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Prevalência e características de dor em pacientes internados em hospital português

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Os estudos de prevalência da dor apontam, sistematicamente, para valores elevados. Embora não comparáveis, a análise global permite inferir que em cada dois pacientes internados, um tem dor. Este estudo teve como principais objetivos determinar a prevalência da dor, suas características, tratamento analgésico e satisfação de usuários internados num hospital da Zona Centro de Portugal face à avaliação e tratamento da dor. MÉTODOS: Estudo transversal e observacional realizado com 141 pacientes, internados há pelo menos 24 horas, em unidades cirúrgicas e médicas (excluídos os não comunicantes), com idade média de 69 anos, de ambos os gêneros, a quem foi realizada uma entrevista após o cumprimento dos respetivos procedimentos formais e éticos. RESULTADOS: Obteve-se prevalência de dor nas 24 horas anteriores ao estudo de 52,5% (28,8% dor intensa). Na altura da entrevista, a prevalência diminuiu para 41,1% (2,7% de dor intensa). Os pacientes com mais dor estavam internados nos serviços cirúrgicos e o tipo de dor era sobretudo musculoesquelética. A maioria dos pacientes com dor esperou, no máximo, 10 minutos para lhe ser administrado um analgésico. Dos 57 que referiram dor no momento da coleta dos dados, 46 (80,7%) não desejaram outro fármaco e 91,3% mostraram-se satisfeitos com o seu tratamento. CONCLUSÃO: Nessa instituição houve prevalência e abordagem da dor semelhantes às da literatura, mas a dor ainda se encontra subtratada. Esses dados permitirão a definição e implementação de um programa de controle de dor mais dirigida e eficaz.

Dor; Intensidade da dor; Prevalência de dor; Satisfação do paciente; Tratamento da dor


BACKGROUND AND OBJECTIVES: Studies on pain prevalence systematically point to high values. Although not comparable, a global analysis allows inferring that from every two hospitalized patients, one is in pain. This study aimed at determining pain prevalence, its characteristics, analgesic treatment and satisfaction of patients admitted to a hospital in the Center of Portugal with regard to pain evaluation and treatment. METHODS: This is a transversal and observational study with 141 patients admitted for at least 24 hours to surgical and medical units (excluded those unable to communicate), with mean age of 69 years, of both genders, who were interviewed after compliance with respective formal and ethic procedures. RESULTS: Pain prevalence in the 24 hours previous to the study was 52.5% (28.8% severe pain). During interviews, prevalence has decreased to 41.1% (2.7% severe pain). Patients with more severe pain were admitted to surgical services and pain was primarily musculoskeletal. Most patients with pain have waited no more than ten minutes before analgesics were administered. From 57 patients referring pain during data collection, 46 (80.7%) did not require a different drug and 91.3% were happy with their treatment. CONCLUSION: In this institution, there has been pain prevalence and approach similar to the literature, but pain remains undertreated. Such data shall allow the definition and implementation of a more focused and effective pain control program.

Pain; Pain intensity; Pain prevalence; Pain treatment; Patient's satisfaction


ARTIGO ORIGINAL

Prevalência e características de dor em pacientes internados em hospital português* * Recebido do Centro Hospitalar Leiria Pombal, Leiria, Portugal.

Eunice José da Graça Dias Gomes da SilvaI; Maria dos Anjos Coelho Rodrigues DixeII

ICentro Hospitalar Leiria Pombal, Leiria, Portugal

IIEscola Superior de Saúde de Leiria, Instituto Politécnico de Leiria, Unidade de Investigação em Saude, Leiria, Portugal

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Maria dos Anjos Coelho Rodrigues Dixe Rua das Hortas nº 81 - Barosa 2400-013 Leiria, Portugal E-mail: manjos.dixe@gmail.com

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Os estudos de prevalência da dor apontam, sistematicamente, para valores elevados. Embora não comparáveis, a análise global permite inferir que em cada dois pacientes internados, um tem dor. Este estudo teve como principais objetivos determinar a prevalência da dor, suas características, tratamento analgésico e satisfação de usuários internados num hospital da Zona Centro de Portugal face à avaliação e tratamento da dor.

