Acessibilidade / Reportar erro

O experimento de Stern-Gerlach e o spin do elétron: um exemplo de quasi-história

The Stern-Gerlach experiment and the electron spin: a quasi history example

Resumos

Nossa proposta neste trabalho é utilizar o conceito de quasi-história como perspectiva de análise para a forma de apresentação didática de conteúdos de física. Pretendemos mostrar as transformações sofridas pelo conhecimento, desde os primeiros registros até a forma como ele aparece nos livros didáticos. O conteúdo a ser trabalhado é o experimento de Stern-Gerlach, geralmente associado à descoberta do spin do elétron, e que desempenhou um importante papel no desenvolvimento da teoria quântica no século XX. Analisando os trabalhos originais e utilizando alguns fatos da história da ciência, discutiremos as modificações sofridas por este conteúdo até a forma em que ele é apresentado nos livros didáticos utilizados nos cursos de graduação em física e engenharias.

experimento de Stern-Gerlach; spin do elétron; quasi-história


The aim of this work is to use the concept of quasi history to analyze the form of didactical presentation of the physics contents. We intend to stress the changes made to the knowledge, since the first records by the way it appears in textbooks. The content to work is the experiment of Stern-Gerlach, usually associated with the discovery of the electron spin, and which played an important role in the development of quantum theory in the twentieth century. Analyzing the original work and using some facts of history of science, we will discuss the modifications made by this content to the form in which it is presented in textbooks used in graduate courses in physics and engineering.

Stern-Gerlach experiment; electron spin; quasi-history


HISTÓRIA DA FÍSICA E CIÊNCIAS AFINS

O experimento de Stern-Gerlach e o spin do elétron: um exemplo de quasi-história

The Stern-Gerlach experiment and the electron spin: a quasi history example

Gerson G. GomesI,1 1 E-mail: gerson.gomes@ifsc.edu.br. ; Maurício PietrocolaII

IInstituto Federal de Santa Catarina, Campus Araranguá, Araranguá, SC, Brasil

IIFaculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil

RESUMO

Nossa proposta neste trabalho é utilizar o conceito de quasi-história como perspectiva de análise para a forma de apresentação didática de conteúdos de física. Pretendemos mostrar as transformações sofridas pelo conhecimento, desde os primeiros registros até a forma como ele aparece nos livros didáticos. O conteúdo a ser trabalhado é o experimento de Stern-Gerlach, geralmente associado à descoberta do spin do elétron, e que desempenhou um importante papel no desenvolvimento da teoria quântica no século XX. Analisando os trabalhos originais e utilizando alguns fatos da história da ciência, discutiremos as modificações sofridas por este conteúdo até a forma em que ele é apresentado nos livros didáticos utilizados nos cursos de graduação em física e engenharias.

Palavras-chave: experimento de Stern-Gerlach, spin do elétron, quasi-história.

ABSTRACT

The aim of this work is to use the concept of quasi history to analyze the form of didactical presentation of the physics contents. We intend to stress the changes made to the knowledge, since the first records by the way it appears in textbooks. The content to work is the experiment of Stern-Gerlach, usually associated with the discovery of the electron spin, and which played an important role in the development of quantum theory in the twentieth century. Analyzing the original work and using some facts of history of science, we will discuss the modifications made by this content to the form in which it is presented in textbooks used in graduate courses in physics and engineering.

Keywords: Stern-Gerlach experiment, electron spin, quasi-history.

1. Os livros didáticos e a pesquisa em ensino de ciências

Livros didáticos são inegavelmente um dos principais recursos didáticos utilizados nas atividades de ensino-aprendizagem. Por conta deste importante papel que desempenha na educação em geral, muitas pesquisas têm se interessado em estudar os seus usos e impacto na aprendizagem. Encontramos na literatura recente da área uma grande quantidade de pesquisas a ele relacionadas. Uma busca na base de dados ERIC limitada aos livros didáticos de ciência ofereceu para os anos de 2008/2009 onze trabalhos em revistas de língua inglesa e de circulação internacional. Em um deles, a difusão e acessibilidade dos meios digitais parece lançar um desafio a esta hegemonia dos livros na atividade didática [1]. Em outros, embora questionado e sofrendo concorrência de outros meios, principalmente o digital [1], continua majoritário como instrumento de professores e alunos [2]. Ainda na relação entre professor e livro didático, Smolkin [3] analisou a frequência de explicações presentes em livros didáticos e nas falas de professores para mostrar que ambos se assemelham, embora os livros de ciências físicas façam mais uso de explicações do que aqueles de ciências da vida. A imagem da ciência inferida a partir das narrativas em livros didáticos foi também objeto de estudo. Irez [4] analisando livros de ciências turcos detectou falhas graves nas concepções transmitidas pelos mesmos.

Um particular interesse tem sido dado à forma como os livros didáticos apresentam os conceitos leis e princípios cientficos. Niaz [5] produziu uma análise de como conceitos relacionados à forma como os números quânticos aparecem em livros de química, buscando classificá-los em cinco categorias, das apresentações menos fundamentadas - 1, às mais fundamentadas - 5. Izquierdo-Aymerich e Aduriz-Bravo [6] analisaram livros didáticos de química da primeira metade do século XX buscando identificar a evolução sobre as explicações de átomo. O presente trabalho se localiza nesta linha de pesquisa, procurando analisar como o conceito de spin é apresentado em livros didáticos de física universitária básica. Nossa análise tomará como fonte de comparação o desenvolvimento histórico deste conteúdo e procurará mostrar que a maioria dos autores opta por relatos que visam aumentar a credibilidade dos conteúdos e por um reforço de uma racionalidade "passada a limpo".

2. Livros didáticos e paradigmas e a vigilância epistemológica

Embora os livros didáticos em geral tenham papel importante no ensino em geral, na área de ciências desempenham um papel peculiar. Desde o final do século XVIII2 2 Sobre a história dos livros didáticos de física no Brasil, ver [7]. organizaram-se como coletâneas consensuais de conhecimentos para a formação de futuros cientistas. Sua difusão e uso a partir deste período fizeram com que pouco a pouco cessasse o uso educacional de textos originais. Kuhn considera a emergência dos livros didáticos em ciências como decorrente de uma característica epistemológica do conhecimento que ela encerra [8]; seria para ele um emblema do caráter paradigmático das ciências experimentais. Em suas palavras [8],

Talvez a característica mais extraordinária da educação científica, característica que é levada a um ponto desconhecido noutros campos de atividade criativa, seja a de se fazerem com manuais [livros didáticos], obras escritas especialmente para estudantes... Aparentemente os cientistas estão de acordo sobre o que é que cada estudante deve saber da matéria. Essa é a razão que explica por que, na preparação de um currículo pré-profissional, eles podem usar manuais em vez duma combinação eclética de originais de investigação...

Na França de meados do século XIX existiam livros didáticos de física como Cours de l'Ecole Polytechnique, em 4 volumes, de J. Jamin [9], o Traité Elementaire de Physique – Expérimentale et Appliquée et de Météorologie de A. Ganot [10] e o Leçons d'Optique Physique, em 2 volumes, de E. Verdet [11]. O livro de Ganot foi traduzido para várias línguas e teve dezenas de edições, sendo referência no Colégio Pedro II até 1898 [12]. Influenciou também autores e colaborou para a consolidação de uma tradição de livros brasileiros do início do século XX [13, 14]. A mútua influência que os autores de livros exercem uns sobre os outros reforça e garante o consenso entre os cientistas.3 3 Vale dizer que o consenso não se estabelece da mesma maneira em todas as áreas das ciências experimentais. Em física e química o consenso é maior que em biologia. Num determinado momento histórico os livros assemelhamse muito, independente de autores, editoras e países de origem, como podem testemunhar professores de física com alguma experiência didática [8].

