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Articulação de textos sobre nanociência e nanotecnologia para a formação inicial de professores de física

Articulation of texts on nanoscience and nanotechnology for the initial training of physics teachers

Resumos

Evidências de que a física moderna e contemporânea deve ser trabalhada no Ensino Médio, agregadas a indícios de que muitos professores não a ensinam, entre outros motivos, por não se sentirem aptos a fazê-lo, nos levaram a uma proposta de um conjunto de textos selecionados a partir de um trabalho preliminar, envolvendo 15 estudantes de uma disciplina de Licenciatura em Física, com textos sobre nanociência e nanotecnologia. Na seleção, que se baseou em ampla revisão sobre o tema, privilegiamos os textos em linguagens alternativas ao uso quase exclusivo da linguagem matemática e buscamos também possibilitar que o estudo ocorra a partir de diferentes estratégias de ensino, com destaque para a história da ciência e a leitura de divulgação científica.

nanociência e nanotecnologia; ensino de física; formação inicial de professores; educação em ciência


Evidence that modern physics should be taught in high school and that many teachers do not teach this subject, among other reasons, because these teachers do not feel able to do it, led us to a proposal for a set of texts selected from a preliminary study involving 15 students in a course of teacher training in physics, with texts on nanoscience and nanotechnology. In the selection, which was based on extensive review of the subject, we focused on texts in alternative language that avoids the almost exclusive use of mathematical language and seeks also allow the study for different teaching strategies, especially with the history of science and reading popular science.

nanoscience and nanotechnology; physics teaching; professional teacher's education; science education


PESQUISA EM ENSINO DE FÍSICA

Articulação de textos sobre nanociência e nanotecnologia para a formação inicial de professores de física

Articulation of texts on nanoscience and nanotechnology for the initial training of physics teachers

Maria Consuelo A. LimaI,1 1 E-mail: mconsuelo@ufma.br. ; Maria José P.M. de AlmeidaII

IDepartamento de Física, Universidade Federal do Maranhão, São Luís, MA, Brasil

IIGrupo de Estudo e Pesquisa em Ciência e Ensino, Faculdade de Educação,Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil

RESUMO

Evidências de que a física moderna e contemporânea deve ser trabalhada no Ensino Médio, agregadas a indícios de que muitos professores não a ensinam, entre outros motivos, por não se sentirem aptos a fazê-lo, nos levaram a uma proposta de um conjunto de textos selecionados a partir de um trabalho preliminar, envolvendo 15 estudantes de uma disciplina de Licenciatura em Física, com textos sobre nanociência e nanotecnologia. Na seleção, que se baseou em ampla revisão sobre o tema, privilegiamos os textos em linguagens alternativas ao uso quase exclusivo da linguagem matemática e buscamos também possibilitar que o estudo ocorra a partir de diferentes estratégias de ensino, com destaque para a história da ciência e a leitura de divulgação científica.

Palavras-chave: nanociência e nanotecnologia, ensino de física, formação inicial de professores, educação em ciência.

ABSTRACT

Evidence that modern physics should be taught in high school and that many teachers do not teach this subject, among other reasons, because these teachers do not feel able to do it, led us to a proposal for a set of texts selected from a preliminary study involving 15 students in a course of teacher training in physics, with texts on nanoscience and nanotechnology. In the selection, which was based on extensive review of the subject, we focused on texts in alternative language that avoids the almost exclusive use of mathematical language and seeks also allow the study for different teaching strategies, especially with the history of science and reading popular science.

Keywords: nanoscience and nanotechnology, physics teaching, professional teacher's education, science education.

1. Introdução

A literatura sobre o ensino da física vem ratificando a necessidade de trabalhar com a Física Moderna e Contemporânea (FMC) no Ensino Médio (EM). Revisões de pesquisas sobre o tema FMC, como as realizadas por Ostermann e Moreira [1] e por Silva e Almeida [2], apontam justificativas que evidenciam a necessidade desse ensino. Dentre essas justificativas, destacamos as mudanças de concepções de mundo na vida do homem moderno.

No contexto da FMC, a mecânica quântica fornece conceitos fundamentais para o desenvolvimento de novas tecnologias, merecendo destaque as pesquisas com materiais em escala nanométrica, as chamadas nanociências e nanotecnologias, que têm papel bastante relevante em nossa sociedade, como apontamos a seguir.

No campo de ação da ciência e da tecnologia, a nanociência e a nanotecnologia vêm se estabelecendo como engenhosidade emergente com grande potencial para a solução de problemas presentes na nossa sociedade. Diante disso, muitos países, destacadamente os mais industrializados, vêm destinando volumosos recursos financeiros para o fomento de pesquisas em nanociência e em nanotecnologia - termos designados para o campo de pesquisas resultante da habilidade do homem em controlar e manipular estruturas básicas da matéria na escala de comprimento menor que 100 nanômetros, em pelo menos uma direção. O tamanho da unidade básica da escala nanométrica, um nanômetro, equivale a um bilionésimo do metro (1 nm = 1 m/1.000.000.000) e pode ser pensado como a soma dos diâmetros de cerca de dez átomos distribuídos em uma linha.

