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Correções da aberração cromática no contexto da óptica geométrica

Corrections of the chromatic aberration in the context of the geometrical optics

Resumos

Neste trabalho apresentamos o fenômeno da aberração cromática e as condições para que seus efeitos sejam mínimos, utilizando um sistema duplo de lentes. Descrevemos, teoricamente, uma situação em que o sistema é composto por duas lentes delgadas e, outra situação, em que as lentes são espessas.

aberração cromática; dubleto de lentes


We discuss in this work the phenomenon of chromatic aberration and the conditions for minimizing their effects, using a double system of lenses. The system is described theoretically when it is composed in one case by thin lenses and in the another one by thick lenses.

chromatic aberration; double lenses


ARTIGOS GERAIS

Correções da aberração cromática no contexto da óptica geométrica

Corrections of the chromatic aberration in the context of the geometrical optics

N. PionórioI; J.J. Rodrigues JrII; A.C. BertuolaI, 1 1 E-mail: acbertuola@gmail.com.

ILaboratório de Física do Semi-Árido, Centro Federal de Educação Tecnológica de Petrolina, Petrolina, PE, Brazil

IIUniversidade Federal do Vale do São Francisco, Juazeiro, BA, Brazil

RESUMO

Neste trabalho apresentamos o fenômeno da aberração cromática e as condições para que seus efeitos sejam mínimos, utilizando um sistema duplo de lentes. Descrevemos, teoricamente, uma situação em que o sistema é composto por duas lentes delgadas e, outra situação, em que as lentes são espessas.

Palavras-chave: aberração cromática, dubleto de lentes.

ABSTRACT

We discuss in this work the phenomenon of chromatic aberration and the conditions for minimizing their effects, using a double system of lenses. The system is described theoretically when it is composed in one case by thin lenses and in the another one by thick lenses.

Keywords: chromatic aberration, double lenses.

1. Introdução

No uso de aparelhos ópticos, tais como microscópio ou telescópio de refração (luneta), foram detectados efeitos que diminuíam a perfeição na formação das imagens. Um desses desconfortáveis efeitos é a denominada aberração cromática, que está associado à luz policromática. No entanto, é possível prever teoricamente as possibilidades de minimização desse efeito, fazendo uso de um sistema composto de duas lentes esféricas convergentes, separadas por uma distância conveniente e previamente conhecida, ou, outro sistema acoplado de duas lentes justapostas. Essas lentes, que constituem tais sistemas ópticos de correção, podem ser delgadas ou espessas. A lente delgada é aquela, na qual a sua espessura pode ser desprezada no contexto dos estudos ópticos. Por outro lado, na lente espessa, a sua largura é relevante para as descrições dos fenômenos ópticos, em um contexto mais realístico.

Nota-se na Fig. 1, que uma lente é um conjunto de dois dióptros esféricos, com seus respectivos raios de curvaturas R1 e R2. No eixo principal, dois focos (F0 - foco objeto, Fi - foco imagem) ficam bem determinados por dois raios de luz monocromáticos de mesmo comprimento de onda. A lente tem uma espessura D medida do vértice V1 ao vértice V2. Dois planos (π12) interceptam perpendicularmente o eixo principal nos pontos H1 e H2. Tais planos2 2 Para uma melhor explicacão apontamos as Refs. [1, 3]. contêm os pontos de intersecções entre os prolongamentos dos raios, incidente e emergente. Neste trabalho, assumiremos que o material da lente é homogêneo,3 3 Para saber mais a respeito do índice de refracão em um meio não homogêneo, vide Ref. [7]. implicando em um único valor pra o índice de refração, para todos os pontos da lente. Em muitas situações a espessura (D) pode ser desprezada, quando comparada com outras distâncias envolvidas no estudo em questão. Caso contrário, essa espessura aparece naturalmente na descrição dos fenômenos estudados.


1.1. Lentes delgadas

Quando se estuda lentes delgadas em um curso de óptica geométrica4 4 Um raio de luz é representado por uma reta. , utiliza-se a famosa equação de Gauss

que é válida na assim chamada aproximação de Gauss [1, 2]. O foco f é o valor da distância focal, p é a distância do objeto (o) à lente e p', a distância da imagem (i) à lente considerada. Todas essas grandezas são medidas em relação ao único vértice (V). Enfatizando que, na idealização em que a espessura é desprezada, os vértices (V1,V2) colapsam para um único ponto e, os planos (π12) funde-se em um só.