O consenso existente entre os cientistas e materializado nos livros didáticos não autoriza, no entanto, a considerá-los como fiéis representantes da área de pesquisa à qual se referem. Por mais que tentem se manter próximos ao contexto original da ciência, tais livros são produções didáticas inseridas num projeto educacional específico. Isso significa que ao contexto epistemológico original da ciência de referência, adicionam-se as características e necessidades próprias do sistema de ensino ao qual se destinam. Chevallard deixa claro este ponto ao mostrar como os saberes escolares são fruto de um processo que ele denomina de "transposição didática", que transforma os saberes sábios4 4 Vale destacar que Chevallard prefere a denominação em francês "savoir" ao invés de "connaissance" e savant ao invés de científico [15, 16]. Como em português temos a possibilidade destas duas palavras, usaremos a denominação "saber sábio", mais próxima do original em francês (todas as traduções neste artigo são dos autores -ver agradecimentos no final). [15]:

Um conteúdo de saber que tenha sido designado como saber a ensinar, sofre [...] um conjunto de transformações adaptativas que vão torná-lo apto para ocupar um lugar entre os objetos de ensino. O 'trabalho' que transforma um objeto de saber a ensinar em um objeto de ensino, é denominado transposição didática.

Ou ainda [16],

O conhecimento não é um dado... ele é construído, e transformado, e – essa foi a palavra-chave – transposto. O golpe foi duplo. Para algumas pessoas, especial-mente para professores, a afirmação era uma ameaça para a crença inconsciente de que o mundo do conhecimento era, por assim dizer, homogêneo, isotrópico e indefinidamente imaculado-portanto, inquestionável.

Longe de constituir-se em uma crítica absoluta, afirmar a diferenciação dos saberes escolares dos saberes sábios deve ser vista como um alerta frente a um consenso muito forte. Em um trabalho recente, Brockington e Pietrocola [17] mostraram como os saberes físicos escolares se transformam e se adaptam ao contexto didático ao qual se destinam. Essa transformação e adaptação são sujeitas a erros, simplificações abusivas, enganos e distorções. Em trabalho já clássico, Whitaker [18] analisa a forma como os livros didáticos apresentam as origens de leis e conceitos da física. Ele mostrou que muitos livros justificam o aparecimento de conteúdos físicos por meio de contextos históricos fantasiosos, supostamente mais convincentes para os alunos. Abordando vários episódios, mostra como fórmulas e conceitos físicos se conectam com resultados experimentais e interpretações que tendem a reforçar o caráter lógico da área. Usando o apoio de estudos históricos, Whitaker mostra que a quase-história é [18]

O resultado de um grande número de livros cujos autores sentiram a necessidade de dar vida ao relato de episódios com um pouco de fundo histórico, mas que, de fato, acabavam reescrevendo a história, de tal forma que ela segue lado a lado com a física. Porque a descrição da física é lógica e ordenada. A impressão dada é necessariamente essa, uma vez que esta foi também a maneira com que as idéias surgiram historicamente.

Um dos casos analisados é a apresentação da formulação da radiação envolvendo Rayleigh, Jeans e Planck. Aqui, Whitaker mostra que o descaminho na construção do saber escolar se dá pelo fato da ordem lógica embutida no relato didático ser muitas vezes contrária à ordem cronológica revelada pela análise histórica. Apoiado no trabalho de Jammer (apud [18]) e de outros historiadores, Whitaker mostra que Planck propõe sua lei da equipartição da energia antes de tomar conhecimento da expressão de Rayleigh que supostamente causava problema àinterpretação clássica. "Esta suposta submissão do relato histórico a propósitos didáticos que visam reforçar a racionalidade interna da ciência" é definida por Whitaker como quasi-história.5 5 Embora estabeleça alguma relação com a pseudo-história discutida por Klein [19], Whitaker faz questão de diferenciar ambas.

Allchin [20, 21] destaca que é constante o uso da história da ciência com objetivos didáticos que acabam por distorcer os fatos históricos. A exemplo de Klein [19], Allchin refere-se a este tipo de relato como pseudohistória. Em uma de suas análises ele mostra como muitos relatos de livros didáticos se assemelham à estrutura de "romances" onde se constrói um cenário para que um personagem desempenhe o papel de protagonista da história [21].

Neste sentido vários autores [20-22] acabam por indicar a necessidade conhecer algumas/várias dessas distorções históricas (talvez as mais comuns) para ser capaz de reconhecer os indícios de pseudo-história. Tratando as distorções, incongruências e outras características que tornam o saber escolar incompatível com os saberes sábios tomados como referência, Chevallard chama atenção para a necessidade dos educadores em geral, e dos professores em particular, se manterem atentos, exercendo uma vigilância epistemológica. Em suas palavras [16]:

[...] uma ferramenta que permite revisar, eliminar, questionar evidências, duvidar de idéias simples, abandonar familiaridades e, conseqüentemente, aspectos enganosos do seu objeto de estudo. Em uma palavra, é o que permite exercer sua vigilância epistemológica. (grifo nosso)

Neste trabalho nos propomos a um exercício de vi-gilância epistemológica nos termos de Chevallard, visando oferecer aos educadores em ciências meios de detectar a pseudo-história, ou seja, relatos didáticos históricos que comprometem a percepção que estudantes terão sobre a ciência. Aqui tomamos um conceito muito caro aos físicos: o spin. A história da ciência será usada como ferramenta de análise capaz de revelar descaminhos, erros, enganos e distorções.

2.1. Spin e os livros

De maneira geral, o conceito de spin aparece no universo escolar na disciplina de química no Ensino Médio, quando do estudo da distribuição eletrônica nos átomos. Mas é no ensino universitário básico que o spin é estudado de modo um pouco mais aprofundado. Para aqueles que seguem aos cursos universitários nas áreas de "ciências experimentais e engenharia", este conceito reaparece ao final do ciclo básico no estudo, costumeiramente chamado "introdução à física moderna". Para os estudantes que até ali chegam, e até mesmo para a maioria dos docentes desses cursos, esse conceito se associa a uma experiência que supostamente "provou" a sua existência: o experimento de Stern-Gerlach (SG). Ele foi proposto pelo físico alemão Otto Stern em 1921 e realizada, em conjunto com outro físico alemão, Walther Gerlach, entre 1921 e 1922.

Uma forma de avaliar a importância deste experimento no desenvolvimento da teoria quântica no século XX pode ser aferida analisando a apresentação de um consagrado livro didático de mecânica quântica [23]. Bastante popular entre os estudantes e professores, este livro é muito utilizado nos cursos de graduação e pósgraduação em física. Logo na primeira página o au-tor adverte que, ao invés de seguir uma abordagem histórica, prefere iniciar a apresentação da mecânica quântica por um exemplo que ilustra, talvez mais do que qualquer outro, a inadequação dos conceitos clássicos. Ele pretende submeter o leitor a um tratamento de choque, para que este perceba, desde o início, o que significa a maneira quântica de pensar. O exemplo escolhido para realizar o suposto tratamento de choque é justa-mente o experimento de SG que, para o autor, [23]

...ilustra de maneira dramática a necessidade de abandono radical dos conceitos da mecânica clássica.

O experimento de SG consiste em fazer um feixe de átomos (originalmente átomos de prata) passar por um campo magnético não-homogêneo produzido por um ímã, e analisar a deposição desses átomos em uma placa coletora na saída do ímã - ver Fig. 1. Curiosamente, observa-se que aproximadamente metade dos átomos deposita-se numa extremidade da placa e a outra metade na posição simetricamente oposta, não se registrando praticamente nenhum átomo em qualquer posição intermediária. Do ponto de vista da física clássica, esta divisão do feixe em duas componentes é bastante estranha e difícil de explicar. À época do experimento, no início da década de 1920, a teoria quântica estava num estágio ainda incipiente, num período que hoje chamamos de " velha mecânica quântica" . O que havia de mais sofisticado era, talvez, o modelo atômico de Bohr, aperfeiçoado por Sommerfeld, mas que carecia ainda de " boas" comprovações experimentais. É justamente atrás destas comprovações que estava Otto Stern em 1921 quando propôs o experimento de que iremos tratar neste trabalho.


