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Relação entre contagem de leucócitos, adiposidade e aptidão cardiorrespiratória em adolescentes púberes

Resumos

Objetivo

Comparar a contagem total e diferencial de leucócitos de adolescentes obesos e eutróficos, e verificar suas possíveis relações com a aptidão cardiorrespiratória e indicadores de adiposidade.

odos

Estudo transversal realizado com 139 adolescentes (107 obesos e 32 eutróficos), com idades entre 13 e 18 anos. A aptidão cardiorrespiratória foi determinada por análise direta de gases durante um teste incremental em esteira rolante. As contagens de leucócitos totais e subconjuntos foram estimadas por citometria de fluxo. A composição corporal foi avaliada pelo método de dupla energia de raios X. O teste t para amostras independentes foi utilizado para comparação entre os grupos. A relação entre leucócitos, aptidão cardiorrespiratória e indicadores de adiposidade foi verificada por meio dos testes de correlação de Pearson e regressão linear múltipla (ajustado para idade e índice de massa corporal).

Resultados

Os adolescentes obesos apresentaram leucócitos (8,12±2,36u/L x 103; p=0,001), neutrófilos (4,33±1,86u/L x 103; p=0,002) e monócitos (0,70±0,22u/L x 103; p=0,002) mais elevados em comparação com os níveis dos eutróficos. Após os ajustes necessários, a aptidão cardiorrespiratória foi negativamente associada com leucócitos, neutrófilos e monócitos em meninos.

Conclusão

Adolescentes obesos apresentaram maior contagem de leucócitos totais e subpopulações, quando comparados aos eutróficos. Observou-se também uma fraca relação positiva entre adiposidade e leucócitos totais, monócitos e neutrófilos, e em meninos, uma relação negativa entre aptidão cardiorrespiratória e leucócitos totais, monócitos e neutrófilos.

Obesidade; Adolescente; Contagem de leucócitos; Adiposidade; Aptidão física; Inflamação


Objective

To compare the total and differential leukocyte count in obese and normal-weight adolescents, and to verify their possible relations with cardiorespiratory fitness and adiposity indicators.

Methods

A cross-sectional study conducted with 139 adolescents (107 obese and 32 normal weight) aged between 13 and 18 years. Cardiorespiratory fitness was determined by direct gas analysis during an incremental treadmill test. Total leukocytes and subsets were estimated by flow cytometry. Body composition was assessed by dual-energy X-ray absorptiometry. Thet-test for independent samples was used for comparison between groups. The relation between leukocytes, cardiorespiratory fitness and adiposity indicators was verified by Pearson’s correlation and multiple linear regression (adjusted for age and body mass index) tests.

Results

Obese adolescents had higher leukocyte (8.12±2.36u/L x 103; p=0.001), neutrophil (4.33±1.86u/L x 103; p=0.002), and monocyte (0.70±0.22u/L x 103; p=0.002) counts compared to the levels of normal weight subjects. After the necessary adjustments, cardiorespiratory fitness had a negative association with leukocytes, neutrophils, and monocytes in boys.

Conclusion

Obese adolescents had higher total and differential leucocyte count when compared to normal weight individuals. We also observed a weak positive association between adiposity and total leukocyte, monocyte, and neutrophil counts, and in boys, a negative association between cardiorespiratory fitness and total count of leukocytes, monocytes, and neutrophils.

