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O ensino de intervenções de Enfermagem como estratégia não farmacológica para alívio da dor* * Recebido da Faculdade Mario Schenberg, Cotia, SP, Brasil.

Resumos

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

Justifica-se a realização da presente pesquisa baseando-se na relevância de serem pontuadas as estratégias das quais a equipe de Enfermagem possa lançar mão de modo a contribuir para o gerenciamento da dor, tendo em vista a pertinência que a dor assume como o 5° sinal vital. O objetivo deste estudo foi descrever quais as intervenções de Enfermagem a serem ensinadas como estratégias para o alívio da dor, de acordo com a percepção dos enfermeiros docentes.

MÉTODOS:

Trata-se de uma pesquisa descritiva e exploratória com enfoque qualitativo. O cenário foi um Curso de Graduação em Enfermagem e os participantes foram os docentes enfermeiros que lecionaram disciplinas de Enfermagem. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Os dados coletados mediante entrevista semiestruturada gravada em áudio, foram posteriormente organizados em categorias.

RESULTADOS:

Da análise dos dados coletados emergiu a categoria “O cuidado de Enfermagem como intervenção não farmacológica no gerenciamento da dor”. Constituíram estratégias específicas de atuação da Enfermagem, no processo de ensino dos graduandos, cuidados complementares como a comunicação eficaz, o posicionamento e a mobilização do paciente e apoio com artefatos, somados ao acompanhamento dos seus familiares.

CONCLUSÃO::

As intervenções de Enfermagem adotadas como terapias não farmacológicas no gerenciamento da dor constituíram as estratégias utilizadas pelos docentes no processo de ensino.

Analgesia; Cuidados de Enfermagem; Docentes de Enfermagem


BACKGROUND AND OBJECTIVES:

This study is justified by the relevance of highlighting strategies which may be used by the nursing team to contribute to pain management, considering the importance of pain as the fifth vital sign. This study aimed at describing Nursing interventions to be taught as strategies for pain relief, according to Nursing professors’ perception.

METHODS:

This is a descriptive, exploratory and qualitative study. The scenario was a Nursing Graduation Course and participants were Nursing professors teaching Nursing disciplines. All participants have signed the Free and Informed Consent Term. Data collected by means of semi-structured interviews recorded in audio were afterward organized in categories.

RESULTS:

From data analysis, the category "Nursing care as non-pharmacological intervention to manage pain" has emerged. Specific Nursing action strategies taught during the course were additional care, such as effective communication, patients’ positioning and mobilization and support with artifacts, added to family monitoring.

CONCLUSION:

Nursing interventions adopted as non-pharmacological therapies to manage pain were the strategies used by professors during the teaching process.

Analgesia; Nursing care; Nursing professors


INTRODUÇÃO

A Associação Internacional para Estudos da Dor (IASP) conceitua a dor como "uma experiência sensorial e emocional desagradável, associada a um dano real ou potencial dos tecidos, ou descrita em termos de tais lesões. Cada indivíduo aprende a utilizar esse termo através de suas experiências prévias traumáticas..."1International Association Study of Pain (IASP). Charlton EJ. (editor), Core Curriculum for Professional Education in Pain. 3rd ed. Seattle: IASP Press; 2005.. Segundo a Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor (SBED)2Sociedade Brasileira para Estudos da Dor (SBED). Histórico da SBED. [disponível em www.dor.org.br] .
www.dor.org.br...
,3Castro AB. Tratamento da dor no Brasil: evolução histórica. Curitiba: Editora Maio; 1999. a longevidade populacional associada ao aumento da sobrevida em relação aos traumas e às doenças crônicas propicia, em geral, o aparecimento de sequelas dolorosas, fato esse que exige o desenvolvimento de estratégias que direcionem a ação profissional para o seu correto e adequado controle. Emerge disso a inferência de que são importantes recursos humanos devidamente formados e qualificados na liderança do processo de gerenciamento, da atenção para avaliar e tratar a dor e, para isso o enfermeiro tem importante papel, visto suas responsabilidades relacionadas à administração setorial, ao planejamento da assistência da equipe por ele coordenada, além da formação generalista e holística que deve envolver a sua graduação.

