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Wavelets biortogonais

Biorthogonal wavelets

Resumos

A transformada wavelet biortogonal e as bases wavelet são uma poderosa ferramenta para análise de dados multiescala, que tem vastas aplicações na física, matemática, computação e tecnologias. A teoria wavelet é construída, não apenas com o uso de uma nova e brilhante ideia, mas pela sinergia de conceitos e necessidades que já existiam a algum tempo em diferentes áreas do conhecimento científico. Dessa forma, neste artigo, apresenta-se conceitos e exemplos de técnicas wavelets biortogonais que podem ser de grande interesse para vários tipos de estudos da comunidade física brasileira, servindo igualmente a outras áreas correlatas. Este texto destina-se, em especial, a pesquisadores, professores e estudantes de pós-graduação, com possibilidades de atender, ainda, estudantes do último ano de graduação.

wavelet; ondinhas; ondeletas; ondaletas; ôndulas; ondículas; análise de multirresolução


The biorthogonal wavelet transform and wavelet bases are a powerful tool for multiscale data analysis, which has many applications in physics, mathematics, and computing technologies. The wavelet theory is constructed not only with the use of a new idea, but with the synergy of concepts and needs in different areas of scientific knowledge. Therefore, this work presents introductory concepts and examples of biorthogonal wavelets techniques that can be of great interest for various types of studies of Brazilian physics community, serving also to other related areas. This text is written, in particular, to researchers, teachers, graduate students and last years under graduate students.

wavelets; multiresolution analysis


NOTAS E DISCUSSÕES

Wavelets biortogonais

Biorthogonal wavelets

Margarete Oliveira DominguesI,1 1 E-mail: margarete.oliveira.domingues@gmail.com. ; Magda Kimico KaibaraII

ILaboratório Associado de Computação e Matemática Aplicada, Coordenadoria de Laboratórios Associados, Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, São José dos Campos, SP, Brasil

IIDepartamento de Matemática Aplicada, Instituto de Matemática e Estatística, Universidade Federal Fluminense, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

RESUMO

A transformada wavelet biortogonal e as bases wavelet são uma poderosa ferramenta para análise de dados multiescala, que tem vastas aplicações na física, matemática, computação e tecnologias. A teoria wavelet é construída, não apenas com o uso de uma nova e brilhante ideia, mas pela sinergia de conceitos e necessidades que já existiam a algum tempo em diferentes áreas do conhecimento científico. Dessa forma, neste artigo, apresenta-se conceitos e exemplos de técnicas wavelets biortogonais que podem ser de grande interesse para vários tipos de estudos da comunidade física brasileira, servindo igualmente a outras áreas correlatas. Este texto destina-se, em especial, a pesquisadores, professores e estudantes de pós-graduação, com possibilidades de atender, ainda, estudantes do último ano de graduação.

Palavras-chave: wavelet, ondinhas, ondeletas,ondaletas, ôndulas, ondículas, análise de multirresolução.

ABSTRACT

The biorthogonal wavelet transform and wavelet bases are a powerful tool for multiscale data analysis, which has many applications in physics, mathematics, and computing technologies. The wavelet theory is constructed not only with the use of a new idea, but with the synergy of concepts and needs in different areas of scientific knowledge. Therefore, this work presents introductory concepts and examples of biorthogonal wavelets techniques that can be of great interest for various types of studies of Brazilian physics community, serving also to other related areas. This text is written, in particular, to researchers, teachers, graduate students and last years under graduate students.

Keywords: wavelets, multiresolution analysis.