As enormes vantagens prometidas para aqueles que possuírem o conhecimento e a capacidade de explorar as nanotecnologias vêm motivando diferentes grupos, de setores públicos e privados, promovendo grande competitividade e, consequentemente, favorecendo o crescente desenvolvimento dessas pesquisas, as quais são, com maior frequência, associadas a grandes benefícios públicos - aplicações em produtos que trazem novas perspectivas para o homem, como a segurança, o bem-estar e a liberdade individual. Contrários a esses argumentos que procuram associar as tecnologias ao progresso, estudos mostram que, ao longo da história, o desenvolvimento das ciências e das tecnologias vem sendo utilizado por poucos grupos privilegiados economicamente e que, em lugar de minimizar problemas sociais, como a pobreza e a fome, vêm aumentando a desigualdade na distribuição de renda no mundo, incrementando os lucros dos investidores econômicos [3].

Para Kosal [4], uma grande preocupação com as nanotecnologias está associada à capacidade que elas possuem de produzir uma nova classe de armas, com potencial maior que as nucleares e que prometem alterar a divisão geopolítica do planeta. Entretanto, como na atualidade grande parte das aplicações das nanotecnologias ainda está no plano especulativo, a autora acredita que ainda haja tempo de escolher a implantação de políticas que permitam maximizar seus benefícios e minimizar seus efeitos negativos.

Em revisão a críticas proferidas à ciência e à tecnologia ao longo do século XX, Broadhead e Howard [5] identificaram a atualidade dessas críticas para as tecnologias emergentes, como a nanotecnologia. Os autores ressaltam que certos atos, como o do Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, ao afirmar que será "guiado pela ciência'', enfatizam a crença ingênua de que a ciência e os cientistas estão acima de qualquer suspeita e que podem ser entendidos como sinônimos de segurança e neutralidade. Essa persistente crença na inerente neutralidade da ciência dificulta não apenas respostas para muitas ameaças atribuídas às tecnologias atuais, mas também o entendimento público de que a ciência e a tecnologia devam ser pensadas de maneira integrada a práticas éticas, necessárias ao esclarecimento de que a investigação científica não é neutra e de que o desenvolvimento tecnológico não é inerente ao progresso.

Quanto ao ensino da FMC, sabemos que, na sua maioria, os cursos de Licenciatura em Física ainda ensinam a física com grande contingente de exercícios e problemas, com ênfase quase exclusivamente na linguagem matemática. Desse viés curricular decorre que, muitas vezes, o professor do EM se sente inseguro para trabalhar conteúdos de FMC [6] e, certamente, o grau de dificuldade aumenta, ao tratar de um assunto da física contemporânea, como a nanociência e a nanotecnologia.

Estudos em diversas áreas constatam que a prática sistemática de conhecimentos teve papel relevante nas sociedades desde tempos remotos. À medida que o homem desenvolvia estudos científicos e tecnológicos e os utilizava nas práticas diárias, a vida das pessoas passou a ser cada vez mais dependente desses conhecimentos.

Atualmente, a aplicação dos conhecimentos da ciência e da tecnologia tem ocupado um papel impactante em diferentes aspectos da vida do homem. Isso impõe uma participação intensa e vigilante sobre o uso dessas aplicações, o que exige dos educadores, especialmente do professor da Educação Básica das áreas relacionadas com esses saberes, a exemplo da física, o desenvolvimento de um trabalho direcionado e imprescindível para a sociedade. Para isso, faz-se necessário que, durante a formação desse professor, seja ressaltado o entendimento de que a ciência é um produto humano e, visto dessa forma, poderá contribuir significativamente para uma melhor compreensão das tecnologias pelo cidadão comum, preparando-o para fazer escolhas em sua vida privada e no contexto social.

Pesquisas mostram que a maioria da população mundial tem pouco ou nenhum conhecimento sobre nanotecnologia, mas revelam, também, a grande preocupação atual em tornar a população conhecedora dessa tecnologia, que promete muitos benefícios, porém também anuncia alguns riscos no seu uso. Muitos programas, a exemplo da implementação de cursos sobre aplicações das nanotecnologias, são desenvolvidos especificamente para promover motivação, entre estudantes nos diferentes níveis de escolaridade, para explorar o conhecimento do uso dessa tecnologia e divulgar a existência de opções em carreiras acadêmicas neste campo de estudo [7]. Os incentivos financeiros destinados às pesquisas básicas e às suas aplicações são originários tanto de instituições governamentais quanto de grandes empresas do setor privado [8].

