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As equações de Hamilton sem transformação de Legendre

Hamilton equations dispensing with Legendre transformation

Resumos

Maxwell, preparando sua abordagem dinâmica ao Eletromagnetismo (Treatise, Vol. II, Part IV, Cap.VI) alcançaa, no capítulo anterior, as equações de Hamilton pelo método das impulsões, que ele atribui a Thomson e Tait. O estado de movimento do sistema é dado em termos das coordenadas generalizadas e dos seus momentos, estes sendo vistos como resultado de impulsões convenientemente aplicadas a partir do repouso e da configuração atual do sistema. Esta abordagem é bem mais física do que a bem rápida baseada na transformação de Legendre e permite ver as equações de Hamilton como prescrevendo as mudanças temporais entre as grandezas de posição e de momento - entendidas como impulsos das forçaas aplicadas - e não como em Lagrange em que só grandezas associadas às massas, posição e velocidade, aparecem.


Maxwell, preparing his dynamical approach to the Electromagnetism (Treatise, Vol. II, Parte IV, Cap.VI), reaches in the previous chapter the Hamilton equations by the impulsive method, attributed by him to Thompson and Tait. The state of motion of the system is given in terms of the generalized coordinates and their momenta, these seen as a result of impulsive forces conveniently applied from rest and from the actual configuration of the system. This approach ismuch more physical than the one provided by thevery rapid one through Legendre transformation and has the merit of allowing us to see the Hamilton equations as prescribing the mutual changes of positions and momenta - let them be understood as impulses of the applied forces - while in Lagrange's method deals only with quantities associated to the masses, position and velocities.


As equações de Hamilton sem transformação de Legendre

Hamilton equations dispensing with Legendre transformation

G.F. Leal Ferreira

guilherm@if.sc.usp.br

Instituto de Física de São Carlos, USP

CP 369, 13560-970, São Carlos, SP

Recebido em 10 de janeiro de 2001. Aceito em 05 de fevereiro de 2001

Maxwell, preparando sua abordagem dinâmica ao Eletromagnetismo (Treatise, Vol. II, Part IV, Cap.VI) alcançaa, no capítulo anterior, as equações de Hamilton pelo método das impulsões, que ele atribui a Thomson e Tait. O estado de movimento do sistema é dado em termos das coordenadas generalizadas e dos seus momentos, estes sendo vistos como resultado de impulsões convenientemente aplicadas a partir do repouso e da configuração atual do sistema. Esta abordagem é bem mais física do que a bem rápida baseada na transformação de Legendre e permite ver as equações de Hamilton como prescrevendo as mudanças temporais entre as grandezas de posição e de momento - entendidas como impulsos das forçaas aplicadas - e não como em Lagrange em que só grandezas associadas às massas, posição e velocidade, aparecem.

Maxwell, preparing his dynamical approach to the Electromagnetism (Treatise, Vol. II, Parte IV, Cap.VI), reaches in the previous chapter the Hamilton equations by the impulsive method, attributed by him to Thompson and Tait. The state of motion of the system is given in terms of the generalized coordinates and their momenta, these seen as a result of impulsive forces conveniently applied from rest and from the actual configuration of the system. This approach ismuch more physical than the one provided by thevery rapid one through Legendre transformation and has the merit of allowing us to see the Hamilton equations as prescribing the mutual changes of positions and momenta - let them be understood as impulses of the applied forces - while in Lagrange's method deals only with quantities associated to the masses, position and velocities.

I Introdução

A passagem da formulação de Lagrange à de Hamilton é, nos dias de hoje, realizada através de transformações de Legendre. Da lagrangeana, expressa em termos das posições qi e suas velocidades , constroi-se a função H, contendo a mesma informação, mas expressa em função dos qi e dos pi, definidos como ¶L. É um caminho rápido, mas que dificilmente consegue dar conteudo físico aos momentos pi e às próprias equações de Hamilton que resultam da transformação. Maxwell, no seu Treatise [1], preparando sua Dynamical Theory of Electromagnetism, que aparece no capítulo 6° da Parte IV do Vol. II, apresenta tratamento, que atribui a Thomson e Tait, em que a energia cinética, inicialmente expressa em termos dos qi e , é agora expressa em termos dos qi e pi, estes sendo definidos como os momentos resultantes de impulsões realizadas a partir de cada configuração qi, do repouso ao estado atual do sistema, com as velocidades . É o que reproduzimos a seguir, com poucas modificações e alguns comentários adicionais. De passagem mencionamos que em sua teoria dinâmica os circuitos elétricos em interação são considerados como um sistema descrito por coordenadas de posição e suas velocidades, enquanto as correntes são descritas por velocidades `elétricas' cujas posições são ignoráveis.

II Os momentos como impulsões

Sejam as equações de Lagrange para as coordenadas generalizadas i do sistema

em que a energia cinética

T, escrita como

T

L, significa a expressão de

T em termos das variáveis lagrangeanas

q

i e

.

Q

i é a força generalizada correspondente à coordenada

q

i e dada em termos das forças

j aplicadas às

j partículas do sistema, com posição

j, como

Quando for evidente a que índice o somatório se refere, ele não será exibido.