1. Introdução

Aplicações da teoria wavelet, típicas na física, são, em geral, aquelas relacionadas à turbulência em fluidos e em plasma, a termodinâmica, a física do estado sólido e atômica, a astrofísica, a geofísica espacial e a física da atmosfera. Os primeiros trabalhos de formalização dessa teoria foram realizados na década de 80, iniciando com os trabalhos de J. Morlet e seus colaboradores A. Grossmann e P. Goupillaud [18,19,29] seguidos pelos trabalhos de Y. Meyer, I. Daubechies e S. Mallat [5,24,27]. Um excelente histórico e síntese da sinergia envolvida nos desenvolvimentos que culminaram no nascimento da teoria conhecida hoje como teoria wavelet encontra-se em [20,21].

Na evolução dessa teoria, um advento histórico foi a criação de funções wavelet biortogonais com características específicas e pré-estabelecidas de interesse em aplicações como a teoria de sinais, análise de imagens e resolução numérica de equações diferenciais [1,7,9,10,14,26,30,34]. As wavelets biortogonais possuem propriedades de localização e cancelamento local de polinômios, fornecendo um método efetivo para a compressão de dados e estudos da regularização local [2,6,8,10]. Tornando-se, assim uma ferramenta apropriada nas representações de funções, ou sinais, em vários níveis de resolução ou frequência [25], permitindo seu estudo local e individualizado.

O objetivo deste artigo consiste em apresentar os conceitos de análise multirresolução biortogonal e algumas propriedades fundamentais de uma forma mais atual para pesquisadores e professores, estudantes de pós-graduação, e mesmo de graduação, interessados em tirar um maior proveito de tal tipo de ferramenta. Na Seção 2 e Seção 3 apresentam-se respectivamente a definição de análise de multirresolução e a análise de multirresolução biortogonal. Na Seção 3.1, a transformada wavelet. Na Seção 3.2, um exemplo de uma análise multirresolução. Na Seção 4, são apresentadas outras wavelets biortogonais. E na Seção 5, as considerações finais.

2. Análise de multirresolução

Nesta seção define-se o conceito de análise de multirresolução baseado em uma sequência de sub-espaços lineares encaixados e suas funções base conhecidas como funções escala. Posteriormente, caracterizam-se espaços complementares a esses espaços encaixados. Nesses novos espaços, as funções base são denominadas funções wavelets.

Por definição, uma análise de multirresolução (MR), do espaço

2(), é uma sequência de sub-espaços lineares Vj de 2(), gerada por uma função ϕ, conhecida como função escala.2 2 Para a devida clareza junto ao leitor iniciante, os Apêndices apresentam conceitos e esclarecimentos matemáticos. A MR {Vj, ϕ} satisfaz as seguintes condições:

1. ... ⊂ V-2V-1V0V1V2⊂ ..., = {0}, 2() = [( ∪j Vj)],

2. f(x) ∈ Vjf(2x) ∈ Vj+1;

3. f(x) ∈ V0f(x – k) ∈ V0, ∀k;

4. , é uma base Riesz de V0, ou seja, satisfaz a desigualdade

em que 0 < A, B < ∞, para todo ∈ ℓ2.

Como consequência dessas propriedades, tem-se os seguintes resultados:

1. Existe uma sequência h ∈ ℓ2 que satisfaz a relação de escala

em que h(k) são os coeficientes do filtro escala.

2. Para cada inteiro j, a família

forma uma base de Riesz de Vj. Ou seja, qualquer função deste espaço pode ser representada por essa família.

Considerando dois espaços encaixados VjVj+1, define-se os espaços Wj = Vj+1Vj que contêm a diferença de informação entre o nível de resolução j e o nível mais refinado j + 1, ou seja, os detalhes entre um nível e o seguinte. Essa caracterização é de grande importância na teoria wavelet.

3. MR biortogonal

A partir do conceito de MR constrói-se uma MR biortogonal, designada MRb, que consiste de pares {Vj,ϕ} e {V* j*} de MR satisfazendo a relação de biortogonalidade

Esses pares estão relacionados por

2() = V0 + V* 0 ,

em que V* 0 indica o espaço das funções perpendiculares a V* 0.