A Fig. 2 permite visualizar a existência de dois tipos de lentes delgadas, classificadas quanto as suas capacidades intrínsecas de aproximar, ou afastar, um raio de luz incidente, do eixo principal E1. Inicialmente, o raio incidente e o eixo principal são paralelos entre si, conseqüentemente, são definidos dois tipos de focos (F): o real (Fig. 1a) determinado pelo cruzamento do raio com o eixo principal E1 e, o virtual (Fig. 1b), que é determinado pelo cruzamento do prolongamento do raio emergente, com o eixo principal. Para reconhecer matematicamente o foco real, ou seja, uma lente convergente, um valor positivo é atribuído para a sua respectiva distância focal (f > 0). Caso contrário, quando a distância focal assumir um valor negativo, imediatamente fica subentendido tratar-se de um foco virtual, ou seja, de uma lente delgada divergente. Não é exagerado afirmar que a Eq. (1) ainda continua sendo testada exaustivamente nos laboratórios de física, por alunos e professores envolvidos com as disciplinas básicas e obrigatórias de um curso de física.


Pode-se determinar o índice de refração das duas lentes (I e II), por meio da equação dos fabricantes de lentes

em que R1j e R2j são os raios de curvaturas5 5 Esses valores podem ser obtidos diretamente por meio de um curvímetro. das duas superfícies esféricas de uma lente, reconhecida na Eq. (2) pelo índice j que pode assumir os rótulos (I,II). Nesse caso, para determinar esse índice, é necessário conhecer previamente o valor da distância focal, que pode ser obtida com a equação de Gauss (1).

O conjunto de lentes desenhadas nas Figs. 3a, 3b e 3c, são aquelas que se comportam como lentes convergentes. Nesse caso, as distâncias focais dessas lentes assumem valores positivos, conforme a convenção adotada anteriormente. O conjunto de lentes em 3c, 3d e 3e são divergentes e, as suas respectivas distâncias focais, assumem valores negativos. Nesta Fig. 3 observa-se que, o valor do raio R1 está sempre associado à curvatura da superfície direita das lentes, enquanto que o raio de curvatura R2 corresponde à superfície esquerda. As lentes convergentes, biconvexa e côncavo-convexa, mostradas nas Figs. 3a e 3c, respectivamente, satisfazem as desigualdades R1 < 0 e R2 > 0, para garantir um valor positivo para a distância focal na fórmula dos fabricantes de lentes (2). Com essa mesma idéia, os raios de curvaturas da lente plano-convexa esboçada na Fig. 3b, satisfazem as condições R1 < 0 e R2→ ∞. Os raios de curvatura das lentes divergentes, bicôncava na Fig. 3d e, convexo-côncava na Fig. 3e, satisfazem as desigualdades R1 > 0 e R2 < 0. Os raios de curvatura da lente divergente plano-côncava (Fig. 3f) satisfazem as condições R1→ ∞ e R2 < 0.


Com as regras de sinais convencionadas acima, tendo conhecimento prévio do comportamento dos raios notáveis e, dispondo das equações de Gauss e dos fabricantes de lentes, pode-se dizer que as bases da óptica geométrica ficam estabelecidas e disponíveis para o seu amplo uso neste trabalho. Essas bases são largamente exploradas em um curso de graduação de física. No entanto, o fenômeno da aberração cromática não é muito invocado e, afirmando sem receio, muitas vezes nem ao menos é mencionado, consolidando-se como um tópico desconhecido para muitos estudantes. Pois bem, neste trabalho exploraremos esse fenômeno e suas possíveis correções.

1.2. Lentes espessas

A principal característica dessa lente é a existência de uma distância bem definida entre os planos (π12). Outra característica importante é que, a sua espessura não é desprezada no estudo. Por exemplo, a equação dos fabricantes de lentes (2) para lentes espessas [1, 3], é complementada para incluir essa espessura, conforme a equação

As distâncias focais F0 e Fi são medidas em relação aos planos (π12), respectiva e novamente j = I,II. Os tipos de lentes espessas são mostrados na Fig. 3 e as regras de sinais para os raios de curvatura são as mesmas definidos acima.

