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Plataformização da pele? Tatuagens biométricas, dataísmo e a datificação do consumidor

¿Plataformización de la piel? Tatuajes biométricos, dataísmo y datificación del consumidor

Resumo

Este ensaio teórico parte da possibilidade da plataformização da pele pelo uso de tatuagens biométricas a fim de analisar os riscos iminentes do consumo de wearables e de seu marketing biopolítico no contexto do capitalismo comunicativo. Aborda-se o tema sob uma perspectiva crítica que vai além da retórica de marketing que foca no aperfeiçoamento individual e no cuidado de si mediante a datificação do consumidor. Objetiva-se, com isso, superar a opacidade dos sistemas tecnológicos associados às tecnologias de comunicação e informação. Discute-se sobre os desdobramentos do marketing biopolítico ligado ao consumo de wearables, como a formação de perfis, informados por uma governamentalidade baseada na crença do dataísmo, que fomenta mercados de verdade objetiva com base na captação de análise de uma quantidade massiva de dados (big data), captados pelas plataformas e por wearables. Conclui-se que o consumo de wearables relacionados com a plataformização da economia, a datificação e o dataísmo oferece riscos à privacidade e à democracia, sobretudo em contextos como o pandêmico, no qual a dependência das tecnologias de comunicação e informação se evidencia.

Palavras-chave:
Plataformização; Tatuagens biométricas; Datificação; Dataísmo; Marketing biopolítico

Resumen

Este ensayo teórico parte de la posibilidad de la plataformización de la piel mediante el uso de tatuajes biométricos para analizar los riesgos inminentes del consumo de wearables y su marketing biopolítico en el contexto del capitalismo comunicativo. El tema se aborda desde una perspectiva crítica que va más allá de la retórica del marketing que se centra en la mejora individual y el autocuidado a través de la datificación del consumidor. El objetivo es superar la opacidad de los sistemas tecnológicos asociados a las tecnologías de la información y la comunicación. Discute las consecuencias del marketing biopolítico asociado al consumo de wearables, como la formación de perfiles, informados por una gubernamentalidad basada en la creencia del dataísmo, que fomenta mercados de verdad objetiva con base en la captura o análisis de una cantidad masiva de datos (big data), capturados por plataformas y wearables. Luego se concluye que el consumo de wearables asociados a la plataformización de la economía, datificación y dataísmo plantea riesgos para la privacidad y la democracia, especialmente en contextos como el de la pandemia, en el que la dependencia de las tecnologías de la información y la comunicación es evidente.

Palabras clave:
Plataformización; Tatuajes biométricos; Datificación; Dataísmo; Marketing biopolítico

Abstract

This theoretical essay starts from the possibility of the platformization of the skin through the use of biometric tattoos to analyze the imminent risks posed by consumer wearables and their biopolitical marketing in the context of communicative capitalism. The theme is approached through a critical perspective that goes beyond the marketing rhetoric that focuses on individual improvement and self-care through consumer datification. The aim is to overcome the opacity of technological systems associated with communication and information technologies. The work discusses the consequences of biopolitical marketing associated with the consumption of wearables; for example, the formation of profiles informed by governmentality based on a belief in dataism, which fosters objective truth markets based on the capture and analysis of big data. The essay concludes that the consumption of wearables associated with the platform economy, datification, and dataism poses risks to privacy and democracy, especially in contexts such as the pandemic, in which dependence on communication and information technologies is evident.

Keywords:
Platformization; Biometric tattoos; Datification; Dataism; Biopolitical marketing

INTRODUÇÃO

Neste ensaio, partimos da provocação sobre a possibilidade de plataformização da pele pelo consumo de tatuagens biométricas, de modo a discutirmos seus prováveis desdobramentos no capitalismo comunicativo (Dean, 2008Dean, J. (2008). Communicative capitalism: circulation and the foreclosure of politics. In M. Boler (Ed.), Digital media and democracy: tatics in hard times. Cambridge, MA: The MIT Press.) e na economia de plataforma (Srnicek, 2017Srnicek, N. (2017). Platform capitalism. Cambridge, UK: Polity.). As perguntas que norteiam nosso ensaio são: em que contexto se inserem o consumo e o marketing biopolítico de wearables e quais são os desdobramentos negativos associado a eles? Visando responder a essas questões, adotamos um framework teórico de cunho crítico e que enfoca o lado obscuro e inesperado da digitalização da vida (Trittin, Scherer, Whelan & Munro, 2019Trittin, H., Scherer, A. G., Whelan, G., & Munro, I. (2019). Exploring dark and unexpected sides of digitalization: how digital technologies challenge organization and organizing. Call for papers - Special Issue of Organization, 28(1), 8-25.). Dessa forma, vamos além da retórica de marketing pautada na promoção do aperfeiçoamento individual e no cuidado de si, posicionando-nos num estrato diferente dos estudos cujo objetivo é analisar novos comportamentos de consumo que surgem no lastro dos wearables (Bode & Kristensen, 2015Bode, M., & Kristensen, D. B. (2015). The digital doppelgänger within: a study on self-tracking and the quantified self. In R. Canniford, & D. Bajde (Eds.), Assembling consumption: researching actors, networks and markets. New York, NY: Routledge.). Contornamos a opacidade dos sistemas tecnológicos (Bridle, 2019Bridle, J. (2019). A nova idade das trevas: a tecnologia e o fim do futuro. São Paulo, SP: Todavia.) por meio da análise de questões que subjazem às tecnologias de informação e comunicação, como o dataísmo (Dijck, 2014Dijck, J. V. (2014). Datafication, dataism and dataveillance: big data between scientific paradigm and ideology. Surveillance and Society, 12(2), 197-208.), a datificação do consumidor (Lupton, 2016Lupton, D. (2016). The Quantified Self. Cambridge, UK: Polity Press.) e a formação de perfis que possibilitam a antecipação de comportamentos (Bruno, 2016Bruno, F. (2016). Rastrear, classificar, performar. Ciência e Cultura, 68(1), 34-38.). Assim, estamos alinhados aos trabalhos que investigam o lado obscuro do consumo (Cluley & Dunne, 2012Cluley, R., & Dunne, S. (2012). From commodity fetishism to commodity narcissism. Marketing Theory, 12, 251-265.) e do marketing (Tadajewski, 2016Tadajewski, M. (2016). Critical marketing studies and critical marketing education: key ideas, concepts and materials. Revista Interdisciplinar de Marketing, 6(2), 3-24.). Lembramos que as transações nos mercados têm consequências positivas e negativas, as quais podem ou não ser previstas pelas partes envolvidas (Nason, 1998). Assim, tanto o marketing quanto o consumo são performáticos, produzindo efeitos para consumidores e outros agentes envolvidos nesses processos e que nem sempre são lembrados por operadores de marketing e demais consumidores (Oliveira & Ayrosa, 2020Oliveira, R. C. A., & Ayrosa, E. A. T. (2020). O custo verdadeiro: análise dos objetos discursivos nas falas de defesa da moda rápida. Revista Interdisciplinar de Marketing, 9(2), 90-112.).