3. O experimento de Stern-Gerlach e seu contexto histórico

Vamos agora apresentar um pouco da história do experimento de SG, contextualizando os trabalhos originais para em seguida interpretá-los. Salientamos que não temos a pretensão de fazer aqui um estudo histórico aprofundado do experimento, nem tão pouco de esmiuçar completamente os trabalhos originais. Uma boa referência histórica é o livro de Mehra e Rechenberg [24]. Detalhes históricos mais curiosos, como por exemplo, o episódio do charuto de má qualidade que ajudou na revelação dos átomos de prata depositados na chapa, podem ser encontrados no artigo de Friedrich e Herschbach [25].

O experimento de SG foi proposto originalmente por Otto Stern [26] para testar a quantização espacial, i.e, se o momento angular de átomos neutros era ou não quantizado, na presença de um campo magnético externo. Para entendermos o que isto significa voltemos à teoria quântica da época, particularmente ao modelo atômico de Bohr-Sommerfeld. Em 1913 Niels Bohr propôs o seu modelo "semi-clássico" para o átomo, introduzindo de forma ad hoc algumas regras de quantização [27]. Ele propõe o modelo planetário para o átomo, mas postula que apenas algumas órbitas (circulares e coplanares) são permitidas aos elétrons, a saber, aquelas nas quais o momento angular L do elétron é um múltiplo inteiro da constante de Planck h (L = nh/2π, n = 1, 2, 3,...) – ver Fig. 2a. Assim os elétrons seriam estáveis nessas órbitas, emitindo radiação somente quando ocorresse a mudança de uma para outra órbita. A partir deste modelo, Bohr, entre outros cientistas, lançou-se ao desafio de descrever corretamente o espectro discreto do átomo de hidrogênio.


Já era conhecido, desde os trabalhos de Michelson de 1891, que no espectro do átomo de hidrogênio algumas linhas espectrais dividiam-se em várias linhas muito próximas uma da outra, dando origem ao que chamamos de estrutura fina do espectro [28]. Este efeito (de segunda ordem em v/c) era dificilmente acomodado dentro da teoria de Bohr e foi principalmente devido a este problema que Arnold Sommerfeld introduziu, em 1916, um "aperfeiçoamento" do modelo de Bohr. Ele incluiu efeitos relativísticos e considerou que os elétrons poderiam mover-se em órbitas elípticas e não apenas num mesmo plano, mas em diversos planos orbitais [29] (Sommerfeld, 1916 apud Weinert, p. 77, nota 4). Assim as órbitas dos elétrons em torno do núcleo seriam quantizadas não apenas em relação ao tamanho e forma, mas também na sua orientação espacial, em relação, por exemplo, à direção de um campo magnético externo - do alemão richtungsquantelung = quantização da direção ou espacial (observe que isto se refere a uma quantização no espaço, e não a uma quantização do espaço em si) – ver Fig. 2b. Dessa forma Sommerfeld introduziu, além dos dois números quânticos, principal e angular, que eram responsáveis pela quantização da magnitude do vetor momento angular L, um terceiro número quântico azimutal (m), que estava relacionado à quantização da direção de L no espaço. É importante salientar que este número quântico azimutal não é o mesmo da moderna mecânica quântica (ml). Sommerfeld previu que deveriam existir 2m valores (m inteiro) para os planos das órbitas dos elétrons, incluindo as posições horizontal e vertical - ver Ref. [29, p. 77] e Ref. [30, p. 36-38].

Com este conjunto de hipóteses, Sommerfeld, e independentemente Peter Debye, conseguiam explicar um fenômeno observado por Zeeman em 1896 acerca do comportamento de átomos em campos magnéticos. O efeito Zeeman (normal) como ficou conhecido, consiste no desdobramento, devido a um campo magnético externo, das linhas espectrais de um átomo previamente excitado. No entanto, a teoria clássica de Lorentz-Larmor fornecia uma explicação tão consistente quanto esta "nova" teoria quântica – para esta explicação clássica, ver [31, 32]. Mas em uma variante do efeito Zeeman (o efeito anômalo), ambas as teorias fracassavam [25, 32]. Conforme veremos na próxima seção, este efeito foi uma das principais motivações que levaram Otto Stern a propor o seu experimento. Assim, a quantização espacial ainda não havia sido testada diretamente, ou seja, não havia implicações experimentais específicas da teoria que houvessem sido medidas.6 6 O poder preditivo de uma teoria é considerado por muitos filósofos da ciência como evidência forte de sua validade. Isto pois a interpretação de resultados já conhecidos pode ser feita por um processo dedutivo inverso. Além disso, não há garantia de que outras teorias venham a realizar a mesma façanha. Trata-se da questão da sub-determinação experimental de uma proposição teórica. O sucesso interpretativo é, pois um indício, mas não evidência, da validade da nova proposição. Sobre a preditividade de uma teoria ver Ref. [33]. Sobre a sub-determinação ver Ref. [34]. Por conta disso, vários físicos eminentes não acreditavam na existência real da quantização espacial. As declarações de Max Born são um exemplo desse posicionamento [35]:

Eu sempre pensava que a quantização [espacial] era um tipo de expressão simbólica para alguma coisa que você não entende. Mas tomar isto literalmente como fez Stern, isto era uma idéia própria dele... Eu tentei persuadir Stern de que isto não fazia sentido, mas ele disse-me que valia a pena tentar.

Peter Debye manifesta-se da mesma forma à Walther Gerlach [25]:

Mas com certeza você não acredita que a orientação [espacial] dos átomos seja algo fisicamente real; isto é apenas um 'esquema' para os elétrons.

Tendo isto em mente, Otto Stern propôs o experimento, que possuía a vantagem de não envolver nenhuma medida espectroscópica. E como ele acreditava na teoria, o resultado esperado era que o feixe de átomos se dividisse em duas componentes ao atravessar um campo magnético externo, o que foi de fato obtido. Por isso, aos olhos dos experimentadores da época, o resultado do experimento pareceu um perfeito sucesso. Veremos a seguir que este ponto será transposto de maneira inversa nos livros didáticos.

Para a realização do experimento, Stern utilizou um pequeno forno para evaporar átomos de prata, cujo feixe era colimado até penetrar numa região com um campo magnético produzido por um eletroímã (ver Fig. 1). Ao final do percurso dentro do eletroímã encontrava-se uma placa de vidro onde os átomos de prata se depositavam. Todo este aparato ficava dentro de uma câmara de vácuo. A escolha do elemento químico prata deve-se a este ser um hidrogenóide, i.e, possuir apenas um elétron de valência, e ser de mais fácil manipulação do que um feixe de átomos de hidrogênio7 7 O experimento com hidrogênio foi realizado mais tarde por Taylor [36]. . O campo magnético utilizado necessitava ser fortemente não homogêneo na direção perpendicular ao deslocamento do feixe. Devido à forma do imã (uma cunha na parte superior e uma estreita canaleta na parte inferior - Fig. 1), o gradiente do campo magnético não era facilmente conhecido.

Como se vê, o experimento de SG era aparentemente simples, mas repleto de sutilezas. Talvez a principal delas seja a suposição de que o momento magnético do átomo seria advindo do movimento orbital do elétron de valência. Isto se revelou, posteriormente, um equívoco. Segundo Friedrich e Herschbach, o que ocorreu foi uma " afortunada coincidência" [35]. A prata possui 47 elétrons, dos quais 46 formam uma camada fechada e o último elétron ocupa o nível 5s1 1 E-mail: gerson.gomes@ifsc.edu.br. (em notação espectroscópica). Isto significa que o momento angular orbital do elétron de valência é zero e não uma unidade como presumido pelo modelo de Bohr. O momento magnético medido por Stern e Gerlach era, na verdade, o momento angular de spin do elétron. Assim eles acreditavam ter confirmado a teoria de Bohr-Sommerfeld (ver seção seguinte, o postal enviado por Gerlach a Bohr), mas na verdade eles trataram do único caso em que a teoria (da época) e os resultados experimentais coincidiam! [29]. Spin é o momento magnético intrínseco das partículas, e parece não haver, até hoje, nenhum análogo clássico para esta propriedade fundamental da matéria. Foi proposto por Goudsmit e Uhlenbeck em 1925 (Uhlenbeck e Goudsmit, apud [29]). Um fato curioso é que, mesmo após o surgimento do conceito de spin, transcorreu algum tempo até que o experimento de SG fosse reinterpretado à luz deste conceito.O primeiro trabalho a relacionar o spin a esse experimento apareceu em 1927 devido a Fraser (Fraser, apud [35], nota 24). Não por acaso será este mesmo cientista o autor a mais tarde introduzir o experimento de SG em um livro didático [37].