Obesity; Adolescent; Leukocyte count; Adiposity; Physical fitness; Inflammation


INTRODUÇÃO

A obesidade se tornou uma epidemia global, que afeta cerca de 500 milhões de adultos.(1Finucane MM, Stevens GA, Cowan MJ, Danaei G, Lin JK, Paciorek CJ, Singh GM, Gutierrez HR, Lu Y, Bahalim AN, Farzadfar F, Riley LM, Ezzati M; Global Burden of Metabolic Risk Factors of Chronic Diseases Collaborating Group (Body Mass Index). National, regional, and global trends in body-mass index since 1980: systematic analysis of health examination surveys and epidemiological studies with 960 country-years and 9·1 million participants. Lancet. 2011;377(9765):557-67.) A adiposidade excessiva está associada a diversos fatores de risco cardiometabólicos (por exemplo: intolerância à glicose, hipertrigliceridemia, hipercolesterolemia e aumento da pressão arterial sistólica),(2Abbasi F, Blasey C, Reaven GM. Cardiometabolic risk factors and obesity: does it matter whether BMI, or waist circumference is the index of obesity. Am J Clin Nutr. 2013;98(3):637-40.) o que eleva a probabilidade de morte prematura.(3Franks PW, Hanson RL, Knowler WC, Sievers ML, Bennett PH, Looker HC. Childhood obesity, other cardiovascular risk factors and premature death. N Engl J Med. 2010;362(6):485-93.) Além disso, evidências apontam que, na obesidade, existe um aumento importante da produção de marcadores inflamatórios e que grande parte dessas complicações cardiometabólicas estaria relacionada a esse estado inflamatório crônico sistêmico observado em indivíduos obesos.(4Gregor MF, Hotamisligil GS. Inflammatory mechanisms in obesity. Annu Rev Immunol. 2011;29:415-45.,5Rocha VZ, Folco EJ. Inflammatory concepts of obesity. Int J Inflam. 2011; 2011:529061.)

A contagem de leucócitos e subpopulações é um marcador clínico de processos inflamatórios(6Farhangi MA, Keshavarz AS, Eshraghian M, Ostadrahimi A, Sabbor-Yaraghi AA. White blood cell count in women: relation to inflammatory biomarkers, haematological profiles, visceral adiposity, and other cardiovascular risk factors. J Health Popul Nutr. 2013;31(1):58-64.,7Ganguli D, Das N, Saha I, Sanapala KR, Chaudhuri D, Gosh S, et al. Association between inflammatory markes and cardiovascular risk factors in women from Kolkata, W.B, India. Arq Bras Cardiol. 2011;96(1):38-46.) relacionados a perturbações cardiometabólicas envolvidas no desenvolvimento de doenças cardiovasculares,(8Tatsukawa Y, Hsu WL, Yamada M, Cologne JB, Suzuki G, Yamamoto H, et al. White blood cell count, especially neutrophil count, as a predictor of hypertension in a Japanese population. Hypertens Res. 2008;31(7):1391-7.) especialmente em indivíduos com sobrepeso.(9Dixon JB, O’Brien PE. Obesity and the white blood cell count: changes with sustained weight loss. Obes Surg. 2006;16(3):251-7.)

Por outro lado, a aptidão cardiorrespiratória tem sido considerada um fator de proteção contra problemas de saúde, tanto em adultos(1010 Woo J, Yu R, You F. Fitness, fatness and survival in elderly populations. Age (Dordr). 2013;35(3):973-84.) quanto em crianças e adolescentes.(1111 Artero EG, España-Romero V, Jiménez-Pavón D, Martinez-Gómez D, Warnberg J, Gómez-Martínez S, González-Gross M, Vanhelst J, Kafatos A, Molnar D, De Henauw S, Moreno LA, Marcos A, Castillo MJ; HELENA study group. Muscular fitness, fatness and inflammatory biomarkers in adolescents. Pediatr Obes. 2014;9(5):391-400.,1212 Magnussen CG, Schmidt MD, Dwyer T, Venn A. Muscular fitness and clustered cardiovascular disease risk in Australian youth. Eur J Appl Physiol. 2012;112(8):3167-71.) Estudos anteriores demonstraram uma relação negativa independente entre níveis de leucócitos e aptidão cardiorrespiratória em homens(1313 Kim DJ, Noh JH, Lee BW, Choi YH, Jung JH, Min YK, et al. A white blood cell count in the normal concentration range is independently related to cardiorespiratory fitness in apparently healthy Korean men. Metabolism. 2005;54(11):1448-52.) e mulheres.(1414 Michishita R, Shono N, Inoue T, Tsuruta T, Node K. Associations of monocytes, neutrophil count, and C-reactive protein with maximal oxygen uptake in overweight women. J Cardiol. 2008;52(3):247-53.) No entanto, apesar de os distúrbios cardiometabólicos associados à obesidade poderem ser desencadeados ainda na primeira infância,(1515 Frohnert BI, Jacobs DR Jr, Steinberger J, Moran A, Steffen LM, Sinaiko AR. Relation between serum fatty acids and adiposity, insulin resistance, and cardiovascular risk factors from adolescence to adulthood. Diabetes. 2013;62(9):3163-9.) pouco se sabe sobre essa associação na infância e na adolescência.

