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Prevalência de dor crônica em uma Unidade Básica de Saúde de cidade de médio porte

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A dor é um fenômeno multifatorial e um dos sintomas mais frequente nas consultas médicas. O objetivo deste estudo foi avaliar a prevalência de dor crônica nos usuários de uma Unidade Básica de Saúde (UBS) na cidade de Santa Maria, RS. MÉTODO: Estudo de caráter transversal em que foram avaliados indivíduos de ambos os sexos, maiores de 18 anos que se encontravam na sala de espera da UBS. Dados de identificação, questionário genérico de qualidade de vida (SF-12), escala de capacidade funcional em pacientes com dor crônica e a escala analógica visual (EAV) foram aplicados. RESULTADOS: 37,8% dos indivíduos entrevistados possuíam dor crônica, a média de idade foi de 46,3 ± 16,4 anos, com predominância feminina (87% dos entrevistados). Nos indivíduos portadores de dor crônica a intensidade da dor, avaliada pela EAV foi de 7,38 ± 2,16. CONCLUSÃO: Apesar da pequena população do estudo, é importante traçar estratégias preventivas visando o bem estar e a qualidade de vida dos pacientes.

Atenção primária a saúde; Dor crônica; Qualidade de vida


BACKGROUND AND OBJECTIVES: Pain is a multifactorial phenomenon and one of the most frequent symptoms reported during medical visits. This study aimed at evaluating the prevalence of chronic pain among users of a Basic Health Unit (BHU) of the city of Santa Maria, RS. METHOD: This is a transversal study evaluating individuals of both genders, above 18 years of age, who were in the waiting room of BHU. Identification data, generic quality of life questionnaire (SF-12), functional capacity scale for chronic pain patients and visual analog scale (VAS) were applied. RESULTS: From all respondents, 37.8% had chronic pain, mean age was 46.3 ± 16.4 years with predominance of females (87%). Chronic pain intensity evaluated by VAS was 7.38 ± 2.16. CONCLUSION: In spite of the small sample size of this study, it is important to develop preventive strategies aiming at well-being and quality of life of chronic pain patients.

Chronic pain; Primary health attention; Quality of life


ARTIGO ORIGINAL

Prevalência de dor crônica em uma Unidade Básica de Saúde de cidade de médio porte* * Recebido da Unidade Básica de Saúde Dr. Roberto Binato. Santa Maria, RS.

Luiz Fernando RuviaroI; Lidiane Isabel FilippinII

IAcadêmico do Curso de Fisioterapia do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA). Santa Maria, RS, Brasil

IIProfessora do Centro Universitário Franciscano (UNIFRA); Doutora em Ciências Médicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Porto Alegre, RS, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Lidiane Filippin Rua Silva Jardim, 1175 97010-491 Porto Alegre, RS. Fone: (51) 8444-8701 E-mail: l.filippin@terra.com.br

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: A dor é um fenômeno multifatorial e um dos sintomas mais frequente nas consultas médicas. O objetivo deste estudo foi avaliar a prevalência de dor crônica nos usuários de uma Unidade Básica de Saúde (UBS) na cidade de Santa Maria, RS.

MÉTODO: Estudo de caráter transversal em que foram avaliados indivíduos de ambos os sexos, maiores de 18 anos que se encontravam na sala de espera da UBS. Dados de identificação, questionário genérico de qualidade de vida (SF-12), escala de capacidade funcional em pacientes com dor crônica e a escala analógica visual (EAV) foram aplicados.

RESULTADOS: 37,8% dos indivíduos entrevistados possuíam dor crônica, a média de idade foi de 46,3 ± 16,4 anos, com predominância feminina (87% dos entrevistados). Nos indivíduos portadores de dor crônica a intensidade da dor, avaliada pela EAV foi de 7,38 ± 2,16.

CONCLUSÃO: Apesar da pequena população do estudo, é importante traçar estratégias preventivas visando o bem estar e a qualidade de vida dos pacientes.

Descritores: Atenção primária a saúde, Dor crônica, Qualidade de vida.

INTRODUÇÃO

A dor tem sido uma das grandes preocupações dos seres humanos desde os primórdios da humanidade. Essa desempenha o papel de alerta, informando ao indivíduo alguma alteração biológica. É um fenômeno multifatorial, onde lesão tecidual, aspectos emocionais, sócioculturais e ambientais a unificam1,2. Manifesta-se em cada indivíduo de forma diferente e única, pois cada um possui uma percepção individual sobre a dor e está associada a fatores físicos e psíquicos3.