As tatuagens biométricas são wearables que merecem ser objeto de investigação. Wearables são, por definição, tecnologias usadas no corpo, um tipo de embodied computing technologies (tecnologias de computação incorporadas) (Wissinger, 2020Wissinger, E. (2020). Click-click-gimme-gimme: pleasures and perils of the “opt in” world of fashion tech. In I. Pedersen, & A Iliadis(Eds.), Embodied computing: wearables, implantables, embeddables, ingestibles. Cambridge, MA: MIT Press.). O mercado de wearables aplicados diretamente sobre a pele, como as tatuagens biométricas, está em franca expansão, com taxa de crescimento anual prevista de 38,70%, entre 2021 e 2025 (Market Watch, 2018Market Watch. (2018, julho, 03). Global electronic skin market analysis & industry forecast 2020-2025, with an expected CAGR of 38.7%. Recuperado de http://www.marketwatch.com/press-release/global-electronic-skin-market-analysis-industry-forecast-2020-2025-with-an-expected-cagr-of-387---researchandmarketscom-2018-07-03
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). Na área de assistência médica os dispositivos implantáveis (implantable) e vestíveis (wearables) também estão em voga, como nos mostram Lee et al. (2020Lee, G.-H., Moon, H., Kim, H., Lee, G. H., Kwon, W., Yoo, S. ... Hahn, S. K. (2020). Multifunctional materials for implantable and wearable photonic healthcare devices. Nature Reviews Materials, 5(2), 149-165.) ao analisarem materiais multifuncionais associados àqueles dispositivos e com aplicações diversificadas. Híbridos de tatuagem e wearables, como o FitBit, as tatuagens biométricas diferem de outros dispositivos por seu caráter temporário, sua aplicação diretamente sobre a pele e por seu apelo estético. Localizadas na camada mais superficial do corpo, essas tatuagens interagem com as camadas mais abaixo da pele (Fuks & Vega, 2016Fuks, H., & Vega, K. (2016). Beauty technology: designing seamless interfaces for wearables computing. Zurich, Switzerland: Springer International Publishing.; Wissinger, 2020). Os wearables, em geral, são equipados com tecnologia que mede e retransmite fluxos de dados de acordo com os movimentos físicos do corpo, ao mesmo tempo que “olham” sempre para dentro dele (Gidaris, 2019Gidaris, C. (2019). Surveillance capitalism, datafication, and unwaged labour: the rise of wearable fitness devices and interactive life insurance. Surveilance and Society, 17(1-2), 132-138.).

Essas tatuagens podem ser usadas com diversos propósitos, de acordo com a tecnologia que lhes serve de base. Podem monitorar pessoas e criar bancos de dados de localização e comportamento (Tribe, Whittow & Batchelor, 2014Tribe, J., Whittow, W., & Batchelor, J. (2014). Aesthetically enhanced RFID Inkjet Antenna logos on skin (AERIALS). In A. Marcus (Ed.), DUXU 2014: design, user experience, and usability. User experience design for everyday life applications and services (pp. 719-730). Springer, Cham. Recuperado de https://doi.org/10.1007/978-3-319-07635-5_68
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); auxiliar pacientes, atletas, militares e idosos com demência; servir como ingresso para eventos e até executar funções bancárias (Techcrunch, 2015TechCrunch. (2015, novembro 23). Chaotic moon explores biometric tattoos for medicine and the military. Recuperado de https://techcrunch.com/2015/11/23/chaotic-moon-explores-biometric-tattoos-for-medicine-and-the-military
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). Entre suas vantagens, estão a segurança e a conveniência para o usuário, pois não podem ser roubadas nem perdidas, além de serem simples de aplicar e de usar (Tribe et al., 2014Tribe, J., Whittow, W., & Batchelor, J. (2014). Aesthetically enhanced RFID Inkjet Antenna logos on skin (AERIALS). In A. Marcus (Ed.), DUXU 2014: design, user experience, and usability. User experience design for everyday life applications and services (pp. 719-730). Springer, Cham. Recuperado de https://doi.org/10.1007/978-3-319-07635-5_68
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). Apesar de servirem a um propósito predeterminado, seu potencial é infinito - poderiam, inclusive, transformar o corpo humano numa placa de circuito (Wilhelm, 2015Wilhelm, P. (2015, novembro 23). Biometric ‘tech tattoos’ could be the future of wearables. Recuperado de http://www.techradar.com/news/wearables/biometric-tech-tattoos-could-be-the-future-of-wearables-1309566
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), ou seja, uma plataforma sobre a qual seria viável desenvolver aplicações com potencial de integração a outras aplicações e sistemas, por meio de interfaces de programação. As tatuagens biométricas são elas mesmas plataformas, portanto permitem a incorporação do consumidor a uma rede de informações e operações além da prevista inicialmente.

Com base nessas informações, é razoável imaginar uma possível plataformização da pele, ou seja, sua transformação numa infraestrutura que suportaria o design e aplicativos (Gillespie, 2010Gillespie, T. (2010). The politics of ‘platforms’. New Media and Society, 12(3), 347-364.). Assim como outras tecnologias biométricas, essas tatuagens são capazes de identificar seus consumidores, bem como “detectar e extrair inferências acionáveis sobre personalidade, intenção, estado emocional, conformidade social, orientação sexual e muitos outros atributos formalmente privados, afirmando que eles se manifestam corporalmente” (Crampton, 2019Crampton, J. W. (2019). Platform biometrics. Surveillance and Society, 17(1-2), 54-62., p. 55). Um exemplo é a tatuagem em forma de rosa que reflete as mudanças de temperatura do corpo, passando de vermelho para branco. Um circuito na videira prateada detecta a temperatura, de modo que as pétalas ficam brancas quando ela ultrapassa o limiar de mudança de cor do pigmento termocrômico (Kao, Holz, Roseway, Calvo & Schmandt, 2016Kao, H.-L., Holz, C., Roseway, A., Calvo, A., & Schmandt, C. (2016). DuoSkin: rapidly prototyping on-skin user interfaces using skin-friendly materials. Recuperado de https://duoskin.media.mit.edu/duoskin_iswc16.pdf
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).

Alguns dados associados a esses dispositivos excedem o que é necessário à consecução de seus objetivos e à melhoria do serviço prestado por eles, configurando um “excedente comportamental” (Zuboff, 2019Zuboff, S. (2019). The age of surveillance capitalism: the fight for a human future at the new frontier of power. New York, NY: PublicAffairs.). Assim, as tatuagens biométricas podem estar ligadas à extração de dados e à vigilância. Embora o debate sobre vigilância e privacidade esteja em voga - Sandvik (2020Sandvik, K. B. (2020). Wearables for something good: aid, dataveillance and the production of children’s digital bodies. Information Communication and Society, 4462, 1-16.) analisa o wearable Khushi Baby, parte de um programa de ajuda internacional voltado para o Sul global, por meio do monitoramento sistemático dos dados de crianças visando regular ou administrar seu comportamento -, os consumidores estão sempre ávidos por novas experiências, em especial as que têm apelo estético (Fuks & Veiga, 2016Fuks, H., & Vega, K. (2016). Beauty technology: designing seamless interfaces for wearables computing. Zurich, Switzerland: Springer International Publishing.) e que prometem otimizar a vida cotidiana, mas nem sempre estão cientes das atividades que subjazem ao consumo de tais tecnologias nem das práticas de marketing que envolvem seus dados coletados, armazenados, analisados e, muitas vezes, comercializados para terceiros.

Neste trabalho, inicialmente, falamos sobre a modulação e a decorrente dividualização do consumidor para, em seguida, nos aprofundar no tema do capitalismo comunicativo e da datificação do consumidor. Discorremos, então, sobre a ideologia do dataísmo e a economia de plataforma, comentando acerca da possibilidade de plataformização da pele e do cenário contemporâneo. Por fim, oferecemos nossas considerações finais sobre as implicações mais amplas das tatuagens biométricas e outros wearables num cenário pandêmico, como o atual.