Trataremos a seguir das possibilidades teóricas para as correções cromáticas, utilizando sistemas constituídos por dubleto de lentes delgadas e espessas.

2. Aberração cromática

Pelos experimentos realizados por Isaac Newton, sabe-se que a luz branca é composta por várias cores com comprimento de onda característico. Na decomposição da luz branca por um prisma, obtêm-se as cores: vermelho, alaranjado, amarelo, verde, azul, anil e violeta. Essa decomposição pode ser flagrada na natureza, no maravilhoso fenômeno do arco-íris.

A Fig. 4 exibe uma foto de um arco-íris formado, entre as nuvens, no céu do semi-árido nordestino. No centro, obviamente, está o Sol a pino e, na periferia do halo, formou-se o arco-íris circular fotografado. Esse espetáculo natural foi oferecido gratuitamente para qualquer expectador.


A aberração cromática de uma imagem emerge da decomposição da luz branca, ou melhor, pelo fato dos materiais, com os quais são confeccionadas as lentes, apresentarem dispersão óptica, ou seja, o valor do seu índice de refração é diferente para cada comprimento de onda [1, 2, 4]. Assim, os raios de luz sofrem desvios diferentes ao atravessarem as lentes e então, determinam seus respectivos focos em posições diferentes no eixo principal E1, para cada comprimento de onda.

A Fig. 5 mostra a formação dos focos no eixo principal [1], para duas cores de luz: vermelho (FR) e violeta (FV). É nessa situação que a distância entre dois focos é a maior possível [5, 6]. Para essas duas cores ocorrem, o menor desvio (ΔR) para o raio de luz vermelho e, o maior desvio (ΔV) para o raio de luz violeta.


3. Correções para as aberrações cromáticas

Existem, pelo menos, duas maneiras de minimizar os efeitos das aberrações cromáticas, usando dois sistemas ópticos compostos por duas lentes (dubleto) acopladas. A seguir, são reveladas essas possibilidades.

3.1. Dubleto de lentes convergentes delgadas separadas

Nessa situação, tendo em vista o sistema da Fig. 5, insere-se entre a lente delgada convergente e o foco FV, outra lente delgada convergente, separadas por uma distância d, como pode ser conferido no desenho menor da figura.

A Fig. 6 mostra a lente corretora LII cuja principal função é aproximar os focos dos raios de luz monocromáticos vermelho e violeta, diminuindo o efeito da aberração cromática. Nesse caso, o raio de luz vermelho incidi, convenientemente, na direção do centro de curvatura da superfície esquerda da lente corretora e, atravessa essa superfície sem sofrer desvio. Confirmando-se geometricamente, de acordo com a Fig. 6, a possibilidade de uma correção para aberração cromática, coloca-se a seguinte pergunta:


• Qual a distância d entre as lentes do dubleto6 6 Substitui-se uma lente convergente por duas lentes convergentes, dispostas simetricamente em relacão à posicão anterior da lente substituída. , para que se tenha a mínima distância entre os focos, que são determinados pelos raios vermelho e violeta?

A resposta para esta pergunta corresponde a uma tentativa de minimizar as aberrações cromáticas, usando um dubleto de lentes delgadas7 7 Nessa situacão, a distância d entre as lentes é bem maior que as espessuras das lentes do sistema. convergentes. Para esse sistema óptico de duas lentes acopladas paralelamente e, ambas perpendiculares ao eixo principal, a distância focal resultante é dada pela equação

em que fI e fII são as respectivas distâncias focais das lentes I e II que formam o dubleto, para uma determinada luz monocromática. Salienta-se que, as distâncias focais de cada lente do dubleto e a distância focal do sistema dubleto, são funções do comprimento de onda da luz monocromática incidente. Derivando ambos os membros da Eq. (4) em relação ao comprimento de onda, usando a regra da cadeia para introduzir os índices de refrações (nI,nII) e impondo a condição df/dλ = 0, o resultado obtido é

É possível realizar uma transformação de variáveis: (R1j,R2j) → (αj,Rj) , definida pelas equações

em que αj > 0 e Rj > 0. Observa-se que, o uso simultâneo dos dois valores dos raios de curvatura da lente foi abandonado, para se trabalhar apenas com o valor de um deles e a razão entre eles. Essa transformação de variáveis respeita as convenções de sinais para as lentes convergentes discutidas anteriormente. Levando em consideração as igualdades na Eq. (6), a equação dos fabricantes de lentes (2) para lente Lj é reescrita na forma