Pesquisa realizada com uma amostra de 162 pessoas - 55% das quais tinham formação superior completa -, na cidade de Campinas, São Paulo, sobre a percepção pública da ciência nos leva a pensar sobre a urgente necessidade de mudanças na formação dos professores de física: o resultado apontou que mais de 70% dos entrevistados acreditam que "os benefícios da ciência e da tecnologia são maiores que os efeitos negativos'' e aproximadamente 90% apontaram a importância de o cidadão participar em questões de ciência. Porém, somente aproximadamente 7% deles já tinham alguma experiência de tal prática e indicaram como principal obstáculo para a sua participação o desconhecimento sobre questões da ciência e da tecnologia [9].

A multidisciplinaridade do campo de estudo que envolve a nanociência e a nanotecnologia tem grande abrangência em áreas como a física, a química, a biologia e as engenharias. Mas os investimentos para aplicações nesse campo tecnológico estão praticamente em todos os setores de atividade humana, o que necessariamente envolve participação da sociedade tanto para a produção quanto para o consumo de seus produtos. Para tanto, a sociedade precisa estar preparada técnica e culturalmente para conviver com possíveis efeitos que o uso dessas novas tecnologias poderá trazer para a saúde, para a segurança e para o meio ambiente: será necessário, entre outras atitudes, participar de debates; tomar decisões sobre o que pesquisar; e, principalmente, exigir transparência de informações das pesquisas em novas tecnologiasç notadamente, em relação às nanotecnologias.

Considerando a importância de, durante a formação de licenciandos em física, enfatizar as atividades em ciência e tecnologia como produtos humanos, propomos que se trabalhe com um conjunto de textos envolvendo conteúdos de nanociência e nanotecnologia. Nosso propósito é contribuir para o preenchimento de uma lacuna existente em alguns cursos de formação de professores de física. O tema tem respaldo na legislação brasileira [10], que cobra revisão nos currículos dos cursos de formação de professores, com o intuito de inserir "estudos de cunho interdisciplinar, para formar professores que possam trabalhar novos enfoques, como solicitado pelos Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio'' [11], necessários ao cidadão para conviver com uma nova realidade que se estabelece.

Tendo em conta as justificativas aqui apresentadas, consideramos pertinente selecionar um conjunto de textos que pudessem ser trabalhados na formação inicial de professores de física e incluíssem aspectos relevantes da nanociência e da nanotecnologia. Para essa seleção, fizemos leituras de vários textos publicados no Brasil, buscando, neles, aspectos que consideramos pertinentes para a formação inicial do professor de física, e também realizamos práticas com licenciandos de física. Durante esse trabalho, nos orientamos pela seguinte questão: Para que produção de significados sobre a nanociência e a nanotecnologia a leitura do texto pode contribuir?

2. Suporte teórico para seleção dos textos

Como dito no item anterior, além de variadas leituras, atividades práticas contribuíram para a seleção do conjunto dos textos, os quais deveriam conter aspectos relevantes da nanociência e da nanotecnologia para serem trabalhados na formação dos professores de física.

Pensando na possibilidade de atualização do currículo do curso de Licenciatura em Física, organizamos aulas de uma de suas disciplinas em uma das três universidades estaduais paulistas. A disciplina é sugerida em catálogo para o oitavo semestre do curso, mas, como não tem pré-requisitos, ela recebe alguns alunos que cursam os primeiros semestres. Além disso, por ser ela parte de um curso que tem várias habilitações, uma das quais é a Licenciatura, vários alunos mudam de habilitação durante o curso ou fazem mais de uma. Assim, não se pode esperar homogeneidade nos saberes já adquiridos pelos licenciandos.

O trabalho realizado em sala de aula foi desenvolvido em três etapas, com 15 licenciandos de física, durante o segundo semestre do ano de 2009. No primeiro dia de aula, aplicamos um questionário aos alunos, incluindo perguntas sobre experiências marcantes vivenciadas por eles como estudantes na universidade, sobre disciplinas já cursadas e solicitando opiniões sobre a profissão de professor de EM; propusemos uma questão referente aos conhecimentos sobre nanotecnologia, além de outras. A aplicação desse questionário teve o intuito de obter algum conhecimento sobre a formação dos alunos, sobre as representações que traziam para a sala de aula e sobre alguns de seus interesses como futuros professores.

Dos 15 estudantes envolvidos no estudo, 14 estavam no último ano do curso e somente um frequentava o terceiro ano. Mais de 50% deles afirmaram haver concluído quase todas as disciplinas envolvendo conteúdos de FMC, mas um aluno não havia concluído nenhuma delas.

As respostas ao questionário mostraram que 80% deles tinham alguma experiência docente: 60% no ensino formal - em escolas públicas, particulares ou cursinhos e, inclusive, em faculdades - e 20% somente com aulas particulares. Atuando como professores, eles haviam encontrado como obstáculos: a indisciplina em sala de aula, a ausência de base matemática e o desinteresse de seus alunos pelos temas abordados, além da dificuldade para elaboração das aulas e da falta de estrutura das escolas. Apesar de dois estudantes afirmarem não enfrentar qualquer dificuldade em sala de aula - justificando os resultados satisfatórios das experiências vivenciadas com a sólida formação recebida -, aproximadamente 50% responderam não estar preparados para lecionar no EM.