REFERENCIAL TEÓRICO

Modulação, dividualização e desdobramentos

O funcionamento dos wearables, em geral, se dá em 3 etapas (Monaham & Wall, 2007). Primeiro, as informações corporais são traduzidas em dados por meio de sensores aplicados diretamente sobre a pele e, no caso de implantes subcutâneos,1 1 Microchips do tamanho de um grão de arroz são desenvolvidos, aperfeiçoados e implantados sob a pele dos consumidores apesar dos questionamentos éticos. Tais dispositivos podem ser programados para conter informações e executar ações predeterminadas. Por um lado, Wahlquist (2017) aponta que seu desempenho ainda é limitado e que algumas dessas ações, como abrir as portas do carro e dirigi-lo sem chave, demandam investimentos e modificações ainda não acessíveis em larga escala. Por outro, vislumbra-se a possibilidade de programar o microchip para múltiplas funções, como servir de passe em transportes e eventos, destrancar portas, desbloquear smartphones e computadores ou mesmo fornecer a localização de pacientes com demência e Alzheimer. incorporadas ao corpo. Na sequência, esses dados são transmitidos pelas redes, o que, para os autores, posicionaria os corpos como “nós” dentro das amplas redes de informação. Por fim, a intervenção nos corpos se tornaria viável mediante mecanismos de feedback sociotécnicos. O monitoramento por wearables é uma prática de vigilância somática, ou seja, tecnológica e invasiva do corpo, capaz de intervir em suas funções (Monahan & Wall, 2007Monahan, T., & Wall, T. (2007). Somatic surveillance: corporeal control through information networks. Surveillance and Society, 4(3), 154-173.). Essas tatuagens atuam como um mecanismo de modulação do comportamento, similar ao computador imaginado por Deleuze (1992Deleuze, G. (1992). Conversações (1972-1990). São Paulo, SP: Editora 34.), que seria capaz de dar a posição de um elemento em espaço aberto a cada instante. Assim, o encarceramento deixa de ser obrigatório para que se exerça a vigilância necessária à captura de dados, bastando para tanto que a posição de cada um seja detectada de forma lícita ou ilícita, operando uma modulação universal (Deleuze, 1992Deleuze, G. (1992). Conversações (1972-1990). São Paulo, SP: Editora 34.).

Não é mais necessário um panóptico, a materialização de vigilância do poder disciplinar, porém isso não significa que ele deixou de existir (Cobbe, 2020). Formas disciplinares de poder existem nas sociedades de controle, mas são exercidas por meios maleáveis para modular o comportamento (Deleuze, 1992Deleuze, G. (1992). Conversações (1972-1990). São Paulo, SP: Editora 34.). Livres para viver suas vidas, as pessoas estão sujeitas ao poder não mais como um todo unificado, e sim como “divíduos” (Deleuze, 1992Deleuze, G. (1992). Conversações (1972-1990). São Paulo, SP: Editora 34.). A modulação envolve a solicitação de informações dispersas dos consumidores e sua reorganização sob a égide de um código específico num plano diferente da realidade (Zwick & Denegri-Knott, 2009Zwick, D., & Denegri-Knott, J. (2009). Manufacturing customers: the database as new means of production. Journal of Consumer Culture, 9(2), 221-247.). A noção de divíduo substitui a de indivíduo e está atrelada a esse processo, que também transforma massas em amostras, dados ou bancos (Deleuze, 1990Deleuze, G. (1992). Conversações (1972-1990). São Paulo, SP: Editora 34.). As ações tradicionais de marketing já atuavam como tecnologias dividualizantes, transformando os consumidores em coleções de dados que podem ser posteriormente analisados e segmentados em novos grupos comercializáveis (Cluley & Brown, 2015Cluley, R., & Brown, S. D. (2015). The dividualised consumer: sketching the new mask of the consumer. Journal of Marketing Management, 31(1-2), 107-122.). Além de as tecnologias dividualizantes visarem ao controle modular, a dividualização é central na lógica de acumulação capitalista, que segmenta a vida em medidas de informação (Zwick & Denegri-Knott, 2009Zwick, D., & Denegri-Knott, J. (2009). Manufacturing customers: the database as new means of production. Journal of Consumer Culture, 9(2), 221-247.).

O controle e a modulação do comportamento consolidam a visão de Crary (2013Crary, J. (2013). 24/7: late capitalism and the ends of sleep. London, UK: Verso.) de um capitalismo 24/7, cuja última fronteira a ser colonizada pelo capital e transformada em mercadoria seria o sono. Os wearables tornaram isso realidade. Onipresentes na cultura do consumo contemporânea, fizeram do sono uma atividade (excedente) produtora de valor (Charitsis, 2016Charitsis, V. (2016). Prosuming (the) self. Ephemera, 16(3), 37-59.). Uma quantidade inimaginável de dados é extraída por essas plataformas, contribuindo para que o dataísmo se torne poderoso. Entendemos dataísmo como a crença de que, quanto maior a geração de dados, mais próximos da verdade estaremos (Charitsis, 2019). A extração hoje é realizada de forma consensual, divertida e normalmente não invasiva, sempre enfatizando a ideia de opção para consumidor, tanto para aderir quanto para desistir de usar a tecnologia (Bridle, 2019Bridle, J. (2019). A nova idade das trevas: a tecnologia e o fim do futuro. São Paulo, SP: Todavia.). O consumidor de wearables acredita que pode se beneficiar do automonitoramento constante. A abordagem de Dijck (2014Dijck, J. V. (2014). Datafication, dataism and dataveillance: big data between scientific paradigm and ideology. Surveillance and Society, 12(2), 197-208.) sobre o dataísmo contrasta com outras que o consideram capaz de fornecer respostas aos anseios de organizações, profissionais de marketing e consumidores. Segundo essa perspectiva, a capacidade de coletar grandes quantidades de dados estaria associada às suposições culturais de que a vida deve ser quantificada, pois, por meio de sua datificação - processo considerado transparente e confiável -, seria possível eliminar emoções e ideologias, além de prever o futuro (Han, 2017Han, B. C. (2017). Psychopolitics: neoliberalism and new technologies of power. Brooklyn, NY: Verso Books.).

Os apelos à otimização de diagnósticos, diminuindo visitas ao médico ou identificando doenças antes mesmo de que os sintomas se apresentarem,2 2 A matéria do site Mashable (2020) aborda os sensores que podem ser inseridos sob a pele e são capazes de prevenir ataques biológicos e futuras pandemias, como a da COVID-19. Tais sensores poderiam indicar que a pessoa está doente antes da manifestação de sintomas. A pesquisa desenvolvida pela Profusa, empresa de biotecnologia, e financiada pelo Darpa, braço de pesquisa do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, explora o uso da lumee oxygen platform, uma plataforma que monitora, por meio de um biossensor, os níveis de oxigênio nos tecidos. Há, então, o emparelhamento com uma sonda de dados aderida à pele acima do sensor, a qual transmite informações para um smartphone ou outros dispositivos. Recuperado de https://mashable.com/article/under-the-skin-sensor-flu-pandemic-coronavirus/ tornam os wearables tentadores. Mas, além da questão da vigilância somática, da dividualização do consumidor e da possibilidade de plataformização da pele, outras questões despontam no horizonte quando investigamos esses dispositivos. Por exemplo, Charitsis (2019Charitsis, V. (2019). Survival of the (data) fit: self-surveillance, corporate wellness, and the platformization of healthcare. Surveillance and Society, 17(1-2), 139-144.) mostra a aliança estratégica entre FitBit e uma das maiores prestadoras de seguro de saúde nos Estados Unidos, fazendo com que estas adotem a plataforma FitBit Care como solução primária. Ou seja, ao contratar um seguro de saúde, obrigatoriamente o consumidor terá de usar um wearable, o que aponta para a combinação de “práticas de autovigilância, planos corporativos de bem-estar e a plataformização da assistência médica” (Charitsis, 2019Charitsis, V. (2019). Survival of the (data) fit: self-surveillance, corporate wellness, and the platformization of healthcare. Surveillance and Society, 17(1-2), 139-144., p. 140). Gidaris (2019Gidaris, C. (2019). Surveillance capitalism, datafication, and unwaged labour: the rise of wearable fitness devices and interactive life insurance. Surveilance and Society, 17(1-2), 132-138.) critica a adoção de apólices de seguro calcadas na coleta de dados - dados são coletados pelos wearables, e, em troca, os segurados recebem benefícios, como reduções de preço das apólices e descontos em sites de e-commerce, como Amazon -, uma vez que esse tipo de autocuidado tecnologicamente mediado contribui e reproduz as desigualdades sociais sistêmicas (Gidaris, 2019Gidaris, C. (2019). Surveillance capitalism, datafication, and unwaged labour: the rise of wearable fitness devices and interactive life insurance. Surveilance and Society, 17(1-2), 132-138.). Também é importante destacar o impacto sobre o direito à privacidade que a coleta de dados e seu uso representam (Zuboff, 2015Zuboff, S. (2015). Big other: surveillance capitalism and the prospects of an information civilization. Journal of Information Technology, 30(1), 75-89.), ultrapassando a esfera do consumidor e tendo alcance social, com consequências para a estabilidade da própria democracia.