Nota-se que dados os valores para os raios de curvatura, o valor de aj fica imediatamente estabelecido. No limite em que αj→ 1, a lente é biconvexa simétrica. Derivando a Eq. (7) em relação ao índice de refração nj, chega-se na equação

Isolando Rj na Eq. (7), e a seguir substituindo na Eq. (8), o resultado é

Substituindo a Eq. (9) na Eq. (5) e, a seguir, integrando em relação ao índice de refração tem-se

Para efetuar as integrações da Eq. (10), recorre-se a uma análise física, guiada pelo gráfico mostrado na figura a seguir.

A região dos comprimentos de onda do espectro da luz visível está bem destacada no gráfico da Fig. 7. Observa-se que, nessa região, os índices de refração de vários materiais sofrem pequenas variações. Por uma observação direta na Fig. 7, constata-se a possibilidade em adotar o índice de refração associado a luz amarela, como um índice de refração médio. Dessa maneira, usando o teorema do valor médio, nas duas integrais que aparecem na Eq. (10), resulta


Tendo em vista a Eq. (11), define-se a quantidade

em que δj é denominado potência dispersiva, relacionando os índices de refração que aparecem naturalmente na Eq. (11). Lembrando novamente que, j = I ou j = II. Da Eq. (11), obtém-se a distância d que minimiza os efeitos das dispersões, cujo valor é

Existe a possibilidade de utilizar um dubleto constituído por duas lentes de mesmo índice de refração, conduzindo o valor de d para a forma mais simples

O tratamento dado tem um cunho geral, não pressupondo de antemão, os mesmos valores para os raios de curvatura das superfícies de cada lente do sistema. O valor para a distância d estabelecido na Eq. (13) (ou em (14)), é aquela em que o sistema dubleto minimiza a dispersão óptica da luz, ou seja, aproxima os focos determinados respectivamente pelos raios de luz violeta (fV) e vermelho (fR), minimizando a distância entre eles. A distância entre esses focos, Δf = fR - fV, ou melhor dizendo, a variação focal Δf, pode ser obtida por meio da Eq. (4) e, o resultado é a equação

O valor mínimo de |Δf| pode ser visualizado por meio de um gráfico, por exemplo, como este da figura a seguir.

Os valores para os índices de refração, mostrados na Fig. 8, válidos para as duas lentes, foram colhidos diretamente na periferia da faixa em destaque na Fig. 7. O material das lentes é o vidro "crown" de silicato de boro. O valor do raio (R = 7,5 cm) foi fixado e adotado para ambas as lentes, de forma que estas fossem biconvexas. O fato das duas lentes serem iguais, simplifica ainda mais a Eq. (14) e, portanto, o valor ideal para a distância entre as lentes coincide com a distância focal determinada por um raio de luz de comprimento de onda na faixa da cor amarela. O valor para a distância ideal (dmín = 7,239 cm) entre as lentes foi obtido diretamente neste gráfico.8 8 Para ser mais preciso, o valor mínimo de d foi obtido diretamente do programa confeccionado para desenhar este gráfico. Por outor lado, para testar de forma rápida a validade da condição estabelecida em (14), utiliza-se o valor n = 1,518 que corresponde a um comprimento de onda de luz na faixa do amarelo (≈ 470 nm). Nesse caso, calculando as distâncias focais para as duas lentes biconvexas por meio da Eq. (7) e, depois, substituindo os valores obtidos na condição (14), obtém-se o mesmo valor para a distância ideal (dmín) entre as lentes, até a terceira casa decimal pelo menos. A condição (14) corresponde a um valor mágico que minimiza a aberração cromática. Nesse caso, para as lentes delgadas separadas exatamente por essa distância, eliminam completamente essa aberração, já que a distância ideal entre os focos se anula.9 9 Geralmente nos livros-textos [1], obtém-se essa condicão adotando a priori o valor nulo para a distância entre os focos. Essa abordagem simplifica a forma de se obter a condicão (13). No entanto, o foco das lentes para a luz amarela é introduzido de uma forma ad hoc, enquanto que neste trabalho emerge diretamente do teorema do valor médio para a integral.