Quando conduzidos a imaginar tipos de estratégias de ensino e de recursos que poderiam ser utilizados para preparar um conjunto de aulas de física para o EM, os alunos descreveram abordagens do ensino, como o uso da história da física, mas principalmente por meio de aulas constituídas basicamente da exposição de teorias seguida por exercícios e, quando possível, ilustradas experimentalmente. Estratégias diferenciadas teriam a função apenas de tornar as aulas mais atrativas.

Mais da metade dos alunos havia participado de algum tipo de pesquisa científica e manifestou a possibilidade de continuar estudando em outra habilitação, outro curso de graduação ou no mestrado. Apenas um deles admitiu concluir seus estudos após o término do curso de Licenciatura. Como experiências positivas na universidade, relataram vivências no ensino superior, envolvendo aulas com conteúdos de filosofia, epistemologia, história da ciência, física moderna - experimental e teórica -, tanto quanto o conhecimento de valores específicos da área de educação, aulas com professores bem preparados e discussões com colegas. Já, ao relatarem as vivências negativas, falaram sobre indecisão na escolha da modalidade do curso, falta de zelo do Instituto de Física em relação ao curso de Licenciatura, docentes que consideram o curso de formação de professores como um valor menor, elitização da universidade, distância da família e pouca motivação nas disciplinas de matemática.

Também lhes foi perguntado a respeito dos conceitos com que deveriam trabalhar com os alunos: "Você saberia contar a alguém que não estuda física o que é Mecânica Quântica? Nanotecnologia? Conte resumidamente o que você diria e/ou falaria''. As respostas sobre Mecânica Quântica foram: "não saberia [o que responder]'' e termos evasivos como "um pouco'', "depende para quem eu iria contar''. Essas respostas parecem contradizer a formação que disseram ter recebido. Outros estudantes afirmaram: "explicaria o espectro da radiação do corpo negro'', "explicaria o efeito Compton'', "[descreveria a] mecânica em termos moleculares que não podemos ver, mas sentimos'', "a mecânica no nível atômico'', porém quatro estudantes não deram resposta alguma.

Em relação à nanotecnologia, seis alunos fizeram alguma relação com estudos em escala nanométrica e os outros nove se posicionaram com as respostas: "Mais ou menos. Com uma hora conseguiria preparar algo''; "Eu diria o que é ..., mas não sei se eles entenderiam bem''; "Precisaria de tempo pra organizar as ideias''; "Teria alguma dificuldade [...]''; "É um tema bastante complicado para ser explicado a um leigo em física. Não sei como explicar''; "Não sei, porque nunca tentei antes. Acho que para isso é necessária uma conversa bem informal utilizando exemplos simples''; "Já tentei algumas vezes sem conseguir êxito''; "nanotecnologia é a tecnologia cada vez em menor espaço com maior capacidade'', e conclui "é difícil falar sobre isso; é um assunto extremamente cuidadoso para ser compreendido em uma frase'' e "Não sei ao certo o que faria''. Dessas respostas podemos inferir a falta de um delineamento mais específico dos estudantes sobre esse assunto.

As respostas dos alunos, referentes ao questionário do primeiro dia de aula, em que constatamos apenas um estudante que ainda não concluíra as disciplinas com conteúdos de FMC, nos levam a julgar que as disciplinas de FMC, da forma como foram ministradas, pouco contribuíram para que os licenciandos, como futuros professores da Educação Básica, construíssem imaginários em que se vissem efetivamente utilizando esses conteúdos quando professores.

Numa segunda etapa, após a escolha dos textos a serem trabalhados, grupos de alunos estudaram em casa e elaboraram sínteses de textos, seguidas de apresentação em forma de seminários na sala de aula. Os trabalhos foram desenvolvidos com o livro Nanociências: A Revolução Invisível [12]; com uma palestra de Feynman [13] - considerada, por muitos físicos, um referencial para o início dos estudos sobre as nanotecnologias -, proferida em 1959, no Instituto de Tecnologia da Califórnia, em Pasadena, Estados Unidos da América; e com um terceiro texto sobre simulações computacionais no ensino de física [14].

O primeiro texto é uma tradução brasileira, de 2009, de um livro de divulgação científica, escrito originalmente na França, em 2008. Os autores são um engenheiro, doutor em física e pesquisador do Centre National de La Recherche Scientifique, em Toulouse, França, e uma jornalista que tem se dedicado à divulgação científica. Eles essencialmente apresentam: noções conceituais e históricas sobre nanociência e nanotecnologia, a partir das primeiras ideias sobre miniaturização até os limites da miniaturização atual; fatos da política de financiamento governamental estadunidense, tidos como responsáveis pelo impulsionamento das pesquisas em nanotecnologia; principais aplicações atuais; perspectivas para aplicações futuras, levantando questões que procuram refletir sobre as consequências do uso de produtos da nanotecnologia; discussões envolvendo questões éticas e pontos de vista de grupos que consideram as aplicações em nanotecnologia a salvação da humanidade e de outros que as consideram uma ameaça pública para a sociedade.

