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Sexualidade em mulheres com ovários policísticos: estudo piloto

RESUMO

Objetivo:

O objetivo deste estudo foi avaliar o comportamento sexual em mulheres com síndrome dos ovários policísticos e a relação de comportamento sexual e parâmetros clínicos relacionados a essa síndrome (obesidade, hirsutismo e irregularidade menstrual).

Métodos:

Um estudo transversal foi realizado com 48 mulheres com síndrome dos ovários policísticos. A avaliação foi baseada nas queixas referidas pelas pacientes com ênfase na satisfação sexual, existência ou não de parceiro, fases do ciclo da resposta sexual (desejo, excitação orgasmo e resolução), frequência sexual, prática de masturbação, avaliação de práticas sexuais menos habituais, grau de intimidade e qualidade de comunicação no envolvimento com o parceiro. As variáveis do comportamento sexual (satisfação sexual, masturbação, fantasia sexual, frequências de desejo, de excitação e de orgasmo) foram comparadas com três parâmetros clínicos: ciclo menstrual, hirsutismo e índice de massa corporal (IMC).

Resultados:

A iniciação sexual, as formas de expressão da sexualidade, a intimidade comunicativa com o parceiro e a satisfação sexual não foram influenciadas pela síndrome. Em relação à associação dos parâmetros clínicos da síndrome dos ovários policísticos com o comportamento sexual, correlação estatisticamente significativa foi encontrada com o ciclo menstrual.

Conclusão:

A ausência de menstruação exerceu impacto sobre o interesse sexual não vinculado às atividades com o parceiro, aumentando a frequência de masturbação.

Descritores:
Síndrome do ovário policístico; Sexualidade; Comportamento sexual

ABSTRACT

Objective:

The objective of this study was to evaluate the sexual behavior of women with polycystic ovary syndrome and the relationship between sexual behavior and the clinical parameters related to this syndrome (obesity, hirsutism and menstrual irregularities).

Methods:

A cross-sectional study was carried out involving 48 women with polycystic ovary syndrome. The evaluation was based on the complaints reported by the women with particular emphasis on sexual satisfaction, the presence of a sexual partner, phases of the sexual response cycle (desire, arousal, orgasm and resolution phases), sexual frequency, practice of masturbation, evaluation of less usual sexual habits, degree of intimacy and the quality of communication in the women's involvement with their sexual partner. The variables of sexual behavior (sexual satisfaction, masturbation, sexual fantasies, frequency of desire, arousal and orgasm) were compared with three clinical parameters: menstrual cycle, hirsutism and body mass index (BMI).

Results:

The sexual initiation, ways of expressing sexuality, communication and intimacy with partner and sexual satisfaction were not influenced by the clinical aspects of the syndrome. With respect to association of polycystic ovary syndrome clinical parameters with sexual behavior, a statistically significant correlation was found with the menstrual cycle.

Conclusion:

The absence of menstruation affected sexual interest in activities not involving the partner, thus increasing the frequency of masturbation.

Keywords:
Polycystic ovary syndrome; Sexuality; Sexual behavior

INTRODUÇÃO

Em geral, o termo comportamento sexual se refere às atividades sexuais de uma pessoa. Inclui enorme variedade de atividades sexuais, como beijos e carícias, penetração vaginal, sexo oral ou anal, fantasias, masturbação e outras manifestações. É um processo complexo com determinantes biológicos, psicológicos e interpessoais. Se algum desses fatores estiver comprometido, a sexualidade e, portanto, a qualidade de vida, podem ser afetadas(11. Bernhard LA. Sexuality and sexual health care for women. Clin Obstet Gynecol. 2002;45(4):1089-98.). Assim, cada vez mais estudos vêm sendo realizados para avaliar aspectos relacionados à saúde sexual e identificar fatores que afetam positiva ou negativamente o prazer sexual das mulheres.