MÉTODOS: Estudo transversal e observacional realizado com 141 pacientes, internados há pelo menos 24 horas, em unidades cirúrgicas e médicas (excluídos os não comunicantes), com idade média de 69 anos, de ambos os gêneros, a quem foi realizada uma entrevista após o cumprimento dos respetivos procedimentos formais e éticos.

RESULTADOS: Obteve-se prevalência de dor nas 24 horas anteriores ao estudo de 52,5% (28,8% dor intensa). Na altura da entrevista, a prevalência diminuiu para 41,1% (2,7% de dor intensa). Os pacientes com mais dor estavam internados nos serviços cirúrgicos e o tipo de dor era sobretudo musculoesquelética. A maioria dos pacientes com dor esperou, no máximo, 10 minutos para lhe ser administrado um analgésico. Dos 57 que referiram dor no momento da coleta dos dados, 46 (80,7%) não desejaram outro fármaco e 91,3% mostraram-se satisfeitos com o seu tratamento.

CONCLUSÃO: Nessa instituição houve prevalência e abordagem da dor semelhantes às da literatura, mas a dor ainda se encontra subtratada. Esses dados permitirão a definição e implementação de um programa de controle de dor mais dirigida e eficaz.

Descritores: Dor, Intensidade da dor, Prevalência de dor, Satisfação do paciente, Tratamento da dor.

INTRODUÇÃO

A dor é um problema universal e transversal a muitas doenças. É subjetiva, muitas vezes difícil de descrever, mas os pacientes devem sentir que o profissional está disponível para ouvi-los. Se não for tratada, conduz a vários efeitos adversos, tais como, cardiovasculares, imunitários, trombóticos, psicológicos, sociais, alterações do sono ou a própria cronificação da dor.

Felizmente, o direito ao seu tratamento tem sido amplamente divulgado e aceito, sendo considerado um critério de qualidade. Os pacientes têm direito à avaliação da dor, ao seu tratamento, a serem envolvidos nele, mesmo depois da alta hospitalar1. Mas, apesar dessa preocupação mundial, continua a ser subtratada, sobretudo devido a barreiras por parte dos profissionais de saúde, dos pacientes, da família, das instituições e da sociedade2-5.

Em Portugal, um estudo realizado entre janeiro de 2007 e março de 2008, por contato telefônico, revelou prevalência de dor crônica, na população Portuguesa, de 36,7%. Da população com dor, 35% referiu dor intensa6.

Os estudos de prevalência de dor são indicadores de qualidade, na medida em que fornecem informações, quer aos profissionais de saúde, quer aos administradores da área da saúde7.São, por isso, uma das primeiras medidas de melhoria assistencial para reduzir a dor. Os resultados podem alertar para essa temática e levar a instituição a adotar estratégias que levem à diminuição da dor8.

Consultando a literatura, pode-se inferir que existem múltiplos estudos de prevalência de dor intra-hospitalar. A tabela 1 resume alguns dos resultados obtidos em hospitais de vários pontos do globo, o que fornece uma visão geral. Apesar do muito que se tem feito para melhorar o tratamento da dor, os estudos referidos apontam para prevalências de dor no momento das entrevistas, entre 43 e 84%, sendo que a dor intensa, nas 24h, chega a atingir valores de 42%7-14. Verdadeiras comparações são difíceis, dadas as variações das amostras, métodos e estrutura dos trabalhos, mas permitem fazer uma análise global e perceber que, por muito que se publique sobre dor, as prevalências mantêm-se altas ao longo dos anos. Alguns estudos evidenciam melhorias no tratamento da dor, fruto da campanha mundial que organizações como a IASP (International Association for the Study of Pain), a WHO (World Health Organization) e a JCAHO (Joint Commission on Accreditation of Healthcare Organizations) efetuaram em prol do tratamento e abordagem da dor1. Estudos que repetiram o estudo de prevalência de dor de 2008, em 2010 obtiveram pior resultado, referindo que uma avaliação anual da prevalência permitiu importante evidência para a instituição e a sua publicação, um incentivo para outras instituições7,13. De fato, estudos como os apontados permitem identificar as situações a melhorar, levando à aplicação de abordagens específicas e dirigidas a essas situações, em cada hospital avaliado (Tabela 1).