OBJETIVO

Comparar a contagem total de leucócitos e seus subconjuntos em adolescentes obesos e eutróficos, além de investigar possíveis relações com a aptidão cardiorrespiratória e a adiposidade.

MÉTODOS

Estudo transversal realizado na Escola Superior de Educação Física da Universidade de Pernambuco, com 139 adolescentes (15,21±1,51 anos), sendo 107 obesos (63 meninas) recrutados para o programa de tratamento da obesidade na adolescência da universidade e 32 adolescentes eutróficos (22 meninas). O estudo estendeu-se no período entre janeiro e abril de 2013.

Os adolescentes preencheram os seguintes critérios de inclusão: idade entre 13 e 18 anos e estágio maturacional entre 3 e 4, de acordo com os critérios de Tanner,(1616 Tanner JM. Growth at adolescence. Oxford: Blackwell Scientific Publications; 1962.) a ausência de hipertensão e/ou outras doenças metabólicas (autorrelatadas ou identificadas por endocrinologista responsável), índice de massa corporal (IMC) acima do percentil 95 (obesos) e entre 25 e percentil 85 (eutróficos).(1717 Kuczmarski RJ, Oqden CL, Grummer-Strawn LM, Flegal KM, Guo SS, Wei R, et al. CDC growth charts: United States. Adv Data. 2000;8(314):1-27.) Adolescentes que relataram uso excessivo de álcool, tabagismo, ou uso contínuo de anti-inflamatórios e/ou antialérgicos foram excluídos da amostra.

O estudo foi realizado de acordo com os princípios da Declaração de Helsinki, tendo sido formalmente aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade de Pernambuco (CAAE: 15796113.9.0000.5207). O consentimento esclarecido dos pais ou responsável legal e o parecer favorável do participante foram obtidos depois de explicação detalhada dos procedimentos de todo protocolo do estudo.

Antropometria e composição corporal

A estatura e a massa corporal foram medidas por meio de estadiômetro e balança de escala calibrada (Welmy®) com precisão de 0,1cm e 0,1kg, respectivamente. Na ocasião, os sujeitos posicionaram-se levemente vestidos e sem sapatos. O IMC foi calculado dividindo o peso corporal (kg) pela estatura elevada ao quadrado (m2Abbasi F, Blasey C, Reaven GM. Cardiometabolic risk factors and obesity: does it matter whether BMI, or waist circumference is the index of obesity. Am J Clin Nutr. 2013;98(3):637-40.). A composição corporal foi determinada pelo método de emissão de raios X de duplo feixe (DXA) (modelo QDR HOLOGIC WI).

Aptidão cardiorrespiratória

O consumo de oxigênio pico (VO2pico) foi usado para determinar a aptidão cardiorrespiratória. VO2 foi analisado diretamente em um sistema metabólico respiratório de circuito aberto (Quark PFT, Cosmed, Itália) durante teste incremental contínuo em esteira rolante (Cosmed T200, Cosmed, Itália). Antes de cada teste, o equipamento foi calibrado para a composição do gás de referência (O2=12,2% e CO2=4,8%; White Martins), seguindo as recomendações do fabricante. A carga inicial foi fixada em 4km/h (aquecimento de 3 minutos) e elevada a 1km/h a cada minuto, com inclinação mantida constante a 1%. Os critérios de interrupção do teste foram fadiga volitiva, escala de Borg e relação de troca de gás superior a 18 e 1,15, respectivamente. O maior valor VO2 obtido antes da interrupção do teste foi considerado como o VO2pico.

Análises sanguíneas

As amostras de sangue foram tomadas a partir da veia periférica do antebraço, com tubos contendo anticoagulante (EDTA), após jejum noturno (12 horas). A contagem total de leucócitos e de subpopulações (neutrófilos, monócitos e linfócitos) foi determinada por meio do método de citometria de fluxo fluorescente (Sysmex XE 2100®).