Analogamente, para um j fixo, as famílias {} e {} também são biortogonais,

Neste caso, são válidas as somas diretas Vj+1 = Vj + Wj e V* j+1 = V* j + W* j em que Wj = Vj+1V* j e W* j = V* j+1Vj.

Definindo as funções ψ e ψ* como

em que usualmente escolhe-se

g(k) = (-1)k+1h*(-k+1), g*(k) = (-1)k+1h(-k+1).

Prova-se que as famílias

são bases de Riesz de Wj e W* j.

Essas famílias de funções satisfazem as condições de biortogonalidade

Em consequência dessa construção, uma MRb é uma ferramenta muito útil para o estudo de funções f2(), pois há duas formas de representá-las nos espaços da MR. A primeira, utiliza expansões em termos de funções escala, e a outra expansões em termos de wavelets. Funções podem ser aproximadas pelas suas projeções em Vj,

em que são os coeficientes escala. As projeções em Wj,

em que os coeficientes wavelet e Qj f(x) contêm a diferença de informação entre os níveis j e j + 1, i.e.,

Qj f(x) = [Pj+1 – Pj] f(x),

caracterizando esquemas de aproximação no espaço das funções wavelet. Em multinível para j0 < j, tem-se:

que está associado à decomposição

Vj+1 = Vj0 + Wj0 + ... + Wj.

que corresponde à seguinte fórmula

e à mudança de base

Essa representação em multinível permite a construção da transformada wavelet discreta e sua inversa conforme apresentado a seguir.

3.1. Transformada wavelet

Para efetuar a transformada wavelet discreta DWT = DWT e sua inversa IDWT = IDWT, i.e.,

calculam-se os coeficientes e obtidos dos coeficientes por meio de algumas manipulações das relações de escala de ϕ* e ψ*, de tal forma que:

e

Esses algoritmos de análise ou decomposição, da transformada, e de síntese ou reconstrução, da transformada inversa, são conhecidos como algoritmos Mallat [24]. Ao final do processo de decomposição, o armazenamento dos coeficientes wavelet e escala é feito no mesmo vetor de dados inicial e, dessa forma, não há necessidade de área física extra de armazenamento.

A seguir apresenta-se um exemplo canônico de MRb utilizando as funções de Haar e também como sua respectiva transformada wavelet pode ser obtida.

3.2. Exemplo - MRb Haar

Em 1910, Haar [12] mostrou que certas funções podem ser transladadas e dilatadas de modo a criar uma base que gera o espaço

2(). Com o desenvolvimento da teoria de MR verificou-se que o sistema de Haar é um caso particular de uma MRb .

Nesta seção, apresenta-se essa MRb em que considera-se ϕ = ϕ* e ψ = ψ*, com a função de Haar ϕ(x) definida por

Em multinível, as funções , também são chamadas de funções de Haar.

Como ilustração, considere a Fig. 1 em que a primeira coluna contém uma função de Haar básica de V0, a segunda coluna uma única função de Haar cujo comprimento é metade da função de V0, e sua translação, sendo ambas funções de V1. A terceira coluna contém quatro translações da função de Haar de comprimento igual a 1/4. Enquanto a quarta coluna apresenta oito translações de uma função de Haar de comprimento 1/8.


A soma de duas funções de Haar de comprimento 1/2 produz a função escala de Haar de comprimento 1, ou seja,

ϕ(x) = ϕ(2x) + ϕ(2x – 1),

e a função wavelet de Haar,

ψ(x) = ϕ(2x) – ϕ(2x – 1).

Para obter os coeficientes e , resolve-se o sistema

em que se obtêm

Nas Figs. 2, 3 e 4 são apresentadas as funções escala de Haar e a decomposição wavelet de V3, V2, V1. Continuando a decomposição do espaço gerado pelas funções escala até o espaço V0, obtem-se a decomposição completa de V3 (Fig. 5). Considerando que é um elemento de V3 segue que





em que é um número real. Separando os índices pares dos ímpares e usando a Eq. (14) obtém-se que

em que

ou seja, é um elemento de V2 + W2.