É nesse contexto que surge o presente estudo com os seguintes objetivos: determinar a prevalência da dor nas últimas 24h e suas características no momento da aplicação do questionário (24h permitem o tratamento da dor e a eventual diminuição da sua prevalência), nos pacientes internados há mais de 24h. Optou-se, também, por avaliar quais as estratégias terapêuticas aplicadas e a sua eficácia e por conhecer a satisfação dos pacientes, face à avaliação e controle da dor.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo transversal e observacional realizado no Centro Hospitalar Leiria-Pombal (CHLP). A sua área de influência abrange uma população de aproximadamente 350.000 habitantes. A internação é distribuída por serviços médicos (Medicina Interna, Cardiologia, Gastroenterologia, Pediatria, Pneumologia, Psiquiatria, Dermatologia), cirúrgicos (Cirurgia Geral, Ginecologia/Obstetrícia, Oftalmologia, Ortopedia, Otorrinolaringologia e Urologia) e Cuidados Intensivos. Recebe pacientes oncológicos e não oncológicos. Tem uma lotação de 543 leitos. Foi acreditado, em julho de 2012, pela JCAHO.

Foram incluídos os pacientes internados há mais de 24h que desejassem participar, que estivessem conscientes para dar o seu consentimento e soubessem falar português. Uma admissão superior a 24h permite uma oportunidade para estabelecer um plano para o tratamento da dor. Outros critérios de inclusão foram que estivessem conscientes e orientados. Esse critério foi verificado através do mini-exame mental breve.

Foram excluídos os pacientes internados nos Serviços de Psiquiatria Obstetrícia, Pediatria e Cuidados Intensivos.

Na altura da coleta de dados, estavam internados 258 pacientes, nos serviços incluídos no estudo. Após a verificação dos critérios de inclusão, a amostra ficou constituída por 141 pacientes, ou seja, 54,7% da totalidade da população.

Utilizou-se uma entrevista estruturada constituída por quatro grupos: características sociodemográficas e clínicas: idade, gênero; estado civil, escolaridade, motivo e tempo de internação; Brief Pain Inventory, Short Form (Inventário Resumido da Dor); versão curta do The McGill Pain Questionnaire (MPQ); satisfação do paciente face à avaliação e controle da dor, grupo que integra questões relacionadas com satisfação, avaliação e controle da dor.

Os dados foram coletados após a autorização do conselho de administração. Os diretores de serviço, bem como os enfermeiros chefes, foram contatados para se definir a melhor estratégia de coleta de dados. Após esse procedimento, foram selecionados os dias para a coleta de dados, a qual foi efetuada por estudantes de enfermagem (após informação e formação para a atividade) e pelos investigadores do estudo, durante os meses de março e abril de 2012. A coleta de dados por pessoal não pertencente ao serviço teve como propósito não influenciar as respostas dos pacientes durante essa etapa da pesquisa. Foi solicitado consentimento a todos os participantes, após explicitação dos objetivos do estudo e sobre o que consistia a sua participação, garantindo o anonimato e confidencialidade das respostas aos instrumentos. Foi sempre garantido um local apropriado para a coleta de dados, tendo sido cumpridas todas as indicações constantes da declaração de Helsinque.

