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Colonialismo na América Latina? Uma perspectiva pós-colonial sul-sul nas relações humanas de uma empresa brasileira na Bolívia

Resumo

O caso aborda a situação vivida por José, executivo, gerente de RH de uma empresa brasileira de óleo e gás na Bolívia. José sustenta seu trabalho de um ponto de vista humanístico único. No entanto, ao iniciar seu trabalho, ele se assusta com um diagnóstico cultural do ano anterior. Os colaboradores revelaram uma visão negativa do Brasil e da empresa, relacionada a uma história de dominação. Olhando para o desenho de um engenheiro boliviano durante as entrevistas, José pôde ver essa representação. Um participante desenhou um funcionário boliviano quando menino, preso por correntes a um adulto implacável que representava os gestores brasileiros. Como reagir a um desenho com uma expressão tão clara? Pela primeira vez, José se viu no lugar do opressor. Como brasileiro, ele estava acostumado a sentir o que é estar no papel de subordinado. Definitivamente, ele é desafiado a criar um plano de ação para lidar com a situação, mesmo enfrentando um chefe obstinado como a representação do adulto. Desta maneira, resta a indagação de qual seria uma solução que fizesse a diferença para todos os envolvidos e reduzisse essa assimetria. Assim, o caso permite aos alunos ter uma visão crítica da subalternidade envolvida nas questões de diferenças culturais nas operações internacionais de corporações multinacionais. Além disso, permitem elaborar soluções para questões relacionais no campo internacional, entre organização e colaboradores dentro do eixo Sul-Sul.

Palavras-chave:
Internacionalização; Recursos Humanos; Colonialidade; Brasil; Bolívia

Abstract

The case addresses the situation experienced by José, an executive, HR manager of a Brazilian oil and gas company in Bolivia. José sustains his work from a unique humanistic standpoint. However, when starting his job, he gets scared of a cultural diagnosis that occurred the previous year. The employees revealed a negative view of Brazil and the company, related to a history of domination. Looking at a Bolivian engineer’s drawing during the interviews, José could see this representation. One participant sketched a Bolivian employee as a boy imprisoned by chains to a ruthless adult representing the Brazilian managers. How can one react to a drawing with such a clear expression? For the first time, José saw himself in the oppressor’s shoes. As a Brazilian, he was used to feeling what it is to be in a subordinate role. Now, he is challenged to create an action plan to deal with the situation, even facing a headstrong boss like the adult’s depiction. He wondered what solution could make a difference for everyone involved and reduce this asymmetry. Thus, the case allows students to have a critical view of the subalternity involved in cultural differences in the international operations of multinational corporations. Furthermore, students can propose solutions for relational issues in the international field between the organization and employees within the South-South axis.

Keywords:
Internationalization; Human Resources; Coloniality; Brazil; Bolivia

Resumen

El caso aborda la situación vivida por José, un ejecutivo, gerente de Recursos Humanos de una empresa brasileña de petróleo y gas en Bolivia. José sustenta su trabajo desde un punto de vista humanista único. Sin embargo, al comenzar su trabajo, se asusta con un diagnóstico cultural del año anterior. Los empleados revelaron una visión negativa de Brasil y la empresa, relacionada con una historia de dominación. Al mirar el dibujo de un ingeniero boliviano durante las entrevistas, José pudo ver esa representación. Un participante dibujó a un empleado boliviano como un niño encadenado a un adulto implacable que representaba a los gerentes brasileños. ¿Cómo reaccionar ante un dibujo con una expresión tan clara? Por primera vez, José se vio en el lugar del opresor. Como brasileño, estaba acostumbrado a sentir lo que es estar en el rol de subordinado. Definitivamente, tiene el desafío de crear un plan de acción para lidiar con la situación, incluso enfrentando a un jefe testarudo como la representación del adulto. Por lo tanto, resta indagar cuál sería una solución que marcaría la diferencia para todos los involucrados y reduciría esta asimetría. Así, este caso permite a los estudiantes tener una visión crítica de la subalternidad involucrada en las cuestiones de diferencias culturales en las operaciones internacionales de las empresas multinacionales. Además, permite la elaboración de soluciones a problemas relacionales en el ámbito internacional, entre la organización y los empleados dentro del eje Sur-Sur.

Palabras clave:
Internacionalización; Recursos humanos; Colonialidad; Brasil; Bolivia

INTRODUÇÃO

Era um dia bastante quente de dezembro de 2014, em Santa Cruz de La Sierra, Bolívia, na sede da Companhia Boliviana-Brasileira de Energia. José, o gerente brasileiro responsável pelo RH local, estava em seu primeiro dia de trabalho na nova função. Apesar de ser tudo novo para ele - o país, o escritório, os colegas, o chefe -, José estava animado para enfrentar os novos desafios.