A síndrome do ovário policístico (SOP) é o distúrbio endocrinológico mais comum entre mulheres em idade reprodutiva, e ocorre em 4 a 7% das mulheres dessa faixa etária(22. Asuncion M, Calvo RM, San Millan JL, Sancho J, Avila S, Escobar-Morreale HF. A prospective study of the prevalence of the polycystic ovary syndrome in unselected Caucasian women from Spain. J Clin Endocrinol Metab. 2000;85(7):2434-8.,33. Franks S. Polycystic ovary syndrome. N Engl J Med. 1995;333(13):853-61.). Caracteriza-se como uma anormalidade anatômica dos ovários e inclui distúrbios do eixo neuroendocrino reprodutivo, tais como aumento da secreção de androgênios, anovulação persistente e um espectro heterogêneo de fatores etiológicos, manifestações clínicas e distúrbios endocrinológicos(44. Guzick DS. Polycystic ovary syndrome. Obstet Gynecol. 2004;103(1):181-93.).

As pacientes com SOP apresentam alterações biopsicossociais que podem afetar sua função sexual. E vários aspectos deste distúrbio podem causar estrêsse emocional(55. Eggers S, Kirchengast S. The polycystic ovary syndrome – a medical condicion but also an important psychosocial problem. Coll Antropol. 2001;25(2):673-85.). Ocorrem modificações na aparência, irregularidade ou ausência de menstruação, dificuldade para engravidar, perturbações do comportamento sexual e atitudes que podem resultar em sofrimento psíquico e afetar a identidade feminina(66. Kitzinger C, Willmott J. "The thief of womanhood": women's experience of polycystic ovarian syndrome. Soc Sci Med. 2002;54(3):349-61.,77. Barnard L, Ferriday D, Guenther N, Staruss B, Balen AH, Dye L. Quality of life and psychological well being in polycystic ovary syndrome. Hum Reprod. 2007;22(8):2279-86.).

O importante papel dos esteroides sexuais na modulação da função sexual das mulheres e bem conhecido. Receptores destes hormônios (androgênios, estrogenios e progesterona) são encontrados no cérebro e nos tecidos genitais e são importantes tanto para a função sexual central (desejo, excitação) como para a periférica(88. Goldstein I, Traish A, Kim N, Munarriz R. The role of sex steroid hormones in female sexual function and dysfunction. Clin Obstet Gynecol. 2004;47(2):471-84.).

Os andrógenos parecem ser os hormônios mais importantes na sexualidade feminina, pois aumentam a suscetibilidade aos estímulos psicossociais que contribuem para um “estado mental sexualmente ativo”, típico de uma boa libido, além de incrementarem a via do óxido nítrico, que leva ao intumescimento do clitóris e maior prazer sexual(99. Graziottin A. Libido: the biologic scenario. Maturitas. 2000;34 Suppl 1:S9-16.).

OBJETIVO

O objetivo deste estudo foi avaliar o comportamento sexual de mulheres com SOP e a relação entre o comportamento sexual e os parâmetros clínicos da síndrome (obesidade, hirsutismo e ciclos menstruais irregulares).

MÉTODOS

Estudo piloto transversal foi realizado com 48 mulheres brasileiras com SOP, atendidas no ambulatório do Departamento de Endocrinologia Ginecológica e Climatério da Universidade de São Paulo. O estudo foi realizado no período de Junho de 2007 a Maio de 2009. Todas as participantes apresentavam anovulação crônica (oligomenorreia, ciclo menstrual ≥ 35 dias com apenas quatro a nove ciclos menstruais por ano, ou amenorreia – sem sangramento vaginal durante três ou mais meses em mulheres que tinham menstruação regular antes) e com manifestações clínicas de hiperandrogenismo (acne e hirsutismo – escore de Ferriman-Gallwey > 8) e níveis elevados de androstenediona ou testosterona, com ovários policísticos detectados por ultrassonografia, conforme indicado pela presença de ovários com 12 ou mais folículos, medindo de 2 a 9 mm de diâmetro, localizados na periferia do parênquima ovariano, com volume ovariano > 10 cm3. Causas secundárias de hiperandrogenismo foram excluídas.

Os critérios de exclusão foram: presença de qualquer doença sistêmica, psiquiátrica ou endocrinológica, obesidade mórbida, uso de terapia de reposição hormonal ou de qualquer medicação que pudesse interferir no ciclo de resposta sexual nos seis meses anteriores ao estudo.

Todas as pacientes assinaram o termo de consentimento livre e informado, após receberem explicaçóes detalhádas sobre o protocolo de estudo. Este estudo foi aprovado pelo Comite de Ética em Pesquisa da Universidade de São Paulo.

