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Para além dos estereótipos: os sentidos do trabalho para mulheres da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro

Más allá de los estereotipos: significado del trabajo para mujeres de la Policía Militar del Estado de Río de Janeiro

Resumo

O objetivo deste artigo é compreender a importância e os sentidos que mulheres atuantes na Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro atribuem ao trabalho. Foram realizadas entrevistas em profundidade com 23 policiais mulheres e seus depoimentos foram submetidos à análise de conteúdo. Os resultados indicam que o trabalho possui alta centralidade em suas vidas, a despeito das dificuldades enfrentadas - tanto as inerentes à atividade policial, quanto aquelas advindas de sua atuação em uma ocupação predominantemente masculina. Com relação aos resultados laborais mais valorizados por essas mulheres, destacam-se a remuneração recebida, por lhes assegurar algum conforto e independência financeira, o prestígio que esta ocupação lhes confere, o prazer e o senso de propósito por realizarem um trabalho percebido como socialmente relevante. O estudo contribui para a literatura sobre sentido do trabalho, ao trazer a perspectiva de um grupo de mulheres que atua em uma profissão estereotipada como masculina. Nesse sentido, vale destacar que os obstáculos enfrentados por estas profissionais em suas carreiras parecem não comprometer os sentidos positivos associados ao trabalho que realizam.

Palavras-chave:
Sentidos do trabalho; Mulheres; Gênero; Profissões estereotipadas; Polícia Militar

Resumen

El propósito de este artículo es comprender la importancia y los significados del trabajo para mujeres que trabajan en la Policía Militar del Estado de Río de Janeiro. Para ello, se realizaron entrevistas en profundidad a 23 mujeres policías y sus testimonios fueron sometidos a análisis de contenido. Los resultados indican que el trabajo tiene una alta centralidad en sus vidas, a pesar de las dificultades que enfrentan -inherentes a la actividad de la policía y derivadas de su desempeño en una ocupación predominantemente masculina. En cuanto a los resultados laborales más valorados por estas mujeres policías, se destacan la remuneración, que les asegura cierta comodidad e independencia económica; el prestigio que esta ocupación les confiere; el placer y sentido de propósito por realizar un trabajo percibido como socialmente relevante. El estudio contribuye a la literatura sobre el significado del trabajo al presentar la perspectiva de un grupo femenino que desempeña una profesión estereotipada como típicamente masculina. En este sentido, cabe señalar que los obstáculos enfrentados por estas profesionales en sus carreras parecen no comprometer los significados positivos asociados al trabajo que desempeñan.

Palabras clave:
Significados del trabajo; /Mujeres; Género; Profesiones estereotipadas; Policía militar

Abstract

The purpose of this article is to understand the importance and the meanings of work for women working in the Military Police of the State of Rio de Janeiro. In-depth interviews were conducted with 23 female police officers, and their testimonies were subjected to content analysis. The results indicate that work has a high centrality in their lives, despite the difficulties faced - both those inherent to the police activity and those arising from working in a male-dominated occupation. Remuneration stands out as a valued result of the work, which ensures some comfort and financial independence. The prestige that this occupation confers to the participants is also important, in addition to the pleasure and sense of purpose for carrying out a job perceived as socially relevant. The study contributes to the literature on the meaning of work by bringing the perspective of a group of women working in a male-stereotyped profession. In that regard, it is worth highlighting that the obstacles faced by the police officers who work in this stereotyped career seem not to prevent the positive meanings associated with their work.

Keywords:
Meaning of work; Women; Gender; Stereotyped professions; Military police

INTRODUÇÃO

Historicamente, homens e mulheres foram alocados em campos de atuação específicos, considerados “apropriados” a seus gêneros (Borrowman & Klasen, 2017Borrowman, M., & Klasen, S. (2017). Drivers of gendered sectoral and occupational segregation in developing countries (Discussion Papers, n. 222). Göttingen, Germany: University of Göttingen.; Soares, Melo, & Bandeira, 2014Soares, C., Melo, H. P., & Bandeira, L. (2014). O trabalho das mulheres brasileiras: uma abordagem a partir dos censos demográficos de 1872 a 2010. In Anais do 19º Encontro Nacional de Estudos Populacionais, São Pedro, SP.). A partir de meados do século passado, entretanto, mudanças impressas no papel social da mulher viabilizaram sua crescente participação no mercado de trabalho, bem como seu acesso a segmentos profissionais tradicionalmente dominados por homens (Bruschini, 2007Bruschini, M. C. A. (2007). Trabalho e gênero no Brasil nos últimos dez anos. Cadernos de Pesquisa, 37(132), 537-572.; Chies, 2010Chies, P. V. (2010). Identidade de gênero e identidade profissional no campo de trabalho. Revista Estudos Feministas, 18(2), 507-528.), a exemplo das corporações militares (Cappelle & Melo, 2010Cappelle, M. C. A., & Melo, M. C. O. L. (2010). Mulheres policiais, relações de poder e de gênero na Polícia Militar de Minas Gerais. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 71-99.; Ribeiro, 2018Ribeiro, L. (2018). Polícia Militar é lugar de mulher? Estudos Feministas, 26(1), 1-15.). Ademais, o aprofundamento do debate em torno das questões de gênero, desvelando seu caráter discursivo e de construção social, tem contribuído para pôr em xeque os estereótipos de gênero (Butler, 2019Butler, J. (2019). Problemas de gênero: Feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro, RJ: Civilização Brasileira.; Connell & Pearse, 2015Connell, R., & Pearse, R. (2015). Gênero: uma perspectiva global. São Paulo, SP: nVersos.), permitindo a homens e mulheres reivindicarem espaços que, até recentemente, lhes eram interditados.

Todavia o ingresso da força de trabalho feminina em segmentos considerados masculinos não ocorre sem dificuldades, requerendo das mulheres determinação para vencer as barreiras impostas e forte motivação para o trabalho (Ribeiro, 2018Ribeiro, L. (2018). Polícia Militar é lugar de mulher? Estudos Feministas, 26(1), 1-15.). Conforme destaca a literatura sobre profissões estereotipadas como masculinas, os obstáculos enfrentados por mulheres que atuam nestas profissões incluem o gerenciamento e adaptação de suas identidades femininas no contexto das expectativas existentes nas “cartilhas identitárias” (Dozier, 2017Dozier, R. (2017). Female masculinity at work: Managing stigma on the job. Psychology of Women Quarterly, 41(2), 197-209.), dificuldades de ascensão na hierarquia organizacional (Cappelle & Melo, 2010Cappelle, M. C. A., & Melo, M. C. O. L. (2010). Mulheres policiais, relações de poder e de gênero na Polícia Militar de Minas Gerais. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 71-99.; Pringle, Harris, Ravenswood, Giddings, Ryan, & Jaeger, 2017Pringle, J. K., Harris, C., Ravenswood, K., Giddings, L., Ryan, I., & Jaeger, S. (2017). Women’s career progression in law firms: Views from the top, views from below. Gender, Work & Organization, 24(4), 435-449.), questionamento de sua competência profissional (Martin & Barnard, 2013Martin, P., & Barnard, A. (2013). The experience of women in male-dominated occupations: A constructivist grounded theory inquiry. SA Journal of Industrial Psychology, 39(2), 1-12.), discriminação e violência de gênero (Bishu & Headley, 2020Bishu, S. G., & Headley, A. M. (2020). Equal employment opportunity: Women bureaucrats in male-dominated professions. Public Administration Review, 80(6), 1063-1074.; Ribeiro, 2018Ribeiro, L. (2018). Polícia Militar é lugar de mulher? Estudos Feministas, 26(1), 1-15.).

Diante do exposto, merece atenção o aumento da participação de mulheres nos efetivos das forças policiais. Dados relativos à década de 2010 apontam que as polícias militares brasileiras já contavam com aproximadamente 12% de mulheres, observando-se em outras corporações participações maiores, como no Corpo de Bombeiros, com 15%, e na Polícia Civil, com quase 33% de seu efetivo (Mourão, Lemgruber, Musumeci, & Ramos, 2016Mourão, B., Lemgruber, J., Musumeci, L., & Ramos, S. (2016). Polícia, justiça e drogas: Como anda nossa democracia. Rio de Janeiro, RJ: CESeC.). A constatação do interesse crescente de mulheres em atuar nesse contexto laboral motivou a realização da presente pesquisa, que buscou compreender a importância e os sentidos que as integrantes da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro (PMERJ) atribuem ao trabalho. Para alcançar esse objetivo foram realizadas entrevistas individuais com 23 policiais femininas desta corporação.