De modo geral, dado Vj+1, as transformações de análise e síntese fornecem um algoritmo para se mudar do espaço Vj+1 para o espaço VjWj e vice-versa, ou seja,

Análise: {cj+1} → {cjdj}

Síntese: {cjdj} → {cj+1}

Considera-se agora um exemplo de uma operação de análise em 5 níveis de decomposição para a função

apresentada na Fig. 6. Na primeira coluna dessa figura são plotadas as aproximações de em V4, V3, V2, V1 e V0, na segunda coluna os detalhes de uma resolução a outra, ou seja, os detalhes em W4, W3, W2, W1 e W0. Pode ser observado o efeito dos filtros passa-baixa e dos detalhes de mais alta frequência sendo gradativamente extraídos do representação inicial da função.


3.3. Propriedades de uma MRb

Nesta seção são apresentadas algumas das principais propriedades de uma MRb que contribuíram bastante para seu sucesso em diferentes áreas. Entre elas, as propriedades de aproximação multi-escala local, análise tempo-frequência e de regularização local.

Momentos nulos e suavidade: A ordem de precisão de esquemas de aproximação é usualmente definida pela capacidade que esses esquemas possuem de reproduzir polinômios. No caso específico de aproximações em termos das transladadas de uma função básica numa malha regular, isto é caracterizado pela condição de Strang-Fix [15].3 3 Ver Apendice 5 para mais detalhes sobre a CSF, suavidade e momentos nulos. Em uma MRb as funções escala ϕ e suas duais ϕ* satisfazem a condição de Strang-Fix (CSF) por construção.

Uma importante característica dos coeficientes wavelet é que a sua ordem de grandeza está associada à suavidade da função f, no suporte de , e ao número de momentos nulos da função ψ*. Portanto, os coeficientes wavelet podem ser usados como indicadores locais de regularidade das funções analisadas, pois tipicamente são pequenos em regiões de suavidade e maiores em regiões com singularidade. Por essa razão, expansões em wavelets possuem a vantagem de poderem ser mais econômicas para uma classe bem ampla de funções. Assim, a amplitude dos coeficientes wavelet é uma medida da regularidade local da função analisada. Por exemplo, seja a função suave por partes, como ilustrado na Fig. 7. Como pode ser visto na representação no plano posição × escala (x × j), a maioria dos seus coeficientes wavelet são desprezíveis e podem ser desconsiderados. Esse é o princípio básico de muitas aplicações de wavelets.


Pode-se verificar que o grau de suavidade de uma função escala está diretamente relacionado com a ordem da sua CSF, ou seja, a suavidade de ϕ, e consequentemente de ψ, aumenta com a ordem da CSF p. Logo, quanto mais suave for a ψ, maior será o número de momentos nulos de ψ*. Neste paradigma de momentos nulos/suavidade das funções wavelet, a interpretação das seguintes formas de representação pode ser diferente:

Supondo que ψ* possui mais momentos nulos que ψ, então, ψ é muito mais suave que ψ*. Logo, a primeira forma (21a) é muito mais indicada do que a segunda (21b), do ponto de vista de compressão de dados. Essa compressão é realizada por meio da reconstrução dos dados apenas com os coeficientes maiores que um certo valor de corte escolhido. Para exemplificar isso, a seguir são apresentados os resultados da compressão de uma imagem do canal infra-vermelho termal do satélite METEOSAT (Fig. 8a). Consideram-se essas duas formas de representação no caso bidimensional, que é descrito em detalhes em [8]. Neste exemplo, utilizam-se as representações associadas a (ψ* , ψ) e (ψ, ψ*) das Eqs. (21a) e (21b), com apenas os coeficientes wavelets significativos de módulo maior que 100. Para (ψ*, ψ) apenas 8% dos coeficientes wavelet foram significativos.


