Hall, S. (2014). A identidade cultural na pós-modernidade Rio de Janeiro, RJ: Lamparina.
  • Hauser, A. (2003). História social da arte e da literatura São Paulo, SP: Martins Fontes.
  • Hirsch, P. M. (1972). Processing fads and fashions: an organization-set analysis of cultural industry systems. The American Journal of Sociology, 77(4), 639-659.
  • Hoffmann, S., & Dellagnelo, E. (2009). Teatro: a configuração estrutural de grupos teatrais. In T. J. Wood, P. F. Bendassolli, C. Kirschbaum, & M. P. Cunha (Eds.), Indústrias criativas no Brasil São Paulo, SP: Ed. Atlas.
  • Jarzabkowski, P., Bednarek, R., & Lê, J. K. (2018). Studying paradox as process and practice identifying and following moments of salience and latency. In M. Farjoun, W. Smith, A. Langley& H. Tsoukas(Ed.), Dualities, dialectics, and paradoxes in organizational life Oxford, UK: Oxford University Press.
  • Jones, C., & Defillippi, J. (1996). Back to the future in film: combining industry and self-knowledge to meet the career challenges of the 21st century. Academy of Management Executive, 10(4), 89-103.
  • Jones, C., Lorenzen, M., & Sapsed, J. (2015). Creative industries: a typology of change. In C. Jones, M. Lorenzen, & J. Sapsed (Eds.), Oxford handbook creative industries Oxford, UK: Oxford University Press.
  • Kauark, G., Rattes, P., & Leal, N. (2019). Um lugar para os equipamentos culturais Salvador, BA: Edufba.
  • Keller, J., Wong, S. S., & Liou, S. (2020). How social networks facilitate collective responses to organizational paradoxes. Human Relations, 73(3), 401-428.
  • Khaire, M. (2017). Culture and commerce: the value of entrepreneurship in creative industries Stanford, CA: Stanford University Press.
  • Kosmala, K. (2007). The identity paradox: reflections on fluid identity of female artist. Culture and Organization, 13(1), 37-53.
  • Lampel, J., Lant, T., & Shamsie, J. (2009). Equilíbrio em cena: o que aprender com as práticas organizacionais das indústrias culturais. Revista de Administração de Empresas, 19(1), 19-26.
  • Langley, A., & Tsoukas, H. (2017). The sage handbook of process organization studies London, UK: Sage Publications.
  • Lapierre, L. (2001). Leadership and arts management. International Journal of Arts Management, 3(3), 4-12.
  • Laraia, R. B. (2006). Cultura: um conceito antropológico Rio de Janeiro, RJ: Zahar.
  • Lawrence, T. B., & Phillips, N. (2002). Understanding cultural industries. Journal of Management Inquiry, 11(4), 430-441.
  • Leal, N. (2018). O Teatro Castro Alves: da gestão à visão dos produtores culturais (Dissertação de Mestrado). Universidade Federal da Bahia, Salvador, BA.
  • Leitão, C. S., & Guilherme, L. L. (2014). Cultura em movimento: memórias e reflexões sobre políticas públicas e práticas de gestão Fortaleza, CE: Armazém da Cultura.
  • Lewis, M. W. (2000). Exploring paradox: toward a more comprehensive guide. Academy of Management Review, 25(4), 760-776.
  • Lin, L., & Lee, T. (2014). Symbolic goods social network experience marketing publishing industry performing arts symbolic economy and creative management: cultural and creative industries urging for new approaches. ENCATC - Journal of Cultural Management and Policy, 4(1), 58-67.
  • Liu, Y., Xu, S., & Zhang, B. (2020). Thriving at work: how a paradox mindset influences innovative work behavior. The Journal of Applied Behavioral Science, 56(3), 347-366.
  • Lord, B., & Lord, G. D. (2005). Manual de gestión de museos Barcelona, España: Ariel.