A pesquisa procurou trazer contribuições à literatura sobre sentido do trabalho ao analisar um conjunto de mulheres que atua em uma profissão estereotipada pelo gênero. Identificada uma lacuna na literatura, buscamos lançar luz sobre os sentidos atribuídos ao trabalho por esse grupo, que enfrenta vários desafios em seu cotidiano laboral, sobretudo em razão do gênero (Bishu & Headley, 2020Bishu, S. G., & Headley, A. M. (2020). Equal employment opportunity: Women bureaucrats in male-dominated professions. Public Administration Review, 80(6), 1063-1074.; Ribeiro, 2018Ribeiro, L. (2018). Polícia Militar é lugar de mulher? Estudos Feministas, 26(1), 1-15.; Ribeiro & Garcia, 2015Ribeiro, A. N., & Garcia, F. C. (2015). Relações de poder e gênero no alto comando da polícia militar de Minas Gerais: uma análise da percepção das mulheres policiais. Teoria e Prática em Administração, 5(1), 53-79.; Williams, 2013Williams, C. L. (2013). The glass escalator, revisited: Gender inequality in neoliberal times, SWS feminist lecturer. Gender & Society, 27(5), 609-629.).

Adicionalmente a pesquisa busca contribuir para o debate sobre profissões estereotipadas pelo gênero, em especial aquelas tidas como masculinas, visto que as discussões sobre esse tema têm se concentrado em questões identitárias (Dozier, 2017Dozier, R. (2017). Female masculinity at work: Managing stigma on the job. Psychology of Women Quarterly, 41(2), 197-209.), em aspectos relacionados ao desempenho (Kmec, McDonald, & Trimble, 2010Kmec, J. A., McDonald, S., & Trimble, L. B. (2010). Making gender fit and “correcting” gender misfits: Sex segregated employment and the nonsearch process. Gender & Society, 24(2), 213-236.; Williams, 2013Williams, C. L. (2013). The glass escalator, revisited: Gender inequality in neoliberal times, SWS feminist lecturer. Gender & Society, 27(5), 609-629.) e nas barreiras enfrentadas pelas mulheres que atuam em profissões dominadas numericamente por homens (Bishu & Headley, 2020Bishu, S. G., & Headley, A. M. (2020). Equal employment opportunity: Women bureaucrats in male-dominated professions. Public Administration Review, 80(6), 1063-1074.; Dozier, 2017Dozier, R. (2017). Female masculinity at work: Managing stigma on the job. Psychology of Women Quarterly, 41(2), 197-209.; Kringen & Novich, 2018Kringen, A. L., & Novich, M. (2018). Is it ‘just hair’ or is it ‘everything’? Embodiment and gender repression in policing. Gender, Work & Organization, 25(2), 195-213.;Williams, 2013Williams, C. L. (2013). The glass escalator, revisited: Gender inequality in neoliberal times, SWS feminist lecturer. Gender & Society, 27(5), 609-629.; Yates, Riach, & Johansson, 2018Yates, S., Riach, K., & Johansson, M. (2018). Stress at work, gendered dys-appearance and the broken body in policing. Gender, Work & Organization, 25(1), 91-105.). Assim, esta investigação amplia o debate, uma vez que analisa o sentido que essas profissionais atribuem ao trabalho em um contexto que lhes é claramente adverso.

OS SENTIDOS DO TRABALHO

Com o pioneirismo de Morse e Weiss (1955Morse, N. C., & Weiss, R. S. (1955). The function and meaning of work and the job. American sociological review, 20(2), 191-198.), as pesquisas sobre o sentido do trabalho ganharam força em virtude dos estudos do Meaning of Working International Research Team (MOW, 1987Meaning of Working International Research Team. (1987). The meaning of working. London, UK: Academic Press.). A pesquisa do grupo MOW (1987)Meaning of Working International Research Team. (1987). The meaning of working. London, UK: Academic Press., realizada com trabalhadores de oito nações ocidentais industrializadas, representa um marco teórico importante e tem exercido grande influência na agenda de estudos brasileiros sobre o sentido do trabalho (Bendassolli, Coelho-Lima, Pinheiro, & Gê, 2015Bendassolli, P. F., Coelho-Lima, F., Pinheiro, R. A., & Gê, P. C. S. (2015). A produção científica brasileira sobre sentidos e significados do trabalho: uma revisão dos usos terminológicos e das classificações temáticas existentes. Avances en Psicología Latinoamericana, 33(2), 203-221.).

Segundo o MOW (1987)Meaning of Working International Research Team. (1987). The meaning of working. London, UK: Academic Press., os sentidos do trabalho são dependentes do contexto, das preferências, da visão de mundo do indivíduo e de seu grau de identificação com o trabalho. Além disso, a construção dos sentidos do trabalho ocorreria por meio de experiências laborais cotidianas e das influências dos contextos socioeconômico, político e cultural. O modelo de investigação construído envolveu tanto os sentidos atribuídos ao trabalho, quanto seus antecedentes e consequências.

Sobre os sentidos do trabalho, os resultados apontaram para o caráter multidimensional do construto, que inclui três componentes centrais. Primeiro temos a centralidade ou a importância do trabalho na vida do indivíduo, considerando tanto o seu envolvimento como a sua prevalência em relação a outras esferas da vida - família, comunidade, religião e lazer (MOW, 1987Meaning of Working International Research Team. (1987). The meaning of working. London, UK: Academic Press.). Em seguida, vêm as normas sociais sobre o trabalho, que fazem alusão ao contrato psicológico e compreendem direitos e obrigações que as pessoas acreditam possuir em sua atuação profissional, perante a organização e a sociedade. Por fim, há os resultados valorizados no trabalho, que aludem àquilo que um trabalhador almeja obter por meio dele e englobam aspectos como status e prestígio, manter-se ativo, retorno financeiro, relações sociais, serviço à sociedade, interesse e satisfação pessoal; os resultados esperados do trabalho contribuem para explicar por que indivíduos sentem-se satisfeitos com o que realizam, por que algumas situações são atraentes para algumas pessoas e não para outras e, também, as razões pelas quais trabalham (MOW, 1987Meaning of Working International Research Team. (1987). The meaning of working. London, UK: Academic Press.).

Em consonância com os achados do grupo MOW, Morin (2001Morin, E. M. (2001). Os sentidos do trabalho. Revista de Administração de Empresas, 41(3), 8-19.) considera que um trabalho com sentido é feito de forma eficiente e gera resultados, é intrinsecamente satisfatório, moralmente aceitável, fonte de relações humanas satisfatórias, garante segurança e autonomia e mantém a pessoa ocupada. Em estudo posterior, Morin, Tonelli e Pliopas (2007Morin, E. M., Tonelli, M. J., & Pliopas, A. L. V. (2007). O trabalho e seus sentidos. Psicologia & Sociedade, 19(Especial), 47-56.) classificaram as fontes de significado nas dimensões individual, organizacional e social. Na primeira dimensão emergiram aspectos como a satisfação advinda do trabalho e a remuneração. Na dimensão organizacional, senso de utilidade e relações sociais foram pontos destacados, enquanto a realização de um trabalho que contribui para a sociedade foi um aspecto relacionado à dimensão social.

Mais recentemente, Rosso, Dekas, e Wrzesniewski (2010Rosso, B. D., Dekas, K. H., & Wrzesniewski, A. (2010). On the meaning of work: A theoretical integration and review. Research in Organizational Behavior, 30, 91-127.) identificaram que o significado do trabalho pode ter quatro fontes que têm origem: a) no próprio indivíduo (self), b) na relação com os outros, c) no contexto laboral e d) na vida espiritual. A fonte relacionada ao indivíduo refere-se a valores e motivações pessoais para o trabalho; já a fonte “outros” sugere que as relações sociais são importantes no processo de significação. O contexto laboral, por sua vez, compreende aspectos relacionados ao desenho e ao ambiente de trabalho. Por fim, a “vida espiritual” levaria o indivíduo a sentir como vocação o exercício de determinada profissão.

