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Efeito comparativo entre a dipirona sódica e a dipirona sódica associada à cafeína no controle da dor pós-exodontia

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: O adequado controle da dor pós-operatória constitui um desafio entre as especialidades cirúrgicas, a despeito dos recentes avanços das técnicas de analgesia e dos analgésicos. A cafeína tem sido utilizada como adjuvante terapêutico para potencializar a eficácia analgésica de alguns fármacos, porém ainda não existe relatos de investigação científica da associação com a dipirona sódica em dor pós-operatória em procedimentos odontológicos. Dessa forma, o objetivo deste estudo foi observar e comparar a eficácia da dipirona sódica isolada e da dipirona sódica associada à cafeína no controle da dor pós-operatória em cirurgia dental, considerando os parâmetros hemodinâmicos dos pacientes como indicador de ansiedade e de dor durante a cirurgia. MÉTODOS: Estudo cruzado e duplo encoberto incluiu 50 pacientes jovens e saudáveis (25 homens e 25 mulheres) com indicação de exodontia bilateral de terceiros molares mandibulares impactados. O lado operado, o gênero do paciente e o fármaco analgésico usado foram randomizados. Os escores obtidos pela escala analógica visual foram submetidos ao teste de Friedman (α = 0,05) para comparação das intensidades dolorosas em intervalos definidos (pré-operatório, pós-operatório imediato, 1, 2, 4 12 horas, 1, 2, 3 e 7 dias após as cirurgias) e as alterações nos parâmetros de pressão arterial e frequência cardíaca foram mensurados no pré-operatório, após a injeção anestésica e no pós-operatório (teste de Friedman, α = 0,05). RESULTADOS: Os pacientes experimentaram dor leve nos dois primeiros dias de pós-operatório e não houve diferença estatisticamente significante entre a eficácia analgésica da dipirona sódica isolada e da dipirona sódica associada à cafeína nos diferentes intervalos medidos. A maioria das alterações cardiovasculares observadas estava dentro da normalidade, considerando a ansiedade e estresse induzido pela cirurgia. CONCLUSÃO: O protocolo terapêutico proposto neste estudo não demonstrou diferença estatística significante na eficiência analgésica da dipirona sódica associada ou não a cafeína no controle da dor pós-exodontia.

Cafeína; Dipirona; Dor; Exodontia; Terceiro molar


BACKGROUND AND OBJECTIVES: Adequate postoperative pain control is a challenge among surgical specialties, in spite of recent advances in analgesic techniques and analgesics. Caffeine has been used as therapeutic adjuvant to potentiate analgesic efficacy of some drugs, however there are still no scientific investigation reports on the association with sodium dipyrone in the postoperative period of dental procedures. So, this study aimed at observing and comparing the efficacy of sodium dipyrone alone or in association with caffeine to control postoperative pain of dental procedures, considering hemodynamic parameters of patients as indicators of anxiety and pain during surgery. METHODS: This is a crossover and double-blind study involving 50 young and healthy patients (25 males and 25 females) referred for bilateral extraction of impacted mandibular third molars. Operated side, patient's gender and analgesic drug used were randomized. Visual analog scale scores were submitted to Friedman test (α = 0.05) to compare pain intensity at defined intervals (preoperative, immediate postoperative, 1, 2, 4 and 12 hours, 1, 2, 3 and 7 days after surgery). Blood pressure and heart rate were measured in the preoperative period, after anesthetic injection and in the postoperative period (Friedman test, (α = 0.05). RESULTS: Patients have referred mild pain in the first two postoperative days and there has been no statistically significant difference between the analgesic efficacy of sodium dipyrone alone or in association with caffeine in different evaluated intervals. Most cardiovascular changes were within normality, considering anxiety and stress induced by surgery. CONCLUSION: The therapeutic protocol proposed in this study has not shown statistically significant difference between sodium dipyrone associated or not to caffeine to control post-tooth extraction pain.