O enfermeiro assume papel preponderante na avaliação precisa da experiência dolorosa e na promoção, manutenção e restauração do conforto do paciente frente à vivência da dor e suas consequências, mediante a organização dos cuidados implementados por ele próprio e pela equipe de Enfermagem ao paciente com dor4Wilkie DK, Ezenwa MO. Pain and symptom management in palliative care and at end of life. Nurs Outlook. 2012;60(6):357-64..

O cuidado de Enfermagem pode expressar alívio do desconforto álgico o que justifica a necessidade de esforços que reproduzam padrões de assistência especificamente voltados às diversas manifestações e percepções da expressão dolorosa, mediante a utilização de escalas e instrumentos que traduzam a intensidade e a qualidade da dor, bem como a aplicação de estratégias de cuidados de Enfermagem ou intervenções não farmacológicas que diminuam as reações fisiológicas e proporcionem conforto5Dalal S, Hui D, Nguyen L, Chacko R, Scotti C, Roberts L, et al. Achievement of personalized pain goal (PPG) in cancer patients referred to a supportive care clinic at a comprehensive cancer center. Cancer. 2012;118(15):3869-77.,6Santos LM, Ribeiro IS, Santana RC. [Identification and treatment of pain in the premature newborn in the intensive care unit]. Rev Bras Enferm. 2012;65(2):269-75. Portuguese..Compreende-se dessa assertiva que há necessidade iminente da preparação do profissional de Enfermagem desde o momento de sua formação para o desenvolvimento de tal competência7Romanek FA, Avelar MC. Percepção dos docentes acerca do ensino da dor para graduandos em enfermagem. Rev Eletr Enf. 2013;15(2):463-70..

A referência do cuidado de Enfermagem como estratégia complementar para alívio da dor se baseia no uso de técnicas como a música, a imaginação guiada, o controle de ruídos ambientais, o toque, a massagem, terapias físicas, além da comunicação propriamente dita, como recursos que diminuem a aflição secundária à dor, que devem ser discutidos com o profissional ao longo do seu processo de educação formal e continuada8dos Santos DS, de Carvalho EC. [Nursing interventions for the care of patients with arthritis: an integrative review]. Rev Bras Enferm. 2012;65(6):1011-8. Portuguese.,9Lira AL, Araújo WM, Souza NT, Frazão CM, Almeida AB. Mapeamento dos cuidados de Enfermagem para pacientes em pós-operatório de cirurgia cardíaca. Rev Rene. 2012;13(5):1171-81..

Assim, justifica-se a realização da presente pesquisa baseando-se na relevância das estratégias das quais a equipe de Enfermagem possa lançar mão de modo a contribuir para o gerenciamento da dor, tendo em vista a pertinência que a dor assume como o 5° sinal vital.

O objetivo deste estudo foi descrever quais são as intervenções de Enfermagem a serem ensinadas como estratégias para o alívio da dor, de acordo com a percepção dos enfermeiros docentes.

MÉTODOS

Trata-se de uma pesquisa descritiva e exploratória com enfoque qualitativo do tipo análise de conteúdo temático. O estudo foi realizado em um curso de graduação em Enfermagem de uma instituição de ensino superior localizada no Município de Mogi das Cruzes. Foram incluídos todos os enfermeiros docentes que lecionaram, no ano de 2011, disciplinas de Enfermagem. Os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Foram coletados dados para a caracterização dos participantes, tais como gênero, idade, tempo de graduação e tempo de docência em enfermagem e, a seguir foi feita entrevista semiestruturada, gravada em áudio, partindo da questão norteadora: "De acordo com a sua percepção, quais são as intervenções de Enfermagem a serem ensinadas como estratégias para o alívio da dor?".

A seguir, foi realizada a transcrição dos discursos oriundos das entrevistas gravadas e após sua leitura rigorosa e criteriosa foram classificados conforme explicitado na tabela 1, sendo estabelecidas Unidades de Registro, das quais resultaram os Núcleos de Compreensão tendo como marco referencial o Módulo Pedagógico da Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor. Após análise procedeu-se um novo reagrupamento e classificação emergindo Categorias. A análise reflexiva e relacional dos conteúdos obtidos baseou-se no referencial teórico, buscando a compreensão do significado do fenômeno sobre a percepção dos docentes da graduação em Enfermagem.

Table 1
Categorization process, São Paulo, 2014

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (Processo CEP UMC 137/2010, CAAE 0131.0.237.237-2010).