Análise estatística

O tratamento dos dados foi realizado por computador, através dos programas Microsoft Excel e Stastistical Package for the Social Sciences (SPSS) - versão 15.0 para Windows. Para sistematizar e realçar a informação fornecida pelos dados recorreu-se a técnicas de estatística descritiva: frequências (absolutas e relativas), medidas de tendência central (medianas e médias aritméticas), medidas de dispersão e variabilidade (desvio padrão - DP).Sempre que se justificou, aplicou-se os testes estatísticos não paramétricos (as variáveis não apresentavam distribuição normal verificada através do teste de Kolmogorov Smirnov) do Qui-quadrado, Mann-Whitney e Kruskal-Wallis.

Este estudo foi aprovado pela Comissão de Ética da instituição sob o protocolo nº1/12 de 13/03/2012.

RESULTADOS

Os 141 pacientes que responderam ao questionário são, majoritariamente, do gênero masculino (54,6%), casados (62,3%) e detentores do 1º ciclo com habilitações literárias (66,1%), com média de idade de 69,3 ± 14,2 anos (Tabela 2).

Estavam internados em serviços de medicina interna (41,8%), clínica cirúrgica (40,4%) e 17,8% na ortopedia, em média há 7,4 ± 11,9 dias, sendo a causa mais frequente da internação uma causa cirúrgica. Nas outras causas foram reportadas artrose do joelho infectada (1); acidente vascular encefálico (1); deiscência da prótese total do joelho direito (1); dor na cabeça e nuca (1); acidente aéreo; fratura (2); luxação da prótese total do quadril (1) e causas desconhecidas (16).

Observou-se uma taxa de prevalência de dor nas últimas 24h de 52,5% (74).

Com o objetivo de verificar se a taxa de prevalência era diferente conforme o gênero, aplicou-se o teste do Qui-quadrado, que não mostrou diferenças significantes (p>0,05), sendo o percentual mais elevado nos pacientes que apresentavam dor tanto no gênero masculino (51,9%) como no gênero feminino (53,1%).

Os pacientes que reponderam não ter dor nas últimas 24h são, em média, mais velhos (70,9±13,9 anos) do que os que afirmaram ter dor (67,8±14,4 anos) no entanto essas diferenças não tem significado estatístico (U= 2163,000; p>0,05).

A presença de dor está relacionada com o motivo da internação (Qui-quadrado=16,042; p<0,05) sendo a prevalência maior quando considerou-se a doença cirúrgica (71,9%). O percentual da doença não cirúrgica foi de 35,7% e de 41,1% para outra causa.

Dos 74 pacientes que referiram ter dor, 72 conseguiram localizá-la. Em 33,3% dos pacientes está localizada exclusivamente no abdômen, mas a dor mais prevalente é a musculoesquelética, com 54% dos pacientes a referenciá-la (Tabela 3).

Seguindo os critérios da Organização Mundial de Saúde e tendo por base os dados apresentados na tabela 4 pode-se salientar que 52,1% dos respondentes sentiram nas últimas 24h dor acima do valor 4 e 20,5% apresentam no momento da coleta de dados dor acima ou igual ao valor 4. Vale salientar que alguns pacientes não conseguiram quantificar a dor, principalmente a dor mínima nas ultimas 24h.

Da aplicação da Short-form McGill Pain Questionnaire pode-se concluir que, dentro da dimensão sensorial da dor, a característica "sensível ao toque" é a mais relevante, uma vez que 14,3% a classificam como intensa.

Já na dimensão afetiva a característica da dor mais salientada foi "cansativa-esgotante", sendo apontada por 14,5% dos respondentes no grau moderada (Tabela 5).

O índice NWC (Number of Words Chosen), ou seja, o número total de palavras escolhidas pelos sujeitos alcança um valor de 3,3 para a média, com um desvio padrão de 3,5. O PRI (Pain Rating Index) sensorial obtém uma média mais elevada com 5,15,1±4,9, do que o PRI afetivo (0,8±1,6). Quanto ao PRI Total, a média situa-se nos 6,0, com um desvio padrão de 6,2.