Caffeine; Dipyrone; Pain; Third molar; Tooth extraction


ARTIGO ORIGINAL

Efeito comparativo entre a dipirona sódica e a dipirona sódica associada à cafeína no controle da dor pós-exodontia * Endereço para correspondência: Dr. Rogério Heládio Lopes Motta Rua José Rocha Junqueira, 13 13414-903 Campinas, SP E-mail: rogeriomotta@yahoo.com

Carllini Barroso VicentiniI; Juliana Cama RamacciatoII; Rubens Gonçalves TeixeiraII; Francisco Carlos GroppoIII; Rogério Heládio Lopes MottaII

IInstituto Tocantinense Presidente Antônio Carlos. Porto Nacional, TO, Brasil

IIFaculdade de Odontologia São Leopoldo Mandic. Campinas, SP, Brasil

IIIUniversidade Estadual de Campinas; Faculdade de Odontologia. Piracicaba, SP, Brasil

Correspondence Endereço para correspondência: Dr. Rogério Heládio Lopes Motta Rua José Rocha Junqueira, 13 13414-903 Campinas, SP E-mail: rogeriomotta@yahoo.com

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: O adequado controle da dor pós-operatória constitui um desafio entre as especialidades cirúrgicas, a despeito dos recentes avanços das técnicas de analgesia e dos analgésicos. A cafeína tem sido utilizada como adjuvante terapêutico para potencializar a eficácia analgésica de alguns fármacos, porém ainda não existe relatos de investigação científica da associação com a dipirona sódica em dor pós-operatória em procedimentos odontológicos. Dessa forma, o objetivo deste estudo foi observar e comparar a eficácia da dipirona sódica isolada e da dipirona sódica associada à cafeína no controle da dor pós-operatória em cirurgia dental, considerando os parâmetros hemodinâmicos dos pacientes como indicador de ansiedade e de dor durante a cirurgia.

MÉTODOS: Estudo cruzado e duplo encoberto incluiu 50 pacientes jovens e saudáveis (25 homens e 25 mulheres) com indicação de exodontia bilateral de terceiros molares mandibulares impactados. O lado operado, o gênero do paciente e o fármaco analgésico usado foram randomizados. Os escores obtidos pela escala analógica visual foram submetidos ao teste de Friedman (α = 0,05) para comparação das intensidades dolorosas em intervalos definidos (pré-operatório, pós-operatório imediato, 1, 2, 4 12 horas, 1, 2, 3 e 7 dias após as cirurgias) e as alterações nos parâmetros de pressão arterial e frequên­cia cardíaca foram mensurados no pré-operatório, após a injeção anestésica e no pós-operatório (teste de Friedman, α = 0,05).

RESULTADOS: Os pacientes experimentaram dor leve nos dois primeiros dias de pós-operatório e não houve diferença estatisticamente significante entre a eficácia analgésica da dipirona sódica isolada e da dipirona sódica associada à cafeína nos diferentes intervalos medidos. A maioria das alterações cardiovasculares observadas estava dentro da normalidade, considerando a ansiedade e estresse induzido pela cirurgia.

CONCLUSÃO: O protocolo terapêutico proposto neste estudo não demonstrou diferença estatística significante na eficiência analgésica da dipirona sódica associada ou não a cafeína no controle da dor pós-exodontia.

Descritores: Cafeína, Dipirona, Dor, Exodontia, Terceiro molar.

INTRODUÇÃO

A dor é um fenômeno biológico importante para a defesa do organismo, porém, desconfortável para o indivíduo acometido. É inerente a alguns procedimentos odontológicos, principalmente aos cirúrgicos como as exodontias de terceiros molares, sendo sua intensidade relacionada à extensão da cirurgia1,2.

A cirurgia para exodontia de terceiros molares impactados normalmente produz descorforto pós-operatório moderado a intenso devido à liberação de mediadores químicos inflamatórios pela manipulação dos tecidos moles, ósseos e dentários. A dor pós-operatória de cirurgia bucal apresenta forte impacto sobre a qualidade de vida dos pacientes e apresenta potencial efeito nas variações dos parâmetros fisiológicos, necessitando portanto de um controle efetivo3-5.