Análise estatística

Para analisar a normalidade e a homogeneidade da distribuição dos dados, foram utilizados os testes Kolmogorov-Smirnorv e Levene, respectivamente. Para comparar a concentração de leucócitos e subconjuntos entre adolescentes obesos e eutróficos, foi utilizado o teste t de Student para amostras independentes ou teste de Mann-Whitney (não paramétrico). A correlação de Spearman foi utilizada para analisar a relação entre a composição corporal, aptidão cardiorrespiratória (VO2pico) e concentrações de leucócitos. Regressão linear múltipla ajustada para idade e IMC foi utilizada para analisar a relação independente entre aptidão cardiorrespiratória e contagem de leucócitos (e subpopulações). Todos os procedimentos estatísticos foram realizados utilizando o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS Inc., Chicago, Estados Unidos), versão 20.0. O nível de significância estatística foi estabelecido em p<0,05.

RESULTADOS

A tabela 1 mostra os parâmetros antropométricos, de composição corporal e aptidão cardiorrespiratória por grupos. Os adolescentes obesos apresentaram idade (p<0,001) e VO2pico (p<0,001) menores; por outro lado, apresentaram IMC, percentual de gordura, massa gorda e massa magra (p<0,001, para todos) maiores em comparação com adolescentes eutróficos.

Tabela 1
Características antropométricas, de composição corporal e de aptidão cardiorrespiratória

Os adolescentes obesos apresentaram maiores contagens de leucócitos totais (8,12±2,36 x 103u/L; p=0,036), neutrófilos (4,33±1,86 x 103u/L; p=0,002) e monócitos (0,70±0 22 x 103u/L; p=0,001) comparados com os eutróficos. Não houve diferença entre os grupos para a contagem da subpopulação de linfócitos (p=0,120) (Figura 1).

Figura 1
Comparação da contagem de leucócitos e subpopulações de adolescentes obesos e eutróficos. *p<0,05

Houve correlação significativa entre contagem total de leucócitos e o percentual de gordura (r=0,22), massa gorda − em quilograma (r=0,25), IMC (r=0,22) e VO2pico (r=-0,22). Também foram observadas correlações significativas entre neutrófilos e percentual de gordura (r=0,27), massa gorda − em quilograma (r=0,24) e VO2pico (r=-0,25); entre monócitos e massa gorda − em quilograma (r=0,19) e IMC (r=0,18); e entre a razão neutrófilos/linfócitos e percentual de gordura (r=0,22) e a massa gorda − em quilograma (r=0,18) (Tabela 2).

Tabela 2
Correlação entre contagem de leucócitos e subconjuntos com parâmetros antropométricos, de composição corporal e aptidão cardiorrespiratória (n=139)

A tabela 3 demonstra as relações entre leucócitos totais, neutrófilos e monócitos com a aptidão cardiorrespiratória, quando realizados ajustes para idade e IMC. Nos meninos, leucócitos totais, neutrófilos e monócitos se mostraram negativamente associados com a aptidão cardiorrespiratória. Não houve esse tipo de relação entre as meninas.

Tabela 3
Associação entre aptidão cardiorrespiratória, leucócitos totais, neutrófilos e monócitos (n=139)

DISCUSSÃO

Os principais achados do presente estudo foram os seguintes: adolescentes obesos apresentaram maior contagem de leucócitos totais e subpopulações (neutrófilos e monócitos) quando comparados aos pares eutróficos; houve relação positiva entre adiposidade e leucócitos totais, monócitos e neutrófilos; houve também relação negativa entre aptidão cardiorrespiratória e leucócitos totais, monócitos e neutrófilos, somente nos meninos, independentemente do IMC e idade.