Entre os acontecimentos históricos sobre a nanociência e a nanotecnologia, Joachim e Plévert polemizam o fato de o físico Richard Feynman ser considerado o pai das nanotecnologias e afirmam que "Feynman não previu o advento da nanotecnologia, como muitas vezes se escreve.'' [15]; e, em relação à palestra de Feynman, dizem que "Hoje esse discurso é considerado palavra de evangelho e qualificado, erradamente, de fundador, enquanto Feynman é consagrado Pai das Nanotecnologias'' [16]. Para melhor compreensão das posições polêmicas desses autores, foi trabalhado também o texto da palestra de Feynman proferida à comunidade dos físicos estadunidenses, na noite de 27 de dezembro de 1959, no qual se lê:

[...] quero falar sobre a manipulação e controle de coisas em pequena escala. Mal digo isto, as pessoas falam-me logo da miniaturização e até onde já progrediu hoje em dia. [...] Mas isto não é nada. É o passo mais primitivo e lento na direção que tenciono discutir. Há um mundo espantosamente pequeno abaixo desse. No ano de 2000, quando olharem para trás, para hoje, vão questionar-se por que é que só em 1960 é que alguém começou a mover-se seriamente nesta direção. [17]

Feynman ressalta o grande número de aplicações tecnológicas que teria esse novo campo de estudo e a contribuição que o microscópio eletrônico traria para o conhecimento do sistema biológico, se o poder de resolução desse microscópio fosse aumentado cem vezes. Ressalta a necessidade de fazer computadores menores, à medida que passassem a ser mais rápidos e mais elaborados.

Atualmente, o computador vem sendo utilizado para elaborações de simulações e modelagens em pesquisas científicas e tecnológicas, em diversos setores, como nas pesquisas em nanotecnologia, com um valor inestimável. No ensino de física, as simulações também tiveram alguns avanços, embora existam alguns questionamentos sobre sua utilização. Para discutir esse tema, levamos para sala de aula o texto "Possibilidades e limitações das simulações computacionais no ensino de física'' [14], com a pretensão de compartilhar com os licenciandos em física uma discussão que já vem sendo estabelecida entre os pesquisadores da área de ensino de ciência.

O conteúdo do livro em estudo [12] foi dividido para ser trabalhado por quatro grupos, enquanto o texto de Feynman [13] foi entregue a outro grupo. Os cincos grupos apresentaram seminários com os textos lidos, seguidos de discussões por toda a classe. A sugestão foi de que todos os estudantes lessem todos os textos. O de Medeiros e Medeiros [14] foi apresentado pela primeira autora deste texto, que acompanhou todas as aulas; a segunda autora foi a professora responsável pela disciplina. Também foi dito aos estudantes que eles poderiam elaborar os seminários utilizando diferentes abordagens, o que os estimulou apresentar alguns comentários sobre Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTC) e história da ciência, abordagens que muitos deles estavam estudando ou já haviam estudado em outras disciplinas.

A terceira e última etapa ocorreu no último dia de aula, quando os estudantes responderam quatro questões: 1 - Que tema(s) de física moderna e contemporânea: (a) você acha que pode(m) ser trabalhado(s) no Ensino Médio?; (b) você trabalharia com esse(s) tema(s)? 2 - O que os textos do livro "Nanociências, a revolução invisível'' trouxeram de novo para você? Se não trouxeram nada, diga por quê. 3 - Pensando na possibilidade de trabalhar "nanociência'' no Ensino Médio, descreva: (a) vantagem(ns) e (b) dificuldade(s). 4 - Admita que seja interessante trabalhar a física no Ensino Médio numa perspectiva cultural, com uma estratégia que suponha as interligações entre Ciência, Tecnologia, Sociedade (CTS). Você acha que conteúdos da nanotecnologia seriam úteis para isso? Se sua resposta for não, justifique. Se sua resposta for sim, de que maneira? O que você trabalharia?

Em relação à possibilidade de trabalhar com temas de FMC no EM, constatamos que todos os 15 alunos indicaram possibilidades de trabalhar com conceitos de mecânica quântica e/ou de teoria da relatividade. Entretanto, embora com respostas afirmativas como "acredito que com esses temas podemos estimular os alunos a desenvolverem a física com um olhar diferente'' e "[...] é possível analisar e propor uma discussão interessante'', alguns deles fizeram ressalvas do tipo: "Sim, dependendo da turma. É importante que toda a turma se envolva e decida juntamente com o professor o que deve ser trabalhado com relação à física moderna'', "Sim, mas... não acredito que todos os professores devam trabalhar se não forem capazes'', "Sim. Porém, apenas se este conteúdo não atrapalhasse o conteúdo 'tradicional' e pudesse ser dado de forma lenta e bem trabalhado'' e "apenas como curiosidade, pois alguns alunos têm interesse no assunto''.