3.2. Dubleto de lentes delgadas justapostas

Nesta seção, discute-se a possibilidade de uma correção para aberração cromática, utilizando um sistema dubleto de lentes justapostas, uma convergente e outra divergente. Inicialmente adotam-se as condições em que, o sistema ainda possa ser reduzido as mesmas condições das lentes delgadas. No entanto, para complementar essa atitude, realiza-se uma investigação mais realística, na qual as lentes não mais sejam consideradas delgadas, migrando para um estudo de um dubleto de lentes espessas.

A Fig. 9, construída com régua e compasso, mostra um par de lentes justapostas "coladas", em que a curvatura de uma face da lente convergente, coincide com a curvatura de uma das faces da lente divergente corretora.


É relevante exibir os tipos de acoplamentos que podem ser considerados, quando se trata de acoplamentos de lentes justapostas.

A Fig. 10 mostra as três formas de acoplamentos [1] entre uma lente convergente e, outra lente divergente corretora. O acoplamento (i) é aquele em que, a curvatura da superfície direita da lente convergente coincide com a curvatura da superfície esquerda da lente divergente. Nesse caso, as superfícies se tocam em todos os pontos, mantendo-se "coladas". Nesse tipo de acoplamento, aparecem dois índices de refração. No acoplamento (ii) os contatos são periféricos enquanto que, em (iii) o acoplamento é do tipo central. Nestes dois últimos acoplamentos, não bastam dois índices de refração, pois apresentam lacunas em algumas regiões entre as lentes.


Se um sistema de lentes justapostas ainda estiver inserido naquelas condições válidas para as lentes delgadas, todo tratamento teórico realizado anteriormente, para um sistema dubleto de lentes delgadas convergentes e separadas, podem ser aproveitadas no limite em que a distância entre as lentes tende para zero. Por exemplo, no limite d → 0, a Eq. (4) que, permite calcular a distância focal do sistema dubleto, é simplificada para a forma

Pode-se, neste momento, derivar a Eq. (16) em relação ao comprimento de onda, ou então, tomar o limite d → 0 na Eq. (5), cujos resultados culminam na mesma equação

A primeira lente LI é convergente e, a transformação de variáveis mais conveniente é dada por (R1I,R2I) → (β,R). A segunda lente corretora LII é divergente e, a transformação de variáveis que será realizada é (R1II,R2II) → (γ,R) . Nesse caso, assumiu-se que a segunda lente está "colada" à primeira. As características das lentes que constituem o sistema dubleto estão contidas na Tabela 1.

Ressaltam-se as seguintes condições: β > 0, γ > 0 e R > 0. Substituindo essas novas variáveis na Eq. (2), dos fabricantes de lentes, o resultado é escrito na forma

Derivando a Eq. (18) em relação ao índice de refração e, usando essa própria equação, obtém-se como resultado a equação

Analogamente, substituindo os valores de LII contidos na tabela acima, diretamente na Eq. (2), o resultado é dado por

Derivando a Eq. (20) e usando a própria igualdade, chega-se a igualdade matemática

Substituindo as Eqs. (19) e (21) na Eq. (17) e, efetuando as integrações usando novamente o teorema do valor médio, o resultado obtido é

Esta condição para a correção da aberração cromática, poderia ter sido obtido de uma maneira mais simples, bastava reconhecê-la como o resultado limite em que d → 0 na Eq. (13).

3.3. Lentes espessas

O acoplamento de duas lentes espessas difere do acoplamento de lentes delgadas, já estudado na seção anterior. A novidade é que, as espessuras das lentes do sistema são parâmetros de muita relevância, para os cálculos que determinam as condições para a correção da aberração cromática. As Eqs. (4) e (16) continuam válidas para os sistemas constituídos de lentes espessas.

3.3.1. Dubleto de lentes espessas justapostas

Usando os valores contidos na Tabela 1, para os raios de curvatura da lente espessa biconvexa LI, a equação dos fabricantes de lentes (3) assume a forma

Para isolar o raio de curvatura R é necessário completar o quadrado perfeito, no colchete do segundo membro da equação anterior (23). Procedendo com os cálculos algébricos obtém-se a equação

Naturalmente que o raio de curvatura assume apenas um valor, logo, existe a necessidade de se decidir a respeito do sinal da raiz na Eq. (24). Adiantamos que o sinal negativo é aquele em que a Eq. (24) determina o valor correto para o raio de curvatura R. De fato, expandindo a raiz em série de Taylor10 10 até o termo de primeira ordem em e, considerando o sinal negativo, o resultado é

No limite em que DI → 0, recupera-se a Eq. (18) válida para a lente delgada biconvexa. O valor do raio de curvatura é agora calculado corretamente por meio da equação11 11 Se o foco não se forma no interior da lente então nIfI > DI, garantindo a existência da raiz no campo dos números reais.