Estudos sobre o sentido do trabalho no Brasil, que se baseiam predominantemente nos arcabouços do grupo MOW e de Morin, têm investigado trabalhadores que atuam em uma ampla gama de setores e ocupações. Pode-se destacar, por exemplo, pesquisas com trabalhadores das indústrias criativas (Bendassolli & Borges-Andrade, 2011Bendassolli, P. F., & Borges-Andrade, J. E. (2011). Significado do trabalho nas indústrias criativas. Revista de Administração de Empresas, 51(2), 143-159.), catadores de materiais recicláveis (Silva, Brito, & Campos, 2020Silva, K. A. T., Brito, M. J., & Campos, R. C. (2020). “O lixo pode ser mais que lixo”: O sentido do trabalho para catadores de materiais recicláveis. Farol - Revista de Estudos Organizacionais e Sociedade, 7(19), 622-658.), docentes do ensino superior (Irigaray, Oliveira, Barbosa, & Morin, 2019Irigaray, H. A. R., Oliveira, L. B., Barbosa, E. S. T., & Morin, E. M. (2019). Vínculos profissionais e sentido do trabalho: uma pesquisa com professores do ensino superior. Revista de Administração Mackenzie, 20(1), 1-27.), bancários (Silva, Costa, Freitas, & Salles, 2019Siqueira, K. C. L., Silva, J. M., & Angnes, J. S. (2017). “Cuidar de preso?”: os sentidos do trabalho para agentes penitenciários. Revista de Ciências da Administração, 19(48), 84-95.), peritos criminais (Rodrigues, Barrichello, Irigaray, Soares, & Morin, 2017Rodrigues, A. L., Barrichello, A., Irigaray, H. A. R., Soares, D. R., & Morin, E. M. (2017). O trabalho e seus sentidos: um estudo com peritos criminais da Polícia Federal. Revista de Administração Pública, 51(6), 1058-1084.) e agentes penitenciários (Siqueira, Silva, & Angnes, 2017Siqueira, K. C. L., Silva, J. M., & Angnes, J. S. (2017). “Cuidar de preso?”: os sentidos do trabalho para agentes penitenciários. Revista de Ciências da Administração, 19(48), 84-95.). Não foram encontradas, no entanto, pesquisas sobre policiais ou outras profissões estereotipadas como masculinas.

Entre as pesquisas nacionais sobre o sentido do trabalho para mulheres, podemos citar os trabalhos de Silva e Cappelle (2015Silva, K. A. T., & Cappelle, M. C. A. (2015). Sentidos do trabalho apreendidos por meio de fatos marcantes na trajetória de mulheres prostitutas. Revista de Administração Mackenzie, 16(6), 19-47.) e de Pereira, Paiva, Santos, e Souza (2018Pereira, J. R., Paiva, K. C. M., Santos, J. V. P., & Sousa, C. V. (2018). “O show tem que continuar”: encalços e percalços do ser/estar prostituta. Contextus - Revista Contemporânea de Economia e Gestão, 16(3), 151-180.) sobre prostitutas e o de Spinelli-de-Sá, Lemos, e Cavazotte (2017Spinelli-de-Sá, J. G., Lemos, A. H. C., & Cavazotte, F. S. C. N. (2017). Making a career in a male-dominated field: the meaning of work for women employed in the financial markets. Revista de Administração Mackenzie, 18(4), 109-136.) sobre profissionais do mercado financeiro. Com relação ao trabalho de Spinelli-de-Sá et al. (2017)Spinelli-de-Sá, J. G., Lemos, A. H. C., & Cavazotte, F. S. C. N. (2017). Making a career in a male-dominated field: the meaning of work for women employed in the financial markets. Revista de Administração Mackenzie, 18(4), 109-136., apesar de o mercado financeiro ser um ambiente predominantemente masculino, a análise das autoras não enfatizou este aspecto; nosso estudo, no entanto, aborda justamente os sentidos do trabalho em profissões estereotipadas como masculinas e, por isso, a próxima seção é dedicada a aspectos conceituais deste segundo tema.

MULHERES EM PROFISSÕES ESTEREOTIPADAS COMO MASCULINAS

Apesar de as mulheres estarem presentes no mercado de trabalho há muito tempo, em ocupações consideradas tipicamente femininas, como criadas, costureiras e parteiras (Beauvoir, 2016Beauvoir, S. D. (2016). O segundo sexo. Rio de Janeiro, RJ: Nova Fronteira.), foi a partir da década de 1970 que novos arranjos laborais e culturais tornaram possível a entrada de mulheres em profissões consideradas redutos masculinos. No caso das carreiras militares, contudo, essa inserção aconteceu após os anos 1980 (Ribeiro, 2018Ribeiro, L. (2018). Polícia Militar é lugar de mulher? Estudos Feministas, 26(1), 1-15.). A “revolução dos gêneros”, caracterizada pela entrada de mulheres em setores ocupacionais tradicionalmente masculinos (England, 2010England, P. (2010). The gender revolution: Uneven and stalled. Gender & Society, 24(2), 149-166.; Trotter, 2017Trotter, L. J. (2017). Making a career: Reproducing gender within a predominately female profession. Gender & Society, 31(4), 503-525.), aumentou e diversificou a participação da mulher no mercado de trabalho remunerado, mesmo frente ao pensamento, ainda comum, de que homens e mulheres possuem, além das diferenças biológicas, interesses e habilidades distintos (Ceci, Ginther, Kahn, & Williams, 2014Ceci, S. J., Ginther, D. K., Kahn, S., & Williams, W. M. (2014). Women in academic science: A changing landscape. Psychological Science in the Public Interest, 15(3), 75-141.).

Contrapondo-se à percepção desta “revolução”, Acker (2012Acker, J. (2012). Gendered organizations and intersectionality: Problems and possibilities. Equality. Equality, Diversity and Inclusion: An International Journal, 31(3), 214-224.) analisa os processos discriminatórios de gênero e postula que a desigualdade e a exclusão de mulheres no ambiente laboral provêm de diferentes aspectos: estruturas organizacionais que reforçam padrões de gênero para profissões, salários, hierarquias e poder; cultura organizacional, com símbolos e estereótipos que expressam sistemas segregacionistas de gênero, além de interações rotineiras marcadas por relações de dominação e/ou subordinação entre homens e mulheres.

Soares, Melo, e Bandeira (2014Soares, C., Melo, H. P., & Bandeira, L. (2014). O trabalho das mulheres brasileiras: uma abordagem a partir dos censos demográficos de 1872 a 2010. In Anais do 19º Encontro Nacional de Estudos Populacionais, São Pedro, SP.) acrescentam que a presença de mulheres em carreiras tipicamente exercidas por homens tem sido modesta e, conforme ressalta Hirata (2018Hirata, H. (2018). Gênero, patriarcado, trabalho e classe. Revista Trabalho Necessário, 16(29), 14-27.), as mulheres não têm acesso às mesmas profissões que os homens, estando limitadas a um número restrito de atividades. Kergoat (2019Kergoat, D. (2019). O trabalho, um conceito central para os estudos do gênero. In M. Maruani. (Org.), Trabalho, logo existo: perspectivas feministas. Rio de Janeiro: Editora FGV.) utiliza a expressão “princípio da separação” para indicar essa distinção entre trabalho masculino e feminino. As mulheres seguem concentradas em nichos ocupacionais, ditos femininos, indicando uma tendência sexista inerente à escolha profissional e à inserção feminina no mercado laboral (Carli, Alawa, Lee, Zhao, & Kim, 2016Carli, L. L., Alawa, L., Lee, Y., Zhao, B., & Kim, E. (2016). Stereotypes about gender and science: Women ≠ scientists. Psychology of Women Quarterly, 40(2), 244-260.; Hatmaker, 2013Hatmaker, D. M. (2013). Engineering identity: Gender and professional identity negotiation among women engineers. Gender, Work & Organization, 20(4), 382-396.). A divisão sexual do trabalho ou segregação ocupacional (Borrowman & Klasen, 2017Borrowman, M., & Klasen, S. (2017). Drivers of gendered sectoral and occupational segregation in developing countries (Discussion Papers, n. 222). Göttingen, Germany: University of Göttingen.) culmina na estereotipação de muitas profissões.

Pesquisas que investigam a atuação de mulheres em carreiras estereotipadas como masculinas sugerem que os desafios enfrentados por elas vão além dos enfrentados por homens em situação análoga (Williams, 2013Williams, C. L. (2013). The glass escalator, revisited: Gender inequality in neoliberal times, SWS feminist lecturer. Gender & Society, 27(5), 609-629.). Estudos nacionais e internacionais com policiais femininas apontam que elas usualmente ocupam cargos administrativos e de menor importância, fazem inúmeras concessões em relação à sua aparência, além de omitirem problemas de saúde física e mental visando neutralizar os estigmas associados a elas (Cappelle & Melo, 2010Cappelle, M. C. A., & Melo, M. C. O. L. (2010). Mulheres policiais, relações de poder e de gênero na Polícia Militar de Minas Gerais. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 71-99.; Kringen & Novich, 2018Kringen, A. L., & Novich, M. (2018). Is it ‘just hair’ or is it ‘everything’? Embodiment and gender repression in policing. Gender, Work & Organization, 25(2), 195-213.; Yates et al., 2018Yates, S., Riach, K., & Johansson, M. (2018). Stress at work, gendered dys-appearance and the broken body in policing. Gender, Work & Organization, 25(1), 91-105.).