A comparação de respostas dadas na primeira e na última aula evidencia que o trabalho sobre nanociência e nanotecnologia teve efeito sobre o imaginário desses licenciandos no que se refere à possibilidade - aceita por unanimidade entre eles - de virem a ensinar esses conteúdos no EM. Em suas respostas sobre como trabalhariam e o que trabalhariam de nanotecnologia, identificamos preferências por distintas abordagens. Em relação à maneira de trabalhar os conteúdos, 13 optaram pela abordagem CTS, enquanto dois escolheram uma abordagem envolvendo apenas Ciência e Tecnologia (CT).

Entre as vantagens de trabalhar com nanociência no EM, consideraram: "a principal vantagem seria abordar um tema interessante e contemporâneo com os alunos''; "discutindo e fazendo os alunos serem críticos e refletirem sobre os aspectos históricos e sociais''; "seria uma aula diferente das demais, sem 'fórmulas', o que poderia fazer os alunos se interessarem mais''; "trazer essa área da tecnologia para explicar objetos do dia-a-dia dos alunos''; "possibilidade de enriquecer culturalmente os alunos e ensinar algo mais próximo do futuro deles''; "é um modo dos estudantes encararem a física como algo novo e motivante''; "apresentar esse 'novo' mundo do qual eles desconhecem e mostrar a relação do desenvolvimento científico com a produção de tecnologia''; "introduzir no Ensino Médio o que se produz atualmente nos Institutos e Universidade, fazendo com que o aluno tenha contato com a ciência que produz 'hoje' e a entenda como construção humana possível de alterações''; "pode ser trabalhado conceitualmente''; "possibilidade de trabalhar física sem a preocupação de trabalhar com a matematização excessiva''; é "importante que os alunos tenham essas noções de 'tamanho' que não são da noção do senso comum. Além disso, tudo que envolve tecnologia costuma impressionar e, portanto, motivar os alunos a participarem do desenvolvimento do assunto''; "proximidade com tecnologias novas''; e "a introdução do tema e a contextualização seriam ótimos. Além de discutir o papel do cidadão frente às novas pesquisas''.

Se, por um lado, esses dizeres indicam certa predisposição para trabalhar conteúdos de nanociência e/ou nanotecnologia no EM, em contrapartida, as dificuldades que os alunos apontaram mostram, também, que não serão pequenos os obstáculos a enfrentar para desenvolver tal trabalho.

Ao se posicionarem como professores do EM, os estudantes argumentaram a existência de algumas barreiras para trabalhar nanociência: "exigiria bastante esforço do professor, que às vezes não tem um tempo razoável para preparação de aulas deste tipo''; há dificuldades para "introduzir conceitos necessários para a compreensão dos alunos''; é difícil a "compreensão do próprio tema pelo professor. Será que ele está preparado além da física?'', a "abstração dos conceitos''; "a grande dificuldade talvez seja com relação à literatura, ou seja, conseguir um livro sobre nanociência onde se possa trabalhar o dia-a-dia dos estudantes'', a "falta de algo mais concreto (essa física é abstrata)''; faz-se necessário "conhecer muito bem os conteúdos para não passar dados errados ou deixar a aula confusa''; "a desvantagem talvez seja com possível supervalorização da ciência e tecnologia em geral. É importante se preocupar com esse aspecto''; e existem dificuldades para "introduzir o conceito 'nano', como inserir realmente o conceito para os alunos''.

Ao submetermos a escolha do livro Nanociência: A Revolução Invisível, trabalhado em sala de aula, à avaliação dos estudantes, verificamos que 80% (12 respostas) consideraram as contribuições significativas do texto para suas formações um indicativo de adequação das questões levantadas pelo tema nanociência e nanotecnologia em cursos de formação inicial de professores. Duas respostas indicaram um posicionamento de neutralidade, enquanto um estudante atribuiu aos textos um valor "nada edificante'' e, ao justificar, disse: "o pouco que me seria útil eu conhecia de outras fontes''.