Suas primeiras impressões foram marcantes. Por um momento pensou que tudo poderia ser mais fácil, pois a empresa estava no país há mais de 15 anos. Todos o receberam com grande simpatia e sua equipe parecia acolhedora e receptiva. No entanto, em uma reunião de almoço com seu chefe Carlos - presidente da empresa e um engenheiro pragmático, rígido, direto e objetivo - José foi advertido. Carlos trabalhava na companhia desde sempre, dedicou sua vida a ela, e foi bastante claro com o recém-chegado: “não se iluda com a recepção calorosa. Eles [os demais colaboradores] só são úteis até a página 2. É preciso ser duro com os funcionários aqui; caso contrário, nada funciona. No ano passado fizemos um diagnóstico de comunicação e cultura que já enviei para o seu e-mail. É interessante, mas acho que não adianta muito. De qualquer forma, seria bom você dar uma pesquisada antes de preparar seu plano de ação. Olha, José, tenho grandes expectativas sobre seu trabalho, e precisamos aumentar o engajamento da força de trabalho. É como te falei, estão sempre sorrindo, concordando com tudo, mas não respondem às demandas na hora que você precisa. Por favor, trabalhe neste ponto o máximo que puder.”

Na tarde do mesmo dia, José leu todo o diagnóstico mencionado por Carlos. Em seu quarto tomando café e olhando pela janela, pensava na situação e nos desafios que se avizinhavam depois de assumir o cargo e se mudar com a família para o novo país. José estava com 45 anos e, mesmo com toda a experiência pessoal e profissional, sentia que teria sérios problemas pela frente. O diagnóstico revelava que a força de trabalho local oferecia uma resistência camuflada.

A metodologia do diagnóstico envolveu entrevistas, desenhos e observação. Os resultados foram precisos: os bolivianos se sentiam subalternizados, inferiores, dependentes e distantes das instâncias de tomada de decisão. Assim, parecia ser natural encontrar mecanismos de resistência dissimulados nas atitudes dos colaboradores no sentido de equilibrar tal assimetria. José, como brasileiro, conhecia bem essa história. Afinal, mesmo trabalhando em uma estatal, também se sentia culturalmente no papel de colonizado nas relações com outros atores internacionais do setor. No entanto, naquele momento, seu mal-estar estava em encontrar-se na posição do outro, do estrangeiro dominador, representante do fardo que é o imperialismo cultural e econômico que tanto detestava. Então, mesmo após 15 anos de atuação da companhia naquele país, as situações sociais e históricas profundamente enraizadas apareciam com vigor. Portanto, as coisas provavelmente não seriam tão fáceis como José havia pensado inicialmente.

Além disso, era preciso atentar ao comportamento de seu chefe. O raciocínio de Carlos era bastante conservador, inflexível e insensível aos resultados do diagnóstico preparado pela consultoria, que revelava a grande distância cultural e a necessidade de diminuir as assimetrias de poder na estrutura local.

À sua maneira, José viu o desafio que teria de enfrentar. Ele cresceu no Brasil, no Rio de Janeiro, numa família de intelectuais. Seu pai era professor de história e sua mãe era uma pesquisadora cientista social. Estudou administração na faculdade, mas sempre se interessou por questões sociais relacionadas ao trabalho e às relações de poder nas organizações. Talvez por isso sua escolha profissional tenha sido trabalhar na maior estatal de petróleo e gás do país ao invés de investir em uma trajetória em empresas privadas ou estrangeiras.

Companhia brasileira de energia

A Companhia Brasileira de Energia (CBE) foi criada, em meados do século XX, pelo governo brasileiro em uma época marcada pelo discurso nacionalista e industrializante. Para muitos brasileiros, assim como para José, a criação dessa empresa teve um significado especial, representando um movimento de resistência contra a hegemonia dos anglo-saxões e de países que dominavam (e ainda dominam) o mundo capitalista e a indústria petrolífera.

A empresa começou a processar petróleo em 1953 e desenvolveu uma tecnologia para extrair óleo de xisto betuminoso, explorando-o em escala industrial a partir da década de 1990. Em 1994, a CBE colocou em serviço a maior plataforma de petróleo do mundo, que acabou afundando após uma explosão em 2001, com perda total. Várias outras plataformas de petróleo permaneceram operacionais, mas grandes perdas foram registradas. Em 1997, o governo aprovou a Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997 que quebrou o monopólio da CBE, permitiu a concorrência nos campos petrolíferos do Brasil, criou a Agência Nacional do Petróleo (ANP) e a regulação e os elementos para a supervisão da indústria do petróleo. Em 1999, a ANP assinou acordos com outras empresas, encerrando o monopólio em definitivo.

Em 2006, a empresa informou que sua planta industrial poderia processar 260 toneladas/hora de xisto betuminoso. Em 2000, a CBE estabeleceu um recorde mundial de exploração de petróleo em águas profundas, atingindo uma profundidade de 1.877 metros (6.158 pés) abaixo do nível do mar. Em 2002, adquiriu a empresa argentina Perez Companc Energía (PECOM Energía S.A.) do Perez Companc Family Group[es] e sua fundação familiar por US$ 1,18 bilhão. No período, a CBE adquiriu ativos na Argentina, Brasil, Venezuela, Bolívia, Peru e Equador, além de 1,1 bilhão de barris de reservas de petróleo bruto e 181 mil barris de óleo equivalente (1.110.000 GJ) por dia.