As áreas de engenharia, direito e medicina também são estereotipadas, tanto pelo predomínio numérico masculino, quanto pela formação de “guetos” genderizados. Hatmaker (2013Hatmaker, D. M. (2013). Engineering identity: Gender and professional identity negotiation among women engineers. Gender, Work & Organization, 20(4), 382-396.) afirma que a profissão de engenheiro apresenta maior contingente de homens em muitos países e Lombardi (2017Lombardi, M. R. (2017). Ingenieras en la construcción civil: la feminización posible y la discriminación de género. Cadernos de Pesquisa, 47(163), 122-146.) acrescenta que as engenheiras que tiveram êxito em suas carreiras o atribuem à apropriação de modos masculinos de ser, por proteção e sobrevivência. Na advocacia, apesar de os percentuais de homens e mulheres não serem tão discrepantes (Martins, 2017Martins, P. (2017). Feminização da advocacia e ascensão das mulheres nas sociedades de advogados. Cadernos de Pesquisa, 47(163), 16-42.), o exercício da profissão é caracterizado pela divisão sexual do trabalho, uma vez que as advogadas são submetidas a condições laborais inferiores às de seus pares e ocupam poucos cargos de liderança em grandes escritórios (Pringle et al., 2017Pringle, J. K., Harris, C., Ravenswood, K., Giddings, L., Ryan, I., & Jaeger, S. (2017). Women’s career progression in law firms: Views from the top, views from below. Gender, Work & Organization, 24(4), 435-449.). Na medicina, as mulheres estão concentradas em áreas relacionadas ao “cuidar”, como pediatria e ginecologia, ao passo que os homens costumam optar por áreas em que agressividade, assertividade e tomada de decisão rápida são necessárias, tais como cirurgia, ortopedia e traumatologia (Scheffer, 2020Scheffer, M. (2020). Demografia Médica no Brasil - 2020. São Paulo, SP: FMUSP. Recuperado dehttps://www.fm.usp.br/fmusp/conteudo/DemografiaMedica2020_9DEZ.pdf
https://www.fm.usp.br/fmusp/conteudo/Dem...
).

Williams (2013Williams, C. L. (2013). The glass escalator, revisited: Gender inequality in neoliberal times, SWS feminist lecturer. Gender & Society, 27(5), 609-629.) afirma que a maior barreira enfrentada pelas mulheres em algumas áreas ocupacionais é a discriminação, que restringe a contratação e a promoção de mulheres e também se manifesta no assédio moral e sexual, sabotagens ou outras formas de hostilidade provenientes de colegas do sexo masculino. Além disso, é comum observar mulheres que desistem do percurso em carreiras tipicamente masculinas para exercer profissões “mais adequadas” a seu gênero (Martin & Barnard, 2013Martin, P., & Barnard, A. (2013). The experience of women in male-dominated occupations: A constructivist grounded theory inquiry. SA Journal of Industrial Psychology, 39(2), 1-12.).

Em suma, mulheres que atuam em carreiras estereotipadas como masculinas enfrentam dificuldades para ingressar, socializar-se e ocupar espaços mais valorizados (Bishu & Headley, 2020Bishu, S. G., & Headley, A. M. (2020). Equal employment opportunity: Women bureaucrats in male-dominated professions. Public Administration Review, 80(6), 1063-1074.; Cappelle & Melo, 2010Cappelle, M. C. A., & Melo, M. C. O. L. (2010). Mulheres policiais, relações de poder e de gênero na Polícia Militar de Minas Gerais. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 71-99.; Kringen & Novich, 2018Kringen, A. L., & Novich, M. (2018). Is it ‘just hair’ or is it ‘everything’? Embodiment and gender repression in policing. Gender, Work & Organization, 25(2), 195-213.; Williams, 2013Williams, C. L. (2013). The glass escalator, revisited: Gender inequality in neoliberal times, SWS feminist lecturer. Gender & Society, 27(5), 609-629.; Yates et al., 2018Yates, S., Riach, K., & Johansson, M. (2018). Stress at work, gendered dys-appearance and the broken body in policing. Gender, Work & Organization, 25(1), 91-105.). No entanto, observa-se uma carência de investigações relacionadas ao sentido atribuído ao trabalho por estas profissionais, indagação pertinente vis-à-vis às barreiras enfrentadas por elas no âmbito profissional. Na seção seguinte serão abordados aspectos relativos ao trabalho na PMERJ, para ampliar o entendimento acerca dos desafios inerentes à atuação profissional de mulheres neste segmento.

O TRABALHO DA MULHER NA PMERJ

As polícias militares podem ser consideradas “guetos masculinos”, onde assumem contornos bem definidos tanto a segregação sexual, quanto o contexto regulador e profundamente marcado por relações de poder e gênero (Cappelle & Melo, 2010Cappelle, M. C. A., & Melo, M. C. O. L. (2010). Mulheres policiais, relações de poder e de gênero na Polícia Militar de Minas Gerais. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 71-99.; Queiroz, Paiva, & Lima, 2019Queiroz, G. B., Paiva, L. E. B., & Lima, T. C. B. (2019). Socialização organizacional na perspectiva de mulheres da polícia militar. Revista Pensamento Contemporâneo em Administração, 13(2), 148-165.). Para Mourão et al. (2016Mourão, B., Lemgruber, J., Musumeci, L., & Ramos, S. (2016). Polícia, justiça e drogas: Como anda nossa democracia. Rio de Janeiro, RJ: CESeC.), a figura da policial traz consigo inúmeras conotações negativas, já que características comumente atribuídas às mulheres, como uma maior inclinação para o cuidado, por exemplo, opõem-se à imagem de policial, marcada pela força e contundência.

De acordo com Donadio e Mazzotta (2009Donadio, M., & Mazzotta, C. (2009). La mujer en las instituciones armadas y policiales: Resolución 1325 y operaciones de paz en América Latina. Buenos Aires, Argetina: RESDAL.), esta segregação se dá na clara divisão de tarefas, em que às mulheres ficam reservadas tarefas administrativas e aos homens cabe o policiamento ostensivo. Na PMERJ é possível observar um efetivo feminino em torno de 10%, do qual somente 40% realizam atividades operacionais enquanto a maioria permanece destinada a exercer atividades administrativas, por se tratar de serviços considerados mais adequados a mulheres (Minayo, Souza, & Constantino, 2008Minayo, M. C. S., Souza, E. R., & Constantino, P. (2008). Missão prevenir e proteger: condições de vida, trabalho e saúde dos policiais militares do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ: Editora Fiocruz.; Ribeiro, 2018Ribeiro, L. (2018). Polícia Militar é lugar de mulher? Estudos Feministas, 26(1), 1-15.). Segundo Cappelle e Melo (2010Cappelle, M. C. A., & Melo, M. C. O. L. (2010). Mulheres policiais, relações de poder e de gênero na Polícia Militar de Minas Gerais. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 71-99.), aquelas que almejam atuar em operações-chave da polícia enfrentam inúmeros obstáculos, incluindo a necessidade de renunciar a comportamentos considerados “femininos” para que seus pares as considerem capazes. Cappelle e Melo (2010)Cappelle, M. C. A., & Melo, M. C. O. L. (2010). Mulheres policiais, relações de poder e de gênero na Polícia Militar de Minas Gerais. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 71-99. ressaltam, ainda, que a maioria das mulheres que foge a esse padrão é vítima de discriminação e, muitas vezes, assédio moral e sexual.

A atuação feminina na PMERJ é, portanto, marcada por práticas que resultam na desigualdade entre os gêneros, na hostilidade dos policiais do sexo masculino para com as colegas de trabalho, e na discriminação, que se manifesta em forma de piadas de cunho sexista e na inferiorização da profissional mulher. Além disso, o assédio sexual, comumente praticado entre oficiais e praças, torna profundamente conflituosas as relações entre os diferentes níveis hierárquicos (Ribeiro, 2018Ribeiro, L. (2018). Polícia Militar é lugar de mulher? Estudos Feministas, 26(1), 1-15.).