Algumas dessas questões fogem ao escopo deste ensaio, mas sinalizam a importância e o alcance do tema em discussão. Dados são infinitos, produzidos pelos consumidores que provavelmente não conseguem dimensionar a quantidade de informações disponibilizadas para organizações (Tadajewski, Denegri-Knott & Varman, 2018Tadajewski, M; Denegri-Knott, J; & Varman, R. (2018). Introducing and advancing critical marketing studies. In M. Tadajewski, M. Higgins, J. Denegri-Knott, & R. Varman (Eds.), The Routledge Companion to critical marketing. New York, NY: Routledge.). A plataformização da pele pode parecer uma possibilidade absurda, contudo pesquisas envolvendo tatuagens e tecnologia estão avançando, bem como as que combinam cosméticos e tecnologias usáveis. O projeto DermalAbyss (Mit Media Lab, 2017Mit Media Lab. (2017). Probing into the skin’s abyss. Recuperado de http://www.media.mit.edu/posts/probing-into-the-skin-s-abyss/
http://www.media.mit.edu/posts/probing-i...
) provou ser possível substituir a tinta usada em tatuagens por biossensores - estes são embedabbles,3 3 Para mais informações sobre tecnologia wearable, ingestable e embeddable, sugerimos a leitura de www.scienceworld.ca/stories/wearable-ingestible- embeddable-technology. pois se situam numa camada inferior à epiderme, como implantes - cujas cores ou intensidade fluorescente mudam em resposta às variações de biomarcadores no líquido intersticial. As tatuagens seriam interfaces que ajudariam em diagnósticos médicos. Apesar do sucesso inicial e da continuidade das pesquisas, o laboratório informa que não há previsões de desenvolver o material para uso comercial e testá-lo clinicamente.

Capitalismo comunicativo e a datificação do consumidor

Tecnologias de informação e comunicação (TIC) dominaram os mercados e os consumidores. As mudanças estão relacionadas com o que Dean denomina de “capitalismo comunicativo”, uma forma de capitalismo tardio pautado nas trocas comunicativas como elementos básicos da produção capitalista. No âmbito do capitalismo comunicativo, “ideais de acesso, inclusão, discussão e participação passam a ser percebidas em expansões, intensificações e interconexões das telecomunicações globais” (Dean, 2008Dean, J. (2008). Communicative capitalism: circulation and the foreclosure of politics. In M. Boler (Ed.), Digital media and democracy: tatics in hard times. Cambridge, MA: The MIT Press., p. 104), sem, contudo, garantir uma variedade de modos de vida e práticas de liberdade e distribuições mais equitativas de riqueza e influência, minando a eficácia política para a maioria dos povos do mundo. A vigilância é parte complementar dessa nova lógica de acumulação capitalista, cujo objetivo é prever e modificar o comportamento humano com o intuito de gerar renda e controlar o mercado (Zuboff, 2015Zuboff, S. (2015). Big other: surveillance capitalism and the prospects of an information civilization. Journal of Information Technology, 30(1), 75-89.). Seu elemento central é o big data, que pode ser entendido como o conjunto de dados coletados e analisados em quantidades extremamente vastas, o que torna possível seu processamento somente por algoritmos (Fuchs, 2018Fuchs, C. (2018). Social media, big data, and critical marketing. In M. Tadajewski, M. Higgins, J. Denegri-Knott, & R. Varman (Eds.), The routledge companion to critical marketing. New York, NY: Routledge.).

O capitalismo comunicativo tem o consumo como foco, pois este evidencia o papel central do mercado na organização social e política (Charitsis, Zwick & Bradshaw, 2018Zwick, D., & Bradshaw, A. (2018). Biopolitical marketing and the commodification of social contexts. In M. Tadajewski, M. Higgins, J. Denegri-Knott, & R. Varman (Eds.), The Routledge Companion to Critical Marketing. New York, NY: Routledge .). Além disso, o consumo é central para o processo de realização de valor do capital (Fontenelle, 2015Fontenelle, I. A. (2015). Organisations as producers of consumers. Organization, 22(5), 644-660.), o que faz das organizações verdadeiras produtoras de consumidores. O mercado se torna um norte que subjuga o Estado à economia. Esta é uma das características do neoliberalismo: “Ordem normativa da razão ou governamentalidade que difunde a lógica econômica de custos e benefícios em uma ampla variedade de locais” (Zwick & Bradshaw, 2018Zwick, D., & Bradshaw, A. (2018). Biopolitical marketing and the commodification of social contexts. In M. Tadajewski, M. Higgins, J. Denegri-Knott, & R. Varman (Eds.), The Routledge Companion to Critical Marketing. New York, NY: Routledge .). Prado (2017Prado, E. F. S. (2017). Sobre comum. In: Laval, C., & Dardot, P. Comum: ensaio sobre a revolução no século XXI. São Paulo, SP: Boitempo .) corrobora essa definição ao descrever o neoliberalismo como uma racionalidade que estrutura a mentalidade e, assim, o comportamento de governantes e governados, fazendo com que todos assumam por vontade própria a condição de mero “capital humano”.

Práticas de produção do self são o sustentáculo da sociedade de consumo e podem ser consideradas práticas neoliberais “que governam o mundo contemporâneo, sendo a gestão do eu o mais importante papel que o sujeito é instado a assumir em um tipo de governmentality [...] no qual a ideologia do indivíduo autônomo está ligada a novas regras políticas e econômicas” (Fontenelle, 2010Fontenelle, I. A. (2010). O fetiche do eu autônomo: consumo responsável, excesso e redenção como mercadoria. Psicologia and Sociedade, 22(2), 215-224., p. 218, grifo do autor). Assim, formas de governar (govern) estão associadas a modos de pensar (mentality), e, por conseguinte, existe uma relação entre formas de poder e processos de subjetivação (Fontenelle, 2010Fontenelle, I. A. (2010). O fetiche do eu autônomo: consumo responsável, excesso e redenção como mercadoria. Psicologia and Sociedade, 22(2), 215-224.). Isso sinaliza uma espécie de biopoder (Foucault, 1978Foucault, M. (1978). The history of sexuality (Vol. 1: An introduction). New York, NY: Pantheon Book.) e, consequentemente, de biopolítica, um processo que subjuga e classifica todas as nossas capacidades corporais, sociais e intelectuais como produtivas (Zwick & Bradshaw, 2018Zwick, D., & Bradshaw, A. (2018). Biopolitical marketing and the commodification of social contexts. In M. Tadajewski, M. Higgins, J. Denegri-Knott, & R. Varman (Eds.), The Routledge Companion to Critical Marketing. New York, NY: Routledge .). Dessa forma, as TIC associadas ao marketing o transformaram numa biopolítica que visa governar a vida dos consumidores enquanto parece não o fazer. Não se trata mais apenas de criar mercado, mas também de mobilizar e extrair valor da criatividade, da comunicação e dos estilos de vida dos consumidores (Zwick & Bradshaw, 2018Zwick, D., & Bradshaw, A. (2018). Biopolitical marketing and the commodification of social contexts. In M. Tadajewski, M. Higgins, J. Denegri-Knott, & R. Varman (Eds.), The Routledge Companion to Critical Marketing. New York, NY: Routledge .). Reforçando essas colocações, o trabalho de Darmody e Zwick (2020)Darmondy, A., & Zwick, D. (2020). Manipulate to empower: hyper-relevance and the contradictions of marketing in the age of surveillance capitalism. Big Data & Society, 7(1), 1-12. argumenta que as práticas de marketing digital foram bastante aprimoradas graças às tecnologias emergentes, permitindo a intensificação e a extensão sem limites da vigilância, da manipulação e do controle dos consumidores enquanto parecem empoderá-los.