A dipirona sódica é um fármaco analgésico usualmente indicado para o controle da dor pós-operatória, obtendo resultados satisfatórios por apresentar mecanismo de ação periférico distinto em relação às outros fármacos analgésicos. A dipirona parece atuar promovendo dessensibilização dos nociceptores periféricos, exercendo bloqueio direto da hiperalgesia inflamatória. Esse mecanismo de dessensibilização provavelmente envolve bloqueio de canais de potássio e ativaçã̃o da via óxido nítrico - GMPc no nociceptor6-8. Entretanto, ainda são escassos os estudos que avaliaram a sua eficácia clínica em procedimentos cirúrgicos na Odontologia, seja administrada isoladamente ou associada3.

A cafeína tem sido relatada como fármaco adjuvante quando combinada a analgésicos e anti-inflamatórios no controle da dor tensional e enxaqueca9-11. O efeito antinociceptivo da cafeína ocorre pelo bloqueio de receptores de adenosina, que são importantes para sensibilização dos nociceptores na transmissão do sinal doloroso. A cafeína também provoca alterações na síntese e atividade de enzimas ciclo-oxigenases em certos locais, melhorando a ação analgésica de diversos fármacos indicados para o controle da dor aguda e crônica12-15.

Considerando a necessidade do controle adequado da dor pós-operatória em exodontias de terceiros molares impactados e a efetividade da associação sinérgica da cafeína com analgésicos e anti-inflamatórios para o tratamento da dor aguda e crônica em outras regiões do corpo, questiona-se o efeito adjuvante da cafeína com a dipirona sódica no controle da dor em um modelo clínico odontológico16-19.

O objetivo deste estudo foi avaliar a relevância clínica do uso da cafeína associada à dipirona sódica no controle da dor pós-operatória em cirurgias de terceiros molares impactados, considerando o controle dos parâmetros hemodinâmicos dos pacientes.

MÉTODOS

Estudo cruzado, aleatório e duplamente encoberto, realizado entre maio e dezembro de 2011, em que foi selecionada uma amostra de 50 pacientes de ambos os gêneros (25 homens e 25 mulheres), com idade entre 18 e 25 anos e sem alterações sistêmicas que contraindicassem os procedimentos cirúrgicos. Todos os voluntários apresentavam indicação de exodontia bilateral de terceiros molares inferiores com padrão de inclusão semelhantes de acordo com a classificação de Pell e Gregory (Classe I e II, posição B) e Winter (Vertical e Mesioangulado)20. Para a coleta de dados foi elaborada uma ficha clínica onde foram anotados dados de identificação do paciente, história médica e odontológica, resultado dos exames pré-operatórios (radiografias, hematimetria, leucometria, coagulometria, função renal e hepática), data e horário da cirurgia, tempo operatório, lado operado na sessão, quantidade de tubetes anestésicos usados, grupo do fármaco analgésico usado na sessão e dados dos parâmetros hemodinâmicos.

Para um correto controle dos pacientes e maior fidelidade dos resultados foi proposto um ensaio clínico aleatório (gerado em http://www.randomization.com) para o lado operado, gênero do paciente e terapêutica analgésica empregada, baseados nos itens de 8-10 do checklist de 2001 da Cochrane Collaboration, Manchester, UK (CONSORT)21. O protocolo de terapia analgésica pós-operatória foi dividido em dois grupos de estudo: Grupo 1 - comprimido de dipirona sódica 500 mg (Magnopyrol®, São Paulo, Brasil) e Grupo 2 - comprimido de dipirona sódica 500 mg associada à cafeína 65 mg (Cafilisador®, São Paulo, Brasil), distribuídos de forma duplamente encoberta, sendo a identificação dos grupos revelada para o operador e para os pacientes somente após a coleta dos resultados.

Cada voluntário da amostra foi submetido a dois procedimentos cirúrgicos realizados pelo mesmo cirurgião com experiência comprovada e com intervalo de 21 dias entre a primeira e a segunda cirurgia22. Este estudo cruzado (Split-mouth) determinou que por ocasião de cada oportunidade cirúrgica o mesmo paciente recebeu um dos tratamentos analgésicos propostos - dipirona sódica isolada para uma cirurgia e dipirona sódica associada a cafeína para a outra cirurgia.