Em 2005, a CBE anunciou uma joint venture com a Nippon Alcohol Hanbai para vender etanol brasileiro ao Japão (a Brazil-Japan Ethanol). Em 21 de abril de 2006, a empresa iniciou a produção da plataforma petrolífera P-50 no campo de Albacora Leste na Bacia de Campos, tornando o Brasil autossuficiente na produção de petróleo. Em novembro de 2015, a empresa havia acumulado US$ 128 bilhões em dívidas, 84% delas em moedas estrangeiras.

Hoje, a CBE ainda é uma empresa multinacional de economia mista atuando no setor de petróleo com distribuição, exploração e refino de combustíveis e gás. É a maior empresa brasileira, com mais de 100 mil colaboradores, atuando em dezessete países. As reservas fora do Brasil representaram 8,4% da produção em 2017, a maior parte na América do Sul (Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Venezuela, Paraguai e Uruguai). A CBE atua na Bolívia desde 1996, mas desenvolve atividades internacionais em outros países desde a década de 1970.

O relatório diagnóstico preparado pela consultoria

José trabalha na Companhia Brasileira de Energia (CBE) desde seus 25 anos de idade e sua carreira tem progredido na empresa. Sempre trabalhou na gestão de recursos humanos, área que está naturalmente alinhada a seus interesses pessoais e ideológicos. O mais recente desafio da carreira foi a promoção a uma posição internacional como Gerente Geral de Recursos Humanos, na Bolívia. Na função, José tinha sob sua responsabilidade aproximadamente 3.000 funcionários, principalmente bolivianos, divididos em quatro cidades e atuantes em diversos setores da indústria de petróleo e gás.

Depois de almoçar com seu chefe e ler o relatório da consultoria, José ficou bastante apreensivo. Resolveu imprimir o documento para tê-lo em mãos e consultá-lo com frequência. A consultoria preparou um diagnóstico cultural baseado em entrevistas com funcionários para entender como se sentiam trabalhando para a empresa brasileira, as dificuldades de relacionamento e as principais diferenças a serem consideradas em futuros planos de ação.

José gostava de seu trabalho, mas ficou muito incomodado com alguns detalhes do diagnóstico. Na metodologia aplicada pela consultoria, os colaboradores tinham a opção de fazer desenhos ou colagens que pudessem representar seus sentimentos em relação à empresa e seu relacionamento com os brasileiros (geralmente gerentes e diretores). As representações gráficas tinham a intenção de dar liberdade aos entrevistados para expor suas posições inconscientes, uma vez que a simples resposta a perguntas pode levar a expressão de respostas desejáveis e não necessariamente reais. O que José viu em alguns desenhos o deixou muito preocupado. Não conseguiu tirar os olhos de um deles, em particular.

Figura 1
Desenho elaborado por funcionário boliviano

O desenho da Figura 1 parecia representar com bastante vigor, algo que estaria implícito na maioria das representações feitas durante o diagnóstico. Era um desenho feito por um engenheiro boliviano, supervisor de produção da usina de Santa Cruz.

O relatório da consultoria interpretou a figura como reveladora de um autor que vê sua própria identidade e a cidade de Santa Cruz, como vinculadas a um cão de guarda hierarquicamente forte chamado Brasil. Além disso, a corrente representa o elo entre a cidade boliviana e o Brasil, refletindo o sentimento de dominação e - possivelmente - as aspirações subimperialistas brasileiras na América do Sul implementadas por gerentes e diretores da multinacional.

Segundo o relatório, a figura da criança representaria a identificação desse homem como sujeito subalterno no relacionamento. Já a figura adulta masculina representaria o poder exercido pela matriz sobre a subsidiária em relação aos recursos disponíveis. Além disso, representações dessa natureza enfatizam questões de assimetria de poder entre os atores.

José então refletiu sobre como lidar com a questão. Era difícil assimilar que, para os colaboradores locais, ele e outros brasileiros eram vistos como o homem autoritário e duro que “escravizava”, no sentido figurado, os trabalhadores locais presos em correntes. Não passava pela sua cabeça, até aquele momento, que ele mesmo, sendo funcionário de uma empresa brasileira, poderia representar o poder hegemônico para aquela população local. José se concentrou em um trecho do relatório que explicava melhor a relação pós-colonial Sul-Sul entre Brasil e Bolívia, e achou que seria essencial mergulhar na história da relação entre os dois países para entender o que estava acontecendo atualmente na companhia.

As preocupações de José

Depois de tanto tempo em uma multinacional em um setor altamente competitivo, sabia que o “mundo do hemisfério norte” percebia de maneira distinta as práticas gerenciais dos chamados países emergentes. O ar de superioridade e a desconfiança na capacidade de gerar resultados superiores marcaram a relação entre os dois polos. No entanto, nesse contexto, a inserção do Brasil na nova ordem econômica - mais competitiva e conectada - não poderia ser desfeita, e seria necessário aprender a lidar com as pressões para a adoção de práticas gerenciais importadas do Norte e estabelecer novas relações Sul-Sul.

José nem discutiu mais sobre o mal-entendido que percebeu na adoção acrítica de modelos estabelecidos em empresas europeias e norte-americanas. Estava cansado de argumentar sobre a possibilidade do fracasso dessas práticas na medida em que desconsideravam a cultura e o conhecimento construídos localmente, ao longo do tempo, e aplicados em países periféricos, o que também é o caso do Brasil. Além disso, as empresas desses países emergentes operam em um caldeirão complexo: sistema econômico instável, organizações em consolidação, legislação confusa ou mudanças constantes gerando incertezas, para além das particularidades culturais.