Além dos conflitos de gênero, a rotina de trabalho na PMERJ apresenta outros aspectos que merecem destaque. Minayo et al. (2008Minayo, M. C. S., Souza, E. R., & Constantino, P. (2008). Missão prevenir e proteger: condições de vida, trabalho e saúde dos policiais militares do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ: Editora Fiocruz.) apontam que as jornadas de trabalho costumam ser extensas, expondo os policiais a extremo desgaste físico e emocional. Os problemas de saúde observados, associados ao ambiente de tensão com o qual lidam diariamente, incluem insônia, tremores no corpo, obesidade e envelhecimento precoce, além de episódios de depressão e agressividade. As condições insatisfatórias de trabalho dos policiais, por sua vez, vão da precariedade operacional e defasagem salarial à obsolescência de coletes, viaturas, equipamentos e armamentos (Minayo et al., 2008Minayo, M. C. S., Souza, E. R., & Constantino, P. (2008). Missão prevenir e proteger: condições de vida, trabalho e saúde dos policiais militares do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ: Editora Fiocruz.). Tais adversidades reforçam a relevância de compreender os sentidos que as policiais atuantes na PMERJ atribuem ao trabalho que exercem.

ASPECTOS METODOLÓGICOS

Levando-se em consideração o caráter subjetivo do objeto da pesquisa, optou-se pela condução de um estudo de cunho qualitativo e interpretativo. O entendimento de que a compreensão dos fenômenos e vivências sociais requer a apreciação dos sentidos atribuídos pelos indivíduos diretamente envolvidos com estes fenômenos justifica a opção por tal paradigma. Em outros termos, entende-se que realidade social é um processo emergente, resultante da experiência vivida pelas pessoas (incluindo o pesquisador) que fazem parte deste mundo “concreto” (Vergara & Caldas, 2005Vergara, S. C., & Caldas, M. P. (2005). Paradigma interpretacionista: a busca da superação do objetivismo funcionalista nos anos 1980 e 1990. Revista de Administração de Empresas, 45(4), 66-72.).

Para alcançar o objetivo deste trabalho, foram realizadas 23 entrevistas em profundidade, nas quais buscou-se compreender o sentido atribuído ao trabalho por policiais femininas que atuam na PMERJ, corporação escolhida em razão do interesse das pesquisadoras pelo universo das corporações militares e por questões de acessibilidade. O acesso às policiais deu-se, inicialmente, por meio de um contato da rede pessoal de uma das autoras, extrapolando-se, depois, este primeiro acesso por meio da técnica bola de neve, ou seja, pela utilização de contatos da rede pessoal e profissional desta participante (Noy, 2008Noy, C. (2008). Sampling knowledge: The hermeneutics of snowball sampling in qualitative research. International Journal of Social Research Methodology, 11(4), 327-344.). O roteiro das entrevistas contemplou perguntas sobre: trajetórias pessoal e profissional das entrevistadas, percepções sobre o trabalho na PMERJ e sobre o que significa ser policial mulher, motivos que as levaram a escolher este trabalho, a centralidade de suas carreiras frente a outras esferas da vida e os sentidos que elas atribuem ao trabalho.

As entrevistas tiveram duração média de 40 minutos e foram gravadas com o consentimento das participantes. A maioria delas foi presencial, mas, em virtude da disponibilidade ou preferência das participantes, sete foram realizadas por telefone; seu conteúdo foi integralmente transcrito, de modo a possibilitar o emprego da técnica de análise de conteúdo (Prior, 2014Prior, L. (2014). Content Analysis. In P. Leavy. (Ed.), The Oxford Handbook of Qualitative Research. Oxford, UK: Oxford University Press.). As categorias de análise foram construídas tendo como base o arcabouço teórico desenvolvido pelo grupo MOW (1987)Meaning of Working International Research Team. (1987). The meaning of working. London, UK: Academic Press., cujo trabalho, além de ser seminal, segue influenciando as pesquisas sobre o tema, tanto no Brasil quanto internacionalmente (Bendassolli et al., 2015Bendassolli, P. F., Coelho-Lima, F., Pinheiro, R. A., & Gê, P. C. S. (2015). A produção científica brasileira sobre sentidos e significados do trabalho: uma revisão dos usos terminológicos e das classificações temáticas existentes. Avances en Psicología Latinoamericana, 33(2), 203-221.; Manuti, Curci, & Van der Heijden, 2018Manuti, A., Curci, A., & Van der Heijden, B. (2018). The meaning of working for young people: the case of the millennials. International Journal of Training and Development, 22(4), 274-288.).

O Quadro 1 apresenta o perfil de cada participante, cujos nomes foram alterados para garantir seu anonimato. Suas idades variam entre 29 e 40 anos. Quanto à escolaridade, 17 possuem ensino superior completo, duas são pós-graduadas e as outras quatro têm ensino médio completo, que é a exigência mínima para o ingresso na PMERJ. Em relação aos perfis familiares, dez são solteiras e treze são casadas - mais da metade possui filhos. Sobre o perfil socioeconômico, a maioria afirmou ser proveniente de famílias com poucos recursos financeiros.

Na PMERJ, treze entrevistadas estão em posições administrativas no interior dos batalhões e as demais atuam em operações táticas de rua, como no patrulhamento de comunidades de risco ou na operação das UPPs de várias comunidades da cidade do Rio de Janeiro. Vale ressaltar que todas já atuaram, em algum momento de suas carreiras policiais, em operações táticas da PMERJ, o que confere a todas elas as experiências peculiares da ação em atividades de risco da corporação.

Quadro 1
Perfil das participantes

ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

A análise e discussão dos dados coletados nas entrevistas sobre os sentidos atribuídos ao trabalho pelas policiais militares foram estruturadas nas categorias: centralidade do trabalho, normas sociais sobre o trabalho e resultados valorizados no trabalho, de acordo com as proposições do grupo MOW (1987). Essa lente teórica, além de alinhada com os objetivos do estudo, mostrou-se aderente ao conteúdo proveniente do campo, o que reforça a atualidade desse modelo.

A centralidade do trabalho em um contexto de adversidades

Com relação à importância do trabalho nas vidas das policiais entrevistadas, cabe destacar a alta centralidade atribuída por todas as participantes (MOW, 1987Meaning of Working International Research Team. (1987). The meaning of working. London, UK: Academic Press.). Para algumas, o exercício da profissão se dá de forma ininterrupta, resultando na impossibilidade de se “desligar” do trabalho, mesmo em momentos de folga, indicando seu forte envolvimento com o trabalho.

Não tem como a gente se desvincular com a polícia, porque a gente vive 24 horas como policial. Por exemplo, eu vou na rua com a minha filha fazer alguma coisa: ‘tô’ armada o tempo todo, entendeu? Porque faz parte da gente (Bianca).

Eu não consigo me desligar do meu serviço. Tirei minha farda, saí do quartel. Deixei de ser polícia? Não consigo! Já arrumei ocorrência no salão de beleza, de eu sair correndo e parar na frente do shopping, com o cabelo cheio de papel laminado, porque o cara entrou no salão e roubou o celular que estava em cima do balcão. Então, você se vê nessa situação 24 horas por dia (Alana).

A questão da vocação, presente na fala de várias entrevistadas, também ajuda a entender o que torna o trabalho tão central em suas vidas. A vocação aparece associada à admiração que as entrevistadas sentiam, desde crianças, pelo trabalho de policial.

Eu acho que, na verdade, sempre tive um comportamento já bastante voltado a essa coisa de resolver problemas. É vocação e admiração pelo trabalho dos policiais (Fernanda).

Eu sempre gostei, não tinha ninguém na família que era policial. Não tinha nenhum amigo que era policial, mas eu sempre me identifiquei. Eu olhava e achava lindo e falava “eu vou ser policial”. E fui. E, na minha época de criança, não tinha muitas mulheres na polícia. Foi quando comecei a ver mulheres fardadas e falei: “é isso que eu quero ser” (Fabiana).

Sempre tive o sonho de ser policial. Desde nova. Sempre sonhei e foquei nisso (Juliana).

Ser policial, para grande parte das entrevistadas, parece ainda indicar a apropriação de um ethos peculiar e, talvez por isso, seja uma profissão da qual elas se orgulhem e cujo exercício transborda as fronteiras do contexto laboral.

Minha mãe fala: “Parece um sargento aqui em casa, mas, aqui em casa, você não é sargento... Olha como você fala com as crianças”. Por mais que você imponha um limite, a incorporação da profissão é tão presente que você acaba levando a polícia para todos os lugares (Rosa).