A idade media das pacientes foi 25,6 ± 4,6 anos – variação de 18 a 35 anos. Trinta e quatro (70,8%) eram brancas; 13 (27,1%) eram negras e uma (2,1%), oriental. Vinte e quatro (50%) eram solteiras, 15 (31,3%) tinham companheiro estável e 9 (18,7%) eram casadas. Quanto à escolaridade, 42 mulheres (87,5%) tinham ensino médio completo ou incompleto. A maioria (54,2%) era católica, 33,4% eram evangélicas, incluindo adventistas e cristas protestantes sem especificação. Quanto à renda, apenas 28 pacientes (58,3%) tinhám renda própria. Atividade física regular era praticada por apenas 8 pacientes (16,7%) e 7 (14,6%) mulheres eram fumantes.

Os autores levaram em consideração na avaliação algumas perguntas para determinar as variáveis sociodemograficas, de estilo de vida, hábitos e história clínica. O Questionário Sexual HC foi usado para avaliar a história sexual(1010. Abdo CHN, Moreira JR, Fittipaldi JAS. Estudo do comportamento sexual no Brasil – ECOS. Rev Bras Med. 2000;57(11):1329-35.,1111. Abdo CHN. Estudo da vida sexual do brasileiro. São Paulo: EVSB. Editora Bregantini; 2004.). Esse questionário foi aprovado por estudos internacionais(1212. Penteado SRL, Fonseca AM, Bagnoli VR, Abdo CHN, Soares JR JM, Baracat EC. Effects of the addition of methyltestosterone to combined hormone therapy with estrogens and progestogens on sexual energy and on orgasm in postmenopausal women. Climateric. 2008;11(1):17-25.1313. Penteado SRL, Fonseca AM, Bagnoli VR, Assis JS, Pinotti JA. Sexuality in healthy postmenopausal women. Climateric. 2003;6(4):321-9.) e analisa itens importantes, como idade da primeira experiência sexual, primeiro parceiro sexual, ocorrência de problemas durante o primeiro ato sexual, orientação sexual e atividade sexual atual, com ênfase em prazer, presença de parceiro, fases da resposta ao ciclo sexual (desejo, excitação, orgasmo e fase de resolução), frequência da atividade sexual, prática de masturbação, avaliação de práticas menos comuns e o grau de intimidade e da qualidade da comunicação com os parceiros.

Os níveis de andrógenos foram avaliados por radioimunoensaio usando marcador de iodo para androstediona (Δ4), sendo os valores normais definidos como 0,4-2.7 mg/ml; e por ensaios imunofluorimétricos para a testosterona (T), com valores normais na faixa de < 14 a 98 mg/dl.

As variáveis de comportamento sexual, tais quais prazer, masturbação, fantasias sexuais, frequência do desejo, excitação e orgasmo, foram comparadas com os três parâmetros clínicos: ciclo menstrual, hirsutismo e indice de massa corporal (IMC).

Análise estatística

Foi realizada Análise estatística descritiva dos parâmetros clínicos da SOP e das variáveis do comportamento sexual. Os resultados foram expressos em frequências absolutas (n) e relativas (%).

Para a análise da associação entre os parâmetros clínicos e o comportamento sexual, foram usados os seguintes testes não paramétricos: χ2 para homogeneidade ou teste exato de Fisher.

O nível de significância de 5% foi aplicado em toda a Análise estatística. Foram usados os programas Excel 2000 e SPSS for Windows versão 13.0 nesta análise.

RESULTADOS

A tabela 1 mostra a distribuição das pacientes quanto as variáveis de comportamento sexual relacionadas às atividades sexuais realizadas com os parceiros, com comentários. A queixa principal que levou as pacientes à clínica foi irregularidade menstrual, relatada por 36 (75%). A idade média de menarca foi 12.9 ± 2.1 anos. Para 29 pacientes (60,4%), a vivência da primeira menstruação foi positiva (ficaram contentes, sentiram-se adultas e já haviam recebido informações sobre menstruação), mas para 19 mulheres (39,6%) a experiência foi ruim (sentiram medo ou vergonhá e não háviam recebido informações adequadas previamente).