O desafio não era simples, já que estrangeiros desavisados podiam ter problemas por não entenderem o ambiente e os costumes. Além disso, José estava se sentindo cometendo o mesmo erro e, simultaneamente, refém de dúvidas sobre possíveis mudanças de cenário. O que poderia fazer em seu trabalho para transformar essa situação? Era claro para ele que a produtividade e os resultados poderiam ser seriamente comprometidos. Os bolivianos pareciam dóceis e pouco inclinados a discutir diretrizes. No entanto, como seu chefe brasileiro havia avisado, esse era um traço comportamental traduzido em “não contestar” uma diretriz, mas também não a seguir exatamente, fazendo na prática o que achavam mais correto, sem dar explicações ao gerente estrangeiro.

Brevemente aconteceria uma reunião com a diretoria da empresa para apresentar um primeiro plano de ação, oferecendo uma ideia de como organizaria seu trabalho a partir daí. Pensou em basear seus passos no relatório da consultoria. Ainda assim, o principal problema era enfrentar seu chefe, o presidente da empresa no país, conhecido como um engenheiro teimoso e inflexível que parecia se encaixar bem no papel do adulto representado no desenho do colaborador (Figura 1).

Antes de deixar o Brasil, recebeu orientações específicas de seus superiores sobre o estilo esperado para gerenciar o setor de recursos humanos: atitude forte, foco em resultados e melhoria de desempenho. Apesar de ciente do relatório diagnóstico preparado pela consultoria, seu chefe não cedeu facilmente. A direção local não estava sensibilizada, e José já conhecia seu novo chefe (haviam trabalhado juntos no Brasil). Ele foi bastante preciso sobre a dificuldade que a ser enfrentada para criar um plano que vinculasse as ações ao diagnóstico encontrado.

O dilema de José

José ainda se incomodava com esse padrão de dominação que se repetia no século XXI, principalmente entre países do Sul, vizinhos, outrora colonizados por países europeus (Portugal e Espanha), e com marcas indeléveis provocadas por um traumático processo histórico. José olhou para aquele desenho e lamentou profundamente as armadilhas sociais do mundo contemporâneo.

Ele acreditava que abordar essa questão abertamente seria vital para melhorar o relacionamento de todos os envolvidos. José havia lido alguns estudos antes de sua viagem à Bolívia e sentiu que precisava abordar esse assunto. No entanto, algumas dúvidas persistiam:

Seria esse um caminho possível considerando o perfil de seu novo chefe? Como ele poderia mostrar que o padrão atual precisava ser quebrado para alcançar mais bem-estar organizacional?

O que ele pode fazer para abordar o aspecto humano dessa operação internacional? Será que alguma medida extra representaria um perigo - como impor uma aproximação de identidades artificiais que poderia ser ainda mais prejudicial aos funcionários?

NOTAS DE ENSINO

Objetivos de aprendizagem

O caso de ensino visa desenvolver nos alunos uma visão crítica das diferenças culturais e da subalternidade promovidas por empresas multinacionais em suas operações no exterior, no cenário Sul-Sul, e criar abertura ao reconhecimento do impacto dos desequilíbrios de poder internacionais no relacionamento dos funcionários. Além disso, ao levantar a questão cultural envolvida nas relações de trabalho entre países, espera-se que os alunos incorporem uma reflexão crítica sobre suas posições nesse tipo de situação.

Disciplinas sugeridas

Administração de Negócios Internacionais; Estratégia em Países Emergentes; Gestão de Recursos Humanos.

O caso funciona com diferentes grupos de estudantes, como alunos de graduação em administração, MBAs ou outros programas globais de formação executiva.

FONTES DO CASO

A inspiração para o caso e o desenho (Figura 1) vem de um projeto de pesquisa realizado por um dos autores, que resultou no relatório de diagnóstico. O projeto de pesquisa foi realizado entre 2005-2014 para compreender melhor os problemas de comunicação organizacional e as dimensões culturais que impactam a gestão da multinacional naquele país. Para o diagnóstico, a pesquisadora entrevistou mais de 200 funcionários bolivianos; e realizou observações não-participantes em diversas unidades de negócios, sedes, escritórios em Santa Cruz e diversos outros locais. Durante as entrevistas, a pesquisadora incentivou os entrevistados a fazer desenhos ou colagens com materiais previamente disponíveis (cola, papel, revistas e canetas coloridas) para expressar sua percepção da relação entre lideranças brasileiras e a matriz brasileira.

PLANEJAMENTO DA AULA

Sugerimos usar o caso em uma seção em que o professor introduz o conceito de gestão estratégica internacional e diferenças culturais nas operações no exterior. Se necessário, pode-se utilizar recursos multimídia antes de aplicar o caso para uma exposição adequada dos conceitos centrais da disciplina.