Ah, ‘pra’ mim é tudo, né? Tudo. Eu me estresso, eu me irrito, eu brigo, eu xingo, mas eu tenho muito orgulho de vestir minha farda. Muito orgulho de trabalhar todo dia (Isadora).

A grande importância atribuída ao trabalho pelas entrevistadas ganha mais relevo se considerarmos as inúmeras dificuldades que enfrentam na rotina de trabalho. Elas relatam condições inadequadas, oriundas de restrições financeiras, e outras dificuldades operacionais da PMERJ, tais como precariedade nos armamentos e falta de organização na gestão de equipes (Minayo et al., 2008Minayo, M. C. S., Souza, E. R., & Constantino, P. (2008). Missão prevenir e proteger: condições de vida, trabalho e saúde dos policiais militares do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ: Editora Fiocruz.).

[...] de você estar num confronto direto com marginais bem armados e você não ter uma arma boa, uma munição. As armas travam, são malconservadas. A polícia ‘tá’ sem viatura, viatura sucateada, as armas todas sucateadas. Vários momentos o policial tem a sua arma travada no meio de um confronto. Então, é muito difícil. Acho que trabalhar na polícia, hoje, é uma situação muito constrangedora, porque a gente não tem nem o respaldo do Estado, né? (Maria).

Além disso, locais de operação da polícia fora dos batalhões, como as UPPs, não oferecem condições de trabalho adequadas em termos de higiene e segurança, expondo as policiais a toda sorte de riscos e reforçando as barreiras de gênero fortemente presentes na profissão.

Eu tive que ficar três anos sem menstruar, até eu conseguir me adaptar às condições de trabalho (Fernanda).

Nossa, é complicado. É um universo muito machista... é o tempo inteiro te pondo à prova. Achando que você não é capaz, que você não vai conseguir fazer, que “Ah não, mulher ‘pra’ isso, não. Melhor pegar outro, vamos pegar um homem que é melhor ‘pra’ fazer”. E é, como dizem, matar um leão por dia (Desirre).

Na literatura que discute sobre as barreiras enfrentadas por mulheres que atuam em profissões estereotipadas como masculinas (Cappelle & Melo, 2010Cappelle, M. C. A., & Melo, M. C. O. L. (2010). Mulheres policiais, relações de poder e de gênero na Polícia Militar de Minas Gerais. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 71-99.; Donadio & Mazzota, 2009Donadio, M., & Mazzotta, C. (2009). La mujer en las instituciones armadas y policiales: Resolución 1325 y operaciones de paz en América Latina. Buenos Aires, Argetina: RESDAL.; Pringle et al., 2017Pringle, J. K., Harris, C., Ravenswood, K., Giddings, L., Ryan, I., & Jaeger, S. (2017). Women’s career progression in law firms: Views from the top, views from below. Gender, Work & Organization, 24(4), 435-449.), destaca-se que o acesso aos cargos de maior importância hierárquica é dificultado às policiais.

A prova para oficial: ano passado foram 100 vagas, cinco pra mulheres. Isso é um absurdo. Qual a diferença? O que um homem faz que uma mulher não faz? O treinamento é todo igual. Por que que, nessas horas, é diferente? (Isadora).

As policiais também parecem ser discriminadas em espaços profissionais considerados elitizados na medida em que sua presença implicaria desvalorização destes.

Até no curso a mulher é muito malvista. Eles têm a visão de que, no curso ali, operacional, se uma mulher consegue passar é porque o nível do curso está fraco. Então é muito difícil você ver uma mulher passar no BOPE, no choque, nesses cursos melhores, justamente por causa disso. E, às vezes, quando entram, eles costumam pressionar bastante ‘pra’ que elas não formem [...], porque existe a ideia de que, se uma mulher consegue cursar, é porque o nível do curso está baixo (Gisele).

Algumas das participantes alegam que precisam renunciar a comportamentos considerados “femininos” para serem respeitadas por seus pares (Cappelle & Melo, 2010Cappelle, M. C. A., & Melo, M. C. O. L. (2010). Mulheres policiais, relações de poder e de gênero na Polícia Militar de Minas Gerais. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 71-99.), o que reforça o entendimento de que a profissão de policial é “tipicamente” masculina (Borrowman & Klasen, 2017Borrowman, M., & Klasen, S. (2017). Drivers of gendered sectoral and occupational segregation in developing countries (Discussion Papers, n. 222). Göttingen, Germany: University of Göttingen.).

Eu tive que amadurecer, tive que perder um pouco a feminilidade. ‘Pra’ não ficar muito ruim ‘pra’ gente, eu acabo virando um homenzinho aqui. Você acaba tendo que se moldar ao ambiente, que aí fica mais fácil conviver. Aqui é um meio masculino, [...] então tem que se adequar (Heloisa).

Ano passado, eu estava trabalhando na rua, eles ficavam olhando, de ficar zombando, de ficar rindo. Entendeu? Por ser mulher, sabe? E aí a gente tinha que agir de outra maneira. Não tem jeito. Aí, você tem que mostrar que você não é uma mulher. Você ‘tá’ igual a um homem ali. Entendeu? (Isadora).

O acesso a uma carreira estereotipada como masculina parece cobrar um preço alto dessas mulheres, cujo cotidiano profissional se revela pontuado por situações frequentes de assédio moral e sexual e até episódios de violência sexual (Ribeiro, 2018Ribeiro, L. (2018). Polícia Militar é lugar de mulher? Estudos Feministas, 26(1), 1-15.; Williams, 2013Williams, C. L. (2013). The glass escalator, revisited: Gender inequality in neoliberal times, SWS feminist lecturer. Gender & Society, 27(5), 609-629.).

Você chega na unidade, todo mundo fica olhando. “Hum, olha ela deve estar na pista, né?”. Isso acontece nas empresas, mas na polícia tem um plus, é tudo ao quadrado (Paula).

Vieram de graça, achando, tipo assim, “Ah! mais uma”. Eu ouvi dizer que existem vários casos de assédio, vários casos de... [silêncio]. Mas a gente é muito calada quanto a isso. A mulher ainda tem medo de falar sobre essas questões. Então, o que aconteceu comigo foi, tipo assim, acredito que eles já tinham feito com várias e não deu em nada. [...] A questão do assédio na polícia é forte (Maria).

Em seu conjunto, os relatos dessas mulheres evidenciam tanto a centralidade que o trabalho de policial assume em suas vidas quanto as várias dificuldades enfrentadas em seu dia a dia como policiais femininas, dificuldades estas decorrentes, em grande medida, do fato de atuarem em uma profissão estereotipada como masculina, o que coincide com evidências encontradas na literatura (Bishu & Headley, 2020Bishu, S. G., & Headley, A. M. (2020). Equal employment opportunity: Women bureaucrats in male-dominated professions. Public Administration Review, 80(6), 1063-1074.; Kringen & Novich, 2018Kringen, A. L., & Novich, M. (2018). Is it ‘just hair’ or is it ‘everything’? Embodiment and gender repression in policing. Gender, Work & Organization, 25(2), 195-213.; Yates et al., 2018Yates, S., Riach, K., & Johansson, M. (2018). Stress at work, gendered dys-appearance and the broken body in policing. Gender, Work & Organization, 25(1), 91-105.). Todavia, a julgar pelos depoimentos, as muitas barreiras interpostas em seu cotidiano não parecem desestimulá-las a trabalhar e tampouco comprometem os sentidos positivos atribuídos ao trabalho que realizam.

Normas sociais sobre o trabalho: quando os deveres eclipsam os direitos

O grupo MOW (1987) considera que as normas representam a ideia de que todo indivíduo tem direitos e deveres relativos ao trabalho. Nos relatos, o senso de dever, fortemente associado ao trabalho policial (Minayo et al., 2008Minayo, M. C. S., Souza, E. R., & Constantino, P. (2008). Missão prevenir e proteger: condições de vida, trabalho e saúde dos policiais militares do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ: Editora Fiocruz.), foi frequentemente sublinhado pelas entrevistadas:

Eu sou o tipo de pessoa que, se ‘tiver’ tendo um problema em qualquer lugar, eu vou ser uma das primeiras pessoas a pegar o meu armamento e falar “então vamos pra lá” (Fabiana).

Então, quando eu consigo, junto com meus colegas, tirar arma, tirar droga da rua, eu ‘tô’ servindo a mim, à minha família, né? Nós somos beneficiários do serviço que nós ajudamos a prestar (Francisca).