As relações entre Estado e mercado e entre mercado e indivíduo se transformam sob a égide neoliberal do capitalismo comunicativo: o mercado se torna lócus de enunciados tomados como verdadeiros para o indivíduo neoliberal (Charitsis et al., 2018Charitsis, V., Zwick, D., & Bradshaw, A. (2018). Creating worlds that create audiences: theorising personal data markets in the age of communicative capitalism. Triple C, 16(2), 820-834.). Os dados digitais geram e suportam os “mercados de verdade” (Lupton, 2016Lupton, D. (2016). The Quantified Self. Cambridge, UK: Polity Press.), sendo considerados mais objetivos, detalhados e dotados de autoridade científica, uma vez que não seriam provenientes da subjetividade humana e de seus vieses. Enunciados mercadológicos e neoliberais que envolvem a gestão do eu e a necessidade de aprimoramento e otimização da vida estão diretamente vinculados à lógica de quantificação e datificação que se articulam e atingem diversos aspectos da vida (Charitsis, 2019Charitsis, V. (2019). Survival of the (data) fit: self-surveillance, corporate wellness, and the platformization of healthcare. Surveillance and Society, 17(1-2), 139-144.).

Datificar é o processo que transforma “comportamentos humanos complexos, sentimentos, relacionamentos e motivações em formas de dados digitais” (Lupton, 2016Lupton, D. (2016). The Quantified Self. Cambridge, UK: Polity Press., p. 137). Esse processo é considerado um meio legítimo de monitorar, acessar e entender o comportamento humano (Dijck, 2014Dijck, J. V. (2014). Datafication, dataism and dataveillance: big data between scientific paradigm and ideology. Surveillance and Society, 12(2), 197-208.). Um exemplo da racionalidade neoliberal e da datificação dos consumidores é o movimento Quantified Self (Bode & Kristensen, 2015Bode, M., & Kristensen, D. B. (2015). The digital doppelgänger within: a study on self-tracking and the quantified self. In R. Canniford, & D. Bajde (Eds.), Assembling consumption: researching actors, networks and markets. New York, NY: Routledge.). Mediante processos de automonitoramento, os self quantifiers acreditam ser possível obter autoconhecimento e se aperfeiçoar, tornando-se o ser humano ideal em cada aspecto da própria vida (Lupton, 2016Lupton, D. (2016). The Quantified Self. Cambridge, UK: Polity Press.; Wolf, 2009Wolf, G. (2009, junho 22). Know thyself: tracking every facet of life, from sleep to mood to pain, 24/7/365. Recuperado de http://www.wired.com/2009/06/lbnp-knowthyself/
http://www.wired.com/2009/06/lbnp-knowth...
). Além da moderna busca narcisista de singularidade e excepcionalidade (Morozov, 2013Morozov, E. (2013). To save everything, click here: the folly of technological solucionism. New York, NY: Public Affairs.), que pode justificar o automonitoramento, este também é encorajado por empresas em troca de incentivos e recompensas (persuaded self-tracking). Uma vez que os wearbales não são considerados dispositivos médicos e, portanto, não são regulados por agências específicas, como a norte-americana FDA (Food and Drugs Administration) (Paluch & Tuzovic, 2019Paluch, S., & Tuzovic, S. (2019). Persuaded self-tracking with wearable technology: carrot or stick? Journal of Services Marketing, 33(4), 436-448.) ou a brasileira Anvisa, questões importantes sobre privacidade e segurança de dados escapam aos consumidores, que desconhecem os fins para os quais seus dados são utilizados.

É interessante destacar que dados produzidos individualmente e em grande volume (big data) são usados para a formação de perfis, que, por sua vez, são empregados em experimentos contínuos, parte dos esforços de marketing dentro das organizações, mas também pela máquina estatal para definir, por exemplo, acesso aos benefícios em Estados de bem-estar social (Bruno, 2016Bruno, F. (2016). Rastrear, classificar, performar. Ciência e Cultura, 68(1), 34-38.; Charitsis et al., 2018Charitsis, V., Zwick, D., & Bradshaw, A. (2018). Creating worlds that create audiences: theorising personal data markets in the age of communicative capitalism. Triple C, 16(2), 820-834.). Os perfis são “uma projeção algorítmica de categorias que se pretendem ajustadas a indivíduos particulares, seja na forma de ofertas personalizadas de produtos e serviços potencialmente desejáveis, seja sob a forma de antecipação de comportamentos ou riscos a evitar” (Bruno, 2016Bruno, F. (2016). Rastrear, classificar, performar. Ciência e Cultura, 68(1), 34-38., p. 37). Um dos problemas da construção desses perfis é que eles funcionam como “um mecanismo de triagem algorítmica do acesso a circuitos de consumo, bem-estar, civilidade etc.” (Bruno, 2016Bruno, F. (2016). Rastrear, classificar, performar. Ciência e Cultura, 68(1), 34-38., p. 37), usados como vetores que permitem agir antes do fato ou da ação, uma espécie de “conformidade antecipatória”, segundo Zuboff (2015Zuboff, S. (2015). Big other: surveillance capitalism and the prospects of an information civilization. Journal of Information Technology, 30(1), 75-89.), antecipando um futuro que passa a ter caráter imediato e pode descambar em práticas discriminatórias, “manipulação, viés, censura, [...] violações da privacidade e dos direitos de propriedade, abuso do poder de mercado, efeitos sobre as capacidades cognitivas, além de uma crescente heteronomia” (Doneda & Almeida, 2018Doneda, D., & Almeida, V. A. F. (2018). O que é a governança de algoritmos? In F. Bruno, B. Cardoso, M. Kanashiro, L. Guilhon, & L. Melgaço (Orgs.), Tecnopolíticas da vigilância: perspectivas da margem. São Paulo, SP: Boitempo., p. 145).

A coleta e análise de dados é um processo dinâmico e de informação contínua entre sistemas de vigilância, criação de perfis e informações pessoais, que se renova a cada interação entre sistemas e consumidores (Pridmore & Zwick, 2011Pridmore, J., & Zwick, D. (2011). Editorial: marketing and the rise of commercial consumer surveillance. Surveillance and Society, 8(3), 269-277.). Por meio do reality mining - mineração da realidade, segundo Zuboff (2015Zuboff, S. (2015). Big other: surveillance capitalism and the prospects of an information civilization. Journal of Information Technology, 30(1), 75-89.) -, operam-se a customização e a estruturação de maneira opaca do mundo por diversas organizações. Mais do que saber o que cada um de nós faz a cada momento e o tempo todo, há a possibilidade de intervenção e alteração do comportamento de forma que se torna impossível distinguir o que é real e o que decorre da manipulação tecnocibernética em tempo real (Charitsis et al., 2018Charitsis, V., Zwick, D., & Bradshaw, A. (2018). Creating worlds that create audiences: theorising personal data markets in the age of communicative capitalism. Triple C, 16(2), 820-834.).

Dataísmo e economia de plataforma

Schwarcz e Starling (2015Schwarcz, L. M., & Starling, H. M. (2015). Brasil: uma biografia. São Paulo, SP: Companhia das Letras.) afirmam que as boas ideologias são como tatuagem com o poder de se sobrepor à sociedade e produzir realidade. A ideologia não é uma ilusão onírica construída para que possamos escapar da realidade, e sim uma construção fantasiosa que produz a própria realidade (Zizek, 1989Žižek, S. (1989). The sublime object of ideology. London, UK: Verso .), “dissolvendo qualquer inadequação intransponível na positividade harmônica de um gozo sem falhas” (Safatle, 2003Safatle, S. (2003). Pósfacio: a política do real de Slavoj Zizek. In: Zizek, S. Bem-vindo ao deserto do real. São Paulo, SP: Boitempo ., p. 189). A constituição do consumidor dividual no bojo da sociedade de controle e da informação decorre da ação de um poder inteligente - smart power, como citado em Han (2017Han, B. C. (2017). Psychopolitics: neoliberalism and new technologies of power. Brooklyn, NY: Verso Books.) -, que seduz o consumidor a explorar a si mesmo por meio de dispositivos que permitem o automonitoramento, apelando para suas emoções, ao mesmo tempo que enxerga o corpo daquele como uma “coleção de dados”.