Entretanto, as respostas que consideramos indicativas da adequação dos trabalhos desenvolvidos com os licenciandos afirmam que essas atividades trouxeram: "mais conhecimento sobre nanociências, principalmente porque isto não é trabalhado em nossa formação''; "vários conceitos e dispositivos que eu não conhecia''; "tudo que sei hoje sobre nanotecnologia: o que é, para que serve a história. Antes destes textos, eu só tinha ouvido o nome nanotecnologia sem saber ao certo nem o que significava''. Declararam também: "O livro de um modo geral me agregou alguns conceitos de nanotecnologia. Só achei um livro que não dá para trabalhar no Ensino Médio''; "O livro é bem interessante por mostrar bastante história da ciência e mostrar a situação política por trás das inovações tecnológicas''; "as disputas e contextos políticos que estão envolvidos na produção de ciência''; "A política envolvida no processo, bem como as 'nanobactérias', alguns outros assuntos da biologia e mesmo da física''; "algumas informações interessantes como dados históricos, mas na verdade achei o livro bastante tendencioso, não trabalharia com ele em sala de aula e acredito que algum outro material teria sido muito mais adequado à disciplina, melhor aproveitado, possibilitando seu uso em futuras aulas e sendo ainda mais construtivo quanto à nossa formação''; "Posso destacar três pontos: primeiro o conhecimento do discurso do Feynman, segundo um entendimento melhor das nanotecnologias e terceiro um pensamento crítico a respeito do uso ou não dos nanomateriais''; "toda a história e desenvolvimento da nanociência no mundo. O que mais me chamou a atenção foram os aspectos políticos e sociais envolvidos nessa tecnologia. Fiquei surpreso com os 'medos' que diversas instituições têm a respeito da nanociência''; "questionamentos sobre mudanças drásticas possíveis por novas tecnologias''; "Eu não conhecia a capacitação de dinheiro para pesquisas nos Estados Unidos da América (EUA) e o volume total investido nos EUA e Europa. Algumas discussões e problematizações que foram feitas nas apresentações também me chamaram a atenção [...] Os pontos históricos citados nos textos trouxeram-me a noção do que se produzia nas décadas de 1980 e de 1990''.

Tomando por base os textos propostos e outros textos da literatura, além das atividades desenvolvidas com esses licenciandos, procuramos montar uma possível unidade de ensino com 16 textos, procurando responder a questão levantada no fim da primeira seção deste trabalho: Para que produção de significados sobre a nanociência e a nanotecnologia a leitura do texto pode contribuir?

3. Características dos textos selecionados

O conjunto dos textos propostos, cada um com características específicas, se constitui de uma bibliografia básica de 13 textos, somados a 3 textos de apoio complementar. Com ela se pretende: explicar alguns conceitos e propriedades, considerados básicos, sobre a nanociência e a nanotecnologia; situar historicamente investimentos científicos em nanociência e nanotecnologia; trazer uma visão da influência do setor econômico sobre as políticas que direcionam as pesquisas científicas; e refletir sobre o papel do cidadão diante de uma sociedade instrumentalizada por inovações tecnológicas, visto que pouco se conhece sobre as consequências do funcionamento da nanotecnologia.

Os textos são de autores com formação em variadas áreas do conhecimento: física, jornalismo, educação, engenharia, química, biomedicina, sociologia e filosofia. Eles incluem, também, diferentes aspectos de interesse para a formação do professor: o valor da divulgação científica para uso didático; aspectos históricos e visão política de financiamentos para as pesquisas e o desenvolvimento científico e tecnológico (utilizado na unidade testada); conceito de escala nanométrica; conceitos e estudos das propriedades dos materiais nanoestruturados; aplicações de produtos da nanotecnologia; compreensão de funcionamento de microscópios utilizados nas pesquisas em escala nanométrica; significado de simulação computacional para o ensino e para a pesquisa (utilizado na unidade testada); preocupações com os possíveis perigos advindos do uso de produtos das novas tecnologias e de questões de natureza ética relativas ao desenvolvimento de pesquisas e de aplicações de produtos das nanotecnologias.

O que apresentamos a seguir é uma pequena síntese das principais características de cada texto. Acreditamos que os textos possibilitam sua organização em sequências diversas em um plano de estudo e propiciam várias estratégias de ensino para trabalhar suas características, de acordo com os objetivos e o tempo disponível em cada curso.

3.1. Os textos básicos

1. Com "O texto de divulgação científica como recurso didático na mediação do discurso escolar relativo à ciência'' [18], pretendemos ressaltar o valor de alguns textos de divulgação científica como recurso didático significativo tanto para a compreensão de conhecimento científico como para um conhecimento de natureza mais cultural.

2. "Desvio de rumo'' [19] apresenta uma visão panorâmica da política de financiamento estabelecida pelos Estados Unidos, entre as décadas de 1980 e 2000, a qual deu um direcionamento às pesquisas em nanociência e nanotecnologia. Traz o momento e o contexto histórico em que a política governamental estadunidense impulsionou as pesquisas em nanociência e nanotecnologia. Evidencia que há poderes políticos que decidem o que pesquisar em ciência e em tecnologia e possibilita promover discussões entre a ciência, a tecnologia e a sociedade.

3. Em "Nanotecnologia'' [20], são trabalhados importantes aspectos da nanotecnologia: histórico, definições, terminologias, propriedades dos materiais nanoestruturados. Os autores apresentam um glossário sobre o tema que é útil para iniciantes e familiarizados com o assunto. O tipo de linguagem permite utilizar conceitos, definições e descrições das propriedades da matéria no campo da nanociência e da nanotecnologia, situando fatos históricos importantes e explorando as dimensões da escala nanométrica. As abordagens conceituais permitem trabalhar do ponto de vista tanto científico como cultural.