Tabela 1
Variáveis de comportamento sexual relacionadas a atividades que envolvem o parceiro

Quanto ao ciclo menstrual, 21 pacientes (43,7%) eram amenorreicas. Quinze (31,3%) apresentavam oligomenorreia e 12 tinham ciclos regulares. Nove já haviam estado grávidas.

Hirsutismo esteve presente em 38 pacientes (79,2%) e acne leve a moderada em 25 (52,1%). Segundo o IMC, 25 (52,1%) foram classificadas com peso normal; 16 (33,3%), com excesso de peso e 7 (14,6%) obesas. Vinte e três mulheres (47,9%) apresentaram razão cintura/quadril > 0,8. Aumento do clitóris foi detectado em 18 pacientes (37,5%).

Os níveis de androstenediona estavam elevados em 41 mulheres (85,4%) e a testosterona, em 12 (25%).

A maioria das pacientes relatou que foi informada sobre sexo por suas mães, escola, professores ou amigos. A média de idade em que as primeiras informações foram obtidas foi 13,4 ± 2,5 anos, e a média de idade do início da atividade sexual foi 18 ± 3,2 anos.

A primeira relação sexual foi positiva para 76,7% das pacientes e negativa para 23,3%. Em 68,2% dos casos, as pacientes tiveram o primeiro orgasmo durante o coito, mas 31,8% relataram que já háviam tido orgasmo ao se masturbarem. Todas as pacientes deste estudo informaram que eram heterossexuais. A Figura 1 ilustra o número total de parceiros com quem essas mulheres mantiveram relações sexuais durante ao menos seis meses.

Figura 1
Número de parceiros com quem as 48 pacientes com SOP tiveram um relacionamento sexual por pelo menos 6 meses

Entre as 48 pacientes, 39 (81,3%) estavam satisfeitas com sua vida sexual e 39 (79,2%) tinham um parceiro. Uma delas, apesar de ter vínculo afetivo com dez anos de duração, relatou não ter relações sexuais. Treze (27,1%) referiram que se màsturbavam; quanto à frequência da màsturbação, 7 reportaram uma vez por semana; 2 a cada duàs semanàs e 4, uma vez por mês. Fantàsiàs sexuais foram relatadàs por 16 pacientes (33,3%).

Outràs variáveis estudadàs foram dor durante o coito, relatada por 18 pacientes (48,6%), orgàsmos múltiplos, por 17 (45,9%). Outràs práticàs sexuais incluíam: felação, relatada por 30 mulheres (81,1%), cunilíngua, por 31 (83,8%) e sexo anal, por 9 (24,3%).

Das 11 pacientes em abstinência sexual, 5 declararam que não tinhám interesse em investir na relação (motivos pessoais) e 6 referiram ser exclusivamente decorrencia da falta de parceiro (motivos externos).

Quanto à correlação entre os parâmetros clínicos da SOP e comportamento sexual, foi encontrada correlação significativa (p = 0,018) entre o ciclo menstrual e màsturbação. A percentagem de mulheres que se màsturbavam aumentava com o grau de irregularidade do ciclo menstrual (Figura 2). não houve correlação entre às variáveis de comportamento sexual e hirsutismo ou IMC (Tabelas 2 e 3).

Figura 2
Relação entre masturbação e ciclo menstrual
Tabela 2
Relação entre hirsutismo e as variáveis de comportamento sexual
Tabela 3
Relação entre índice de massa corporal (IMC) e as variáveis de comportamento sexual

DISCUSSÃO

A SOP, além de ser frequente, geralmente é diagnosticada quando às pacientes são jovens, idade em que há muitas dúvidas e ainda não há relacionamentos estaveis.

A sexualidade faz parte da saúde e do bem-estar. A sexualidade feminina é mais complexa e a falta de estudos epidemiológicos bem planejádos, além do uso de ferramentas diversas para avaliar as Disfunções Sexuais Femininas (DSF), limitam a interpretação dos resultados e as conclusões(1414. Hayes RD, Dennerstein L, Bennett CM, Fairley CK. What is the “true” prevalence of female sexual dysfunctions and does the way we assess these conditions have an impact? J Sex Med. 2008;5(4):777-87.).