Os fármacos mais utilizados para a dor foram, majoritariamente, tramadol e paracetamol (66,7%). Em apenas um paciente foi aplicada medida não farmacológica de tratamento da dor (Tabela 6).

Mais de metade da amostra (85,5%) referiu que os profissionais lhes avaliam a dor "perguntando- lhes". Apenas 14,5% referiram ter-lhes sido mostrada uma régua ou escala de faces.

A maioria dos entrevistados (74,3%) esperou no máximo 10 minutos para lhe ser administrado um analgésico quando reportou dor. Três pacientes solicitaram fármaco para dor e nunca o receberam (Tabela 7).

Apenas 3 (4,6%) pacientes referiram que o fármaco que lhes foi administrado não aliviou a dor tendo solicitado outro fármaco e esses três pacientes salientaram que quando solicitaram outro fármaco, os profissionais levaram menos de 10 minutos para administrar.

Dos 58 pacientes que, no momento da coleta de dados, referiram ter dor, (independentemente da intensidade), apenas 11 (19,3%) referiram que desejavam uma dose mais forte de fármaco para a dor. Dos 47 pacientes restantes, apenas 27 optaram por justificar por que não desejam outro fármaco mais forte. A razão mais prevalente foi "não sinto necessidade" com 59,3% (Tabela 8).

Quarenta e um por cento dos pacientes referiram que tomavam fármacos em casa para a dor, sendo que o paracetamol era o mais utilizado (47,1%), seguindo-se os anti-inflamatórios (77%) e a morfina (5,9%). Apenas 22,7% mantiveram o fármaco durante a internação. Ao serem questionados sobre o grau de satisfação com o resultado do tratamento da dor, verifica-se que a maior parte está moderadamente muito satisfeita (91,4%), no entanto é de salientar os 6 (8,6%) que não se encontram satisfeitos (moderadamente insatisfeito, insatisfeito e muito insatisfeito).

DISCUSSÃO

O presente estudo mostrou prevalência de 52,5% nas 24h, que diminuiu para 41,1%, na altura da entrevista. Embora esteja dentro dos valores apresentados por outros estudos7,8,10-14,17 o fato de, após 24h de internação, existirem ainda 41,1% com dor, significa que praticamente um em cada dois pacientes têm dor, e que mais poderá ser efetuado para o seu tratamento. Ainda, em relação à dor intensa pela escala analógica visual (EAV>7) no momento da entrevista, apenas dois pacientes a referiram.

Quando perguntou-se qual o método habitual que os profissionais utilizaram para lhes avaliar a dor, apenas 14,5% referiram ser através de régua ou escala de faces. A utilização destes instrumentos aumenta o diagnóstico de dor, sobretudo nos idosos, mas este estudo mostrou que os profissionais ainda não os utilizam na totalidade de forma sistemática.

Não se identificou significado estatístico no fato de a maioria dos pacientes que referiram dor serem mais novos. De fato, segundo alguns autores, são os mais velhos que referem dor e é a população onde ela é mais subtratada, quer pela sua polimedicação, quer pelas doenças associadas15.

Os pacientes que apresentavam mais dores estavam internados nos serviços de cirurgia geral e ortopedia e tinham uma doença cirúrgica, o que está de acordo com a literatura11,12. Esses pacientes têm mais dor relacionada com alterações sensoriais na zona da cicatriz, em longo prazo. São pacientes cujo controle da dor deve ser, por isso mesmo, mais rigoroso, entretanto continuam a ser aqueles com mais prevalência de dor. Estudo português6 refere que, dos 37% de pacientes com dor crônica, 6% apontam a cirurgia como a sua causa. No presente estudo, a causa de dor mais apontada pelos pacientes foi a dor musculosquelética (54%). Em outros estudos a dor mais prevalente é igualmente a dor musculoesquelética18 e a dor de cabeça19, porém durante a avaliação de pacientes com dor crônica.