Eu gosto de fato disso, sabe? Servir e proteger [...]. Eu gosto de estar no grupamento tático, que é onde a gente tem mais contato com a sociedade. É onde você se sente útil e desenvolve a função policial militar (Bianca).

Os depoimentos das entrevistadas reforçam o entendimento de Minayo et al. (2008Minayo, M. C. S., Souza, E. R., & Constantino, P. (2008). Missão prevenir e proteger: condições de vida, trabalho e saúde dos policiais militares do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ: Editora Fiocruz.) de que, no que tange a uma certa conduta moral e profissional, os processos laborais da polícia são inseparáveis de um modo de viver e pensar que contribui para forjar um perfil de trabalhador apto a cumprir seu dever e honrar as expectativas da sociedade. Além do senso de dever já ilustrado, a correção moral é, também, destacada por Isadora: “Muito orgulho em saber que eu sempre tive minha ficha totalmente limpa. Que eu nunca me corrompi. Que eu nunca me envolvi com nada errado.” Servir à sociedade e fazê-lo com retidão moral sobressaíram-se como atitudes valorizadas pelas policiais entrevistadas.

Aspectos relativos aos direitos dessas profissionais não apareceram nos relatos, o que nos leva a indagar se essa ausência não estaria relacionada às inúmeras concessões feitas cotidianamente pelas policiais, de forma a neutralizar os estigmas associados a elas. Também é possível que estas policiais sintam-se intrusas em um ambiente predominantemente masculino e, portanto, com menos legitimidade para reivindicar direitos (Cappelle & Melo, 2010Cappelle, M. C. A., & Melo, M. C. O. L. (2010). Mulheres policiais, relações de poder e de gênero na Polícia Militar de Minas Gerais. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 71-99.; Kringen & Novich, 2018Kringen, A. L., & Novich, M. (2018). Is it ‘just hair’ or is it ‘everything’? Embodiment and gender repression in policing. Gender, Work & Organization, 25(2), 195-213.; Yates et al., 2018Yates, S., Riach, K., & Johansson, M. (2018). Stress at work, gendered dys-appearance and the broken body in policing. Gender, Work & Organization, 25(1), 91-105.).

Resultados valorizados no trabalho: independência financeira, prestígio e propósito

Os resultados sobre o trabalho que as entrevistadas mais demonstraram valorizar estão associados à remuneração recebida, que lhes assegura algum conforto material e independência financeira, ao prestígio por exercer um trabalho socialmente reconhecido e ao senso de propósito decorrente do serviço prestado à sociedade.

A independência financeira e a vida mais digna, para elas e suas famílias, foram conquistadas após o ingresso na corporação e emergiram com intensidade em seus relatos. Para muitas, a opção pela carreira de policial militar deveu-se, em grande medida, à busca por segurança financeira associada à atuação em um cargo público. Ainda que enfrentem inúmeros percalços na rotina de trabalho, tais conquistas lhes conferem grande satisfação com a profissão e as mantêm motivadas.

O meu trabalho é tudo. Tudo que eu conquistei, eu consegui através do meu trabalho. [...] Poderia ser melhor? Poderia, mas não é. Eu faço o possível e o impossível para manter meu trabalho porque é dali que eu tiro meu sustento e da minha família (Desirre).

É o meu sustento, é de onde eu consigo tirar as boas coisas para minha filha... Onde eu consigo pagar o plano de saúde, pagar o colégio particular. [...] Tem as suas peculiaridades, como qualquer trabalho tem? Tem. Tem ponto negativo? Tem. Mas eu gosto muito do que eu faço (Fabiana).

É a minha independência. Eu hoje tenho uma casa legal, não moro mais em comunidade. Moro em um lugar legal com meu filho, meu filho estuda em colégio particular, tem as coisinhas dele, dentro do possível. E, no fundo, eu gosto. O que a polícia me proporciona é minha independência e eu sou muito agradecida por isso. Vejo que as pessoas que estão à minha frente já têm uma situação melhor e isso me motiva um pouco mais (Natalia).

Segundo Kergoat (2019Kergoat, D. (2019). O trabalho, um conceito central para os estudos do gênero. In M. Maruani. (Org.), Trabalho, logo existo: perspectivas feministas. Rio de Janeiro: Editora FGV., p. 293), “[...] o trabalho remunerado continua a constituir a base da autonomia das mulheres” e, neste sentido, o trabalho de policial parece representar a possibilidade de sua emancipação. Como não existe diferença salarial entre homens e mulheres nesta e nas demais ocupações públicas, é possível considerar que a escolha desta carreira tenha sido, em parte, influenciada pela perspectiva de uma remuneração considerada atraente para essas mulheres, oriundas, em sua maioria, das camadas populares.

O segundo resultado sobre o trabalho considerado relevante refere-se ao prestígio social que esta ocupação lhes confere: muitas destacaram o orgulho que suas mães, pais, avós, filhos e maridos sentem do trabalho que realizam. Para Francisca e Alana, por exemplo, a admiração advinda de pessoas próximas é uma importante fonte de inspiração à sua atuação profissional, amenizando as dificuldades inerentes à carreira.

[...] orgulho de saber que a filha é policial, que a filha é sargento da polícia. Eles (os pais) falam com um certo orgulho. A minha filha, também, eu vejo muito isso nela, de contar para os coleguinhas da escola que a mãe é policial, de querer ter uma farda (e ela tem!). Eu mandei fazer para ela, porque ela queria se vestir igual a mim (Francisca).

Minha avó é louca de paixão, é o orgulho da vida dela que ela tem uma neta policial. Ela não pode me ver fardada, que ela fica assim “Ai meu Deus, como eu sinto orgulho disso” (Alana).

O depoimento de Bianca ilustra a admiração que algumas participantes também recebem por parte da população. O entusiasmo expresso por crianças quando as policiais estão em atividades de patrulhamento é fonte de satisfação e aumenta sua identificação com a carreira escolhida.

É um retorno superbacana. Muitas vezes, durante o patrulhamento, tem uma criança que faz um “joinha” ‘pra’ mim. Eu já tive situações, por exemplo, nas Olimpíadas, de criança tirando foto comigo, dizendo que quando crescer vai ser assim também. Já tive criança que me pediu autógrafo. Então é a coisa mais linda. Eu acho que eu não faria outra coisa na vida (Bianca).

É possível indagar se o prestígio conferido pela profissão de policial militar é importante para as participantes porque sinaliza a conquista de um espaço em uma carreira considerada masculina e, por isso, de difícil acesso às mulheres (Hirata, 2018Hirata, H. (2018). Gênero, patriarcado, trabalho e classe. Revista Trabalho Necessário, 16(29), 14-27.), ou seja, se a percepção de prestígio decorre, justamente, do fato de se tratar de profissão estereotipada como masculina.

Por fim, o senso de missão ou propósito em relação ao trabalho que realizam é outro resultado valorizado. Para as participantes, o trabalho de policial militar é nobre, gratificante e de grande utilidade para a população, como ilustram as falas seguintes. Vale destacar que o sentimento de servir à sociedade (MOW, 1987Meaning of Working International Research Team. (1987). The meaning of working. London, UK: Academic Press.; Rosso et al., 2010Rosso, B. D., Dekas, K. H., & Wrzesniewski, A. (2010). On the meaning of work: A theoretical integration and review. Research in Organizational Behavior, 30, 91-127.) está presente tanto entre policiais que trabalham em operações de rua, quanto entre as que se dedicam a atividades administrativas.

Meu trabalho significa muita coisa. A rotina da polícia me faz muito bem. Eu me acho superimportante aqui no quartel. Não estou dizendo que sou insubstituível, que sou melhor do que alguém, mas eu atribuo valor à minha presença aqui. Aqui, eu consigo ver as coisas acontecendo. O polícia precisa de uma viatura? Eu consigo fazer o possível para que essa viatura seja liberada. Eu consigo ajudar um monte de gente, só fazendo meu serviço (Rosa).

Todo dia que eu saio para trabalhar, eu ‘tô’ fazendo a diferença para alguém. Eu ‘tô’ evitando um carro ser roubado quando eu passo na rua. A gente pegou uma parturiente aqui no centro, a menina estava dando à luz. Botei na viatura e levei ela ‘pro’ hospital. Esse dia foi incrível. Porque a mulher podia ter passado mal, ter complicações com o filho, podia ter morrido e, por causa de uma condução até o hospital, o filho nasceu e foi tudo perfeito. Eu prendo vagabundo, mas eu levo a moça que ‘tá’ passando mal para o hospital (Diana).