A dor é um sintoma e uma das causas mais frequentes da procura por auxílio médico4. Estima-se que 80% da população mundial procure o sistema de saúde devido a essa morbidade5. No Brasil, estima-se que a dor crônica acometa entre 30% e 40% da população e é a principal causa de absenteísmo, licenças médicas, aposentadoria precoce, indenizações trabalhistas e baixa produtividade sendo apontada como um problema de saúde pública6-8.

Em janeiro de 2000, a Joint Comission on Accreditation on Heathcare Organizations (JCAHO) publicou norma que descreve a dor como quinto sinal vital. Portanto, deve ser sempre avaliada e registrada juntamente aos outros sinais vitais para que possam ser realizados ajustes necessários ao tratamento. A queixa de dor deve ser sempre valorizada e respeitada, devido ao desconforto que manifesta9,10.

A política para o tratamento da dor, seja com seu controle próprio, seja na prestação de cuidados paliativos, é o exemplo maior de universalidade e da transversalidade das atividades interdisciplinares na área da saúde pública. A assistência ao paciente com queixa álgica é complexa, exigindo tanto conhecimento quanto habilidade da equipe assistencial em perceber e tratar a dor de forma adequada11.

Portanto, o controle da dor torna-se uma prática de saúde pública indispensável, especialmente na atenção básica de saúde, pela demanda por serviços de saúde, impacto social desfavorável sob a qualidade de vida dos indivíduos portadores de dores crônicas12. É importante salientar que a falta de diagnóstico e tratamento adequado na fase aguda pode favorecer a cronificação da dor e o agravamento da apresentação clínica13. Assim, o objetivo deste trabalho foi investigar a prevalência de dor crônica e sua interferência na qualidade de vida nos usuários da unidade básica de saúde.

MÉTODO

Estudo de caráter transversal com foco em usuários da Estratégia de Saúde da Família Dr. Roberto Binato na cidade de Santa Maria-RS, sua área de abrangência é de uma população adstrita de aproximadamente 13.000 habitantes. Foram entrevistados os indivíduos que estavam na sala de espera por atendimento médico ou odontológico. Foram incluídos indivíduos de ambos os sexos, maiores de 18 anos e excluídos gestantes, indivíduos com doenças neuropsiquiátricas e neoplasias. Todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE).

A pesquisa investigou a prevalência de dor crônica nesses usuários, tendo como instrumentos de pesquisa o questionário sobre dados pessoais, questionário genérico de qualidade de vida (SF-12), escala de capacidade funcional em pacientes com dor crônica e a escala análoga visual (EAV).

Para a análise dos dados foi utilizado o programa SPSS 15.0. Os dados simétricos foram apresentados em média e desvio padrão. Os dados assimétricos foram expressos por mediana e seus percentis (p25 e p75).

Estudo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Franciscano sob nº 210.2011.2.

RESULTADOS

Foram entrevistados 45 indivíduos, os dados de identificação da amostra estão apresentados na Tabela 1. A prevalência da dor crônica nesse estudo foi de 37,8% e a intensidade desta dor na EAV apresentou uma média de 7,38 ± 2,16 (Tabela 1).

O questionário SF-12 foi aplicado em todos os indivíduos entrevistados. A saúde física dos indivíduos que não sofriam de dor crônica foi de 48,8 ± 10,6, na avaliação do domínio da saúde mental foi encontrado valores de 45,7 ± 12,1. A saúde física refere-se à capacidade funcional que considera os aspectos físicos, dor e estado geral de saúde do questionário SF-12, enquanto as saúde mental refere-se à saúde mental contemplando aspectos emocionais, aspectos sociais e vitalidade do mesmo questionário14. Na Tabela 2 são apresentados os dados gerais sobre a qualidade de vida e prevalência de dor dos entrevistados portadores de dor crônica.

DISCUSSÃO

A dor é um sintoma frequentemente referido pelos pacientes na atenção primária à saúde. A dor é um sintoma de alerta, comum a várias doenças com impacto negativo a qualidade de vida relacionada à saúde. Por isso, a importância no diagnóstico e tratamento na atenção primária a saúde, evitando assim que esta se arraste até os níveis mais complexos de atenção à saúde15.

Mesmo sendo expressão direta de afastamento de uma condição saudável, a dor e a incapacidade funcional são elementos subnotificados pela atenção básica em saúde no Brasil, uma vez que não são registradas especificamente nas unidades básicas de saúde (UBS). Dado que se contrapõe a uma das responsabilidades da estratégia de atenção básica no Brasil que é manter uma postura pró-ativa ante os problemas de saúde-doença da população16.