4. Os artigos originais

As publicações originais sobre o experimento são quatro8 8 Na verdade há mais dois artigos: um de ambos os autores, de 1924, e outro somente de W. Gerlach, de 1925. Tais trabalhos, que fazem uma revisão dos anteriores, não serão tratados aqui. : o primeiro, de 1921, é de autoria apenas de Otto Stern [26], onde ele propõe a realização do experimento. Os três seguintes, em co-autoria com Walther Gerlach, constituem-se em curtas comunicações que visavam descrever os resultados experimentais obtidos: um em 1921 [38], e dois em 1922, [39, 40].

O primeiro artigo [26] foi recebido pela revista alemã Zeitschrift für Physik em 26 de agosto de 1921, sob o título Uma maneira de verificar experimentalmente a quantização espacial em um campo magnético. Ele inicia pela previsão da teoria quântica (de Bohr-Sommerfeld) de que o vetor momento angular de um ângulos discretos em átomo pode assumir apenas relação a um campo magnético externo, e a diferença da previsão clássica, que parece suficiente na explicação do efeito Zeeman normal.

...agora, qual interpretação é correta, a clássica ou a quântica, pode ser decidido por um experimento basicamente muito simples. Precisamos apenas investigar a deflexão que um feixe de átomos sofre em um campo magnético apropriadamente não homogêneo.

e continua a descrição da teoria deste experimento10 10 Este ponto será detalhado na próxima seção, no comentário feito sobre um exercício presente num livro didático. .

O segundo artigo, " A comprovação experimental do momento magnético do átomo de prata" [38], recebido pela mesma revista em 18 de novembro, tem por objetivo apenas mostrar a confirmação experimental da existência do momento magnético do átomo de prata, sem apresentar nenhum resultado que confirme a quantização espacial. Logo no início os autores se justificam [38],

as análises experimentais lá [no artigo anterior] mencionadas tiveram que ser interrompidas por razões externas. Seja-nos permitido então comunicar brevemente os resultados certos obtidos até o momento, já que nos parece de suficiente interesse.

Uma das principais "razões externas" pelas quais as análises experimentais foram interrompidas foi a falta de recursos financeiros, reflexo da economia alemã pós primeira guerra mundial11 11 Àquela época Otto Stern ocupava uma posição no Instituto de Física Teórica em Frankfurt, como assistente de Max Born, e este colaborou muito na obtenção de recursos. Após o eclipse de 1919, a teoria da relatividade geral de Einstein ocupava grande espaço na mídia, e Born tirou vantagem desse fato. Ele organizou uma série de seminários dirigidos ao público leigo, cobrando a entrada. O dinheiro ajudou na realização do experimento de SG, mas não foi suficiente e outros recursos tiveram que ser buscados [25]. .

Em seguida eles passam a descrever, sumariamente e sem apresentar nenhum esquema ou desenho, a montagem experimental. São apontadas também algumas dificuldades encontradas [38],

A camada de prata aí [lâmina de vidro] depositada está muito abaixo do limite de visibilidade, mesmo após oito horas de duração do experimento. A mesma será revelada através da deposição de prata, de modo a manter a forma geométrica da deposição original,

e acrescentam uma nota dizendo que mais detalhes sobre o método de revelação serão comunicados em nota posterior. Provavelmente esta é a origem da "lenda do charuto",12 12 Nas palavras do próprio Stern: "Após a ventilação para liberar o vácuo, Gerlach removeu a flange do detector. Mas ele não conseguiu ver nenhum traço do feixe de átomos de prata e entregou a flange para mim. Com Gerlach olhando por sobre meus ombros enquanto eu observava atentamente a placa, ficamos surpresos ao ver surgir gradualmente o traço do feixe... Finalmente nós compreendemos [o que estava acontecendo]. Eu era na época o equivalente a um professor assistente. Meu salário era baixo demais para comprar bons charutos, assim eu fumava charutos ruins. Estes possuíam uma grande quantidade de enxofre, então minha respiração sobre a placa transformou a prata em sulfeto de prata, que é escuro e, portanto, facilmente visível. Era como a revelação de um filme fotográfico" [35]. contada por Herschbach [25].

Podemos observar aqui aspectos importantes do contexto original da pesquisa revelados [38],

Foram feitos alternadamente nove experimentos, cinco sem campo magnético e quatro com campo magnético. Um experimento sem e outro com campo, não mostrou qualquer deposição [de prata], uma vez por razões desconhecidas (obstáculo no trajeto do feixe?), outra por entupimento do diafragma frontal devido ao respingamento de prata derretida do forninho.

Os autores mencionam que algumas medidas não apresentaram nenhum resultado, por razões desconhecidas. Eles revelam também que não conheciam o grau de variação do campo magnético, e reconhecem que necessitam aperfeiçoar o experimento [38].

Indicações mais precisas não são possíveis no momento; primeiro, porque ainda não foi possível medir o valor de ∂H/∂z [gradiente do campo] tão perto da cunha, segundo, porque ainda não sabemos qual espessura de prata pode ser demonstrada através da revelação.

A conclusão do artigo é otimista, embora houvesse poucos elementos para isso:

A partir das experiências realizadas até então não duvidamos que, através de experimentos com feixes de diâmetro me-nor e eventualmente um método de revelação melhorado, poderemos decidir sobre a [existência da] quantização espacial. O resultado desse trabalho é a comprovação de que o átomo de prata possui um momento magnético.

Talvez uma das razões para o "fracasso" desses primeiros experimentos tenha sido a fenda colimadora, que provavelmente era de perfil circular, já que eles informam que o primeiro diafragma possuía 1/20 mm de diâmetro (durchmesser);13 13 Para mais detalhes sobre a importância da forma da fenda colimadora, ver Ref. [30, p. 40-41].

O terceiro artigo [39], A comprovação experimental da quantização espacial em um campo magnético, foi recebido em 1º de março de 1922, e apresenta os resultados positivos por eles perseguidos. Eles descrevem o aparato experimental, incluindo apenas uma figura bastante rudimentar, e enfatizam as modificações introduzidas em relação ao experimento anterior. Entre elas, o aumento da distância entre o primeiro diafragma e o forno, a fim de evitar que o respingamento de prata obstruísse a passagem do feixe, e a nova fenda colimadora, de perfil retangular e desta vez mais estreita, com as dimensões 0,8 mm x 0,03-0,04 mm.

Os resultados são apresentados desta vez acompanhados por uma figura (foto) onde aparece a prata depositada na placa de vidro após uma revelação (fotográfica), para os casos com e sem campo magnético. Essa foto foi enviada num postal a Bohr, onde Walther Gerlach felicita-o pela confirmação de sua teoria – ver Fig. 3 a seguir.


Os autores revelam que a figura da foto (Fig. 3 no original) foi obtida por eles após 8 horas de exposição, tendo sido ampliada 20 vezes, e comentam que [39],

Este foi a melhor imagem obtida. Duas outras imagens deram em todos os pontos essenciais o mesmo resultado, ainda que não com a completa simetria. Deve ser dito aqui que um alinhamento preciso de diafragmas tão pequenos no caminho ótico é muito difícil, e que para obter uma imagem completamente simétrica como a da Fig. 3 é preciso um pouco de sorte; posicionamentos incorretos de quaisquer dos diafragmas de apenas alguns poucos centésimos de milímetro já bastam para fazer fracassar por completo [a experiência].