Em cada procedimento cirúrgico foi administrado aos pacientes 1 g de amoxicilina (Amoxil®, Rio de Janeiro, Brasil) e 4 mg de dexametasona (Decadron®, Campinas, Brasil) uma hora antes do momento operatório. Os pacientes foram orientados a realizar bochecho vigoroso com solução de clorexidina a 0,12% (Proderma®, Piracicaba, Brasil) por 1 minuto, passaram por antissepsia extrabucal com solução de clorexidina a 2% (Proderma®, Piracicaba, Brasil) e receberam recomendações pós-operatórias de dieta, repouso e higiene bucal23.

Para a realização da extração dos elementos dentários foram utilizados materiais e instrumentais de rotina necessários a essa prática cirúrgica e rigorosa obediências dos princípios de assepsia. Foi realizado bloqueio anestésico dos nervos alveolar inferior, lingual e bucal com lidocaína a 2% com epinefrina 1:100.000 (Alphacaine®, Rio de Janeiro, Brasil)24. A incisão sulcular foi realizada com lâmina de bisturi nº 15 (MedGoldman®, São José, Brasil) e após descolamento foi conseguido um retalho mucoperiósteo. A ostectomia e odontossecção foram realizadas com instrumento rotatório com irrigação fisiológica estéril abundante. Para a sutura foi usado o fio nylon 3.0 (Polysuture®, São Sebastião do Paraíso, Brasil).

Após a realização do procedimento cirúrgico, cada paciente recebeu um frasco com 8 comprimidos de dipirona sódica 500 mg (Grupo 1) ou dipirona sódica 500 mg associada à cafeína 65 mg (Grupo 2) e uma prescrição posológica por via oral a cada 6 horas por dois dias. Os voluntários foram avaliados em consultas de retorno de 1, 2 e 7 dias de pós-operatório e foram orientados a não usar nenhuma outra classe farmacológica.

Os dados relacionados aos parâmetros hemodinâmicos de pressão arterial sistólica e diastólica e frequência cardíaca foram medidos com equipamento digital calibrado (G-Tech®, Providencie, U.S.A), anotados e comparados em diferentes períodos (pré-operatório, após a anestesia, ao término da cirurgia, segundo dia e sétimo dia de pós-operatório)25.

Para avaliação da dor foi utilizada a escala analógica visual (uma linha horizontal de 100 mm) impressa em 10 folhas de um livreto com orientações sobre o preenchimento na capa. Cada folha desse livreto representava um momento de mensuração da dor (pré-operatório, pós-operatório imediato, 1, 2, 4, 12 horas, 1, 2, 3 e 7 dias de pós-operatório). Os pacientes foram orientados a marcar com um traço sobre a linha horizontal relacionando a sua intensidade dolorosa, considerando a marca zero como nenhuma dor e a marca 10 como a maior dor possível2,5,26. Os voluntários foram orientados a entregar pessoalmente o livreto com as escalas analógicas visuais preenchidas na consulta de retorno de 7 dias de pós-operatório. As suas marcações de intensidade dolorosa foram posteriormente mensuradas por paquímetro digital calibrado (Pantec®, São Bernardo do Campo, Brasil), considerando a distância da marca zero ao traço registrado pelo paciente em cada momento de medida. Todos os voluntários preencheram o livreto de respostas de acordo com as orientações do pesquisador e nos horários determinados, e retornaram para a avalição pós-operatória quando requisitados. Além disso, os voluntários tiveram acompanhamento diário pelo telefone.

Todos os pacientes foram informados dos objetivos da pesquisa e aceitaram participar mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Análise estatística

Neste estudo foram utilizadas técnicas de estatística descritiva através de distribuições absolutas, percentuais e métodos estatísticos inferenciais. O teste t pareado, o teste de Wilcoxon e o teste de Friedman foram usados com nível de significância de 5%, sendo que os cálculos foram obtidos por meio do software BioEstat 5.0 (Fundação Mamirauá, Belém, PA).