No presente estudo 37,8% dos indivíduos entrevistados possuíam dor crônica, a média de idade foi de 46,3 ± 16,4 anos, com predominância feminina (87% dos entrevistados). Nos indivíduos portadores de dor crônica a intensidade da dor, avaliada pela EAV, foi de 7,38 ± 2,16. O alto índice no escore da EAV indica dores relativamente fortes, e o grande número de indivíduos com essa queixa diária podem orientar serviços de atenção básica para essa parcela da população, uma vez que há uma forte associação entre a dor e a baixa capacidade para o trabalho17.

A ocorrência da dor é crescente em decorrência dos novos hábitos de vida, da maior longevidade do indivíduo, das modificações do meio ambiente. Além de gerar estresse físico e emocional, é razão de elevados gastos econômicos e sociais para a sociedade. Dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em 2007, mostram que 20% dos benefícios concedidos por afastamento do trabalho foram destinados a pacientes portadores de dores crônicas18.

Estudo realizado entre janeiro de 2004 e janeiro de 2008 mostrou que o custo médio para o portador de dor crônica é de R$ 127,00 mensais (com variabilidade entre R$ 5,00 a R$ 780,00) sendo estes valores apenas dispensados para medicamentos19. Realizou-se um estudo na cidade de Sorocaba com pacientes com dor crônica acompanhados nos três níveis de atenção à saúde e observaram uma grande demanda de dor crônica em serviços de atenção básica à saúde20.

No presente estudo foi avaliada a percepção sobre a qualidade de vida pelo questionário SF-12. Essa é uma versão resumida do questionário SF-36 que consta de 12 itens que englobam oito dimensões do SF-36. Possui duas áreas de domínio: saúde física e saúde mental. Os indivíduos entrevistados demonstraram valores abaixo do ponto de corte para tal questionário (42,6 ± 13,2) sugerindo uma qualidade de vida física inferior aos indivíduos sem dor crônica (p < 0,05). Entretanto, quando avaliamos o domínio da saúde mental não foi encontrada diferença significativa. Talvez com uma amostra maior isso fosse possível de demonstrar. Somado ao questionário de qualidade de vida, também foi avaliado a capacidade funcional em pacientes portadores de dor crônica. Essa escala contempla três dimensões: intensidade da dor, interferências em atividades funcionais e emocionais.

A população avaliada demonstrou dor com intensidade moderada (5,6 ± 0,47); e interferência tanto nas atividades funcionais quanto emocionas, respectivamente (3,48 ± 0,21 e 3,64 ± 0,18). Estudo21 sobre o impacto da dor crônica na qualidade de vida dos indivíduos demonstrou que esta possui impacto desfavorável na qualidade de vida, interferindo nas atividades diárias de até dois terços dos pacientes, especialmente na capacidade de realizar exercícios, praticar esportes, desempenhar tarefas da vida diária, bem como executar atividades laborais. Outro estudo22 que avaliou a capacidade funcional por meio da escala Older American Resources and Services (OARS), validado para a língua portuguesa em 111 indivíduos (idosos) portadores de dor crônica residentes na área de abrangência de uma UBS, na cidade de Londrina, PR. Foi verificado interferência, principalmente no sono, no humor e no lazer, ou seja, dor crônica tem impacto negativo na capacidade funcional dos acometidos, principalmente na realização de AIVD, podendo limitar ou até mesmo levar à incapacidade funcional.

Apesar da pequena população estudada, é importante salientar que são necessárias medidas estratégicas preventivas visando o bem-estar e a qualidade de vida dos indivíduos acometidos.

CONCLUSÃO

A dor crônica afeta diretamente a função e a qualidade de vida dos indivíduos acometidos, e devido à sua elevada prevalência é necessária maior atenção dos profissionais que atuam nas unidades básicas para tratá-la de maneira eficiente.

Apresentado em 18 de fevereiro de 2012.

Aceito para publicação em 24 de maio de 2012.

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  • Endereço para correspondência:

    Lidiane Filippin
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    Recebido da Unidade Básica de Saúde Dr. Roberto Binato. Santa Maria, RS.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Jun 2012
    • Data do Fascículo
      Jun 2012

    Histórico

    • Recebido
      18 Fev 2012
    • Aceito
      24 Maio 2012
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