Comentando ainda os resultados, Stern e Gerlach observam que a dispersão do feixe no campo magnético fornece dois feixes discretos, e que não se observam átomos sem deflexão. E concluem o artigo [39]:

Nós 'vemos' nesses resultados a comprovação experimental direta da quantização da direção num campo magnético. Uma apresentação detalhada dos experimentos e resultados das nossas até então curtas comunicações será publicada nos Anais da Física [a revista Annalen der Physik], assim que conseguirmos uma informação quantitativa do valor do magneton, com base em medições mais exatas da não-homogeneidade do campo magnético.

O quarto e último artigo desta série, O momento magnético do átomo de prata [40], foi recebido um mês depois, em 1º de abril de 1922, e visava apresentar o resultado do valor do momento magnético que ainda faltava no trabalho anterior. Stern e Gerlach esclarecem que precisavam conhecer com precisão a distância z entre o feixe de átomos e a borda do ímã, e também ∂H/z (gradiente do campo) na direção perpendicular ao feixe. Além disso, eles utilizaram uma fenda colimadora ainda mais estreita, o que reforça a importância da colimação. Eles estimam o erro máximo de seus resultados em 10% e concluem [40],

Dessas medidas resulta que o momento magnético do átomo de prata normal no estado gasoso é de 1 magneton de Bohr.

A reação da comunidade científica a esses trabalhos foi, em geral, bastante positiva. Algumas são citadas em [25], dentre as quais destacamos aqui a de Sommerfeld, que aparece na edição de 1922 de seu livro:

Através do seu arranjo experimental engenhoso Stern e Gerlach demonstraram 'ad oculos' não apenas a quantização espacial dos átomos num campo magnético, como também provaram a origem quântica da eletricidade e sua conexão com a estrutura atômica.

A de Einstein, também datada de 1922, que cita uma tentativa teórica (fracassada) sua e de Ehrenfest [41] de explicar o fenômeno:

A realização mais interessante até o momento é o experimento de Stern e Gerlach. O alinhamento dos átomos sem colisões [entre si] via [trocas] radiativas não é compreensível com base nos métodos [teóricos] correntes; levaria mais de 100 anos para os átomos se alinharem. Eu fiz um pequeno cálculo sobre isto com [Paul] Ehrenfest. [Heinrich] Rubens considera que o resultado experimental está totalmente correto.

E a de Bohr, a quem Gerlach endereçou o postal, e que parece não ter compreendido imediatamente o resultado do experimento:

Eu ficaria muito grato se você ou Stern pudessem me explicar, em poucas linhas, qual interpretação vocês deram dos seus resultados experimentais de que os átomos se orientam apenas paralelos ou opostos, mas nunca normais ao campo, que possam fornecer razões teóricas para sua última afirmação.

Como resultados das suas investigações experimentais, Stern e Gerlach decidem (corretamente) rejeitar a teoria clássica, sem saber que também não confirmavam a teoria quântica, já que nem suspeitavam da existência do spin do elétron [29].

5. O spin e o experimento de Stern-Gerlach nos livros didáticos

Faremos a análise dos livros tomando como critério de escolha as obras mais utilizadas nos cursos universitários básicos de física no Brasil. Acreditamos que em função da discussão acima sobre os livros didáticos e os consensos na comunidade científica, estes livros se-jam também os mais utilizados em outros países com tradição científica consolidada. Em cada obra buscaremos localizar o lugar e a forma pela qual o experimento de Stern-Gerlach é apresentado e sua relação com o conceito de spin. Apenas como demarcação histórica, pela apresentação acima, pudemos verificar que a concepção original do experimento e sua interpretação imediata não estavam associadas ao spin do elétron, embora num momento posterior isso tenha sido feito. Em particular, estaremos interessados em avaliar a existência ou não de estratégias que visam aumentar a clareza e veracidade na apresentação didática do conhecimento científico. Tomaremos como base para a análise três estratégias inferidas dos trabalhos de Whitaker sobre a quasi-história e de outros autores [20, 21, 22]. São elas: i) o caráter fortemente indutivo das teorias; ii) o papel confirmatório das experiências e finalmente, iii) aumento da racionalidade pela linearização histórica.

Os cursos universitários de física fazem a introdução à mecânica quântica, primeiramente de forma mais qualitativa ao final do ciclo básico (segundo ano). Nesta fase dos cursos, os livros didáticos mais utilizados no contexto das universidades e faculdades brasileiras são os livros de Serway [42], Tipler [43], Nussenzveig16 16 Esta obra é de um autor nacional. [44] e Halliday e cols. [45]. Inicialmente destacamos as opções cronológicas adotadas pelos autores na apresentação do experimento de SG. Com exceção de [45], o experimento de SG é apresentado posteriormente ao conceito de momento magnético intrínseco, i.e, o spin do elétron. Este último livro, como veremos a seguir, é o que faz o melhor - no sentido de o mais fiel aos fatos históricos tratamento do tema entre aqueles analisados. Iniciaremos pela apresentação dos livros que não seguem a seqüência cronológica entre experimento e apresentação do spin; em seguida, a análise do livro que o faz.

No livro de Serway [42], o conceito de quantização espacial é introduzido na seção 42.5, quando da discussão sobre o momento angular orbital. O spin é apresentado uma seção antes. Encontramos alguns problemas na apresentação do experimento de SG. Inicialmente, a descrição da experiência limita-se a uma frase e a figura utilizada para representá-la (de número 4211) é de baixa qualidade, pois não permite a visualização do campo magnético não-uniforme. Além disso, nesta figura, a marca do feixe na chapa fotográfica, representando a "divisão real", está um pouco exagerada na comparação com figura original pois, como visto nesta, a divisão é muito menos nítida (ver Fig. 3). Num contexto didático, é compreensível uma certa "limpeza" técnica na montagem experimental visando destacar o princípio de funcionamento do experimento. Por exemplo, as representações sobre o experimento de Michelson-Morley de 1887, sobre a influência do movimento orbital da Terra sobre a propagação da luz, aparece em muitos livros didáticos sem os sistemas de multiplicação das reflexões dos raios de luz visando aumentar as distâncias e a precisão experimental. No en-tanto, aqui a não-uniformidade do campo magnético é parte essencial da montagem, pois o efeito a ser evidenciado decorre disso. Ou seja, a "limpeza", com finalidades didáticas, joga fora "o bebê com a água suja". Além disso, a anterioridade na apresentação do spin sobre o experimento e a quantização espacial induz a uma interpretação (errônea) de que o experimento de SG é uma proposição decorrente da hipótese do spin eletrônico e visa simplesmente comprová-lo. O texto prossegue explicando a previsão da física clássica e a da mecânica quântica, salientando que a experiência de SG comprova, pelo menos qualitativamente, a quantização espacial. Esta concordância apenas qualitativa é um equívoco, pois a teoria quântica da época (a de Bohr-Sommerfeld) era diferente da atual. A explicação e a conclusão do experimento de SG limitam-se a um parágrafo, e o texto termina fazendo a observação de que a experiência de SG proporcionou dois resultados importantes: a verificação da quantização do espaço e a demonstração da existência do spin [42] (p.100-101). Aqui há um julgamento anacrônico do papel desempenhado pelo experimento. O experimento não se propôs a demonstrar a existência do spin, como discutimos na seção acima. A verificação da hipótese referente à quantização espacial faz parte do contexto original da pesquisa, mas não a demonstração do spin. A opção dos autores parece focar-se na apresentação do spin como conteúdo a ensinar, submetendo os demais trabalhos (no caso o experimento de SG) a uma lógica de validação do mesmo. No caso, há uma epistemologia ingênua que parece apresentar os experimentos como etapas comprobatórias das proposições teóricas [18].

No livro de Tipler o spin do elétron também é apresentado antes da experiência de SG [43] (p.253). A experiência de SG é apresentada, mas de maneira totalmente descontextualizada. Assim como no texto anteriormente analisado, a descrição do experimento é sumária, limitando-se a uma frase e uma figura. Há ainda um erro nesta descrição, pois é dito que o campo magnético varia ligeiramente [43] (p.255), enquanto que, na experiência original, o campo magnético precisa variar muito, pois era bastante não homogêneo. A explicação final é também bastante curta e o texto termina com a definição de "quantização do espaço". Observa-se que não é mencionado em lugar algum que o objetivo do experimento de SG é verificar a quantização espacial. A opção dessa obra assemelha-se muito a de [42].