É necessário que se reserve uma aula com duração mínima de dois blocos de 45 a 50 minutos, de forma a permitir: uma breve exposição de conceitos, a leitura individual do caso, a realização de debate em grupo (quatro a cinco alunos) e o debate em plenário. Por fim, o professor deve promover a aproximação entre os conceitos centrais e os principais aspectos abordados no debate em plenário. Dessa forma, o tempo da atividade pode ser distribuído conforme sugerido no Quadro 1.

Quadro 1
Plano de Aula Sugerido

Os alunos podem representar a perspectiva individual de cada personagem, como José, seu chefe ou o colaborador que fez o desenho. Também podem realizar uma encenação com situações relacionadas à sua experiência ou buscar materiais na internet que possam apresentar diferentes aspectos sócio-históricos e culturais de ambos os países.

QUESTÕES DE ORIENTAÇÃO

Além das questões apresentadas no final do caso, os alunos devem ser incentivados a refletir sobre outras perguntas que possam ajudar a estruturar melhor o problema e produzir uma resposta mais analítica do que descritiva.

  1. Há negligência por parte das multinacionais em relação ao aspecto humano na internacionalização? Na sua opinião, por que e como essas companhias internacionais incorrem nesse comportamento? Por que esse cenário deve mudar?

  2. Em que medida você acredita que o padrão de dominação e subalternização observado no desenho pode afetar o bem-estar dos colaboradores? Como e por quê?

  3. Se você analisasse a ilustração apresentada, diria que a relação de dominação é uma particularidade da empresa estudada? Como você expressaria sua preocupação com a ilustração a partir do discurso das identidades empresariais globais?

  4. Do ponto de vista da companhia, o que ela pode fazer para minimizar esses efeitos? Discuta se essas ações podem representar um perigo extra, como impor uma aproximação de identidades artificiais que pode ser ainda mais prejudicial aos colaboradores.

  5. Pense em algumas empresas multinacionais que operam em seu país. Quais seus países de origem? Em que outros países atuam? Na maioria dos casos, você pensou em empresas com sede em países de economia desenvolvida (países anglo-saxões, asiáticos, europeus? Há algum estranhamento ou distanciamento nas relações culturais entre funcionários locais e gestores estrangeiros?

Sugerimos estimular os alunos a se colocarem no lugar de José e, ao mesmo tempo, utilizar exemplos e situações locais em que identifiquem a necessidade de atuação crítica e propositiva como futuros gestores nas operações internacionais.

REVISÃO DE LITERATURA

Existem relações pós-coloniais entre Brasil e Bolívia?

Exceto pela ocupação da província do Acre por aventureiros brasileiros à procura de borracha no início do século 20, o Brasil nunca colonizou a Bolívia (Smith, 1971Smith, P. S. (1971). Bolivian Oil and Brazilian Economic Nationalism. Journal of Interamerican Studies and World Affairs, 13(2), 166-181. Retrieved from https://doi.org/10.2307/174677
https://doi.org/10.2307/174677...
). É possível falar em relações pós-coloniais quando se observa duas nações que não compartilham um passado colonial? A relação entre Brasil e Bolívia muda para se assemelhar a uma relação “colonizador-colonizado” quando a Bolívia concedeu ao Brasil alguns direitos de exploração em virtude de seu primeiro movimento de nacionalização ocorrida em 1936, no rescaldo de uma disputa fronteiriça entre Bolívia e Paraguai conhecida como “Guerra do Chaco”. Na ocasião, a Bolívia nacionalizou os ativos da empresa norte-americana Standard Oil e assinou diversos acordos com autoridades brasileiras. Conforme acordo assinado em 1938, o Brasil construiria uma ferrovia para dar à Bolívia acesso ao Oceano Atlântico para permitir a distribuição do produto. Em troca, o Brasil obteve direitos exclusivos de exploração de petróleo na região de Santa Cruz (Smith, 1971Vilarino, R. C. (2006). Os Acordos de Roboré-Brasil, Bolívia e as questões do petróleo, desenvolvimento e dependência no final dos anos 1950 (Doctoral Dissertation). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP.; Vilarino, 2006Vilarino, R. C. (2006). Os Acordos de Roboré-Brasil, Bolívia e as questões do petróleo, desenvolvimento e dependência no final dos anos 1950 (Doctoral Dissertation). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP.). Em outras palavras, após a expulsão do colonizador norte-americano, o Brasil obteve plenos direitos de exploração. Existe alguma diferença entre a colonização perpetrada pela Standard Oil dos Estados Unidos e aquela de um país vizinho?

Foi somente em 1955, no entanto, que o Brasil finalmente construiu a ferrovia; imediatamente depois, os dois países assinaram um novo acordo para ratificar o original (Smith, 1971Smith, P. S. (1971). Bolivian Oil and Brazilian Economic Nationalism. Journal of Interamerican Studies and World Affairs, 13(2), 166-181. Retrieved from https://doi.org/10.2307/174677
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; Vilarino, 2006Vilarino, R. C. (2006). Os Acordos de Roboré-Brasil, Bolívia e as questões do petróleo, desenvolvimento e dependência no final dos anos 1950 (Doctoral Dissertation). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP.). Esta rodada de negociações ficou conhecida como o “Acordo de Roboré”, que se tornou bastante controverso em ambos os países. Mais recentemente, ambos os lados decidiram descartar o novo arranjo para abrir caminho para empresas privadas explorarem petróleo na Bolívia, incluindo a possibilidade dessas empresas operarem em associação com empresas estrangeiras (Smith, 1971Smith, P. S. (1971). Bolivian Oil and Brazilian Economic Nationalism. Journal of Interamerican Studies and World Affairs, 13(2), 166-181. Retrieved from https://doi.org/10.2307/174677
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; Vilarino, 2006Vilarino, R. C. (2006). Os Acordos de Roboré-Brasil, Bolívia e as questões do petróleo, desenvolvimento e dependência no final dos anos 1950 (Doctoral Dissertation). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP.). Nesse contexto, não é apropriado falar das relações Brasil-Bolívia sem levar em consideração “Roboré”, que se tornou sinônimo de uma tentativa de intervenção pós-colonial.

