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Colagenoma estoriforme: relato de caso

Resumos

O colagenoma estoriforme é um tumor raro originado a partir da proliferação de fibroblastos com produção aumentada de colágeno tipo I. É encontrado mais frequentemente na face, pescoço e extremidades, podendo aparecer no tronco, couro cabeludo e, raramente, na mucosa oral e leito subungueal. Afeta ambos os gêneros, com discreta predominância em mulheres. Pode ser solitário ou múltiplo, sendo que, neste caso, é um importante indicador da presença de síndrome de Cowden. Apresenta-se como tumor sólido, nodular, de crescimento lento e indolor. Deve constar como diagnóstico diferencial de tumores cutâneos bem delimitados, como dermatofibroma, fibroma pleomórfico, lipoma esclerótico, fibrolipoma, colagenoma de células gigantes, histiocitoma fibroso benigno, nevo de Spitz intradérmico e angioistiocitoma de células gigantes.

Colágeno; Hamartoma; Neoplasias cutâneas; Fibroma; Pele; Relatos de casos


Storiform collagenoma is a rare tumor, which originates from the proliferation of fibroblasts that show increased production of type-I collagen. It is usually found in the face, neck and extremities, but it can also appear in the trunk, scalp and, less frequently, in the oral mucosa and the nail bed. It affects both sexes, with a slight female predominance. It may be solitary or multiple, the latter being an important marker for Cowden syndrome. It presents as a painless, solid nodular tumor that is slow-growing. It must be considered in the differential diagnosis of other well-circumscribed skin lesions, such as dermatofibroma, pleomorphic fibroma, sclerotic lipoma, fibrolipoma, giant cell collagenoma, benign fibrous histiocytoma, intradermal Spitz nevus and giant cell angiohistiocytoma.

Collagen; Hamartoma; Skin neoplasms; Fibroma; Skin; Case reports


INTRODUÇÃO

O colagenoma estoriforme, ou fibroma esclerótico, é um tumor cutâneo benigno raro, que afeta mais comumente adultos jovens e de meia idade de ambos os gêneros, com discreto predomínio em mulheres. Apresenta-se como pequena pápula ou nódulo de consistência fibrótica, é bem circunscrito, róseo, esbranquiçado ou de coloração da pele, e tem crescimento lento e indolor. É mais frequentemente encontrado na face e nas extremidades, podendo aparecer em tronco, couro cabeludo e, mais raramente, leito subungueal e mucosa oral. Geralmente, aparece como tumor solitário, sendo a apresentação múltipla um importante indicador da presença da síndrome de Cowden, uma genodermatose de herança autossômica dominante.(1Rapini RP, Golitz LE. Sclerotic fibromas of the skin. J Am Acad Dermatol. 1989;20(2 Pt 1):266-71.

Lee JH, An JS, Lee ES, Kwon SY, Kim YS. Comparison of sporadic sclerotic fibroma and solitary fibrous tumor in the oral cavity. Yonsei Med J. 2007;48(3):535-9.

Tosti A, Cameli N, Peluso AM, Fanti PA, Peserico A. Storiform collagenoma of the nail. Cutis. 1999;64(3):203-4.
-4Requena L, Gutiérrez J, Sánchez Yus E. Multiple sclerotic fibromas of the skin. A cutaneous marker of Cowden’s disease. J Cutan Pathol. 1992;19(4):346-51. Review.) Tem como diagnósticos diferenciais outros tumores cutâneos bem delimitados, como dermatofibroma, fibroma pleomórfico, lipoma esclerótico, fibrolipoma, colagenoma de células gigantes, histiocitoma fibroso benigno, nevo de Spitz intradérmico e angioistiocitoma de células gigantes.(5Izquierdo MJ, Pastor MA, Carrasco L, Requena C, Soguero ML, Moreno C, et al. [Sclerotic fibroma with multinucleated giant cells.] Actas Dermosifiliogr. 2001;92(9):419-21. Spanish.

Zelger BG, Zelger B, Steiner H, Rütten A. Sclerotic lipoma: lipomas simulating sclerotic fibroma. Histopathology.1997;31(2):174-81.

Rudolph P, Schubert C, Harms D, Parwaresch R. Giant cell collagenoma: a benign dermal tumor with distinctive multinucleated cells. Am J Surg Pathol. 1998;22(5):557-63.
-8Brito H, Pereira EM, Reis-Filho JS, Maeda SA. Giant cell collagenoma: case report and review of the literature. J Cutan Pathol. 2002;29(1):48-51.)

RELATO DE CASO

Paciente do gênero masculino, 36 anos, branco, auxiliar de limpeza, natural de Aracajú (SE), morando em São Paulo (SP) há 15 anos. Queixava-se de surgimento de massa em ombro direito há 2 anos, de crescimento lento, indolor, sem sinais inflamatórios ou saída de secreções. Negava trauma prévio no local da massa. Negava surgimento de outras massas, comorbidades, antecedentes pessoais patológicos ou familiares, etilismo, tabagismo e uso de drogas ilegais.