No livro de Nussenzveig [44] a experiência de SG é apenas citada, em um único parágrafo, quando da discussão do spin do elétron. E dito que, em conseqüência do spin, "um feixe de elétrons" é afetado por um campo magnético não homogêneo, e que uma experiência foi realizada por O. Stern e W. Gerlach em 1921, fazendo "um feixe" atravessar um campo magnético fortemente não homogêneo. Segundo o autor, esta experiência mostrou que "o feixe" se divide em duas componentes, associadas aos dois únicos valores possíveis da projeção do spin [44] (p.394). Este trecho é tudo o que o texto apresenta sobre o experimento de SG. Desconsiderando o fato de que a experiência que obteve os resultados apresentados foi em 1922, e não em 1921, há aqui, ao nosso ver, dois problemas. O primeiro refere-se às expressões "feixe de elétrons" e depois "um feixe": não é dito que tipo de feixe utilizou-se na experiência, mas como mencionou-se um feixe de elétrons, dá-se a entender que a experiência original utilizou tal feixe, o que é incorreto. Até aonde sabemos, o experimento de SG com um feixe de elétrons nunca foi realizado, devido às grandes dificuldades experimentais. As dúvidas sobre a possibilidade de observar este efeito com elétrons surgiram no final da década de 1920, quando houve um acalorado debate sobre as propriedades intrínsecas do elétron livre. Bohr, entre outros, acreditava que o elétron possuiria spin somente quando ligado aos átomos [46].O segundo problema é que, assim como os outros textos, a forma como foi apresentado o experimento de SG, induz o leitor a fazer uma associação completa com o spin do elétron.

A apresentação anacrônica realizada pelos três grupos de autores e a "limpeza" técnica, em maior ou menor grau, de detalhes considerados fundamentais, como a existência de campo magnético não homogêneo e feixe de átomos (e não de elétrons, como citado no livro acima), permite algumas considerações: o experimento não tem identidade didática própria nas obras. Embora, tenha sido um experimento fundamental no percurso epistemológico do início do século XX, interpretado na perspectiva atual, transforma-se em mera comprovação da hipótese do spin.

O livro de Halliday e cols. [45] apresenta inicialmente o conceito de quantização espacial e destaca que esta foi prevista teoricamente pelo físico austríaco Wolfgang Pauli e comprovada experimentalmente pelos físicos alemães Otto Stern e Walther Gerlach em 1922. Segue-se a isso, uma figura e a descrição do aparelho de SG, bastante próxima à montagem original. O texto prossegue fazendo uma discussão do comportamento de um dipolo num campo magnético não-uniforme, apresentando após os resultados experimentais de SG. A figura 13 deste livro é idêntica à figura original (ver Fig. 3 na seção anterior) e mostra os resultados originais obtidos na experiência de SG, com o campo magnético desligado e ligado.17 17 Analisamos a quarta edição deste livro. Na quinta edição, infelizmente, esta figura (além de outros comentários importantes) foi retirada. Esta seção termina com um interessante exemplo do cálculo da deflexão do feixe, que, embora não mencionado, é bastante semelhante ao realizado por O. Stern, quando este propôs a experiência [26]. Este cálculo (clássico) é surpreendentemente simples, pois utiliza basicamente a segunda lei de Newton e a fórmula cinemática para a distância percorrida num movimento uniformemente acelerado. O experimento foi apresentado num contexto histórico muito próximo àquele que podemos inferir a partir da análise dos artigos e documentos originais. Não houve alteração na ordem de apresentação do experimento, nem se constatou uma estratégia de apresentar o experimento como uma forma de comprovação de previsões teóricas ligadas ao conceito de spin.

A seção seguinte trata do spin do elétron, e mostra uma dificuldade na interpretação do experimento de SG, pois, de acordo com a teoria quântica esperar-se-ia um número ímpar de marcas na placa coletora. Mas conforme salienta Weinert, esta é uma leitura do experimento sob a ótica da teoria quântica atual [29]. Na época, a teoria "vigente" era a de Bohr-Sommerfeld, que ainda não havia introduzido números quânticos semi-inteiros e, portanto, previa o aparecimento de apenas um número par de marcas na placa. A conclusão do tema é apresentada em um curto parágrafo que re-interpreta o experimento de SG à luz do conceito de spin. Aqui há uma mudança essencial em relação à intenção original do experimento e pela maneira como ele foi imediatamente interpretado. Como apresentamos acima, o resultado obtido pelo experimento foi positivo em relação à hipótese que o suscitou (quantização espacial). Ou seja, a anomalia atribuída ao resultado experimental não pertence ao contexto da problemática científica original. Há ruptura entre a maneira como o experimento foi recebido pela comunidade e àquela apresentada no livro, visando aumentar a clareza e o valor do conceito de spin. Em termos da historiografia moderna, os autores do livro produziram um "anacronismo", por tomar um ponto de vista atual na organização dos fatos passados. Dessa forma, a história passa a se constituir num fio condutor tecido ao in-verso, do presente para o passado. Isto se configura como uma busca de predecessores que possam justificar a pertinência e valor do conceito que se quer ensinar, no caso o spin.

6. Considerações finais: entre a transposição didática e a quasi-história

O uso da história da ciência com fins didáticos enfrenta problemas de diversas ordens. Um deles se vincula à necessidade de atender a compromissos situados em áreas de interesse diversos, quais sejam, aqueles específicos do historiador, do educador e do cientista. O que se pôde extrair como resultado da análise acima é que na maioria dos livros analisados, alguns compromissos presentes na segunda área (educacional) e na terceira (científica) suplantam aqueles da primeira (histórica). No caso, existe uma tendência em apresentar a ciência numa perspectiva que fortalece sua racionalidade. Isto ajuda a entender a inversão entre experimento de SG e a proposição do spin verificada na maioria dos livros de Ensino Superior. O objetivo final parece ser o de gerar lógica interna ao sistema de ideias apresentado implicando na crença de numa racionalidade crescente no desenvolvimento da ciência. Isto induz a uma imagem positivista da ciência, na qual a sequência de eventos caminha no sentido de atingir um ápice com a proposiçãao de uma lei/conceito.

É sabido que no processo de produção de conteúdos escolares existe a descaracterização do saber científico, pois este assume compromissos com as esferas da dimensão escolar [15]. Essa descaracterização passa, entre outras coisas, pela desincretização, descontextualização e despersonalização [47]. O estudo realizado acima parece indicar que os autores de livro produzem, com fins pedagógicos, a desincretização e a descontextualização, preservando, pelo menos parcialmente, a personalização dos fatos históricos relatados. Neste caso, a descaracterização histórica do saber físico vem acompanhada de uma narrativa que busca apresentar a ciência como uma empreitada "racional".

Análises como as feitas acima constituem-se em exercícios de vigilância epistemológica, nos termos mencionados por Chevallard. A submissão dos contextos originais de produção de conhecimento são mais comuns do que se possa imaginar, visto que os relatos históricos são sempre impregnados de concepções epistemológicas. Num quadro como este é fácil os autores de livros didáticos, com boas intenções, se deixarem seduzir por relatos que incorporam desejos positivistas inerentes a todos aqueles que consideram a ciência como uma forma de produzir conhecimento seguro. Cabe o conselho de permanecermos vigilantes e buscar alternativas que incorporem o uso da história da ciência com versões da dinâmica interna da ciência menos estereotipadas.

Agradecimentos

Agradecemos a valiosa ajuda de Gabriela Nascimento Corrêa na tradução dos textos em alemão e a Gustavo Costa Ribeiro com as figuras.

Referências

[1] E.P. Salpeter, Textbook Deathwatch, Tech & Learning, 30, 26 (2009).

[2] V. Hatzinikita, K. Dimopoulos and V. Christidou, Science Education 92, 664 (2008).