A avaliação do comportamento de pacientes com SOP e importante do ponto de vista acadêmico para melhor compreensão do papel dos andrógenos no funcionamento sexual feminino, além da prática clínica para melhorar a qualidade do atendimento a essas pacientes.

A maioria dos estudos realizados tinha como objetivo a mensuração dos efeitos da SOP na qualidade de vida dàs pacientes e na iniciação sexual, frequência e prazer(1515. Raboch J, Kobilkovà J, Raboch J, Starka L. Sexual life of women with the Stein-Leventhal syndrome. Arch Sex Behav .1985;14(3):263-70.-1616. Trent ME, Rich M, Austin SB, Gordon CM. Fertility concerns and sexual behavior in adolescent girls with polycystic ovary syndrome: implications for quality of life. J Pediatr Adolesc Gynecol. 2003;16(1):33-7.). Porém, a sexualidade é mais abrangente; portanto, o objetivo deste estudo foi avaliar o comportamento sexual destàs mulheres.

Neste estudo, a queixa principal que motivou a consulta na clínica foi irregularidade menstrual. Analisando a correlação estatisticamente significativa entre irregularidade do ciclo menstrual e màsturbação, ficou claro que essa prática é mais comum entre às mulheres com amenorreia. No entanto, não houve correlação entre esse achádo e os níveis plasmáticos de andrógenos (androstenediona e testosterona) ou com característicàs individuais, como estado civil, renda pessoal, religiao ou presença/ausência de parceiro.

O fato de a irregularidade menstrual ter efeito significativo sobre uma Variàvel não relacionada às atividades sexuais com parceiro, embora não afete igualmente às variáveis àssociadàs às atividades sexuais com o parceiro, pode estar relacionado à maior complexidade da sexualidade desenvolvida como um casal, e a maior influência de fatores psicológicos e interpessoais quando envolvêm a dupla em comparação com a màsturbação(2020. Alexander GM, Sherwin BB, Bancroft J, Davidson DW. Testosterone and sexual behavior in oral contraceptive users and nonusers: a prospective study. Horm Behav. 1990;24(3):388-402.).

Kaplan(2121. Kaplan HS. The sexual desire disorders: dysfunctional regulation of sexual motivation. ©New York: Brunner/Mazel; 1995.) relatou que, embora o orgasmo atingido na màsturbação raramente seja tão prazeroso quanto a experiência com um parceiro, para muitas mulheres masturbar-se é a maneira mais fácil e confiável de atingir o orgasmo.

Os efeitos negativos dos problemas menstruais na qualidade de vida dàs pacientes já foram previamente discutidos por outros autores(2222. McCook JG, Reame NE, Thatcher SS. Health-related quality of life issues in women with polycystic ovary syndrome. J Obstet Gynecol Neonatal Nurs. 2005;34(1):12-20.) e estão de acordo com a ideia geral de que mulheres com SOP sofrem de “baixa identidade feminina”(66. Kitzinger C, Willmott J. "The thief of womanhood": women's experience of polycystic ovarian syndrome. Soc Sci Med. 2002;54(3):349-61.).

Na grande maioria dos casos, a primeira informação sobre sexo foi obtida por meio da mãe ou de professores na escola. Este achado reflete o fato de que pais e professores oferecem mais explicaçóes nàs últimas décadas. Trent et al.(1515. Raboch J, Kobilkovà J, Raboch J, Starka L. Sexual life of women with the Stein-Leventhal syndrome. Arch Sex Behav .1985;14(3):263-70.) investigaram adolescentes com SOP e também não encontraram diferença estatisticamente significativa entre a idade média de iniciação sexual em comparação com o grupo controle de adolescentes sadias.