Com as disputas em torno do Acordo de Roboré, o Brasil perdeu a posição privilegiada que manteve por mais de vinte anos, ficando sem seus direitos de perfuração na Bolívia. Somente no final da década de 1990 as multinacionais brasileiras finalmente começariam a investir na exploração de petróleo e gás naquele país. Como resultado da difusão do Consenso de Washington na América Latina, os governos lançaram várias iniciativas para abrir indústrias para a concorrência e levaram outras multinacionais, principalmente da Europa (nenhuma dos Estados Unidos), a estabelecer-se na Bolívia para explorar suas reservas de petróleo e gás. No entanto, todas foram igualmente afetadas pelo decreto de nacionalização do Presidente Evo Morales, de maio de 2006Morales, E. (2006). Speech to the Parliament on January 31 st . Retrieved from http://www.aporrea.org/internacionales/n72540.html
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. Naquela época, só as multinacionais brasileiras de energia eram responsáveis por cerca de 22% do produto interno bruto do país (Copara, 2014).

Cultura e identidade

A formação da identidade internacional de uma multinacional pode ser diretamente impactada pela decisão de ignorar os diversos aspectos culturais identificados entre colaboradores, bem como aqueles que emergem da interação entre colaboradores estrangeiros e locais.

Segundo Nkomo e Cox (2006Nkomo, S. M., & Cox, T. (2006). Diversidade e identidade nas organizações. In S. R. Clegg, C. Hardy, & W. R. Nord (Eds.), Handbook de Estudos Organizacionais: Modelos de análise e novas questões em estudos organizacionais (Vol. 1). São Paulo, SP: Atlas. ), existem múltiplas identidades entre os indivíduos e nenhuma delas contribui para a complexidade observada na formação da identidade da organização. Os indivíduos não são apenas africanos, europeus, coreanos, brancos, negros, mulheres, homens, gerentes de marketing ou gerentes de produção. As identidades se cruzam para criar uma identidade amalgamada, e a interação entre elas é essencial para o contexto organizacional. Assim, o estudo da identidade envolve necessariamente a interação entre diversas identidades.

Adler (1997Adler, N. J. (1997). International dimensions of organizational behavior. Cincinnati, OH: South-Western College Publishing. ) apresentou a “projeção de similaridade” como um ponto essencial para a percepção de distâncias e assimetrias no ambiente organizacional dentro do conceito de diversidade e internacionalização. De acordo com essa teoria, as pessoas acreditam que “os outros” são sempre mais parecidos com elas do que de fato o são, e prever semelhanças reflete um processo frequente e natural. Pesquisadores americanos solicitaram a gerentes de quatorze países que descrevessem as metas e rotinas de trabalho dos colegas da empresa em outros países. Em todos os casos, os gerentes descreveram essas atividades como se estivessem descrevendo suas próprias. Isso parece mostrar que as semelhanças de previsão envolvem assumir, imaginar e perceber semelhanças quando há diferenças. É comum ouvir, no ambiente organizacional, comentários como: “Eu o entendo perfeitamente, mas ele não me entende”. Este exemplo demonstra o tipo de distorção que o processo de comunicação pode sofrer. Vale salientar que equipes de diferentes origens culturais geralmente discordam de muitos significados, como a causa dos eventos, a determinação de evidências admissíveis, a relevância de informações específicas e possíveis conclusões. Em alguns casos, as divergências permanecem implícitas ou camufladas porque os membros assumem que suas interpretações são semelhantes quando, na verdade, o que acontece é o contrário.

Segundo Adler (1997Adler, N. J. (1997). International dimensions of organizational behavior. Cincinnati, OH: South-Western College Publishing. ), o processo de implementação de uma identidade global e sinérgica deve ser cuidadoso. Antes que os membros da organização compreendam as necessidades de mudança com base nessa premissa, devem desenvolver autoconsciência cultural e conhecimento de outras culturas. Sem a compreensão de algumas dessas dinâmicas, muitas propostas de mudança e interação podem parecer absurdas. Com o aprofundamento do conhecimento cultural, a organização pode solucionar problemas e implementar mudanças que levarão a empresa a atingir seus objetivos com mais eficiência, respeitando e valorizando as diferenças e a saúde mental de seu capital humano.