Em suma, mesmo diante de inúmeros obstáculos, o trabalho policial parece ter sentido para essas mulheres na medida em que está relacionado ao exercício de uma profissão que lhes garante o sustento, que lhes confere um relativo destaque social e que lhes traz realizações na medida em que lhes permite prestar um serviço que consideram socialmente relevante.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os relatos das entrevistadas revelaram que o trabalho de policial é central em suas vidas. A despeito das inúmeras dificuldades relacionadas às condições laborais inadequadas e à cultura machista da corporação, típica de uma profissão estereotipada como masculina (Minayo et al., 2008Minayo, M. C. S., Souza, E. R., & Constantino, P. (2008). Missão prevenir e proteger: condições de vida, trabalho e saúde dos policiais militares do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ: Editora Fiocruz.; Ribeiro, 2018Ribeiro, L. (2018). Polícia Militar é lugar de mulher? Estudos Feministas, 26(1), 1-15.), essas policiais retratam suas vivências de forma positiva e, até mesmo, inspiradora. A alta centralidade do trabalho também aparece retratada na dificuldade que elas encontram para se desligar do ofício e pela reprodução constante da linguagem e postura de policial fora do horário de trabalho, transbordando para suas vivências familiar e social.

Dentre os resultados valorizados, destacam-se a conquista da independência financeira e de uma vida mais confortável para elas e suas famílias. Este aspecto pode estar associado à origem social das entrevistadas, marcada por dificuldades materiais e de inserção profissional, cabendo destacar que a maioria se posiciona como principal responsável pelo sustento de suas famílias. A ênfase na independência conquistada por meio do trabalho sinaliza uma aspiração de cunho feminista, pois, além do desejo de superar privações materiais típicas de seus contextos de origem, essas mulheres revelaram, também, o desejo por maior autonomia e autodeterminação (Kergoat, 2019Kergoat, D. (2019). O trabalho, um conceito central para os estudos do gênero. In M. Maruani. (Org.), Trabalho, logo existo: perspectivas feministas. Rio de Janeiro: Editora FGV.).

Outro aspecto que emergiu da análise refere-se a que o prestígio do trabalho de policial reflete-se no orgulho de seus familiares e no reconhecimento por parte da comunidade em que estão inseridas. Nesse sentido, cabe indagar se essa admiração deve-se ao fato de atuarem em uma carreira vista como masculina e, por isso, entendida como superior (Williams, 2013Williams, C. L. (2013). The glass escalator, revisited: Gender inequality in neoliberal times, SWS feminist lecturer. Gender & Society, 27(5), 609-629.). Em outros termos, a conquista de um espaço profissional em um território considerado masculino pode ter contribuído para a construção de uma autoimagem “superior”, por ser masculinizada. Ainda que não se possa confirmar essa suposição, alguns relatos sugerem, por parte das entrevistadas, uma autoimagem positiva por associação aos estereótipos de masculinidade.

Por fim, as policiais também destacam a satisfação em realizar um trabalho socialmente relevante, seja pela segurança oferecida no patrulhamento ou pela ajuda que prestam às pessoas, em diversas situações. A contribuição social em conjunto com o trabalho de policial pode explicar tanto a sensação de que exercem um trabalho com sentido, quanto a admiração por parte das famílias dessas policiais, o que também reforça o sentido positivo atribuído a seu trabalho.

Em suma, esses aspectos contribuem para tornar central sua experiência laboral na polícia, mesmo diante de percalços derivados da atuação em uma profissão desafiadora para todos que a escolhem e que, para as mulheres, em particular, envolve desafios decorrentes do fato de atuarem em uma profissão dominada numericamente por homens e com uma cultura essencialmente machista. Essa constatação nos permite trazer duas contribuições ao debate sobre os sentidos do trabalho.

A primeira diz respeito ao entendimento do sentido do trabalho para mulheres que atuam em uma profissão estereotipada pelo gênero; as barreiras enfrentadas por elas poderiam pôr em xeque tal sentido, mas o estudo revelou que, apesar das adversidades, o trabalho como policial é percebido como central na vida dessas profissionais.

A segunda contribuição relaciona-se ao aparente paradoxo, retratado na pesquisa, entre um trabalho exercido em condições desfavoráveis, porém pleno de sentido. A explicação para essa combinação pode dever-se, de um lado, à natureza do trabalho, carregado de senso de missão (Minayo et al.,2008Minayo, M. C. S., Souza, E. R., & Constantino, P. (2008). Missão prevenir e proteger: condições de vida, trabalho e saúde dos policiais militares do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, RJ: Editora Fiocruz.) e retratado como vocacionado por algumas entrevistadas e, de outro, à satisfação pela conquista do espaço em uma área ocupacional estereotipada como masculina e aberta às mulheres só há pouco tempo (Hirata, 2018Hirata, H. (2018). Gênero, patriarcado, trabalho e classe. Revista Trabalho Necessário, 16(29), 14-27.; Williams, 2013Williams, C. L. (2013). The glass escalator, revisited: Gender inequality in neoliberal times, SWS feminist lecturer. Gender & Society, 27(5), 609-629.). Missão, superação, independência financeira e conquista talvez expliquem a alta centralidade do trabalho para essas profissionais. Cabe destacar que a literatura corrente sobre o sentido do trabalho não aprofunda a discussão acerca do paradoxo entre condições laborais adversas e centralidade e apreço pelo trabalho.

A constatação da forte identificação dessas profissionais com seu trabalho permite-nos trazer, também, contribuições para a literatura sobre profissões estereotipadas como masculinas. A constatação desta identificação amplia o debate acerca destas profissões, já que se tende a enfatizar os efeitos deletérios para as mulheres que nelas atuam (Cappelle & Melo, 2010Cappelle, M. C. A., & Melo, M. C. O. L. (2010). Mulheres policiais, relações de poder e de gênero na Polícia Militar de Minas Gerais. Revista de Administração Mackenzie, 11(3), 71-99.; Kringen & Novich, 2018Kringen, A. L., & Novich, M. (2018). Is it ‘just hair’ or is it ‘everything’? Embodiment and gender repression in policing. Gender, Work & Organization, 25(2), 195-213.; Pringle et al., 2017Pringle, J. K., Harris, C., Ravenswood, K., Giddings, L., Ryan, I., & Jaeger, S. (2017). Women’s career progression in law firms: Views from the top, views from below. Gender, Work & Organization, 24(4), 435-449.; Yates et al., 2018Yates, S., Riach, K., & Johansson, M. (2018). Stress at work, gendered dys-appearance and the broken body in policing. Gender, Work & Organization, 25(1), 91-105.). Nesse sentido, pode-se ponderar que os obstáculos enfrentados pelas policiais nessa carreira estereotipada não conseguem esvaziar a identificação e os sentidos positivos associados a seu trabalho; ao contrário, o enfrentamento das adversidades parece ampliar estes sentidos.

Pode-se postular, ainda, que, apesar dos estereótipos que marcam essa e outras profissões, não há profissões masculinas e femininas, mas profissões dominadas numericamente por um ou outro gênero. Em outros termos, não há vocações genderizadas, apenas espaços laborais delimitados historicamente como típicos de um determinado gênero. Nesse sentido, o presente trabalho contribui para a crítica a estereótipos e para reforçar o coro por um mundo do trabalho agênero.

Dentre as limitações desta pesquisa, destaca-se que não foram feitas entrevistas com mulheres do círculo de oficiais da PMERJ. Devido ao recorte escolhido, as percepções destas profissionais não foram contempladas, pois poderiam trazer à tona aspectos relacionados aos cargos de liderança que ocupam. Dessa forma, como agenda de pesquisa futura, sugere-se explorar os sentidos atribuídos ao trabalho por mulheres que ocupam posições de comando da PMERJ, visto que, para este grupo, as vivências e desafios enfrentados, possivelmente, assumem diferentes contornos. Outro aspecto a ser abordado em estudos futuros diz respeito ao processo de construção identitária de mulheres policiais em seu ambiente laboral, estereotipado como masculino. É possível que os diversos obstáculos vivenciados pelas policiais nesse contexto adverso mostrem-se relevantes e permitam o surgimento de novos olhares sobre este fenômeno.

AGRADECIMENTOS

A primeira autora agradece à CAPES pela bolsa de estudos concedida para a realização de seu doutorado na PUC-Rio, cuja tese serviu de base para o presente artigo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Set 2022
  • Data do Fascículo
    Jul-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    21 Maio 2021
  • Aceito
    13 Dez 2021
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