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética de Pesquisa em seres humanos do Centro de Pesquisas Odontológicas e Faculdade de Odontologia São Leopoldo Mandic (Processo nº 2010/0124), de acordo com as normas da Declaração de Helsinki e da Resolução 196/1996.

RESULTADOS

Não houve relato de nenhum efeito adverso nos dois períodos do estudo. Dentre os pacientes observados, nenhum deles necessitou prolongar o uso do fármaco analgésico além das 48 horas de cobertura ou utilizar outros analgésicos de suporte. Todos os voluntários da amostra retornaram nas consultas de avaliação e não foram registradas complicações.

A análise dos dados revelou que o tempo de cirurgia não foi influenciado (teste t pareado) pelo lado operado (p = 0,0846), pela ordem da sessão de atendimento (p = 0,4537) e pelo gênero (p = 0,0548). O tempo de cirurgia também não diferiu entre os tratamentos (p = 0,2449), como pode ser observado na figura 1. Além disso, foi possível observar que o tempo médio necessário para a cirurgia ficou abaixo dos 45 minutos, tanto quando a dipirona foi utilizada isolada (36,3 ± 4,6 min) quanto quando associada à cafeína (37,4 ± 5,8 min) (Figura 1).


Da mesma forma, o número de tubetes anestésicos utilizados não sofreu influência (teste de Wilcoxon) do lado operado (p = 1,0000), da ordem da sessão de atendimento (p = 0,2622), do gênero (p = 0,332) e dos tratamentos (p = 0,2622), sendo que em 94% das cirurgias realizadas sob o tratamento com dipirona foram utilizados três tubetes e em 86% daquelas realizadas com dipirona associada à cafeína. Nas demais cirurgias foram utilizados quatro tubetes.

Foi observado um aumento significativo (teste de Friedman, p < 0,05) da pressão arterial sistólica (PAS) e da pressão arterial diastólica (PAD) no período "após a anestesia" em comparação com os demais períodos, para os dois tratamentos. No entanto, a comparação (teste de Wilcoxon) entre os valores de PAS e PAD obtidos para os tratamentos mostrou que não houve diferenças estatisticamente significantes (p > 0,05) entre eles em nenhum dos períodos avaliados (Figura 2).


A figura 3 mostra o comportamento da frequência cardíaca (FC) ao longo dos períodos estudados. A análise dos dados (teste de Friedman) revelou que houve aumento significativo (p < 0,05) da FC no período "após a anestesia" para ambos os tratamentos, sendo que este aumento perdurou no pós-operatório imediato, voltando aos valores basais nos períodos seguintes. Não houve diferenças estatisticamente significantes (teste de Wilcoxon) entre os tratamentos considerando cada período de tempo estudado separadamente.


Foi possível observar que os níveis de dor permaneceram, em média, menores que 30 mm para os dois tratamentos e durante todos os períodos, mostrando, assim, a eficácia dos dois tratamentos, os quais tiveram comportamento idêntico em relação à dor relatada ao longo do período. Houve um aumento significativo (Friedman, p < 0,05) da dor a partir do pós-operatório imediato até um dia, quando os valores voltaram aos níveis iniciais (Figura 4).


DISCUSSÃO

A dor é um fenômeno fisiológico esperado nos tratamentos cirúrgicos odontológicos e está relacionada à sensibilização dos nociceptores e a liberação dos mediadores inflamatórios no local da lesão tecidual produzida pelos procedimentos operatórios. Estudos semelhantes a esta pesquisa observaram que a mensuração da dor pela escala analógica visual no pós-operatório de cirurgia de dentes impactados corresponde ao modelo clínico mais comumente utilizado e amplamente aceito para avaliar o efeito de fármacos analgésicos em Odontologia1-5,26.