Para a segunda lente espessa bicôncava, a distância focal é calculada por meio da equação

Nessa equação, os valores da tabela foram usados na equação dos fabricantes de lentes (3). Novamente, completando o quadrado perfeito dentro do colchete no segundo membro da Eq. (27), o raio de curvatura é calculado por

A decisão a respeito do sinal da raiz é imediata, basta considerar a condição R > 0. Assim sendo, tem-se

Para confirmar esse resultado, lança-se a uma análise análoga àquela que foi realizada para a lente LI, passando por uma expansão da raiz e tomando o limite DII → 0. De fato, expandindo a raiz no colchete da Eq. (29) em série de Taylor, o resultado é a equação12 12 As Eqs. (26) e (29) podem ser comparadas e assim, obtém-se uma condicão que caracteriza o acoplamento de lentes justapostas "coladas":

Derivando a Eq. (23) em relação ao índice de refração nI e usando a Eq. (26), obtém-se

Se as raízes na Eq. (31) forem expandidas em série de Taylor e considerando apenas os termos até a primeira ordem em , resulta

Caso o limite DI → 0 seja considerado, recupera-se a Eq. (19), válida para as lentes delgadas.

Da mesma maneira, derivando a Eq. (27) e levando em consideração a Eq. (28), obtém-se

Expandindo as raízes em série de Taylor e, considerando termos até primeira ordem em , o resultado obtido é dado por

No limite em que DII → 0 a Eq. (34) se reduz à Eq. (21), válida para as lentes delgadas.

As Eqs. (31) e (33) podem ser substituídas na Eq. (17) e, em seguida, seus dois termos podem ser integrados no intervalo do espectro de luz visível. Efetuando tais integrações utilizando o teorema do valor médio, obtém-se uma verdadeira, mas volumosa equação que não oferece nenhuma praticidade de trabalho. Por outro lado, a versão aproximada é muito mais vantajosa pela utilidade que se pode dar no estudo dos limites e, pela sua sintética expressão analítica. De fato, substituindo as Eqs. (32) e (34) na Eq. (17), integrando no espectro visível, usando o teorema do valor médio e utilizando a definição da Eq. (12), o resultado é

No limite em que DI → 0 e DII → 0, a Eq. (35) assume a mesma forma matemática da Eq. (22), válida para um acoplamento de lentes delgadas. A condição (35) obtida imediatamente acima, minimiza o efeito da aberração cromática por meio do dubleto de lentes espessas justapostas.

3.3.2. Dubleto de lentes convergentes espessas separadas

O sistema óptico usado é constituído por duas lentes convergentes espessas, separadas por certa distância d. O procedimento nesta seção, segue nos moldes daqueles desenvolvidos anteriormente, no estudo sobre o sistema dubleto de lentes convergentes delgadas. O que de fato muda é o uso da equação dos fabricantes de lentes para a lente espessa (3). Para a primeira lente tal equação é escrita na forma

Para a segunda lente corretora, a distância focal tem a forma análoga à equação anterior, conforme a equação

As duas Eqs. (36) e (37) são usadas para se chegar a duas expressões, ambas semelhantes à Eq. (32). Estas são substituídas na Eq. (5) que é integrada nas mesmas condições que foram realizadas na Eq. (10). Usando novamente o teorema do valor médio para efetuar as integrações, chega-se a condição

na qual definiu-se

e também

A condição estabelecida na Eq. (38) é aquela em que a aberração cromática é minimizada por meio de lentes espessas convergentes, separadas por uma conveniente distância entre elas. Para cada espessura existe uma distância específica correspondente na qual a variação focal (|Δf| ) é mínima, conforme é exemplificado na figura a seguir.

