Paciente de 45 anos, sexo feminino, procurou atendimento oftalmológico queixando-se de baixa acuidade visual súbita em olho direito e anisocoria. Negava comorbidades e traumas. Ao exame, a motilidade ocular era normal e não havia ptose. Biomicroscopia e fundoscopia sem alterações. Midríase do olho direito, com reflexo consensual do olho esquerdo sem alterações ( Figura 1 ). Quando questionada sobre medicações em uso, relatou ter iniciado na noite anterior o uso de gel dermatológico facial que contém extrato de café em sua composição. Orientamos a suspensão do gel e, após 24 horas, observamos melhora do quadro.
Paciente com anisocoria após o uso do produto dermatológico e isocoria após a suspensão do uso do produto
A cafeína é um alcaloide derivado da metilxantina, que está presente em diversas bebidas e causa descarga simpática de noradrenalina, gerando midríase, mas apenas em pacientes que não ingerem rotineiramente café.(11. Gilbert RM, Marshman JA, Schwieder M, Berg R. Caffeine content of beverages as consumed. Can Med Assoc J. 1976;114(3):205-8.,22. Whitsett TL, Manion CV, Christensen HD. Cardiovascular effects of coffee and caffeine. Am J Cardiol. 1984;53(7):918-22.)Já se demonstrou a associação da cafeína com o aumento da pressão sanguínea e com a redução do fluxo sanguíneo cerebral.(11. Gilbert RM, Marshman JA, Schwieder M, Berg R. Caffeine content of beverages as consumed. Can Med Assoc J. 1976;114(3):205-8.,22. Whitsett TL, Manion CV, Christensen HD. Cardiovascular effects of coffee and caffeine. Am J Cardiol. 1984;53(7):918-22.)A cafeína também está associada a alterações de espessura da retina e coroide, pressão intraocular e pupila.(33. Avisar R, Avisar E, Weinberger D. Effect of coffee consumption on intraocular pressure. Ann Pharmacother. 2002;36(6):992-5.,44. Wilhelm B, Stuiber G, Lüdtke H, Wilhelm H. The effect of caffeine on spontaneous pupillary oscillations. Ophthalmic Physiol Opt. 2014;34(1):73-81.)
O início súbito de anisocoria pode ser indicativo de doença intracraniana, mas a possibilidade de uso inadvertido de medicação midriática deve sempre ser lembrada.(55. Zimmerman CF, Hogan RN, Le TD. Mydriatic and cycloplegic drugs. In: Zimmerman TJ, editor. Textbook of Ocular Pharmacology. Philadelphia: Lippincott-Raven; 1997. p.807-26.)Pupila midriática não responsiva à luz pode indicar pupila tônica de Adie, acometimento do terceiro nervo craniano ou bloqueio farmacológico. Sinéquias posteriores também podem levar a este quadro após episódio de uveíte.
A reação pupilar à pilocarpina 1%, uma droga parassimpaticomimética, pode ser usada para fazer o diagnostico diferencial entre midríase paralítica e bloqueio farmacológico do esfíncter iriano. Observa-se a contração pupilar nos casos de midríase paralítica por lesão nervosa pós-ganglionar. Na midríase farmacológica, não há resposta ao colírio de pilocarpina, assim como na midríase secundária a trauma.(66. Andreola B, Piovan A, Da Dalt L, Filippini R, Cappelletti E. Unilateral mydriasis due to Angel’s Trumpet. Clin Toxicol (Phila). 2008;46(4):329-31.,77. Firestone D, Sloane C. Not your everyday anisocoria: angel’s trumpet ocular toxicity. J Emerg Med. 2007;33(1):21-4.)
Desta forma, o relato de caso sugere que os componentes do extrato de café podem ter um efeito temporário no diâmetro pupilar quando aplicados topicamente em alguns pacientes, sendo importante estar ciente desta possibilidade.
REFERENCES
-
1Gilbert RM, Marshman JA, Schwieder M, Berg R. Caffeine content of beverages as consumed. Can Med Assoc J. 1976;114(3):205-8.
-
2Whitsett TL, Manion CV, Christensen HD. Cardiovascular effects of coffee and caffeine. Am J Cardiol. 1984;53(7):918-22.
-
3Avisar R, Avisar E, Weinberger D. Effect of coffee consumption on intraocular pressure. Ann Pharmacother. 2002;36(6):992-5.
-
4Wilhelm B, Stuiber G, Lüdtke H, Wilhelm H. The effect of caffeine on spontaneous pupillary oscillations. Ophthalmic Physiol Opt. 2014;34(1):73-81.
-
5Zimmerman CF, Hogan RN, Le TD. Mydriatic and cycloplegic drugs. In: Zimmerman TJ, editor. Textbook of Ocular Pharmacology. Philadelphia: Lippincott-Raven; 1997. p.807-26.
-
6Andreola B, Piovan A, Da Dalt L, Filippini R, Cappelletti E. Unilateral mydriasis due to Angel’s Trumpet. Clin Toxicol (Phila). 2008;46(4):329-31.
-
7Firestone D, Sloane C. Not your everyday anisocoria: angel’s trumpet ocular toxicity. J Emerg Med. 2007;33(1):21-4.
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
21 Set 2017 -
Data do Fascículo
Oct-Dec 2017
Histórico
-
Recebido
25 Fev 2017 -
Aceito
4 Maio 2017