A grande maioria dos pacientes encontrava-se medicada com tramadol e paracetamol e apenas cinco pacientes tinham um opioide forte prescrito. Tratando-se majoritariamente de pacientes cirúrgicos, seria de esperar, em termos teóricos, que essa porcentagem fosse maior, embora o pequeno número de pacientes não permita generalizar. No entanto, na prática, esse medo dos opioides fortes está bem documentado. Estudo16 mostrou que, embora os enfermeiros oncológicos estivessem conscientes do subtratamento da dor, o medo da adição aos opioides, da interferência com o diagnóstico e dos efeitos secundários levava a um tratamento inadequado da dor.

Apesar dos valores de prevalência de dor, o estudo mostra que a maioria dos pacientes esperou, no máximo 10 minutos por um analgésico, após ter reportado a dor. Os três pacientes que necessitaram de mais fármaco, também esperaram menos de 10 minutos. Estudo7 apresenta que os pacientes chegavam a esperar uma a duas horas por analgesia adicional.

Curioso é o fato de 47 pacientes com dor, na altura da entrevista, não terem solicitado mais fármaco. Esta amostra registrou, na sua maioria, uma EAV inferior ou igual a 3, o que pode justificar essa atitude. Quase 60% dos pacientes justificam-na por "não sentir necessidade de mais medicação". As restantes justificativas são compatíveis com as barreiras para o tratamento da dor por parte dos pacientes: o medo dos efeitos secundários.

Mesmo com as prevalências de dor apontadas, a grande maioria dos pacientes continua a mostrar-se satisfeita com o tratamento da sua dor. Esse resultado é consistente com outros estudos7,8,14,20. Os pacientes aceitam facilmente o sofrimento e a dor, associados à cirurgia e à internação hospitalar. Não foi avaliada no presente estudo, a satisfação em relação aos profissionais, mas isso pode influenciar a opinião dos pacientes em relação à dor.

Este estudo serviu de orientação para construir uma intervenção estruturada a profissionais de saúde, de um dos serviços de cirurgia do Centro Hospitalar onde foi realizado o estudo, uma vez que é onde existe mais prevalência de dor. O objetivo é estender, progressivamente, esse programa de formação e instituição de normas de orientação clínica aos restantes serviços do Centro Hospitalar.

Será interessante, posteriormente, repetir o estudo da prevalência, tentando perceber a eficácia da intervenção, avaliando, também, a dor nos pacientes não comunicantes, uma vez que essa é uma limitação do presente estudo.

CONCLUSÃO

Dado que a dor permanece subtratada, é importante manter a realização de estudos como este, de modo a permitir uma reflexão sobre a sua prevalência, características e quais os locais de premente atuação. Mesmo com dor, a maioria dos pacientes mostrou-se satisfeita com o tratamento, o que faz ponderar a necessidade de informá-los, alertando-os para o seu direito de "não ter dor" e os benefícios que daí resultam.

Também em relação aos profissionais, sobretudo dos serviços cirúrgicos, este estudo alerta para o muito que há a fazer, sobretudo em relação aos receios para com o fármaco.

AGRADECIMENTOS

Aos professores e alunos de enfermagem da Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria, pela colaboração na coleta dos dados, e aos elementos da Unidade de Dor do Centro Hospitalar de Leiria Pombal, pelo apoio prestado desde o primeiro momento do estudo.

Apresentado em 08 de julho de 2013.

Aceito para publicação em 05 de novembro de 2013.

Conflito de interesses: não há.

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  • Endereço para correspondência:
    Maria dos Anjos Coelho Rodrigues Dixe
    Rua das Hortas nº 81 - Barosa
    2400-013 Leiria, Portugal
    E-mail:
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    Recebido do Centro Hospitalar Leiria Pombal, Leiria, Portugal.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Fev 2014
    • Data do Fascículo
      Dez 2013

    Histórico

    • Recebido
      08 Jul 2013
    • Aceito
      05 Nov 2013
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