A ideologia associada ao capitalismo comunicativo e ao uso de wearables é o dataísmo, que celebra ferramentas de automonitoramento “como portadoras de verdades quantitativas objetivas sobre o usuário” (Charitsis, 2019Charitsis, V. (2019). Survival of the (data) fit: self-surveillance, corporate wellness, and the platformization of healthcare. Surveillance and Society, 17(1-2), 139-144., p. 141). O sucesso dessa ideologia decorre do fato de muitos consumidores, de forma ingênua ou involuntária, confiarem suas informações pessoais às plataformas corporativas (Dijck, 2014Dijck, J. V. (2014). Datafication, dataism and dataveillance: big data between scientific paradigm and ideology. Surveillance and Society, 12(2), 197-208.), em decorrência do entrelaçamento entre governo, negócios e academia (pesquisadores), que determina como confiamos às instituições a manipulação de seus (meta)dados. Corroboramos o pensamento de Dijck (2014)Dijck, J. V. (2014). Datafication, dataism and dataveillance: big data between scientific paradigm and ideology. Surveillance and Society, 12(2), 197-208., para quem os pesquisadores que endossam o paradigma da informação também entendem os dados como traços naturais e as plataformas como facilitadoras neutras. O compartilhamento de informações pessoais por plataformas se tornou a nova norma, e os metadados associados às informações são rotineiramente compartilhados com terceiros - inclusive agências de inteligência, como denunciado por Edward Snowden, em 2013 - para fins de marketing personalizado em troca de serviços gratuitos (Dijck, 2014Dijck, J. V. (2014). Datafication, dataism and dataveillance: big data between scientific paradigm and ideology. Surveillance and Society, 12(2), 197-208.). Assim, os metadados se tornaram a moeda pela qual os cidadãos pagam por serviços e segurança de comunicação, troca essa que se aninha na zona de conforto da maioria dos consumidores (Dijck, 2014Dijck, J. V. (2014). Datafication, dataism and dataveillance: big data between scientific paradigm and ideology. Surveillance and Society, 12(2), 197-208.).

O automonitoramento por meio de wearables é um lócus no qual “o poder se manifesta como um regime de verdade”, construindo o sujeito que se automonitora como um “eu cientificado que, seguindo os princípios do dataísmo, adere à objetividade e à credibilidade das métricas” (Charitsis, 2019Charitsis, V. (2019). Survival of the (data) fit: self-surveillance, corporate wellness, and the platformization of healthcare. Surveillance and Society, 17(1-2), 139-144.). O dataísmo permeou todos os setores da vida, incluindo a educação (Williamson, 2015Williamson, B. (2015). Algorithmic skin: health-tracking technologies, personal analytics and the biopedagogies of digitized health and physical education. Sport, Education and Society, 20(1), 133-151.), o trabalho (Moore & Robinson, 2016Moore, P., & Robinson, A. (2016). The quantified self: what counts in the neoliberal workplace. New Media and Society, 18(11), 2774-279.) e programas de bem-estar (wellness), estes associados à biopolítica, transformando a vida num exercício constante de otimização e demonizando aqueles que falham em se auto-otimizar com sucesso, pois, além de tudo, a biopolítica é um regime de responsabilidade pessoal (Zwick & Bradshaw, 2018Zwick, D., & Bradshaw, A. (2018). Biopolitical marketing and the commodification of social contexts. In M. Tadajewski, M. Higgins, J. Denegri-Knott, & R. Varman (Eds.), The Routledge Companion to Critical Marketing. New York, NY: Routledge .). Ao adotarmos essa lógica visando à auto-otimização empreendedora e ao autoconhecimento, assumimos implicitamente que aqueles que não adotam essas práticas ou falham em se engajar com sucesso nelas são, de certa forma, deficientes - “ignorantes, não possuem a disposição apropriada para fazê-lo ou deliberadamente se autonegligenciam” (Lupton, 2016Lupton, D. (2016). The Quantified Self. Cambridge, UK: Polity Press., p. 181). Um exemplo disso é que a ausência de perfis em redes sociais é tratada pela mídia com desconfiança em algumas de suas abordagens, indicando que as pessoas que resistem a elas são problemáticas: “Se você vai sair com alguém e a pessoa não tem um perfil no Facebook, você deve desconfiar”, declarou Farhad Manjoo, colunista da revista Slate, como citado em Morozov (2013Morozov, E. (2013). To save everything, click here: the folly of technological solucionism. New York, NY: Public Affairs.). Se, por um lado, existem benefícios associados ao uso de wearables - adoção de estilos de vida saudáveis, prevenção de doenças e minimização de riscos à saúde -, por outro, por meio deles são formados perfis graças à captura e à análise de (meta)dados, o que pode ser usado de forma discriminatória contra os consumidores em qualquer instância.

O capitalismo se reestrutura de tempos em tempos e, desde 2008, está associado a uma narrativa focada na ascensão tecnológica, marcando o que ficou conhecido como economia cognitiva, informacional, imaterial ou de conhecimento, denominada “economia de plataforma” (Srnicek, 2017Srnicek, N. (2017). Platform capitalism. Cambridge, UK: Polity.). Plataformas são locais de poder, resistência e exclusão (Cobbe, 2020), e a economia plataformizada se caracteriza pela extração e pelo uso de uma nova matéria-prima: dados (Srnicek, 2017Srnicek, N. (2017). Platform capitalism. Cambridge, UK: Polity.). Diz-se que os dados são o petróleo do século XXI, e Morozov (2018Morozov, E. (2018). Big tech: a ascensão dos dados e a morte da política. São Paulo, SP: Ubu Editora.) reconhece sua importância, levando em consideração as transformações digitais em curso. De forma similar ao petróleo, os dados devem ser extraídos e refinados para serem usados. Esse processo envolve a captação dos dados por sensores, seu registro em algum tipo de mídia material e sua manutenção em sistemas de armazenamento maciço (Srnicek, 2017Srnicek, N. (2017). Platform capitalism. Cambridge, UK: Polity.). Contudo, dados são informações sobre algo que aconteceu, mas não necessariamente explicam o porquê de algo ter acontecido. Para Srnicek, a explicação é sinônimo de conhecimento.

Os avanços tecnológicos baratearam a datificação de atividades cotidianas e seu registro, e, com a digitalização das comunicações, o volume de dados produzido se tornou estratosférico, mas os modelos de empresas tradicionais não estavam adequados às atividades de extração e uso de dados. A plataforma é também um novo modelo de negócio que fornece a infraestrutura, atuando como intermediário entre vários usuários e exibindo tendências de monopólio decorrentes dos efeitos de rede - quanto maior o número de usuários, mais valiosa a plataforma e, em tese, melhores seus algoritmos -, empregando subsídios cruzados para atrair usuários diversos - oferecem serviços gratuitos enquanto lucram com propaganda e usam metadados. De forma complementar, sua arquitetura é projetada para governar as possibilidades de interação, sendo que as regras de desenvolvimento de produtos e serviços na plataforma são definidas pelo seu proprietário, o que indica que ela não é um espaço vazio nem apolítico (Srnicek, 2017Srnicek, N. (2017). Platform capitalism. Cambridge, UK: Polity.).