Dupla localização: As wavelets biortogonais possuem duas características fundamentais: a localização física e a localização em frequência.

A função escala ϕ(x) concentra-se em um intervalo finito, com comprimento Δx. Desta forma, à medida que j aumenta, ϕ(2jx – k) fica localizada em intervalos de comprimento cada vez menores, de escala Δj x = O(2-j). Os índices k indicam a translação k2-j efetuada. Assim, em cada nível de escala j, todas as funções escala possuem a mesma forma, só mudando a posição em que estão localizadas, que diferem por um múltiplo inteiro da escala. Este comportamento é similar para as wavelets, garantindo assim a localização física.

Tendo em vista as propriedades de dupla localização das wavelets, tanto no domínio temporal quanto no domínio das frequências, percebe-se que os coeficientes wavelet são uma medida do conteúdo frequencial de f associado às frequências ξ ∈ Ωj que ocorrem no suporte de (t). Neste sentido, a transformada wavelet é do tipo local em tempo-frequência, com resoluções temporal e frequencial inversamente proporcionais

Δj x ×Δjξ = constante.

Essa expressão está relacionada com um teorema de Fourier, e na física é conhecida no contexto do Princípio de Incerteza de Heissenberg. Uma boa discussão desse assunto é apresentada em [21, 23, cap. 12 e 13].

4. Wavelets biortogonais e teoria de filtros

No domínio da frequência, a relação de escala é expressa como

em que H(ξ) = é um filtro do tipo passa-baixa, i.e., H(0) = 1 e H(π) = 0, associado a ϕ (Fig. 9). Em consequência dessa construção das funções escala em termos de um filtro passa- baixa 9(ξ), a transformada de Fourier (ξ) está localizada simetricamente em uma região centrada em torno de ξ = 0.


Desta forma, em operações de convolução, (ξ) pode ser interpretada como um filtro passa-baixa, que privilegia as baixas frequências. Fazendo uma mudança de escala, resulta que (2-jξ) também é um filtro passa-baixa, centrado em torno de ξ = 0, com largura de banda proporcional a 2j. O caso das funções wavelets é diferente. O filtro wavelet G(ξ) = é do tipo passa-banda, i.e., G(0) = 0 e G(π) = 1 (conforme Fig. 9).

Portanto, (ξ) também é uma função simétrica, mas que se anula em ξ = 0. Para ξ > 0, concentra-se em uma região Ω de comprimento Δξ. Desta forma, em operações de convolução, (ξ) pode ser interpretada como um filtro passa-banda, que privilegia as frequências |ξ| ∈ Ω. Fazendo uma mudança de escala, resulta que (2-jξ) também é um filtro passa-banda, com localização em uma região Ωj, com largura de banda Δjξ, proporcional a 2j.

Outros exemplos referente a MRb são as funções wavelet biortogonais splines em que as funções wavelet ψ* são funções splines4 4 Ver propriedades dessas funções splines no Apêndice 6. . As conhecidas famílias wavelet ortogonais de Daubechies são casos particulares dessas famílias biortogonais splines em que ϕ = ϕ* e ψ = ψ*. Numa visão mais atual, as wavelets biortogonais splines e as wavelets ortogonais de Daubechies estão associadas a pares de filtros biortogonais H e H*, tal que

satisfaça a relação

em que PM são filtros interpolantes de Lagrange associados a esquemas de interpolação. Para cada inteiro par M = 2K, o filtro interpolante PM é definido por

para K > 1, e possui as seguintes propriedades:

1. simetria em torno de ξ = 0, i.e., PM(ξ) = PM(-ξ).

2. positividade, PM(ξ) > 0, para -π < ξ < π, e PM(ξ) = 0 se e somente se ξ = ±π. Além disso, para = 0, e = ±π,

Filtros que satisfazem as propriedades acima são conhecidos na teoria de banco de filtros como linear-phase halfband maxflat filters [6]. Os exemplos de filtros biortogonais H e H* apresentados neste trabalho são obtidos por fatorizações do filtro PM. Por isso esse filtro possui um papel importante na teoria wavelet.