Estudos anteriores relataram um estado de inflamação crônica e de baixo grau em adolescentes obesos.(1818 Stofkova A. Leptin and adiponectin: from energy and metabolic dysbalance to inflammation and autoimmunity. Endocr Regul. 2009;43(4):157-68. Review.,1919 Iyer A, Fairlie DP, Prins JB, Hammock BD, Brown L. Inflammatory lipid mediators in adipocyte function and obesity. Nat Rev Endocrinol. 2010;6(2):71-82. Review.) As contagens de leucócitos mais elevadas observadas em adolescentes obesos no presente estudo foram semelhantes aos resultados em adultos,(9Dixon JB, O’Brien PE. Obesity and the white blood cell count: changes with sustained weight loss. Obes Surg. 2006;16(3):251-7.) em crianças(2020 Zaldivar F, McMurray RG, Nemet D, Galassetti P, Mills PJ, Cooper DM. Body fat and circulating leukocytes in children. Int J Obes (Lond). 2006;30(6):906-11.) e adolescentes.(2121 Kim JA, Park HS. White blood cell count and fat distribution in female obese adolescents. Metabolism. 2008;57(10):1375-9.) De fato, as correlações positivas encontradas entre a contagem total de leucócitos e subpopulações (neutrófilos e monócitos), mesmo de intensidades fracas (r=0,18 a r=0,27), já demonstradas em estudos anteriores,(6Farhangi MA, Keshavarz AS, Eshraghian M, Ostadrahimi A, Sabbor-Yaraghi AA. White blood cell count in women: relation to inflammatory biomarkers, haematological profiles, visceral adiposity, and other cardiovascular risk factors. J Health Popul Nutr. 2013;31(1):58-64.,7Ganguli D, Das N, Saha I, Sanapala KR, Chaudhuri D, Gosh S, et al. Association between inflammatory markes and cardiovascular risk factors in women from Kolkata, W.B, India. Arq Bras Cardiol. 2011;96(1):38-46.) evidenciaram que, em parte, a contagem de leucócitos totais, monócitos e neutrófilo sofre influência dos indicadores de adiposidade, com reflexo, de forma global, no perfil inflamatório do adolescente.

Outro ponto importante diz respeito à diferença significativa entre as idades dos adolescentes obesos e eutróficos. No entanto, todos os adolescentes obtiveram a classificação do estado nutricional por meio de curvas de percentis(1717 Kuczmarski RJ, Oqden CL, Grummer-Strawn LM, Flegal KM, Guo SS, Wei R, et al. CDC growth charts: United States. Adv Data. 2000;8(314):1-27.) que levam em consideração a idade individual de cada adolescente. Adicionalmente, as análises de regressão, foram todas corrigidas pela idade, a fim de isolar qualquer influência dessa variável sobre os resultados encontrados.

Em adultos, tem sido descrito que alta contagem de leucócitos é um fator de risco independente para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares.(2222 Asadollahi K, Beeching NJ, Gill GV. Leukocytosis as a predictor for non-infective mortality and morbidity. QJM. 2010;103(5):285-92. Review.) O mecanismo para esse efeito não está totalmente esclarecido, mas está provavelmente relacionado com a liberação de radicais livres, moléculas pró-coagulantes e enzimas proteolíticas por neutrófilos e monócitos, o que pode acelerar o processo de formação de placa aterosclerótica.(2020 Zaldivar F, McMurray RG, Nemet D, Galassetti P, Mills PJ, Cooper DM. Body fat and circulating leukocytes in children. Int J Obes (Lond). 2006;30(6):906-11.) Além disso, os monócitos secretam fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), uma citocina que se relaciona com a resistência à insulina.(2323 Brost SE. The role of TNF- alpha in insulin resistance. Endocrine. 2004; 23(2-3):177-82. Review.)

Adicionalmente, neutrófilos e monócitos têm sido associados com doença arterial coronariana.(2424 Madjid M, Fatemi O. Component of the complete blood count as risk predictors for coronary heart disease: in-depth review and update. Tex Heart Inst J. 2013;40(1):17-29. Review.) Nossos resultados sugerem que os efeitos desses processos prejudiciais podem se iniciar cada vez mais cedo, o que, por sua vez, pode indicar que a obesidade na adolescência pode desencadear o aparecimento da doença arterial coronariana.

Outro achado importante do presente estudo foi uma correlação negativa entre o VO2pico e a contagem de leucócitos totais e neutrófilos. Embora o VO2pico seja considerado um marcador de aptidão física, também é importante destacar que tal parâmetro reflete a função do sistema cardiopulmonar, sendo considerado um parâmetro de proteção contra os fatores de risco para aterosclerose.(2525 Ichihara Y, Hattori R, Anno T, Okuma K, Yokoi M, Mizuno Y, et al. Oxygen uptake and its relation to physical activity and other risk factors in asymptomatic middle-aged Japanese. J Cardiopulm Rehabil. 1996;16(6):378-85.) Michishita et al.,(1414 Michishita R, Shono N, Inoue T, Tsuruta T, Node K. Associations of monocytes, neutrophil count, and C-reactive protein with maximal oxygen uptake in overweight women. J Cardiol. 2008;52(3):247-53.) em um estudo com mulheres com excesso de peso, observaram correlação negativa entre monócitos e VO2pico. Dessa maneira acredita-se que a elevação na aptidão cardiorrespiratória de adolescentes obesos pode influenciar na diminuição da produção de marcadores inflamatórios, proporcionando um maior estafo anti-inflamatório, que é importante na prevenção de eventos cardiovasculares.