Muitos pesquisadores consideram que há homogeneidade cultural dentro de um país ou local específico (Fletcher & Bohn, 1998Fletcher, R., & Bohn, R. (1998). The impact of psych distance in the internationalization of the Australian firm. Journal of Global Marketing, 12(2), 47-68. Retrieved from https://doi.org/10.1300/J042v12n02_04
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; Kogut & Singh, 1988). No entanto, essa suposição pode não estar correta, uma vez que muitos países são compostos por diferentes grupos étnicos ou desenvolveram diferentes valores e tradições culturais regionalmente (Jack, Calás, Nkomo, & Peltonen, 2008Jack, G. A., Calás, M. B., Nkomo, S. M., & Peltonen, T. (2008). Critique and International Management: An uneasy relationship? Academy of Management Review, 33(4), 870-884. Retrieved from https://doi.org/10.5465/amr.2008.34421991
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; Jack & Westwood, 2009Jack, G., & Westwood, R. (2009). International, and Cross-Cultural Management Studies: A Postcolonial Reading. Basingstoke, UK: Palgrave Macmillan.). Além disso, a própria globalização compromete-se a levar a diversidade de forma muito fragmentada para dentro das organizações, privilegiando uma análise individual do fenômeno, com considerações críticas sobre a influência externa e coletiva.

Em busca de uma perspectiva pós-colonial Sul-Sul dos negócios internacionais

O discurso de Morales (2006Morales, E. (2006). Speech to the Parliament on January 31 st . Retrieved from http://www.aporrea.org/internacionales/n72540.html
http://www.aporrea.org/internacionales/n...
) foi preenchido com uma série de observações anticolonialistas e reivindicou os direitos da população local aos recursos naturais explorados por estrangeiros. Sua declaração contra os colonizadores - inclusive as multinacionais brasileiras - estava perfeitamente alinhada com as afirmações pós-coloniais que davam voz aos subalternos (Spivak, 1988Spivak, C. (1988). Can the subaltern speak? In G. Spivak (Ed.),Marxism and the Interpretation of Culture (pp. 271-233). UK: Macmillan Education.).

É amplamente reconhecido que “foi principalmente através da publicação da obra-prima de Said (1978Said, W. (1978) Orientalism. New York, NY: Vintage.) denominada Orientalism que a teoria pós-colonial começou a ganhar reconhecimento nos círculos acadêmicos ocidentais como uma nova e importante perspectiva de crítica radical” (Banerjee & Prasad, 2008Banerjee, S. B., & Prasad, A. (2008). Introduction to the special issue on “Critical reflections on management and organizations: a postcolonial perspective”. Critical Perspectives on International Business 4(2/3), 90-98. Retrieved from https://doi.org/10.1108/17422040810869963
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, p. 92, tradução nossa). A teoria pós-colonial apresenta críticas radicais ao colonialismo, imperialismo e neocolonialismo, sendo este último uma extensão do colonialismo para além da mera ocupação do território usando diferentes controles políticos, econômicos e culturais (Jack & Westwood, 2009Jack, G., & Westwood, R. (2009). International, and Cross-Cultural Management Studies: A Postcolonial Reading. Basingstoke, UK: Palgrave Macmillan.). “A teoria pós-colonial assume uma posição firmemente comprometida com a crítica ao eurocentrismo… (e) pode ser vista como uma crítica e desconstrução muito mais abrangente das práticas e discursos constitutivos do (neo) colonialismo” (Banerjee & Prasad, 2008Banerjee, S. B., & Prasad, A. (2008). Introduction to the special issue on “Critical reflections on management and organizations: a postcolonial perspective”. Critical Perspectives on International Business 4(2/3), 90-98. Retrieved from https://doi.org/10.1108/17422040810869963
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, p. 92, tradução nossa).

O termo pós-colonial busca denunciar o discurso colonial que retrata o colonizador como desenvolvido e iluminado, e o colonizado como ignorante e marginal. No entanto, se no colonialismo o Estado era responsável por impor a dominação sobre outra nação, no neocolonialismo as multinacionais tornaram-se um veículo essencial para o mesmo propósito (Banerjee & Linstead, 2001Banerjee, S. B., & Linstead, S. (2001). Globalization, multiculturalism, and other fictions: colonialism for the new millennium? Organization, 8(4), 683-722. Retrieved from https://doi.org/10.1177/135050840184006
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; Jack & Westwood, 2009Jack, G., & Westwood, R. (2009). International, and Cross-Cultural Management Studies: A Postcolonial Reading. Basingstoke, UK: Palgrave Macmillan.; Wanderley & Celano, 2018Wanderley, S., & Celano, A. (2018). Brazil-Bolivia and a horse trade: a postcolonial case within South America. Critical Perspectives on International Business, 14(4), 426-441. Retrieved from https://doi.org/10.1108/cpoib-11-2016-0048
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). À medida que as multinacionais se expandem, ocorre um novo tipo de expansão colonial. Esse quadro contemporâneo é baseado em relações corporativas e não apenas em governos nacionais. O crescimento global das multinacionais com origem em países desenvolvidos tornou-se um veículo legítimo de intervenção para a imposição do discurso do desenvolvimento impulsionado pelas instituições ocidentais que “eram um substituto mal disfarçado para intervenções coloniais anteriores e mais ostensivas” (Jack & Westwood, 2009Jack, G., & Westwood, R. (2009). International, and Cross-Cultural Management Studies: A Postcolonial Reading. Basingstoke, UK: Palgrave Macmillan., p. 370, tradução nossa).