O termo “plataforma” institui um modo de ser que sanciona um estado particular das coisas, enquadrando discursivamente serviços e tecnologias de empresas como Facebook no contexto de demandas financeiras, culturais e regulatórias. Esse enquadramento é estratégico, posicionando-as de forma a

buscar lucros atuais e futuros, [...] atingir um ponto regulatório entre as proteções legislativas que as beneficiam e as obrigações que não as beneficiam, e apresentar um imaginário cultural no qual seus serviços façam sentido. O termo “plataforma” é discursivamente construído visando estabelecer os próprios critérios pelos quais essas tecnologias serão julgadas e assumindo a forma de um arranjo progressivo e igualitário, [que promete] apoiar aqueles que a sustentam (Gillespie, 2010Gillespie, T. (2010). The politics of ‘platforms’. New Media and Society, 12(3), 347-364., pp. 348-350).

DOS RISCOS DA PLATAFORMIZAÇÃO

Assim como outros wearables (Charitsis, 2019Charitsis, V. (2019). Survival of the (data) fit: self-surveillance, corporate wellness, and the platformization of healthcare. Surveillance and Society, 17(1-2), 139-144.; Giradis, 2019Gidaris, C. (2019). Surveillance capitalism, datafication, and unwaged labour: the rise of wearable fitness devices and interactive life insurance. Surveilance and Society, 17(1-2), 132-138.), as tatuagens biométricas estão vinculadas a projetos de saúde e bem-estar. Deleuze já havia citado o exemplo da medicina sem médico nem doente, focada em enfermos potenciais e no risco, substituindo o corpo individual pela cifra dividual a ser controlada (1990). Apesar de o autor considerar seu exemplo frágil, os wearables o tornaram relevante. Todo processo da sociedade da informação que envolve big data, algoritmos, reality mining e formação de perfis é guiado pela crença preditiva de que, por meio dos dados, obteremos respostas e poderemos nos aprimorar e nos empoderar de modo exponencial. Isso abre espaço para debatermos a crise das instituições no bojo das sociedades de controle, caracterizada pela implantação de um novo regime de dominação (Deleuze, 1990Deleuze, G. (1992). Conversações (1972-1990). São Paulo, SP: Editora 34.). Zuboff (2015Zuboff, S. (2015). Big other: surveillance capitalism and the prospects of an information civilization. Journal of Information Technology, 30(1), 75-89.) corrobora esse ponto ao afirmar que o capitalismo de vigilância instaura um regime institucional ubíquo, denominado Big Other.

Esse novo regime aniquila as liberdades conquistadas e asseguradas pelo Estado de direito. Trata-se de um regime de fatos independentes e independentemente controlados, tornando despiciendos contratos, governanças e o dinamismo da democracia de mercado. O futuro que está emergindo substituirá a comunidade de iguais vinculados por leis na inevitável luta humana contra a incerteza. O poder associado ao contrato, ao Estado de direito e à confiança social será, então, suplantado por um sistema de conformidade baseado em recompensas, punições, e ligado a um novo tipo de mão invisível, contribuindo para a acumulação de capital e ativos de vigilância e de direitos, na medida em que os direitos individuais são tomados dos indivíduos pelo Big Other e redistribuídos unilateralmente por eles (Zuboff, 2015Zuboff, S. (2015). Big other: surveillance capitalism and the prospects of an information civilization. Journal of Information Technology, 30(1), 75-89.).

O resultado dessa mudança institucional é descrito como um mundo sem rotas de fuga, no qual o (in)divíduo não se submete mais à massa ou ao grupo, submissão essa que ocorria em prol da segurança e da prosperidade - ou da civilização, como em Freud (1997Freud, S. (1997). O mal-estar na civilização. Rio de Janeiro, RJ: Imago.). No deserto descrito por Zuboff, a experiência real será baseada puramente numa forma de automaticidade de estímulos e respostas, e a conformidade (ao social) ocorrerá “não como ação, mas como resultado; não como causa, mas como efeito” (Zuboff, 2015Zuboff, S. (2015). Big other: surveillance capitalism and the prospects of an information civilization. Journal of Information Technology, 30(1), 75-89., p. 82). Com base nisso, a agência que restaria aos consumidores dividualizados seria a escolha de um dos caminhos moldados

pelos interesses financeiros e ou ideológicos, que imbuem o Big Other e invadem todos os aspectos da “vida privada” de cada um. A falsa consciência já não será produzida pelos fatos escondidos da classe e sua relação com a produção, mas pelos fatos ocultos da modificação do comportamento mercantilizada (Zuboff, 2015Zuboff, S. (2015). Big other: surveillance capitalism and the prospects of an information civilization. Journal of Information Technology, 30(1), 75-89., p. 82).

Isso implica reconhecermos que o consumidor dividualizado da sociedade de informação corre o risco de ser reduzido a uma mera condição animal, inclinado “a servir às novas leis do capital impostas a todos os comportamentos por meio da alimentação implacável de registros ubíquos em tempo real, baseados em fatos de todas as coisas e criaturas” (Zuboff, 2015Zuboff, S. (2015). Big other: surveillance capitalism and the prospects of an information civilization. Journal of Information Technology, 30(1), 75-89., p. 82). Como pontuou Arendt (1998Arendt, H. (1998). The human condition. Chicago, IL: University of Chicago Press., p. 322): “O problema com as teorias modernas do behaviorismo não é que elas estejam erradas, mas que elas possam se tornar verdadeiras, que elas sejam a melhor conceitualização possível de certas tendências óbvias na sociedade moderna”.

Precisamos deixar anotada a importância de investigarmos profundamente como se dá a proteção legal de dados, inclusive os captados por wearables, visando salvaguardar o direito à privacidade, previsto no artigo XII da Declaração Universal de Direitos Humanos da ONU. É necessário que os consumidores entendam que devem lutar para preservá-lo, ainda que pensem que não têm nada a esconder. Devem lembrar que, antes de consumidores, são cidadãos e estão implicados numa rede social muito mais ampla do que suas versões virtuais. O que está em jogo com a datificação do consumidor e o dataísmo é a ascensão de um regime institucional ubíquo e em rede “que registra, modifica e mercantiliza a experiência humana, desde o uso de um eletrodoméstico até seus próprios corpos, da comunicação ao pensamento, tudo com vista a estabelecer novos caminhos para a monetização e o lucro” (Zuboff, 2015Zuboff, S. (2015). Big other: surveillance capitalism and the prospects of an information civilization. Journal of Information Technology, 30(1), 75-89., p. 81).

Essa discussão ganha mais peso agora, com as práticas de confinamento e distanciamento social, que fomentaram o uso das tecnologias de informação e comunicação (Biddle, 2020Biddle, S. (2020, abril 06). Coronavírus traz novos riscos de abuso de vigilância digital sobre a população. The Intercept Brasil. Recuperado de http://www.theintercept.com/2020/04/06/coronavirus-covid-19-vigilancia-privacidade/
http://www.theintercept.com/2020/04/06/c...
). Os dados relativos à saúde dos consumidores só podem ser acessados pelos médicos e por terceiros mediante o consentimento expresso dos pacientes (Gidaris, 2019Gidaris, C. (2019). Surveillance capitalism, datafication, and unwaged labour: the rise of wearable fitness devices and interactive life insurance. Surveilance and Society, 17(1-2), 132-138.). Contudo, hoje eles circulam por plataformas diversas, e suas informações podem ser comercializadas em conjunto com várias outras, dentro do processo já discutido neste ensaio, uma vez que o consentimento do consumidor não necessariamente se encaixa no que a Lei de Proteção de Dados prevê. O sigilo está diretamente ligado à privacidade e decorre dela, sua causa. Ao exercitarmos o direito à privacidade, fazemos escolhas, inclusive relativas à manutenção de nossos dados em sigilo. Assim, o direito à privacidade dota consumidores do direito de decidir. Os consentimentos que dependem de um mero clique parecem não ser suficientes para garantir a disponibilização de dados pessoais por plataformas associadas à wearables.