[3] L.B. Smolkin et al., Science Education 93, 587 (2009).

[4] S. Irez, Science Education 93, 422 (2009).

[5] Niaz e Fernandez, International Journal of Science Education 30, 869 (2008).

[6] M. Izquierdo-Aymerich and A. Aduriz-Bravo, Science Education 18, 1 (2009).

[7] C.R. Mattos e R.B. Nicioli Jr., Investigações em Ensino de Ciências (Online) 13, 275 (2008).

[8] T. Kuhn, in: A Crítica e o Desenvolvimento do Conhecimento, editado por I. Lakatos e A. Musgrave (Cultrix e Edusp, São Paulo, 1979), p. 48-50.

[9] J. Jamin, Cours de l'Ecole Polytechnique (Gauthier-Villars, Paris, 1868), 4 volumes.

[10] A. Ganot, Traité Elementaire de Physique Expérimentale et Appliquée et de Météorologie (Chez Auteur-Editeur, Paris, 1868).

[11] E. Verdet, Leçons d'Optique Physique (Imprimerie Impériale, Paris, 1870), 2 volumes.

[12] A. Vechia e M. Cavazotti (orgs), A Escola Secundária: Modelos e Planos no Brasil nos Séculos XIX e XX (Annablume, Rio de Janeiro, 2003).

[13] K.M. Lorenz, Ciência e Cultura 38, 426 (1986).

[14] J.P. Alves Filho, M. Pietrocola e T.F. Pinheiro, in: Ensino de Física, organizado por M. Pietrocola (Editora da UFSC, Florianópolis, 2000), p. 77-99.

[15] Y. Chevallard, La Transposition Didactique: Du Savoir Savant au Savoir Ensigné (La pensée Sauvage, Grenoble, 1991).

[16] Y. Chevallard, European Educational Research Journal 6, 9 (2007).

[17] G. Brockington e M. Pietrocola, Investigações em Ensino de Ciências 10, 387 (2005).

[18] M.A.B. Whitaker, Physics Education 14, 108 (1979); Physics Education 14, 239 (1979).

[19] M. Klein, History in the Teaching of Physics: Proc. Int. Working Seminar on the Role of History of Physics in Physics Teaching, edited by S.G. Brush and A.L. King (University Press of New England, Hannover, 1972), p. 21.

[20] D. Allchin, Science Education 13, 179 (2004).

[21] D. Allchin, Science Education 15, 91 (2006).

[22] G. Holton, Science Education 12, 603 (2003).

[23] J.J. Sakurai, Modern Quantum Mechanics (Addison-Wesley Publishing, Reading, 1994).

[24] J. Mehra and H. Rechenberg, The Historical Development of Quantum Theory (Springer, New York, 1982), p. 426.

[25] B. Friedrich and F. Herschbach, Phys. Today 56, 53 (2003).

[26] O. Stern, Z. Phys 7, 249 (1921). Tradução para o inglês em Z. Phys. D. 10, 114 (1988), número comemorativo ao centenário de nascimento de Otto Stern.

[27] A French, P Kennedy and L Feuer, American Journal of 54, 762 (1986).

[28] O. Darrigol, From c-Numbers to q-Numbers: The Classical Analogy in the History of Quantum Theory (Univ. of California Press, Berkeley, 1992), p. 102.

[29] F. Weinert, Stud. Hist. Phil. Mod. Phys 26, 75 (1995).

[30] J.R. Stenson, Representations for Understanding the Stern-Gerlach Effect. Master Thesis, Brigham Young University, 2005 - extraído de http://www.physics.byu.edu/research/theory/Docs/JaredsThesis05.pdf, acessado em 24/2/2008.

[31] E. Whittaker, A History of the Theories of Aether and Electricity (Harper & Brothers, New York, 1951), v. 1, p. 410-414.

[32] F. Caruso e V. Oguri, Física Moderna: Origens Clássicas e Fundamentos Quânticos (Elsevier Editora, Rio de Janeiro, 2006), p. 234-237.

[33] M. Bunge, Epistemologia (Edusp, São Paulo, 1980).

[34] H. Barreau, in: Epistemology and the Social, edited by E. Agazzi, J. Echeverría and A.G. Rodríguez ( Rodopi B.V. Editions, Amsterdam/New York, 2008) v. 15, p. 33-47.

[35] B. Friedrich and F. Herschbach, Daedalus 127, 165 (1998).

[36] J.B. Taylor, Phys. Rev 28, 576 (1926).

[37] R.G.J. Fraser, Molecular Rays (Cambridge Univ. Press, London, 1931), p. 117 e 150.

[38] W. Gerlach and O. Stern, Z. Phys. 8, 110 (1921).

[39] W. Gerlach and O. Stern, Z. Phys. 9, 349 (1922).

[40] W. Gerlach and O. Stern, Z. Phys. 9, 353 (1922).

[41] A. Einstein and P. Ehrenfest, Z. Phys. 11, 31 (1922).

[42] R.A. Serway, Física para Cientistas e Engenheiros, Com Física Moderna (LTC, Rio de Janeiro, 1992), v. 4, 3ª ed.

[43] P.A. Tipler, Física para Cientistas e Engenheiros, v. 4, Ótica e Física Moderna (Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 1992), 3ª ed.

[44] H.M. Nussenzveig, Curso de Física Básica, v. 4, Otica, Relatividade e Física Quântica (Edgard Bücher Ltda., São Paulo, 1998).

[45] D. Halliday, R. Resnick e K.S. Krane, Física, v. 4 (LTC, Rio de Janeiro, 1991), 4ª ed.

[46] B.M. Garraway e S. Stenholm, Contemp. Phys. 43, 147 (2002).

[47] Y. Chevallard and M-A. Johsua, Recherches em Didactique des Mathematiques 3, 157 (1982).