RESULTADOS

Em relação à caracterização, participaram deste estudo um total de 5 docentes, denominados neste estudo "A", "B", "C", "D" e "E". Destes, 4 eram mulheres com idades entre 31 e 40 anos; em relação do tempo de formação, 4 eram graduados em Enfermagem há mais de 10 anos e 4 atuavam como docentes entre 10 e 15 anos. Atable 1 apresenta os discursos selecionados, as unidades de registro, o núcleo de compreensão e a categoria.

DISCUSSÃO

Da categoria "O cuidado de Enfermagem como intervenção não farmacológica para o gerenciamento da dor" emergiram menções aos tratamentos disponíveis para o manejo da dor. Nessa perspectiva, os docentes referiram o reconhecimento de que as intervenções de Enfermagem por si representam ações não farmacológicas de conforto e melhora do quadro álgico:

"... a mudança de decúbito, o curativo, o paciente acamado muito tempo, você pode deixá-lo sentado e até a higienização que traz conforto, e este "sentir bem" acaba facilitando a resistência à dor" (A). "O cuidado emocional é com intervenções não farmacológicas, como trocar o colchão, o toque, a mudança de decúbito e estimular a mobilidade" (D).

O tratamento da dor baseado na associação entre ações de Enfermagem e técnicas terapêuticas reduz os custos, além de evitar a ocorrência de possíveis efeitos adversos relacionados ao uso de fármacos e intervenções invasivas; aí reside a importância da Enfermagem para o gerenciamento do 5° sinal vital2Sociedade Brasileira para Estudos da Dor (SBED). Histórico da SBED. [disponível em www.dor.org.br] .
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É importante oferecer ao aluno da Graduação em Enfermagem instrumentos que identifiquem as necessidades de cuidados específicos para cada indivíduo com dor, assim, baseando-se nas recomendações das entidades de classe de Enfermagem pertinentes ao estudo das respostas humanas ao abalo biológico, emocional e social que a dor pode acarretar1010 Portella VC, Crossetti MG, Baron DA, Mendes EM,Crippa SP. Fórum em ambiente virtual na relação de confiança entre o profissional e o indivíduo cuidado. Rev Gaúcha Enferm. 2012;33(4):72-8..

Na área de Enfermagem na Saúde da Criança, a percepção da docente participante convergiu para a técnica não farmacológica como a primeira escolha no processo de gerenciamento da dor, com foco na criança e na família, como segue: "A família tem que estar orientada a valorizar o que a criança sente, a fala... uma vez que a dor é diagnosticada, ensino a tentar primeiro intervir não farmacologicamente com a mudança de decúbito ou até o brinquedo... eu tento orientar isso aos alunos... que não podemos erradicar a dor, mas minimizar"(B).

Os tratamentos convencionais farmacológicos para tratamento da dor em pediatria vêm sendo associados, com eficácia, às técnicas complementares; o estímulo à imaginação do paciente pediátrico é o principal elemento da assistência1111 Palermo TM. Assessment of chronic pain in children: current status and emerging topics, Pain Res Manag. 2009;14(1):21-6..

No que tange ao processo de assistência de Enfermagem às crianças e adolescentes que vivenciam dor, notadamente durante a internação hospitalar, há que se considerar a pertinência de estratégias de cuidado emocional, flexibilidade, motivação do lúdico, uso de imaginação e estabelecimento de comunicação com o infante e com o sistema de apoio para compreensão da percepção de cada elemento sobre a experiência dolorosa e, a partir daí, implementar estratégias para o seu controle1212 da Luz JH, Martini JG. [Understanding the meaning of being hospitalized in daily lives of children and teenagers with chronic diseases]. Rev Bras Enferm. 2012;65(6):916-21. Portuguese..

A comunicação foi referida como uma ferramenta do cuidado na área de saúde mental ante a especificidade da experiência dolorosa para pacientes com distúrbios álgicos:

"Eu abordei um paciente com a aluna... ele falou espontaneamente que estava distante da família, que não podia pegar a sobrinha no colo, que a médica estava diminuindo a dose da medicação" (C).