DISCUSSÃO FINAL

Biotecnologia, engenharia genética e nanotecnologia estão confluindo, o que nos faz pensar sobre possíveis inovações e seu impacto para os consumidores. Se tomarmos como base os números do mercado de wearables como FitBit,4 4 De acordo com o site Business of Apps, em 2020 existiam 31 milhões de usuários de FitBit. Mais informações em https://www.businessofapps.com/data/fitbit-statistics/. podemos arriscar que os consumidores desses dispositivos aplicados sobre a pele - como as tatuagens biométricas - e de embeddables - aplicados sob a pele, como implantes subcutâneos - serão incontáveis quando estes chegarem ao mercado para consumo em massa. A plataformização da pele nos parece uma tendência com horizonte de concretização não muito distante. Pedersen (2020Pedersen, I. (2020). Will the body become a platform? Body networks, datafied body, and AI future. In I. Pedersen, & A. Iliadis (Eds.), Embodied computing: wearables, implantables, embeddables, ingestibles. Cambridge, MA: MIT Press.) coloca uma questão similar à nossa, envolvendo a possibilidade da plataformização do corpo. A autora também demonstra preocupação com as tecnologias incorporadas (wearables, embeddables etc.), uma vez que os consumidores podem não ter conhecimento de potenciais ameaças - como a do vírus BlueBorne, que se espalhou por meio de dispositivos bluetooth -, além de ignorar que seus dados pessoais sensíveis podem ser carregados, monitorados e até disponibilizados via internet para algoritmos e atores que desconhecem.

É provável que crises de saúde pública, como a pandemia do coronavírus que assola o mundo, abreviem essas previsões. Para muitos pesquisadores, a pandemia é um cenário de incerteza que possibilitará a aceleração e a intensificação da mediação da vida pelas plataformas digitais, aumentando também a vigilância e tendo ainda outras consequências nefastas para todos (Evangelista, 2020Evangelista, R. (2020, abril 02). A distopia da aceleração está a caminho? Recuperado dehttps://outraspalavras.net/tecnologiaemdisputa/a-distopia-da-aceleracao-esta-a-caminho/
https://outraspalavras.net/tecnologiaemd...
). Se, por um lado, a possibilidade de monitorar o avanço do coronavírus e o respeito ao isolamento é vista com bons olhos, por outro, acende a discussão sobre como é e será feita a coleta de dados, o respeito à privacidade e o destino desses dados (Passos, 2020Passos, J. (2020, abril 30). Uso de dados pessoais em pandemia deve ser restrito à saúde, dizem pesquisadores. Recuperado de http://www.faperj.br/?id=3969.2.7
http://www.faperj.br/?id=3969.2.7...
). Vislumbramos a adoção das tatuagens biométricas para atendimentos médicos a distância, por exemplo, e não seria absurdo imaginar que elas poderiam ser aprimoradas com o intuito de indicar se uma pessoa se encontra doente antes mesmo da manifestação de sintomas, dentro da lógica de previsão e antecipação (Bruno, 2016Bruno, F. (2016). Rastrear, classificar, performar. Ciência e Cultura, 68(1), 34-38.; Dhar, Jarke & Laarzt, 2014Dhar, V., Jarke, M., & Laartz, J. (2014). Big data. Business and Information Systems Engineering, 6, 257-259.). Diante disso, não é improvável que dados sensíveis - sobre raça, vida sexual e saúde - gerados por esses dispositivos sejam utilizados para fins não autorizados pelos seus usuários, vide o caso da disponibilização de dados pelas operadoras de telefonia para o governo objetivando, em tese, o combate ao coronavírus (Ventura, 2020Ventura, M. (2020, abril 02). Operadoras de telefonia vão disponibilizar dados de deslocamento de usuários para o governo. Recuperado de https://oglobo.globo.com/sociedade/coronavirus/operadoras-de-telefonia-vao-disponibilizar-dados-de-deslocamento-de-usuarios-para-governo-24346725
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).

Isso nos leva a pensar que, se há algo que podemos associar à plataformização da pele e tem origem nos filmes de ficção, é o elemento distópico associado à vigilância e à falta de privacidade, ainda que até o momento os consumidores se sintam livres e empoderados graças aos wearables. Com a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), em agosto de 2020, o cuidado com a privacidade e o controle dos dados pessoais - entendidos como toda informação relacionada com a pessoa física natural identificada ou identificável - ganhou destaque. Os dados referentes à saúde são classificados como sensíveis e protegidos pelo sigilo médico-paciente (Gidaris, 2019Gidaris, C. (2019). Surveillance capitalism, datafication, and unwaged labour: the rise of wearable fitness devices and interactive life insurance. Surveilance and Society, 17(1-2), 132-138.). Para dispor deles, os consumidores e as organizações que comercializam wearables e serviços de telemedicina devem observar as bases legais para tratamentos dos dados, elencadas na LGPD. O consentimento figura entre elas. Mas, caso seja a base escolhida, é importante ser coletado de forma ativa, específica, destacada e para finalidade específica (Pompeu, 2021Pompeu, M. (2021, março 11). A LGPD como condição para as healthtechs captarem investimentos. Recuperado de http://www.conjur.com.br/2021-mar-11/pompeu-lgpd-condicao-healthtechs-captarem-investimentos
http://www.conjur.com.br/2021-mar-11/pom...
). Com base no exposto, deixamos como sugestão para futuras pesquisas que seja explorada a temática do consentimento e da agência do consumidor face ao uso de tecnologias vestíveis. Estudos interdisciplinares que possam explorar as interseções entre consumo, marketing e privacidade também nos parecem relevantes num cenário no qual as tecnologias de informação e comunicação se tornaram indispensáveis em nossas vidas.

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  • 1
    Microchips do tamanho de um grão de arroz são desenvolvidos, aperfeiçoados e implantados sob a pele dos consumidores apesar dos questionamentos éticos. Tais dispositivos podem ser programados para conter informações e executar ações predeterminadas. Por um lado, Wahlquist (2017)Wahlquist, C. (2017, outubro 31). Under the skin: how insertable microchips could unlock the future. Recuperado de http://www.theguardian.com/technology/2017/nov/01/under-the-skin-how- insertable-microchips-could-unlock-the-future
    http://www.theguardian.com/technology/20...
    aponta que seu desempenho ainda é limitado e que algumas dessas ações, como abrir as portas do carro e dirigi-lo sem chave, demandam investimentos e modificações ainda não acessíveis em larga escala. Por outro, vislumbra-se a possibilidade de programar o microchip para múltiplas funções, como servir de passe em transportes e eventos, destrancar portas, desbloquear smartphones e computadores ou mesmo fornecer a localização de pacientes com demência e Alzheimer.
  • 2
    A matéria do site Mashable (2020) aborda os sensores que podem ser inseridos sob a pele e são capazes de prevenir ataques biológicos e futuras pandemias, como a da COVID-19. Tais sensores poderiam indicar que a pessoa está doente antes da manifestação de sintomas. A pesquisa desenvolvida pela Profusa, empresa de biotecnologia, e financiada pelo Darpa, braço de pesquisa do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, explora o uso da lumee oxygen platform, uma plataforma que monitora, por meio de um biossensor, os níveis de oxigênio nos tecidos. Há, então, o emparelhamento com uma sonda de dados aderida à pele acima do sensor, a qual transmite informações para um smartphone ou outros dispositivos. Recuperado de https://mashable.com/article/under-the-skin-sensor-flu-pandemic-coronavirus/
  • 3
    Para mais informações sobre tecnologia wearable, ingestable e embeddable, sugerimos a leitura de www.scienceworld.ca/stories/wearable-ingestible- embeddable-technology.
  • 4
    De acordo com o site Business of Apps, em 2020 existiam 31 milhões de usuários de FitBit. Mais informações em https://www.businessofapps.com/data/fitbit-statistics/.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    Mar-Apr 2022

Histórico

  • Recebido
    25 Fev 2021
  • Aceito
    27 Jul 2021
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