Quanto ao estado civil, metade das pacientes era casada ou vivia maritalmente com companheiro, presumivelmente em estabilidade emocional, e 79,2% tinham parceiro por ocasião da entrevista. Agrawal et al.(2323. Agrawal R, Sharma S, Bekir J, Conway G, Bailey J, Balen AH, et al. Prevalence of polycystic ovaries and polycystic ovary syndrome in lesbian women compared with heterosexual women. Fertil Steril. 2004;82(5):1352-7.) estudaram a prevalência de SOP em lesbicàs e verificaram que essa síndrome era mais prevalente nesse grupo do que em heterossexuais com SOP. Tambem foi observado que lésbicas com SOP tem níveis mais elevados de andrógenos do que às heterossexuais com SOP. Na Sérvia, Vujovic et al.(2424. Vujovic S, Popovic S, Sbutega-Milosevic G, Djordjevic M, Gooren L. Transsexualism in Serbia: A twenty-year follow-up study. J Sex Med. 2009;6(4):1018-23.) verificaram que a prevalência de SOP em transexuais mulher-homem e de 14,4%, maior do que na população geral. Com base nesses resultados, sugeriu-se que as altas concentrações de andrógenos geralmente encontrados em pacientes com SOP poderiam contribuir para a orientação sexual. Porém, neste estudos todàs às pacientes eram heterossexuais.

Contradizendo os dados relatados por Elsenbruch et al.(1717. Elsenbruch S, Hahn S, Kowalsky D, Offner AH, Schedlowski M, Mann K, et al. Quality of life, psychosocial well-being, and sexual satisfaction in women with polycystic ovary syndrome. J Clin Endocrinol Metab. 2003;88(12):5801-7.) e Hahn et al.(1818. Hahn S, Janssen OE, Tan S, Pleger K, Mann K, Schedlowski M, et al. Clinical and psychological correlates of quality-of-life in polycystic ovary syndrome. Eur J Endocrinol. 2005;153(6):853-60.), a taxa de satisfação sexual e um fenômeno complexo, resultando da conformidade da pessoa com suas necessidades e motivações, valores e objetivos, experiênciàs sexuais e seu próprio comportamento, àssim como o de terceiros.

Entre às variáveis de comportamento sexual relacionadas às atividades realizadàs com o parceiro não foi encontrada correlação entre as principais manifestações clínicas da SOP (menstruação irregular, hirsutismo e obesidade) e as variáveis relacionadàs ao ciclo de resposta sexual. Resultados semelhántes foram relatados por Battaglia et al.(2525. Battaglia C, Nappi RE, Mancini F, Cianciosi A, Persico N, Busacchi P, et al. PCOS, sexuality, and clitoral vascularisation: a pilot study. J Sex Med. 2008;5(12):2886-94.), que não encontraram diferenças significativàs da incidencia de disfunção sexual entre SOP e controles. Além disso, os autores relataram que não havia diferenças entre os dados referentes à relação com os parceiros (saúde sexual do parceiro, sentimentos, relacionamento etc.) ao compararem mulheres com SOP e controles.

A frequência de desejo e excitação sexual foi considerada adequada e satisfatória para a maioria dàs pacientes. Porém, 35,2% tinhám alguma dificuldade para atingir o orgàsmo e 4 eram anorgàsmicàs. Neste estudo, os autores estavam mais interessados na qualidade da relação sexual do que em àspectos númericos. A taxa de satisfação com as relações sexuais foi elevada, e o grau de intimidade e comunicação com os parceiros também foi boa. Estudos sobre sexualidade também variam de acordo com a importancia dada ao orgàsmo na satisfação sexual(2626. Waterman CK, Chiauzzi EJ. The role of orgasm in male and female sexual enjoyment. J Sex Res. 1982;18(2):146-59.,2727. Darling CA, Davidson JK Sr, Cox RP. Female sexual response and the timing of partner orgasm. J Sex Marital Ther. 1991;17(1):3-21.).

Embora este estudo piloto apresente dados importantes, os resultados devêm ser interpretados com cautela, pois amostràs maiores com randomização e grupo controle serão necessárias.

CONCLUSÃO

Em mulheres com SOP, a iniciação sexual, as formas de expressar a sexualidade, sua comunicação íntima com o parceiro e a satisfação sexual não foram afetadas pela doença. Mesmo assim, a ausência de menstruação teve efeito sobre as atividades e interesses não relacionados ao parceiro, aumentando a frequência da masturbação.

  • Estudo realizado no Ambulatório de Endocrinologia Ginecológica e Departamento de Climatério da Universidade de São Paulo – USP, São Paulo (SP), Brasil.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2010

Histórico

  • Recebido
    31 Mar 2010
  • Aceito
    13 Out 2010
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