A dor no contexto do portador de doença mental é considerada como diferenciada na avaliação desse tipo de paciente, e o gerenciamento do quinto sinal vital é inserido na recomendação para assistência de saúde e de Enfermagem dos "necessitados de cuidados especiais"2Sociedade Brasileira para Estudos da Dor (SBED). Histórico da SBED. [disponível em www.dor.org.br] .
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A comunicação como ferramenta de gerenciamento da dor favorece a avaliação do processo álgico, possibilitando a expressão da intensidade e da qualidade do desconforto, além disso, por si só compreende estratégia de alívio seja pela orientação, pela imaginação guiada ou pela possibilidade de verbalização1313 Macedo AC, Romanek FA. Gerenciamento da dor no pós-operatório de pacientes com câncer pela enfermagem. Rev Dor. 2013;14(2):1-4..

O gerenciamento da dor foi considerado nessa categoria, em sua versão não farmacológica, como as intervenções de cuidados empregados pela equipe de Enfermagem. No ensino desse cuidado aos alunos, a comunicação, a mobilização física, o apoio, e a utilização de artefatos e acompanhamento por parte do seu sistema de apoio familiar constituem estratégias específicas da atuação da Enfermagem.

CONCLUSÃO

O ensino da dor como 5° sinal vital reforça a necessidade de mobilização de esforços que contribuam para a elaboração de estratégias para o seu gerenciamento. Nesse sentido, pode-se depreender que a Enfermagem representa importante elemento para esse processo mediante a aplicação de intervenções próprias à ciência do cuidado. Assim, as intervenções de Enfermagem representadas pelo posicionamento, pela comunicação, pela realização de curativos, pela adoção de elementos que favoreçam a criatividade podem ser adotadas como terapias não farmacológicas para o gerenciamento da dor, de acordo com a percepção dos docentes enfermeiros.

  • *
    Recebido da Faculdade Mario Schenberg, Cotia, SP, Brasil.

REFERENCES

  • 1
    International Association Study of Pain (IASP). Charlton EJ. (editor), Core Curriculum for Professional Education in Pain. 3rd ed. Seattle: IASP Press; 2005.
  • 2
    Sociedade Brasileira para Estudos da Dor (SBED). Histórico da SBED. [disponível em www.dor.org.br] .
    » www.dor.org.br
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    Castro AB. Tratamento da dor no Brasil: evolução histórica. Curitiba: Editora Maio; 1999.
  • 4
    Wilkie DK, Ezenwa MO. Pain and symptom management in palliative care and at end of life. Nurs Outlook. 2012;60(6):357-64.
  • 5
    Dalal S, Hui D, Nguyen L, Chacko R, Scotti C, Roberts L, et al. Achievement of personalized pain goal (PPG) in cancer patients referred to a supportive care clinic at a comprehensive cancer center. Cancer. 2012;118(15):3869-77.
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    Santos LM, Ribeiro IS, Santana RC. [Identification and treatment of pain in the premature newborn in the intensive care unit]. Rev Bras Enferm. 2012;65(2):269-75. Portuguese.
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    Romanek FA, Avelar MC. Percepção dos docentes acerca do ensino da dor para graduandos em enfermagem. Rev Eletr Enf. 2013;15(2):463-70.
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    dos Santos DS, de Carvalho EC. [Nursing interventions for the care of patients with arthritis: an integrative review]. Rev Bras Enferm. 2012;65(6):1011-8. Portuguese.
  • 9
    Lira AL, Araújo WM, Souza NT, Frazão CM, Almeida AB. Mapeamento dos cuidados de Enfermagem para pacientes em pós-operatório de cirurgia cardíaca. Rev Rene. 2012;13(5):1171-81.
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    Portella VC, Crossetti MG, Baron DA, Mendes EM,Crippa SP. Fórum em ambiente virtual na relação de confiança entre o profissional e o indivíduo cuidado. Rev Gaúcha Enferm. 2012;33(4):72-8.
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    Palermo TM. Assessment of chronic pain in children: current status and emerging topics, Pain Res Manag. 2009;14(1):21-6.
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    da Luz JH, Martini JG. [Understanding the meaning of being hospitalized in daily lives of children and teenagers with chronic diseases]. Rev Bras Enferm. 2012;65(6):916-21. Portuguese.
  • 13
    Macedo AC, Romanek FA. Gerenciamento da dor no pós-operatório de pacientes com câncer pela enfermagem. Rev Dor. 2013;14(2):1-4.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2014

Histórico

  • Recebido
    01 Abr 2014
  • Aceito
    24 Out 2014
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