As wavelets splines biortogonais são construídas em [6]. Para cada 1 < N* < M, seja N, de mesma paridade de N*, tal que M = N+N*. Seja H* = HN* o filtro definido por

e seja H = HN,N* o filtro definido por

em que k = 0, se N* for par e k = 1, se N* for ímpar.

Na Fig. 10 estão os gráficos dos filtros biortogonais H, H*, G, G* para (N,N*) = (1,5) e na Fig. 11 estão apresentadas suas respectivas funções escala e wavelets.



Para a construção das funções wavelets ortogonais de Daubechies utiliza-se outra fatoração do filtro PM considerando H = H*. Isso dá origem aos filtros ortogonais de Daubechies H = HK(ξ),M = 2K, de tal forma que

PM(ξ) = |HK(ξ)|2.

Os coeficientes h(k) desse filtro são nulos para k < 0 e para k > M.

As respectivas funções escala ϕ = ϕK possuem suporte [0,M – 1] e definem uma família ortogonal em que ϕ* = ϕ e ψ* = ψ. Essas funções escala não apresentam qualquer tipo de simetria, exceto quando K = 1 em que tem-se a wavelet de Haar. Isto pode ser verificado no exemplo das função escala e wavelet de Daubechies, para K = 2, apresentadas na Fig. 12 juntamente com suas transformadas de Fourier e para K = 4, na Fig. 13. Observa-se também que a medida que K aumenta a suavidade dessa funções também aumentam.



5. Considerações finais

Em suma, a transformada wavelet revela qual parte do dado ou da função analisada transporta energia e em quais frequências, como também permite avaliar a regularidade local desse dado ou função. Essa frase traduz talvez quase todo o espírito, do ponto de vista físico, dessa ferramenta.

Existem muitas outras famílias de wavelet, como, por exemplo, a wavelet de Morlet, de Maar, de Meyer, construídas e aplicadas em vários problemas físicos [7,9,14,17,19], as wavelet packets [25], e as dual-tree wavelets [22]. Contudo, na maioria das aplicações, as funções wavelet utilizadas têm sido as famílias de Morlet e as biortogonais de Daubechies. Há muitos programas e informações sobre wavelets disponíveis gratuitamente, como apresentado na Tabela 1.

Existe um esforço necessário inicial por parte dos interessados para a utilização do formalismo das transformadas wavelet. Entretanto, isso é realmente compensado por ser esta uma ferramenta muito útil na análise de dados e de equações diferenciais, constituindo um cenário encorajador, senão muitas vezes, indispensável, para as atividades de ensino e pesquisa.

Agradecimentos

As autoras agradecem a Dra. Sônia Gomes, ao Dr. Odim Mendes e ao Dr. José Eduardo Castilho, pelas sugestões e incentivos que levaram a essa publicação. Agradecem também a ANR, à CAPES (pelo apoio financeiro aos eventos WWLET(PAEP 0880-08-6, 86/2010-29, 126/2012-83), ao CNPq (Proc. 483226-2011/4, 306828-2010/3, 307511/2010-3, 454160-2008-9, 308680/2007-3, 309017/2007-6, 486165/2006-0, 170153/2005-3 e 382465/01-6) e à FAPESP (Proc. 2009/548995-3, 2008/09736-1 e 2007/07723-7) pelo auxílio dado as suas pesquisas e desenvolvimentos que serviram de base a este trabalho.

Recebido em 1/11/2011; Aceito em 23/6/2012; Publicado em 21/11/2012

Conceitos matemáticos

Algumas das propriedades matemáticas e definições de interesse na MR, muito esclarecedores principalmente para professores são apresentadas nesta seção [2,3,11,13].