  • Luonila, M., & Johansson, T. (2016). Reasons for networking in institutionalized music productions: case studies of an Opera House and a Music Festival. International Journal of Arts Management, 18(3), 50-66.
  • Lüscher, L., & Lewis, M. (2008). Organizational change and managerial sensemaking: working through paradox. Academy of Management Journal, 51(2), 221-240.
  • Malagodi, M. E., & Cesnik, F. S. (2000). Projetos culturais: elaboração, administração, aspectos legais e busca de patrocínio São Paulo, SP: Escrituras.
  • Marins, S. R., & Davel, E. P. B. (2020). Empreendedorismo cultural e artístico: veredas da pesquisa acadêmica. Pensamento Contemporâneo em Administração, 14(4), 115-140.
  • Medeiros, A., Alves, M., & Farah, M. (2015). Programa Cultura Viva e o campo organizacional da cultura: análise de políticas públicas pela perspectiva institucionalista. Revista de Administração Pública, 49(5), 1215-1235
  • Menger, P. M. (2014). The economics of creativity: art and achievement under uncertainty Cambridge, MA: Harvard University Press.
  • Michaud, V. (2013). Mediating the paradoxes of organizational governance through numbers. Organization Studies, 35(1), 75-101.
  • Milanesi, L. (1991). A casa da invenção São Paulo, SP: Edições Siciliano.
  • Miron-Spektor, E., Ingram, A., Keller, J., Smith, W., & Lewis, M. (2017). Microfoundations of organizational paradox: paradox mindset, limited resources and tensions. Academy of Management Annual Meeting Proceedings, 61(1), 1-50.
  • Nussbaumer, G., & Rattes, P. C. (2005). Equipamentos culturais de Salvador: públicos, políticas e mercados Recuperado de http://www.gepicc.ufba.br/enlepicc/pdf/GiseleNussbaumer.pdf
    » http://www.gepicc.ufba.br/enlepicc/pdf/GiseleNussbaumer.pdf
  • Nussbaumer. G., Vinhas, J. V., Lins, L., Leal, N., Rattes, P. C., & Ahmad, S. (2010). Mapa dos teatros de Salvador Recuperado de http://www.cult.ufba.br/arquivos/mapa_teatros_salvador.pdf
    » http://www.cult.ufba.br/arquivos/mapa_teatros_salvador.pdf
  • O’Connor, E. S. (1995). Paradoxes of participation: textual analysis and organizational change. Organization Studies, 16(5), 769-803.
  • Olivieri, C., & Natale, E. (2016). Guia brasileiro de produção cultura: ações que transformam a cidade São Paulo, SP: Edições Sesc.
  • Parush, T., & Koivunen, N. (2014). Paradoxes, double binds, and the construction of ‘creative’ managerial selves in art-based leadership development. Scandinavian Journal of Management, 30(1), 104-113.
  • Peltoniemi, M. (2015). Cultural industries: product-market characteristics, management challenges and industry dynamics. British Academy of Management, 17(1), 41-68.
  • Poole, M. S., & Ven, A. H. Van. (1989). Using paradox to build management and organization theories. Academy of Management Review, 14(4), 562-578.
  • Putnam, L., Fairhust, G. T., & Banghart, S. (2016). Contradictions, dialectics, and paradoxes in organizations: a constitutive approach. Academy of Management Annals, 10(1), 65-171.
  • Radbourne, J. (2002). Social intervention or market intervention? A problem for governments in promoting the value of the arts. International Journal of Arts Management, 5(1), 50-61.
  • Radbourne, J., & Fraser, M. (1996). Arts management: a practical guide St Leonards, Australia: Allen & Unwin.
  • Rego, A., & Cunha, M. P. (2020). Paradoxos da liderança: gerir contradições, dilemas e tensões da vida organizacional Lisboa, Portugal: Edições Sílabo.
  • Rubim, A. (2007). Políticas culturais no Brasil: tristes tradições. Revista Galáxia, 13, 101-113.
  • Rubim, A., & Barbalho, A. (2007). Políticas culturais no Brasil Salvador, BA: Edufba.