Jack et al. (2008Jack, G. A., Calás, M. B., Nkomo, S. M., & Peltonen, T. (2008). Critique and International Management: An uneasy relationship? Academy of Management Review, 33(4), 870-884. Retrieved from https://doi.org/10.5465/amr.2008.34421991
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) sugeriram que a literatura dominante com foco principal nas multinacionais tende a estar firmemente enraizada na tradição positivista-funcionalista e não reflete as consequências epistemológicas. Eles sugeriram que as questões de poder e ideologia devem ser centrais, no sentido de superar o que observam como “a relação desconfortável” entre a literatura dominante e a crítica (Jack et al., 2008Jack, G., & Westwood, R. (2009). International, and Cross-Cultural Management Studies: A Postcolonial Reading. Basingstoke, UK: Palgrave Macmillan.). Deve-se acrescentar que o mesmo vale para a relação entre os negócios internacionais dominantes e as multinacionais.

Além disso, devemos estar cientes de que as investigações pós-coloniais sobre os negócios internacionais foram incentivadas principalmente para investigar as relações Norte-Sul - e foram promovidas pelos pesquisadores do Norte (por exemplo, Jack & Westwood, 2009Jack, G., & Westwood, R. (2009). International, and Cross-Cultural Management Studies: A Postcolonial Reading. Basingstoke, UK: Palgrave Macmillan.; Wanderley & Celano, 2018Wanderley, S., & Celano, A. (2018). Brazil-Bolivia and a horse trade: a postcolonial case within South America. Critical Perspectives on International Business, 14(4), 426-441. Retrieved from https://doi.org/10.1108/cpoib-11-2016-0048
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). Portanto, devemos ser cautelosos ao usar o cânone pós-colonial para investigar casos de relações Sul-Sul e Sul-Norte liderados por multinacionais.

Décadas marcadas pela firme crença de que as multinacionais são uma instituição exclusivamente euro-americana resultaram em uma mobilização significativa de teorias, estruturas e conceitos euro-americanos para explicar o caminho para a internacionalização tomado pelas multinacionais (Bartlett & Ghoshal, 2000Bartlett, C. A., & Ghoshal, S. (2000). Going global: lessons from late movers. Harvard Business Review, 78, 132-142. Retrieved from https://hbr.org/2000/03/going-global-lessons-from-late-movers
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; Dunning, Kim, & Park, 2008Dunning, H., Kim, C., & Park, D. (2008). Old wine in new bottles: A comparison of emerging-market TNCs today and developed-country TNCs thirty years ago. In K. P. Sauvant (Ed.), The Rise of Transnational Corporations from Emerging Markets (Chap. 8). Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing.; Rugman, 2009Rugman, M. (2009). The Oxford handbook of international business. Oxford, UK: Oxford Press.). Por exemplo, Bartlett e Ghoshal (2000)Bartlett, C. A., & Ghoshal, S. (2000). Going global: lessons from late movers. Harvard Business Review, 78, 132-142. Retrieved from https://hbr.org/2000/03/going-global-lessons-from-late-movers
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classificaram as multinacionais como late movers (ou organizações não pioneiras) e sugeriram que, para alcançar as multinacionais, seria necessário que suas matrizes promovam uma mentalidade mais global guiada por líderes implacáveis. No entanto, essas sugestões ainda estão dentro do mesmo campo que Bartlett e Ghoshal (2000)Bartlett, C. A., & Ghoshal, S. (2000). Going global: lessons from late movers. Harvard Business Review, 78, 132-142. Retrieved from https://hbr.org/2000/03/going-global-lessons-from-late-movers
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propõem para multinacionais de países desenvolvidos em que “raramente mencionam explicitamente o papel das relações de poder no equilíbrio entre global e local” (Geppert & Dörrenbächer, 2014Geppert, M., & Dörrenbächer, C. (2014). Politics and Power within Multinational Corporations: Mainstream Studies, Emerging Critical Approaches and Suggestions for Future Research. International Journal of Management Review, 16(2), 226-244. Retrieved from https://doi.org/10.1111/ijmr.12018
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, p. 230, tradução nossa). Na mesma linha, a ascensão das multinacionais foi reduzida a “vinho velho em garrafa nova”, dispensando assim a necessidade de alterar o quadro analítico vigente (Dunning et al., 2008Dunning, H., Kim, C., & Park, D. (2008). Old wine in new bottles: A comparison of emerging-market TNCs today and developed-country TNCs thirty years ago. In K. P. Sauvant (Ed.), The Rise of Transnational Corporations from Emerging Markets (Chap. 8). Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing., p. 158, tradução nossa). O mesmo foi sugerido por Rugman (2009Rugman, M. (2009). The Oxford handbook of international business. Oxford, UK: Oxford Press., p. 50), que considera que as multinacionais são “principalmente baseadas na região de origem”, a exemplo das companhias que analisou.

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  • [Versão traduzida]

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    Sep-Oct 2022

Histórico

  • Recebido
    27 Abr 2021
  • Aceito
    06 Set 2021
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