Ao exame físico, apresentava lesão nodular em região supraescapular direita, bem delimitada, de coloração rósea, com 1,5cm de diâmetro, consistência fibrótica, indolor à palpação (Figura 1).

Figura 1
Aspecto pré-operatório da lesão

O paciente foi submetido a exérese de fuso cutâneo, contendo a lesão sob anestesia local com lidocaína, seguida de fechamento primário com sutura simples de Nylon 4.0mm preto e curativo com gaze estéril e fita microporosa. A lesão foi submetida a estudo histopatológico. O paciente foi orientado a realizar limpeza local da ferida operatória diariamente com clorexidina aquosa e manter troca diária de curativos. Após 14 dias, os pontos de sutura foram removidos, havendo evolução satisfatória de cicatriz no local da ferida operatória (Figura 2).

Figura 2
Aspecto pós-operatório (2 meses) do sítio de exérese da lesão

O exame histopatológico da lesão revelou formação nodular bem delimitada, caracterizada por proliferação colagênica hipocelular, com fibras colágenas dispostas em arranjo estoriforme. Presença de células com citoplasma mal definido e núcleos ora ovalados, ora alongados. O nódulo encontrava-se circundado por derme preservada e epiderme sem alterações histológicas dignas de nota. A lesão foi totalmente removida, e não havia sinais histológicos de malignidade. Pelos achados da microscopia, permitiu-se concluir pelo diagnóstico de colagenoma estoriforme.

DISCUSSÃO

O colagenoma estoriforme é um tumor benigno descrito primeiramente por Weary et al.,(9Weary PE, Gorlin RJ, Gentry WC Jr, Comer JE, Greer KE. Multiple hamartoma syndrome (Cowdens disease). Arch Dermatol. 1972;106(5):682-90.) na língua de um paciente com síndrome de Cowden, uma genodermatose de herança autossômica dominante que associa lesões mucocutâneas como tricolemomas faciais múltiplos, pápulas verrucosas em mucosa oral, pápulas queratósicas translúcidas em polpas digitais e desenvolvimento aumentado de carcinomas em mamas e tireoide. Após a descrição original, outros autores descreveram a ocorrência do colagenoma estoriforme em face, palmas e plantas de pacientes portadores de síndrome de Cowden.(1010 Brownstein MH, Mehregan AH, Bikowskis JB, Lupulescu A, Patterson JC. The dermatopathology of Cowden´s syndrome. Br J Dermatol. 1979;100(6):667-73.,1111 Starink TM, Meijer CJ, Brownstein MH. The cutaneous pathology of Cowden´s disease: new findings. J Cutan Pathol. 1985;12(2):83-93.) Não está totalmente esclarecido se o tumor é um hamartoma ou uma neoplasia fibrocística verdadeira.(1212 Donati P, Amantea A, Carducci M, Balus L. Sclerotic (hypocellular) fibromas of the skin. Br J Dermatol. 1991;124(4):395-6.,1313 Lo WL, Wong CK. Solitary sclerotic fibroma. J Cutan Pathol. 1990;17(5):269-73.)

Os primeiros autores a descreverem a lesão isolada, sem associação com a síndrome, foram Rapini e Golitz,(1Rapini RP, Golitz LE. Sclerotic fibromas of the skin. J Am Acad Dermatol. 1989;20(2 Pt 1):266-71.) em uma série de casos de 11 pacientes portadores de colagenoma estoriforme solitário em diversas localizações da superfície corpórea, e que não apresentavam quaisquer sinais de síndrome de Cowden.

Requena et al.(4Requena L, Gutiérrez J, Sánchez Yus E. Multiple sclerotic fibromas of the skin. A cutaneous marker of Cowden’s disease. J Cutan Pathol. 1992;19(4):346-51. Review.) revisaram a literatura pertinente e chegaram à conclusão de que a presença de colagenomas estoriformes múltiplos constituía um marcador cutâneo da síndrome de Cowden, que pode auxiliar no diagnóstico precoce dessa genodermatose. A presença solitária do tumor não indica, por si só, a ocorrência da síndrome. Entretanto, conforme apontado por Al-Daraji et al.(1414 Al-Daraji WI, Ramsay HM, Ali RB. Storiform collagenoma as a clue for Cowden disease or PTEN hamartoma tumour syndrome. J Clin Pathol. 2007;60(7):840-2.), mesmo o achado da presença de um colagenoma estoriforme isolado deve propiciar investigação clínica detalhada do paciente à procura de outros sinais que possam apontar para a presença de síndrome de Cowden, posto que esse tumor pode ser a primeira manifestação clínica evidente da genodermatose.

Do ponto de vista histopatológico, a lesão é bastante característica. Consiste em um fibroma majoritariamente constituído por fibras espessas de colágeno e presença escassa de fibroblastos. As fibras de colágeno se dispõem em arranjo estoriforme ou em “anéis de cebola”.(5Izquierdo MJ, Pastor MA, Carrasco L, Requena C, Soguero ML, Moreno C, et al. [Sclerotic fibroma with multinucleated giant cells.] Actas Dermosifiliogr. 2001;92(9):419-21. Spanish.)