A energia cinética é, em geral, uma função quadrática das velocidades

em que os coeficientes

a

i,j são funções das posições

q's e satisfazem a relação

a

i,j(

q) =

a

j,i(

q). Dada uma configuração do sistema, isto é, dadas as coordenadas

q

i, qualquer estado de movimento do mesmo, isto é, qualquer conjunto de valores de velocidades

, pode ser alcançado através de determinadas impulsões (impulsos instantâneos) [2])

j aplicadas às partículas a partir do repouso, naquela configuração. Os valores de

caracterizam, para cada configuração

q

i, um conjunto de impulsões, que levariam o sistema do repouso àquele estado de movimento. Consideremos as impulsões

j perpetradas no tempo

t, ou melhor, entre

t

- e

t

+,

Integrando no tempo a Eq.(1) e tendo em conta a Eq.(4) temos

Vê-se que a contribuição da integral se anula porque, por exemplo,

dt =

dq

i = 0 e a variação máxima das velocidades,

, é finita. Então, os ¶

T

L

adquirem valores específicos

p

i, os momentos, independentes agora da representação inicial lagrangeana. Temos então

Para um dado estado do sistema,

q

i,

, o emprego do 2

o e do 3

o termo da igualdade acima poderia ser usado para se calcular um conjunto de impulsões que levaria o sistema às velocidades desejadas, mas não necessitamos delas para determinar os

p

i, dados pelo 1

o e 3

o termo da Eq.(6). Portanto, o conjunto dos

p

i podem ser usados alternativamente aos

e a Eq.(6) indica como fazê-lo, isto é, invertendo-a com

Embora as impulsões tenham sido usadas para caracterizar fisicamente os momentos pi, e possam ser usadas livremente em deduções (veja, por exemplo, a obtenção da expressão da energia cinética na seção III), os momentos podem agora ser usados como variáveis contínuas no tempo. A substituição dos pelos pj com a Eq.(7) na Eq.(3) forneceria a energia cinética TH em que ela é expressa em termos dos qi e pi. Note-se que TH, em vez de expressar-se só através de grandezas associadas às partículas qi e , usa as variáveis pi associadas às forças, ou aos seus impulsos e as equações de Hamilton vão dizer como se dão as mudanças recíprocas.

III Obtenção da relação ¶THpi = , precursora de ¶Hpi =

Com a representação TH, estados com os mesmos qi mas com variados pi podem ser vistos como resultantes de aplicações de impulsões de magnitudes diferentes. Se a partir da mesma configuração dois conjuntos de impulsões, pi e pi + dpi, são aplicados a partir do repouso, a diferença de energia cinética alcançada é claramente dada por

já que as posições não mudam. Vamos mostrar que

dT também pode ser calculado como

e, então, concluiremos das Eqs.(8) e (9) que

= ¶

T

H

p

i.

Para isto, vamos calcular primeiro a energia cinética comunicada nas impulsões que levam do repouso aos momentos pi através do trabalho W realizado. Este vale

que podemos escrever como

em que

é a média das velocidades durante o impulso e que no caso presente é a metade da velocidade final

. Pela Eq.(11) a energia cinética é então

expressão que, em vista das razões já apresentadas, é válida em geral, isto é, para qualquer tipo de movimento. Agora, das Eqs.(6) e (7), podemos concluir que, em vista da simetria dos coeficientes

a

i,j e

b

i,j, temos

Retornando às impulsões

p

i e

p

i +

dp

i, nas quais as velocidades passam de

a

+

d

, tira-se das Eqs.(12) e (13) que

que comparada à Eq.(8) leva a

que, praticamente, é uma das Equações de Hamilton.

IV Obtenção da outra equação de Hamilton, ¶Hqi=-i

Seguindo [1], lembra-se primeiro que dp = dt e que dq = dt e usando a Eq.(15) temos que

Como

segue da Eq.(16) que

Supondo que o sistema seja conservativo e que, assim, o trabalho elementar das forças

dW

c se expressa através de uma energia potencial

U(

q),

podemos igualar

dT a

dW

c, Eq.(19), e obter

e sendo os

dq

i independentes

em que se definiu a hamiltoniana

H(

q,

p), reconhecida como a energia total do sistema. Como o potencial não depende das velocidades, a Eq.(15) pode ser reescrita como

que é a outra equação de Hamilton.

V Conclusões

Estamos agora convencidos de que na Mecânica de Hamilton, as forças, através de seus impulsos, tornam-se atores principais e não mero coadjuvantes como na de Lagrange. Sabemos também que o movimento contínuo de um sistema pode ser estudado como criado do repouso, na configuração atual, por impulsões, fornecendo um meio alternativo de abordagem.

Agradecimentos

O autor agradece a bolsa de produtividade ao CNPq.

  • [1] J. Clerk Maxwell, A treatise on Electricity and Magnetism, Vol.2, Dover Public., Nova York, 1954, Parte IV, Cap. V.
  • [2] S. W. McCuskey, An Introduction to Advanced Dynamics, Addison-Wesley Publ. Co., Reading, 1959, Cap.  2.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Maio 2011
  • Data do Fascículo
    Jun 2001

Histórico

  • Aceito
    05 Fev 2001
  • Recebido
    10 Jan 2001
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