  • Rubim, A., & Rocha, R. (2010). Políticas culturais para as cidades Salvador, BA: Edufba .
  • Rubim, A., & Rohde, B. (2008). Políticas culturais na Bahia: governo Jaques Wagner - 2007 Salvador, BA: Edufba .
  • Rubim, L. (2005). Produção cultural. In L. Rubim (Org.), Organização e produção da cultura Salvador, BA: Edufba .
  • Santos, F. P., & Davel, E. (2018). Gestão de equipamentos culturais com base na identidade territorial. Revista Gestão & Conexões, 7(2), 7-42.
  • Sarkovas, Y. (1998). Manual de estratégias para captação de patrocínios São Paulo, SP: Revista Marketing Cultural.
  • Schad, J., Lewis, M., Raisch, S., & Smith, W. (2016). Paradox research in management science: looking back to move forward. Academy of Management Annals, 10(1), 5-64.
  • Serapião, F. (2012). Centro Cultural São Paulo: espaço e vida São Paulo, SP: Monolito.
  • Smith, W. K., & Lewis, M. W. (2011). Toward a theory of paradox: a dynamic equilibrium model of organizing. Academy of Management Review, 36(2), 381-403.
  • Souza, M. M. P., & Carrieri, A. P. (2013). A arte de (sobre)viver coletivamente: estudando a identidade do Grupo Galpão. Revista de Administração, 48(1), 7-20.
  • Streatfield, P. J. (2001). The paradox of control in organizations London, UK: Routledge.
  • Stierand, M., Boje, D., Vlad, G., Dorfler, V., & Feuls, M. (2019). Paradoxes of creativity: examining the creative process through an antenarrative lens. Journal of Creative Behavior, 53(2), 165-170.
  • Storey, J., & Salaman, G. (2009). Managerial dilemmas: exploiting paradox of strategic leadership West Sussex, UK: John Wiley Editorial.
  • Thiry-Cherques, H. R. (2006). Projetos culturais: técnicas de modelagem Rio de Janeiro, RJ: FGV.
  • Throsby, D. (2001). Economics and culture Cambridge, UK: Cambridge University Press.
  • Townley, B., & Beech, N. (2010). Managing creativity: exploring the paradox Cambridge, UK: Cambridge University Press .
  • Trevelyan, R. (2001). The paradox of autonomy: a case of academic research scientists. Human Relations, 54(4), 495-525.
  • Turbide, J., & Hoskin, K. (1999). Managing non-profit arts organizations through management accounting systems: mission possible? International Journal of Arts Management, 1(2), 68-81.
  • Turbide, J., & Laurin, C. (2009). Performance measurement in the arts sector: the case of the performing arts. International Journal of Arts Management, 11(2), 56-70.
  • Valiati, L., Miguez, P., Cauzi, C., & Silva, P. (2017). Economia criativa e da cultura: conceitos, modelos teóricos e estratégias metodológicas. In L. Valiati, & A. L. N. Fialho(Orgs.), Atlas econômico da cultura brasileira: metodologia I Porto Alegre, RS: Editora da UFRGS.
  • Vasconcelos, I. F. G., Mascarenhas, A., & Vasconcelos, F. C. (2006). Gestão do paradoxo “passado versus futuro”: uma visão transformacional da gestão de pessoas. RAE-eletrônica, 5(1), 1-25.
  • Weinstein, L., & Bukovinsky, D. (2009). Use of the balanced scorecard and performance metrics to achieve operational and strategic alignment in arts and culture not-for-profits. International Journal of Arts Management, 11(2), 42-55.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Mar 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Feb 2022

Histórico

  • Recebido
    01 Out 2020
  • Aceito
    25 Out 2021
Fundação Getulio Vargas, Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas Rua Jornalista Orlando Dantas, 30 - sala 107, 22231-010 Rio de Janeiro/RJ Brasil, Tel.: (21) 3083-2731 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernosebape@fgv.br