As funções que pertencem ao espaço

2 obedecem a seguinte condição

O espaço ℓ2 consiste de todas as sequências de números complexos cuja soma dos módulos ao quadrado é finita.

Uma família { ϕn} de vetores em uma base do espaço de 2 é um frame se existe duas constantes A > 0 e B > 0 tais que, para qualquer f em 2,

Se A = B, o frame é chamado de frame seguro. Uma base Riesz é um frame cujos vetores são linearmente independentes.

Ortogonalidade e biortogonalidade

Se uma função f(t) ∈ 2 é expandida em termos de um certo conjunto ortonormal {ϕk(t)}k Z, pode-se escrever:

Uma vez que se conhece uma função f(t) para todo domínio, os coeficientes podem ser obtidos pelo produto interno da função com as bases, i.e.:

Em certas aplicações, no entanto, as funções bases ortonormais podem carecer de algumas propriedades desejáveis do processamento de sinais. Nessas oportunidades, representações biortogonais tornam-se uma eficiente alternativa para superar algumas das limitações de ortogonalidades e fornecer uma boa aproximação para uma dada função. Seja assim {ϕk(t)}k Z um conjunto de funções bases biortogonais. Existindo um outro conjunto de funções bases {k(t)}k Z2, tal que:

o conjunto {

k(t)}k Z é chamado bases duais de {ϕk(t)}k Z. A linha sobre a função significa o seu complexo conjugado.

Dessa forma, pode-se expandir uma função g(t) em termos da base biortogonal:

e obter os coeficientes por meio de:

Por outro lado, a função g(t) pode ser expandida em termos da base dual:

e obter os coeficientes duais por meio de:

Diferentemente das bases ortogonais, que pertencem ao mesmo espaço, em uma base biortogonal as bases duais não tem de estar no espaço original. Quando acontece das bases biortogonais e sua dual estarem no mesmo espaço.

Suporte compacto

Se a função f é não zero com suporte compacto, então sua Transformada de Fourier não pode ser zero em todo o intervalo. Isso implica que se a sua transformada de Fourier possui suporte compacto, então a função f não pode ser zero em todos os intervalos temporais. Se as restrições de Heisenberg são verificadas, é impossível existir uma função do 2 que possua suporte compacto nos domínios de tempo e frequência (Fourier). Isso significa que não existe uma análise frequencial instantânea para sinais de energia finita.

No caso da MRb, seja p a ordem da condição de Strang-Fix CSF satisfeita por ϕ, i.e., todo polinômio de grau menor ou igual a p pode ser representado exatamente por ϕ(x) e suas transladadas ϕ(x – k). Pode-se verificar que p + 1 é exatamente a multiplicidade do zero do filtro H(ξ) em ξ = π. Essa propriedade garante a ordem de aproximação

O mesmo é válido para as duais ϕ*. Se p* é a ordem da CSF das ϕ*, a multiplicidade do zero em H*(ξ) em ξ = π é p* + 1.

Por outro lado, como G(ξ) = , a multiplicidade do zero do filtro G(ξ), em ξ = 0, é igual a p* + 1. Analogamente, como G*(ξ) = , a multiplicidade do zero do filtro G*(ξ), em ξ = 0, é igual a p + 1. Pode-se verificar que o número de momentos nulos de uma função wavelet é igual a multiplicidade do zero do filtro G(ξ) em ξ = 0. Portanto,

que está relacionado com

Analogamente, para as wavelet duais ψ*, tem-se que:

que está relacionado com

splines

As funções B-splines B(x) de ordem ℓ, em que x, são construídas a partir da seguinte convolução:

B(x) = (B0 * B-1)(x), ℓ > 1,

em que B0(x) é a função característica no intervalo [0,1], i.e.,

Para calcular as funções B-splines de ordem superior, utiliza-se a seguinte fórmula:

O primeiro termo entre parênteses da equação anterior representa uma binomial

e s(x) é expresso da forma a seguir

O suporte das B(x) é

Essas funções são sempre positivas no interior desse suporte e elas são simétricas em torno do ponto zero se ℓ for ímpar e do ponto 1/2 se ℓ for par. A função é a conhecida função chapéu, i.e.,

Exemplos de funções B(x), para ℓ = 0, ..., 3, são apresentados na Fig. 14, em que é possível verificar as propriedades de suporte compacto, positividade e simetria.


