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Hemoperitôneo secundário a GIST gástrico c-KIT negativo e anticorpo anti-DOG1 positivo

Resumos

Os tumores estromais do trato gastrintestinal, embora relativamente raros, compreendem a maioria dos tumores mesenquimais do trato digestivo e constituem 5% de todos os sarcomas. Quanto à apresentação clínica, os sintomas mais comuns são dor, hemorragia digestiva e massa palpável. Este trabalho relatou o caso de um paciente jovem que desenvolveu hemoperitôneo por ruptura de neoplasia gástrica e necessitou de tratamento cirúrgico de urgência. A análise patológica e imunoistoquímica revelou tratar-se de um caso raro epidemiologicamente: tipo celular epitelioide e c-KIT negativo.

Tumores do estroma gastrintestinal; Hemorragia gastrintestinal; Gastrectomia; Neoplasias gastrintestinais; Endoscopia; Relatos de casos


Although relatively rare, the gastrointestinal stromal tumors comprise most mesenchymal tumors of the digestive tract and account for 5% of all sarcomas. The most common symptoms are pain, gastrointestinal bleeding and palpable mass. This study reported the case of a young patient who developed hemoperitoneum due to gastric neoplasm rupture and required urgent surgical treatment. Pathology and immunohistochemistry analysis showed an epidemiologically rare case: epithelioid and c-KIT negative tumor.

Gastrointestinal stromal tumors; Gastrointestinal hemorrhage; Gastrectomy; Gastrointestinal neoplasms; Endoscopy; Case reports


RELATO DE CASO

Hemoperitôneo secundário a GIST gástrico c-KIT negativo e anticorpo anti-DOG1 positivo

Marina Gabrielle EpsteinI; Aline Fioravanti PasquettiI; Sara Venoso CostaI; Murillo de Lima FavaroII; Orlando Contrucci FilhoIII; Marcelo Augusto Fontenelle Ribeiro JuniorIV

IServiço de Cirurgia Geral, Universidade de Santo Amaro - UNISA, São Paulo (SP), Brasil

IIDepartamento de Técnica Cirúrgica, Universidade de Santo Amaro - UNISA, São Paulo (SP), Brasil

IIIServiço de Cirurgia Geral e Serviço de Proctologia, Universidade de Santo Amaro - UNISA, São Paulo (SP), Brasil

IVDepartamento de Clínica Cirúrgica, Universidade de Santo Amaro - UNISA, São Paulo (SP), Brasil

Autor correspondente Autor correspondente: Marina Gabrielle Epstein Rua Professor Carlos de Carvalho, 88, apto. 111 - Itaim Bibi CEP: 04531080 - São Paulo (SP), Brasil Tel.: (11) 3079-1831 E-mail: ma_epstein@hotmail.com

RESUMO

Os tumores estromais do trato gastrintestinal, embora relativamente raros, compreendem a maioria dos tumores mesenquimais do trato digestivo e constituem 5% de todos os sarcomas. Quanto à apresentação clínica, os sintomas mais comuns são dor, hemorragia digestiva e massa palpável. Este trabalho relatou o caso de um paciente jovem que desenvolveu hemoperitôneo por ruptura de neoplasia gástrica e necessitou de tratamento cirúrgico de urgência. A análise patológica e imunoistoquímica revelou tratar-se de um caso raro epidemiologicamente: tipo celular epitelioide e c-KIT negativo.

Descritores: Tumores do estroma gastrintestinal; Hemorragia gastrintestinal/diagnóstico; Gastrectomia; Neoplasias gastrintestinais; Endoscopia; Relatos de casos

INTRODUÇÃO

Os tumores estromais gastrintestinais (GIST, sigla do inglês gastrointestinal stromal tumors) ocorrem predominantemente entre 40 e 80 anos, tendo uma incidência entre os sexos praticamente semelhante(1). Podem se originar em qualquer local do trato gastrintestinal, sendo que 50 a 60% das lesões são provenientes do estômago, 20 a 30% do intestino delgado, 10% do intestino grosso, 5% do esôfago e 5% de outros locais da cavidade abdominal(2). São tumores derivados das células intersticiais de Cajal, localizadas ao nível do plexo mioentérico, entre a camada muscular longitudinal e a circular do trato gastrintestinal(3). Apresentam características imunofenotípicas e ultraestruturais, tanto de músculo liso quanto de diferenciação neural, e expressam o receptor KIT (CD117), semelhante ao GIST(4).

A apresentação clínica dos pacientes portadores de GIST é variável e se correlaciona principalmente com o tamanho da lesão(5). Usualmente, o diagnóstico não é possível por biópsias endoscópicas, por causa de sua localização submucosa. A tomografia computadorizada com contraste oral e venoso é ideal para definir a extensão exofítica e intramural do tumor. O anticorpo anti-DOG1 (do inglês discovered on GIST-1 - DOG1), desenvolvido recentemente, tem sido relatado como mais sensível e mais específico para o diagnóstico de GIST em relação ao CD117 ou CD34. O tratamento padrão para pacientes com GIST não metastático é a ressecção cirúrgica completa da lesão, pois oferece a maior chance de cura. A descoberta do STI571 (imatinibe) revolucionou o tratamento desse câncer, por ser a primeira terapia a agir especificamente na alteração molecular responsável pela etiologia da doença. Esse tratamento é utilizado para doença metastática ou irressecável(1).