A dor decorrente da cirurgia de remoção de terceiros molares impactados pode ser influenciada por diversos fatores como o caráter invasivo desse procedimento, a ansiedade em relação à expectativa de dor, as complicações possíveis e o forte impacto em relação à qualidade de vida no pós-operatório imediato2,28. Os parâmetros hemodinâmicos neste estudo serviram como referência para avaliação indireta da ansiedade dos pacientes. Não foi indicada medicação ansiolítica pelo seu forte impacto na percepção dolorosa pós-operatória25,27-28. Os resultados de pressão arterial e FC apresentaram valores próximos aos parâmetros fisiológicos, e as pequenas alterações observadas possivelmente estão associadas ao momento cirúrgico e não indicavam padrão grave de ansiedade capaz de interferir na percepção dolorosa em relação aos tratamentos testados. Estudos com desenho clínico semelhante a esta pesquisa corroboram com as inferências observadas sobre a interação dos padrões hemodinâmicos com a ansiedade e a percepção dolorosa25.

O controle do tempo cirúrgico e das complicações perioperatórias foi relatado como um fator importante na avaliação da dor decorrente da remoção de terceiros molares impactados quando se compara duas modalidades terapêuticas2,5,24,25. Os resultados deste estudo demonstraram que não houve diferenças estatisticamente significantes no tempo da cirurgia e na quantidade de tubetes anestésicos usados em relação ao lado operado, gênero do paciente e substância analgésica utilizada. Os anti-inflamatórios esteroides são comumente usados de forma preemptiva em cirurgias de exodontia de dentes inclusos para adequado controle do edema, trismo e dor pós-operatória30,31. A interferência dos corticoides na percepção dolorosa dos pacientes configura limitação inevitável deste estudo, considerando que a sua prescrição é clássica e necessária em procedimentos cirúrgicos invasivos em Odontologia32.

Estudos clínicos com critérios semelhantes aos adotados nesta pesquisa demonstraram que as coberturas analgésica e anti-inflamatória são importantes nas primeiras 48 horas pós-operatórias e a adição de substâncias adjuvantes parece melhorar o efeito analgésico dos fármacos clássicos prescritos em cirurgias odontológicas2,5,13,28,30,31.

A cafeína tem sido associada como adjuvante terapêutico de analgésicos para o tratamento da dor crônica e tensional. Estudos comparativos demonstraram que a cafeína quando associada a fármacos como o paracetamol, ibuprofeno, ácido acetilsalicílico e naproxeno melhoram a absorção e distribuição plasmática desses fármacos e contribui para a inibição da liberação de mediadores inflamatórios da hiperalgesia11,16-17,33,34. Em relação ao efeito analgésico adjuvante da cafeína para a dipirona sódica em outras situações, os resultados não são consistentes, pois existem poucos estudos controlados, prospectivos e aleatórios18,19.

A dipirona sódica é um fármaco de vasta utilização para o controle da dor inflamatória, principalmente no pós-operatório de cirurgias gerais35. Sua eficiência analgésica pode ser atribuída ao mecanismo de ação periférico diferente dos outros fármacos comumente utilizados6-8. A adição da cafeína parece modificar o efeito da dipirona sódica no controle da dor, porém o mecanismo de ação dessa associação ainda não está esclarecido16-19. Entretanto a análise dos resultados obtidos no presente estudo permite observar que a associação da cafeína com a dipirona não demonstrou efeito analgésico pós-operatório diferenciado nas cirurgias de remoção de terceiros molares impactados e devido a escassez de publicações acerca deste assunto sugere-se novos estudos clínicos controlados.

CONCLUSÃO

O protocolo terapêutico proposto neste estudo não demonstrou diferença estatística significante na eficiência analgésica da dipirona sódica associada ou não a cafeína no controle da dor pós-exodontia.

Apresentado em 28 de janeiro de 2013.

Aceito para publicação em 12 de agosto de 2013.

Conflito de interesses: Nenhum.

* Recebido da Faculdade de Odontologia São Leopoldo Mandic. Campinas, SP.

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  • Endereço para correspondência:
    Dr. Rogério Heládio Lopes Motta
    Rua José Rocha Junqueira, 13
    13414-903 Campinas, SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Out 2013
    • Data do Fascículo
      Set 2013

    Histórico

    • Recebido
      28 Jan 2013
    • Aceito
      12 Ago 2013
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