Recebido em 30/12/2009; Aceito em 30/9/2010; Publicado em 12/7/2011

  • [1] E.P. Salpeter, Textbook Deathwatch, Tech & Learning, 30, 26 (2009).
  • [2] V. Hatzinikita, K. Dimopoulos and V. Christidou, Science Education 92, 664 (2008).
  • [3] L.B. Smolkin et al., Science Education 93, 587 (2009).
  • [4] S. Irez, Science Education 93, 422 (2009).
  • [5] Niaz e Fernandez, International Journal of Science Education 30, 869 (2008).
  • [6] M. Izquierdo-Aymerich and A. Aduriz-Bravo, Science Education 18, 1 (2009).
  • [7] C.R. Mattos e R.B. Nicioli Jr., Investigações em Ensino de Ciências (Online) 13, 275 (2008).
  • [8] T. Kuhn, in: A Crítica e o Desenvolvimento do Conhecimento, editado por I. Lakatos e A. Musgrave (Cultrix e Edusp, São Paulo, 1979), p. 48-50.
  • [9] J. Jamin, Cours de l'Ecole Polytechnique (Gauthier-Villars, Paris, 1868), 4 volumes.
  • [10] A. Ganot, Traité Elementaire de Physique Expérimentale et Appliquée et de Météorologie (Chez Auteur-Editeur, Paris, 1868).
  • [11] E. Verdet, Leçons d'Optique Physique (Imprimerie Impériale, Paris, 1870), 2 volumes.
  • [12] A. Vechia e M. Cavazotti (orgs), A Escola Secundária: Modelos e Planos no Brasil nos Séculos XIX e XX (Annablume, Rio de Janeiro, 2003).
  • [13] K.M. Lorenz, Ciência e Cultura 38, 426 (1986).
  • [14] J.P. Alves Filho, M. Pietrocola e T.F. Pinheiro, in: Ensino de Física, organizado por M. Pietrocola (Editora da UFSC, Florianópolis, 2000), p. 77-99.
  • [15] Y. Chevallard, La Transposition Didactique: Du Savoir Savant au Savoir Ensigné (La pensée Sauvage, Grenoble, 1991).
  • [16] Y. Chevallard, European Educational Research Journal 6, 9 (2007).
  • [17] G. Brockington e M. Pietrocola, Investigações em Ensino de Ciências 10, 387 (2005).
  • [18] M.A.B. Whitaker, Physics Education 14, 108 (1979);
  • Physics Education 14, 239 (1979).
  • [19] M. Klein, History in the Teaching of Physics: Proc. Int. Working Seminar on the Role of History of Physics in Physics Teaching, edited by S.G. Brush and A.L. King (University Press of New England, Hannover, 1972), p. 21.
  • [20] D. Allchin, Science Education 13, 179 (2004).
  • [21] D. Allchin, Science Education 15, 91 (2006).
  • [22] G. Holton, Science Education 12, 603 (2003).
  • [23] J.J. Sakurai, Modern Quantum Mechanics (Addison-Wesley Publishing, Reading, 1994).
  • [24] J. Mehra and H. Rechenberg, The Historical Development of Quantum Theory (Springer, New York, 1982), p. 426.
  • [25] B. Friedrich and F. Herschbach, Phys. Today 56, 53 (2003).
  • [26] O. Stern, Z. Phys 7, 249 (1921). Tradução para o inglês em Z. Phys. D. 10, 114 (1988), número comemorativo ao centenário de nascimento de Otto Stern.
  • [27] A French, P Kennedy and L Feuer, American Journal of 54, 762 (1986).
  • [28] O. Darrigol, From c-Numbers to q-Numbers: The Classical Analogy in the History of Quantum Theory (Univ. of California Press, Berkeley, 1992), p. 102.
  • [29] F. Weinert, Stud. Hist. Phil. Mod. Phys 26, 75 (1995).
  • [30] J.R. Stenson, Representations for Understanding the Stern-Gerlach Effect Master Thesis, Brigham Young University, 2005 - extraído de http://www.physics.byu.edu/research/theory/Docs/JaredsThesis05.pdf, acessado em 24/2/2008.
  • [31] E. Whittaker, A History of the Theories of Aether and Electricity (Harper & Brothers, New York, 1951), v. 1, p. 410-414.
  • [32] F. Caruso e V. Oguri, Física Moderna: Origens Clássicas e Fundamentos Quânticos (Elsevier Editora, Rio de Janeiro, 2006), p. 234-237.
  • [33] M. Bunge, Epistemologia (Edusp, São Paulo, 1980).
  • [34] H. Barreau, in: Epistemology and the Social, edited by E. Agazzi, J. Echeverría and A.G. Rodríguez ( Rodopi B.V. Editions, Amsterdam/New York, 2008) v. 15, p. 33-47.
  • [35] B. Friedrich and F. Herschbach, Daedalus 127, 165 (1998).
  • [36] J.B. Taylor, Phys. Rev 28, 576 (1926).
  • [37] R.G.J. Fraser, Molecular Rays (Cambridge Univ. Press, London, 1931), p. 117 e 150.
  • [38] W. Gerlach and O. Stern, Z. Phys. 8, 110 (1921).
  • [39] W. Gerlach and O. Stern, Z. Phys. 9, 349 (1922).
  • [40] W. Gerlach and O. Stern, Z. Phys. 9, 353 (1922).
  • [41] A. Einstein and P. Ehrenfest, Z. Phys. 11, 31 (1922).
  • [42] R.A. Serway, Física para Cientistas e Engenheiros, Com Física Moderna (LTC, Rio de Janeiro, 1992), v. 4, 3Ş ed.
  • [43] P.A. Tipler, Física para Cientistas e Engenheiros, v. 4, Ótica e Física Moderna (Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 1992), 3Ş ed.
  • [44] H.M. Nussenzveig, Curso de Física Básica, v. 4, Otica, Relatividade e Física Quântica (Edgard Bücher Ltda., São Paulo, 1998).
  • [45] D. Halliday, R. Resnick e K.S. Krane, Física, v. 4 (LTC, Rio de Janeiro, 1991), 4Ş ed.
  • [46] B.M. Garraway e S. Stenholm, Contemp. Phys. 43, 147 (2002).
  • [47] Y. Chevallard and M-A. Johsua, Recherches em Didactique des Mathematiques 3, 157 (1982).
  • 9
    9 Conforme mencionado, o anômalo não era explicado por nenhuma teoria da época. Dessa forma ele apresenta o dilema e conclui [26]:
  • 1
    E-mail:
  • 2
    Sobre a história dos livros didáticos de física no Brasil, ver [7].
  • 3
    Vale dizer que o consenso não se estabelece da mesma maneira em todas as áreas das ciências experimentais. Em física e química o consenso é maior que em biologia.
  • 4
    Vale destacar que Chevallard prefere a denominação em francês "savoir" ao invés de "connaissance" e savant ao invés de científico [15, 16]. Como em português temos a possibilidade destas duas palavras, usaremos a denominação "saber sábio", mais próxima do original em francês (todas as traduções neste artigo são dos autores -ver agradecimentos no final).
  • 5
    Embora estabeleça alguma relação com a pseudo-história discutida por Klein [19], Whitaker faz questão de diferenciar ambas.
  • 6
    O poder preditivo de uma teoria é considerado por muitos filósofos da ciência como evidência forte de sua validade. Isto pois a interpretação de resultados já conhecidos pode ser feita por um processo dedutivo inverso. Além disso, não há garantia de que outras teorias venham a realizar a mesma façanha. Trata-se da questão da sub-determinação experimental de uma proposição teórica. O sucesso interpretativo é, pois um indício, mas não evidência, da validade da nova proposição. Sobre a preditividade de uma teoria ver Ref. [33]. Sobre a sub-determinação ver Ref. [34].
  • 7
    O experimento com hidrogênio foi realizado mais tarde por Taylor [36].
  • 8
    Na verdade há mais dois artigos: um de ambos os autores, de 1924, e outro somente de W. Gerlach, de 1925. Tais trabalhos, que fazem uma revisão dos anteriores, não serão tratados aqui.
  • 9
    Conforme mencionado, o anômalo não era explicado por nenhuma teoria da época.
  • 10
    Este ponto será detalhado na próxima seção, no comentário feito sobre um exercício presente num livro didático.
  • 11
    Àquela época Otto Stern ocupava uma posição no Instituto de Física Teórica em Frankfurt, como assistente de Max Born, e este colaborou muito na obtenção de recursos. Após o eclipse de 1919, a teoria da relatividade geral de Einstein ocupava grande espaço na mídia, e Born tirou vantagem desse fato. Ele organizou uma série de seminários dirigidos ao público leigo, cobrando a entrada. O dinheiro ajudou na realização do experimento de SG, mas não foi suficiente e outros recursos tiveram que ser buscados [25].
  • 12
    Nas palavras do próprio Stern: "Após a ventilação para liberar o vácuo, Gerlach removeu a flange do detector. Mas ele não conseguiu ver nenhum traço do feixe de átomos de prata e entregou a flange para mim. Com Gerlach olhando por sobre meus ombros enquanto eu observava atentamente a placa, ficamos surpresos ao ver surgir gradualmente o traço do feixe... Finalmente nós compreendemos [o que estava acontecendo]. Eu era na época o equivalente a um professor assistente. Meu salário era baixo demais para comprar bons charutos, assim eu fumava charutos ruins. Estes possuíam uma grande quantidade de enxofre, então minha respiração sobre a placa transformou a prata em sulfeto de prata, que é escuro e, portanto, facilmente visível. Era como a revelação de um filme fotográfico" [35].
  • 13
    Para mais detalhes sobre a importância da forma da fenda colimadora, ver Ref. [30, p. 40-41].
  • 15
    Extraída da Ref. [25].
  • 16
    Esta obra é de um autor nacional.
  • 17
    Analisamos a quarta edição deste livro. Na quinta edição, infelizmente, esta figura (além de outros comentários importantes) foi retirada.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Set 2011
    • Data do Fascículo
      Jun 2011

    Histórico

    • Aceito
      30 Set 2010
    • Recebido
      30 Dez 2009
    Sociedade Brasileira de Física Caixa Postal 66328, 05389-970 São Paulo SP - Brazil - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: marcio@sbfisica.org.br