Os gráficos mostrados na Fig. 11 foram desenhados por meio da Eq. (15) e das Eqs. (36) e (37). As condições são as mesmas daquelas utilizadas para confeccionar o gráfico na Fig. 8, ou seja, um par de lentes convergentes idênticas. A distância ideal em que a variação focal é minimizada depende da espessura (e) das lentes utilizadas. A tabela a seguir contém aquele valor para o índice de refração que, quando substituídos na condição (38) obtém-se as respectivas distâncias ideais entre as lentes, conforme a espessura das lentes.


A Tabela 2 mostra claramente que a distância ideal entre as lentes se modifica conforme a espessura. Esses resultados concordam com que se constata visualizando a Fig. 11, no que se refere aos valores "mágicos" de d que anulam a variação focal. Os valores para os índices de refração coincidem até a terceira casa decimal e, estão na faixa do comprimento de onda amarelo.

Para verificar a influência da espessura das lentes, considera-se a seguir o mesmo sistema dubleto utilizado para construir o gráfico da Fig. 8. A distância entre as lentes é aquela ideal usada para eliminar os efeitos da aberração cromática, quando as lentes são consideradas delgadas (dmín). Nessas condições, estuda-se a variação da distância focal em função da espessura das lentes, por meio das Eqs. (36), (37) e (4). O resultado é exibido graficamente na Fig. 12.


Pelo comportamento desse gráfico, observa-se que a variação da distância focal só se anula quando as lentes tiverem espessuras nulas. Nesse caso, quando as lentes forem espessas, a variação focal mínima não assumirá o valor nulo, na condição em que a distância ideal seja aquela válida para as lentes delgadas.

4. Conclusão

O fenômeno da aberração cromática pode ser corrigido com dois sistemas de lentes acopladas. O primeiro sistema é constituído de duas lentes convergentes separadas por uma distância conveniente. O outro sistema é constituído por uma lente convergente e outra divergente, justapostas "coladas". Tais sistemas podem ter um comportamento de uma lente delgada, ou, de forma mais realística, devem ser considerado como um sistema de lentes espessas. Nesse caso, as espessuras das lentes são relevantes para as possíveis correções da aberração cromática.

Agradecimentos

Pionório e Bertuola agradecem a FACEPE e a Diretoria de Pesquisa do CEFET Petrolina. Rodrigues Jr. agradece a FACEPE e ao CNPq. Os autores agradecem ao árbitro por suas valiosas sugestões.

Recebido em 22/1/2008; Aceito em 15/5/2008; Publicado em 8/10/2008

Esta equacão foi obtida sem nenhuma restricão quanto aos valores dos índices de refracão. A condicão para minimizacão da aberracão cromática, que será apresentada mais adiante, satisfaz automaticamente essa equacão, pois utiliza os valores contidos na tabela que já pressupõem esse tipo de acoplamento.

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  • 1
    E-mail:
  • 2
    Para uma melhor explicacão apontamos as Refs. [1, 3].
  • 3
    Para saber mais a respeito do índice de refracão em um meio não homogêneo, vide Ref. [7].
  • 4
    Um raio de luz é representado por uma reta.
  • 5
    Esses valores podem ser obtidos diretamente por meio de um curvímetro.
  • 6
    Substitui-se uma lente convergente por duas lentes convergentes, dispostas simetricamente em relacão à posicão anterior da lente substituída.
  • 7
    Nessa situacão, a distância
    d entre as lentes é bem maior que as espessuras das lentes do sistema.
  • 8
    Para ser mais preciso, o valor mínimo de
    d foi obtido diretamente do programa confeccionado para desenhar este gráfico.
  • 9
    Geralmente nos livros-textos [1], obtém-se essa condicão adotando a priori o valor nulo para a distância entre os focos. Essa abordagem simplifica a forma de se obter a condicão (13). No entanto, o foco das lentes para a luz amarela é introduzido de uma forma
    ad hoc, enquanto que neste trabalho emerge diretamente do teorema do valor médio para a integral.
  • 10
  • 11
    Se o foco não se forma no interior da lente então
    nIfI >
    DI, garantindo a existência da raiz no campo dos números reais.
  • 12
    As Eqs. (26) e (29) podem ser comparadas e assim, obtém-se uma condicão que caracteriza o acoplamento de lentes justapostas "coladas":
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Out 2008
    • Data do Fascículo
      Set 2008

    Histórico

    • Recebido
      22 Jan 2008
    • Aceito
      15 Maio 2008
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