RELATO DO CASO

Paciente LGS, masculino, 28 anos, natural do Ceará, deu entrada no pronto-socorro do Hospital Municipal Dr. Moysés Deutsch com queixa de epigastralgia e hiporexia com início há 1 dia. Negava náuseas, vômitos ou febre. Como antecedente patológico, referia úlcera gástrica diagnosticada há 2 anos e tratamento com inibidor de bomba de prótons. Ao exame físico, apresentava-se em bom estado geral, hemodinamicamente estável, normocorado e afebril. Apresentava abdome plano, flácido, doloroso à palpação em epigastro e hipogastro, sem sinais de irritação peritoneal.

Realizou endoscopia digestiva alta no primeiro dia de internação, sendo registrada lesão submucosa na grande curvatura e parede posterior de corpo distal, com erosão em seu ápice, medindo cerca de 2,5cm de diâmetro. No 5º dia de internação, observou-se queda progressiva dos níveis de hemoglobina (de 14,0 para 8,3), sem repercussão hemodinâmica. O abdome encontrava-se flácido, doloroso à palpação difusa com descompressão brusca positiva. Frente ao quadro, foi solicitada tomografia computadorizada de abdome, que demonstrou líquido livre na cavidade abdominal e tumoração na grande curvatura gástrica (Figura 1). A hipótese diagnóstica foi de hemoperitônio, sendo indicada laparotomia exploradora. Durante a cirurgia, foi confirmado hemoperitôneo, com lesão tumoral aderida em região de corpo e fundo gástrico, semipediculado, de aproximadamente 8cm, com sinais de ruptura. Não foram encontradas quaisquer outras lesões ou sangramento em outras estruturas peritoneais ou carcinomatose. Optou-se por realizar gastrectomia parcial em cunha, com margens de ressecção de 6cm e rafia de parede gástrica em dois planos. O resultado do anatomopatológico revelou GIST, de padrão arquitetural epitelioide, índice mitótico de 1 por 50 campos de grande aumento e moderado pleomorfismo celular. Não apresentava sinais de necrose, nem de infiltração de mucosa gástrica. A imunoistoquímica foi negativa para DC117 e tem seus resultados demonstrados no quadro 1. Apesar de ser um quadro grave, o paciente evoluiu sem intercorrências e recebeu alta hospitalar no 5º dia do pós-operatório. Prosseguir em acompanhamento ambulatorial, sem sinais de recidiva da doença.



DISCUSSÃO

GISTs representam apenas 1% de todos os tumores gástricos primários. Também constitui-se, na imunoistoquímica, positivo para o c-KIT (CD117). Sabe-se que cerca de 95% de todos os GIST são positivos para esse receptor(5). Histologicamente, sabe-se que os tumores GIST são originalmente derivados de células do músculo liso. Nos anos 1990, observaram-se algumas inconsistências sobre os tumores classificados de maneira abrangente como GIST. Importante descoberta deu-se quando foi identificada a quase universalidade da expressão do receptor CD117 para os GIST, ao contrário dos leiomiomas, leiomiossarcomas e outras células fusiformes do trato gastrintestinal, que são comumente CD117 negativas(5,6). Assim como é observado na literatura, o primeiro sintoma agudo do caso foi hemorragia gastrintestinal. Esse encontra-se presente em cerca de 40% dos casos(6,7). O DOG1 é uma proteína transmembrana, descoberta pela análise do perfil da expressão gênica dos GISTs, que demonstrou ser útil como marcador imunoistoquímico(8). Os resultados imunoistoquímicos da utilização concomitante de DOG1 e KIT nos GISTs mostraram 85% dos casos positivos para ambos os marcadores (DOG+/KIT+), 6% negativos para DOG1 e KIT e 6% para DOG+/KIT-, contra 3% para DOG-/KIT+. A especificidade de DOG1 mostrou-se bastante elevada com poucos tipos de tumores não GISTs imunorreativos para DOG1(8). A identificação de pacientes CD117- porém DOG1+ permite tratamento com inibidores de tirosinaquinase, da mesma forma que os C-KIT positivos. Em relação às vias de acesso, optou-se pela laparotomia exploradora, porém, na literatura, há autores(9) que descrevem um caso de hemoperitônio secundário a GIST gástrico tratado por via laparoscopia e gastrectomia vertical, sem intercorrências, e casos que se iniciaram por via laparoscópica e, em razão do sangramento intenso e da instabilidade hemodinâmica do paciente, houve conversão para laparotomia(10).

Data de submissão: 19/12/2011

Data de aceite: 17/1/2012

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  • 5. Huang HY, Li CF, Huang WW, Hu TH, Lin CN, Uen YH, et al. A modification of NIH consensus criteria to better distinguish the highly lethal subset of primary localized gastrointestinal stromal tumors: a subdivision of the original high-risk group on the basis of outcome. Surgery. 2007;141(6):748-56.
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  • 9. Costi R, Le Bian A, Creuze N, Prevot S, Cauchy F, Violi V, et al. Hemoperitoneum caused by a ruptured GIST located in the posterior gastric wall managed by endoscopic diagnosis and laparoscopic treatment: case report and literature review. Surg Laparosc Endosc Percutan Tech. 2011;21(6):e316-8.
  • 10. Varras M, Vlachakos N, Akrivis C, Vasilakaki T, Skafida E. Malignant gastrointestinal stromal tumor presenting with hemoperitoneum in puerperium: report of a case with review of the literature. World J Surg Oncol. 2010;8:95.
  • Autor correspondente:

    Marina Gabrielle Epstein
    Rua Professor Carlos de Carvalho, 88, apto. 111 - Itaim Bibi
    CEP: 04531080 - São Paulo (SP), Brasil
    Tel.: (11) 3079-1831
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Out 2012
    • Data do Fascículo
      Set 2012

    Histórico

    • Recebido
      19 Dez 2011
    • Aceito
      17 Jan 2012
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