A imuno-histoquímica demonstra que o colagenoma estoriforme apresenta, usualmente, coloração positiva para vimentina e CD34, mas negativa para neurofilamentos, S-100, enolase neurônio-específica, antígeno carcinoembriogênico, antígeno de membrana embrionária, queratina de alto peso molecular e citoqueratina. A coloração de fator 13a é positiva para células dendríticas esparsas, o que pode ser útil no diagnóstico diferencial de dermatofibroma, o qual exibe positividade difusa em toda a lesão.(1515 Bhambri A, Del Rosso JQ. Solitary sclerotic fibroma. J Clin Aesthet Dermatol. 2009;2(6):36-8.) Foi sugerido que a lesão é uma neoplasia fibrocística com regulação anormal de produção e processamento de colágeno tipo I.(1616 Shitabata PK, Crouch EC, Fitzgibbon JF, Swanson PE, Adesokan PN, Wick MR. Cutaneous sclerotic fibroma. Immunohistochemical evidence of a fibroblastic neoplasm with ongoing type I collagen synthesis. Am J Dermatopathol. 1995;17(4):339-43.)

CONCLUSÃO

O colagenoma estorifome é um tumor benigno raro que pode ser encontrado em qualquer área da superfície corpórea e mucosa oral, e cujo tratamento-padrão é a excisão com margens livres. A ocorrência solitária é a mais frequente e, uma vez confirmado o diagnóstico histopatológico, nenhum tratamento ou investigação adicionais costumam ser necessários. Porém, o achado de múltiplos colagenomas estoriformes em um paciente deve apontar para uma investigação mais detalhada sobre a provável presença de síndrome de Cowden, tanto no paciente como em seus familiares, em virtude da origem genética da síndrome. Apesar da baixa incidência, o colagenoma estoriforme, por sua apresentação clínica, deve ser lembrado no diagnóstico diferencial de tumores cutâneos bem delimitados, como dermatofibroma, fibroma pleomórfico, lipoma esclerótico, fibrolipoma, colagenoma de células gigantes, histiocitoma fibroso benigno, nevo de Spitz intradérmico e angioistiocitoma de células gigantes.

REFERENCES

  • 1
    Rapini RP, Golitz LE. Sclerotic fibromas of the skin. J Am Acad Dermatol. 1989;20(2 Pt 1):266-71.
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  • 3
    Tosti A, Cameli N, Peluso AM, Fanti PA, Peserico A. Storiform collagenoma of the nail. Cutis. 1999;64(3):203-4.
  • 4
    Requena L, Gutiérrez J, Sánchez Yus E. Multiple sclerotic fibromas of the skin. A cutaneous marker of Cowden’s disease. J Cutan Pathol. 1992;19(4):346-51. Review.
  • 5
    Izquierdo MJ, Pastor MA, Carrasco L, Requena C, Soguero ML, Moreno C, et al. [Sclerotic fibroma with multinucleated giant cells.] Actas Dermosifiliogr. 2001;92(9):419-21. Spanish.
  • 6
    Zelger BG, Zelger B, Steiner H, Rütten A. Sclerotic lipoma: lipomas simulating sclerotic fibroma. Histopathology.1997;31(2):174-81.
  • 7
    Rudolph P, Schubert C, Harms D, Parwaresch R. Giant cell collagenoma: a benign dermal tumor with distinctive multinucleated cells. Am J Surg Pathol. 1998;22(5):557-63.
  • 8
    Brito H, Pereira EM, Reis-Filho JS, Maeda SA. Giant cell collagenoma: case report and review of the literature. J Cutan Pathol. 2002;29(1):48-51.
  • 9
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  • 10
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  • 11
    Starink TM, Meijer CJ, Brownstein MH. The cutaneous pathology of Cowden´s disease: new findings. J Cutan Pathol. 1985;12(2):83-93.
  • 12
    Donati P, Amantea A, Carducci M, Balus L. Sclerotic (hypocellular) fibromas of the skin. Br J Dermatol. 1991;124(4):395-6.
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    Lo WL, Wong CK. Solitary sclerotic fibroma. J Cutan Pathol. 1990;17(5):269-73.
  • 14
    Al-Daraji WI, Ramsay HM, Ali RB. Storiform collagenoma as a clue for Cowden disease or PTEN hamartoma tumour syndrome. J Clin Pathol. 2007;60(7):840-2.
  • 15
    Bhambri A, Del Rosso JQ. Solitary sclerotic fibroma. J Clin Aesthet Dermatol. 2009;2(6):36-8.
  • 16
    Shitabata PK, Crouch EC, Fitzgibbon JF, Swanson PE, Adesokan PN, Wick MR. Cutaneous sclerotic fibroma. Immunohistochemical evidence of a fibroblastic neoplasm with ongoing type I collagen synthesis. Am J Dermatopathol. 1995;17(4):339-43.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    03 Mar 2015
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2015

Histórico

  • Recebido
    7 Jul 2013
  • Aceito
    4 Dez 2013
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