A transformada de Fourier das funções B(x) também possui uma fórmula explícita, que é expressa por,

Isto facilita a construção do filtro escala, H*N*,N, das funções biortogonais splines.

Características das wavelets

Um maior detalhamentos das características das funções wavelet biortogonais splines e ortogonais e Daubechies estão apresentadas a seguir.

Biortogonais splines

O filtro H* é associado à função B-spline ϕ* = BN*, de ordem N* – 1. Neste caso, a MR {ϕ*,V* j} está associada aos espaços das funções em que a derivada de ordem N* – 2 é contínua, e polinomial por partes de grau N* – 1. Por outro lado, o filtro HN,N* define uma função escala ϕ = ϕN,N* de tal forma que {ϕ,Vj} e {ϕ*,V* j} definem uma MRb. Da mesma forma que ϕ*, ϕ é simétrica em torno de x = 0 se N for par, e simétrica em torno de x = 1/2 se N for ímpar. O suporte da função escala ϕ é [-N, N + 1].

A ordem dos zeros dos filtros H e H* em π são N e N*. Então, CSF para a função escala ϕ = ϕN,N* é da ordem de N – 1 e a CSF de sua dual é da ordem de N* – 1. Logo, a wavelet ψ tem N* – 1 momentos nulos, enquanto sua dual ψ* possui N – 1.

Os coeficientes dos filtros h* e h, são números racionais cujos denominadores são potências de 2. Esta propriedade reduz erros na implementação numérica de algoritmos que utilizam esses valores. Além disso, são simétricos em torno de k = 1/2, se N for ímpar, ou em torno de k = 0 se N for par. Na Tabela 2 são apresentados os coeficientes h(k) e h*(k) associados a (N,N*) = (1,5), e (2,4), os valores não incluídos, não nulos, são obtidos por simetria.

Ortogonais de Daubechies

Como a ordem dos zeros dos filtros HK em π é K, então, a CSF para a função escala ϕ é da ordem de K – 1 e a wavelet ψ tem K – 1 momentos nulos. A Tabela 3 contém esses coeficientes para K = 2 e 4.

Maiores detalhes sobre a construção e propriedades dessas funções podem ser encontrados na Ref. [6, cap. 6, pag. 195].

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Apêndices

Espaços2e2

Apendice 5

(0) ≠ 0 e (ζ) tem zeros de ordem .

Seja p um inteiro não negativo. Uma função f satisfaz a condição de Strang-Fix de ordem p se (0) ≠ 0 e (ζ) tem zeros de ordem p + 1 em todos os pontos ζ = 2 πk, 0 ≠ k .

Apêndice 6

  • 1
    E-mail:
  • 2
    Para a devida clareza junto ao leitor iniciante, os
    ApêndicesApêndicesEspaços2e ℓ2 apresentam conceitos e esclarecimentos matemáticos.
  • 3
    Ver
    Apendice 5Apendice 5(0) ≠ 0 e (ζ) tem zeros de ordem . Seja p um inteiro não negativo. Uma função f satisfaz a condição de Strang-Fix de ordem p se (0) ≠ 0 e (ζ) tem zeros de ordem p + 1 em todos os pontos ζ = 2 πk, 0 ≠ k ∈ . para mais detalhes sobre a CSF, suavidade e momentos nulos.
  • 4
    Ver propriedades dessas funções
    splines no
    Apêndice 6Apêndice 6.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Dez 2012
    • Data do Fascículo
      Set 2012
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