Interessantemente, a associação entre aptidão cardiorrespiratória e contagem de leucócitos e subpopulações foi observada apenas em meninos, após ajuste para o IMC e idade. Tal resultado está de acordo com o de estudos anteriores em populações de idades mais avançadas.(2626 Isasi CR, Deckelbaum RJ, Tracy RP, Starc TJ, Berglund L, Shea S. Physical fitness an C- reactive protein level in children and young adults: the Columbia University BioMarkers Study. Pediatrics. 2003;111(2):332-8.,2727 Elosua R, Barteli B, Ordovas JM, Corsi AM, Lauretani F, Ferruci L; InCHIANT Investigators. Association between physical activity, physical performance, and inflammatory biomarkers in an elderly population: the InCHIANTI study. J Gerontol A Biol Med Sci. 2005;60(6):760-7.) A razão para essa diferença entre os gêneros não está totalmente compreendida, mas o nível de atividade física mais baixo, geralmente observados em meninas, é um potencial fator.(2828 Wärnberg J, Cunningham K, Romeo J, Marcos A. Physical activity, exercise and low-grade systemic inflammation. Proc Nutr Soc. 2010;69(3):400-6.) Além disso, há uma estreita relação entre esteroides sexuais, inflamação e distribuição de gordura corporal em mulheres, pois, devido ao ciclo menstrual, os níveis circulantes de marcadores inflamatórios podem variar significativamente.(2929 Blum CA, Müller B, Huber P, Kraenzlin M, Schindler C, De Geyter C, et al. Low-grade inflammation and estimates of insulin resistance during the menstrual cycle in lean and overweight women. J Clin Endocrinol Metab. 2005;90(6):3230-5.)

Nesse sentido, a aderência de leucócitos, principalmente os monócitos e neutrófilos, ao endotélio, e também a migração dessas células para a parede do vaso sanguíneo são características envolvidas em várias fases da aterosclerose.(6Farhangi MA, Keshavarz AS, Eshraghian M, Ostadrahimi A, Sabbor-Yaraghi AA. White blood cell count in women: relation to inflammatory biomarkers, haematological profiles, visceral adiposity, and other cardiovascular risk factors. J Health Popul Nutr. 2013;31(1):58-64.) Adamopoulos et al.(3030 Adamopoulos S, Parissis J, Kroupis C, Georgiadis M, Karatzas D, Karavolias G, et al. Physical training reduces peripheral markers of inflammation in patients with chronic heart failure. Eur Heart J. 2001;22(9):791-7.) demonstraram que o aumento do VO2pico após período de treinamento aeróbio foi eficaz para inibir a infiltração de monócitos na parede do vaso. Assim, níveis mais elevados de VO2pico proporcionam efeitos cardiovasculares protetores, inibindo processos inflamatórios.

As principais limitações do estudo foram a análise isolada da contagem de leucócitos, uma vez que a avaliação de sua função e de sua ativação poderia fornecer informações importantes; o não controle dos períodos menstruais das adolescentes; e, finalmente, a não avaliação da influência do padrão de distribuição de gordura.

Por outro lado, vale salientar que, no presente estudo, o VO2pico foi determinado por análise direta de gases, e a composição corporal foi avaliada por meio da técnica de absortometria de duplo feixe (DXA). Tais métodos reforçam os resultados deste estudo, por se tratarem de técnicas mais precisas e de maior acurácia, principalmente em relação à população em estudo.

CONCLUSÃO

Níveis mais elevados de leucócitos (monócitos e neutrófilos) foram observados em adolescentes obesos em comparação com os eutróficos. Esse perfil sugeriu um estado pró-inflamatório crônico nesses adolescentes obesos, o que poderia estar relacionado com a adiposidade excessiva e à aptidão cardiorrespiratória diminuída. Tais dados destacam a necessidade eminente para o desenvolvimento de intervenções nessa população visando não somente ao controle de peso, mas também a melhorias na aptidão cardiorrespiratória.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2014

Histórico

  • Recebido
    30 Jun 2014
  • Aceito
    30 Out 2014
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