4. Em "Abordagem em nanociência e nanotecnologia para o Ensino Médio'' [21], é trabalhado um dos conceitos mais importantes para a compreensão da potencialidade da matéria em escala nanométrica - o aumento da área superficial dos materiais nessa escala. O entendimento desse conceito poderá ser explorado com atividades em sala de aula, usando-se figuras geométricas descritas no próprio texto, que discute, principalmente, dois conceitos básicos envolvidos nos estudos das nanociências e das nanotecnologias: a escala nanométrica e o aumento da área superficial dos materiais nessa escala.

5. "Há mais espaços lá embaixo'' [13] é a tradução do título da palestra "There's plenty of room at the bottom'', proferida pelo físico estadunidense Richard P. Feynman para a sociedade dos físicos dos Estados Unidos (American Physical Society), em 29 de dezembro de 1959. Essa palestra é considerada referência quase constante em trabalhos que pretendem situar historicamente o surgimento da nanociência e/ou da nanotecnologia. A inclusão deste texto visa subsidiar a compreensão de ocorrências que contribuem para a construção da ciência.

6. "Miniaturizar sempre e cada vez mais'' [22] sintetiza fatos importantes da história da miniaturização, dando ênfase ao período que começa com a invenção do transistor até os dias atuais. A história da miniaturização é também a história da nanotecnologia e tem como propósito trazer fatos históricos importantes da miniaturização, no sentido de mostrar como se deu a construção da ciência na escala nanométrica. Traz opiniões dos autores que contrariam outros autores e poderão ser utilizadas para promover debates em sala de aula, evidenciando a existência de posições controversas entre cientistas.

7. "Microscopia eletrônica'' [23] discute o poder de resolução do microscópio óptico e do microscópio eletrônico e permite compreender a diferença entre dois tipos básicos de microscópio eletrônico e o uso da microscopia eletrônica em nanomateriais. O texto tem como propósito auxiliar na discussão sobre o papel dos instrumentos, particularmente dos microscópios, nos estudos de caracterização dos materiais em escala atômica.

8. "O potencial gigantesco do infinitamente pequeno'' [24] apresenta características particulares do mundo na escala nanométrica e ressalta a potencialidade da nanotecnologia para gerar grandes oportunidades para o mundo, a partir do uso dessa nova tecnologia imprevisível e em rápida expansão. Apresenta um conjunto de conceitos, de definições, de propriedades e, principalmente, de aplicações do mundo nanométrico. O propósito do uso deste texto é mostrar uma visão de como as nanotecnologias possibilitam aplicações variadas.

9. "Possibilidades e limitações das simulações computacionais no ensino da física'' [14] discute pressupostos e limites de validade das teorias que fundamentam as simulações computacionais utilizadas no ensino de física e os aspectos do uso da simulação computacional que podem ser favoráveis ou/e desfavoráveis no ensino dessa disciplina. Além do aspecto do uso da simulação no ensino da ciência, o texto abre possibilidades para discussões de técnicas de modelagem e de simulação numérica que vêm sendo desenvolvidas tanto para o auxílio da compreensão científica e/ou tecnológica de sistemas complexos como para tomada de decisões de setores produtivos nos âmbitos público e privado.

10. "Uma breve história do risco'' [25] nos permite refletir como a percepção de segurança e de riscos relativos às inovações tecnológicas pode se alterar ao longo do tempo. Mostra como o conhecimento da história é imprescindível para compreender fatos da atualidade e, principalmente, para tomada de decisões que podem ter grandes repercussões para o futuro da sociedade. Nesse sentido, o texto pretende contribuir para reflexões sobre possíveis decisões sobre as nanotecnologias.

11. "A nanociência e a política de ciência e tecnologia'' [26] critica as diretrizes da política de ciência e tecnologia nacional e as intervenções orientadoras e reguladoras do poder público. A partir da leitura do texto, podem-se fazer questionamentos relativos à visão mercantilista da ciência e da tecnologia e aos modos como ocorrem a inserção social da pesquisa e os desenvolvimentos tecnológicos dela decorrentes. O texto pode contribuir para a conscientização sobre a relevância de problemas associados aos produtos das nanotecnologias. Sabemos que a maioria dos cientistas apoia o desenvolvimento das nanotecnologias como solução para muitos problemas que afligem a sociedade atual, enquanto praticamente inexistem ações nacionais que revelem preocupações com os possíveis perigos advindos do uso de seus produtos.

12. "O embate da nanoética'' [27] levanta questões que envolvem segurança e conflitos de interesses no uso e na produção de nanomateriais. Traz ideias que podem promover discussões sobre qual ética a sociedade precisa desenvolver para conviver com a tendência de industrialização de produtos com toxidades desconhecidas.

13. "Nanotecnologias e poder: em busca de uma nanoética'' [28] situa o entendimento sobre a questão do poder, do ponto de vista da ética, como o aspecto mais importante a ser encarado em relação às nanotecnologias e aborda percepções de como se estabelece o poder de sistemas interessados em manter o controle de novas tecnologias. O texto poderá proporcionar discussões de como opor-se à legitimação de uma ética que promova o estabelecimento de poder abusivo sobre o controle das nanotecnologias.

3.2. Os textos complementares

1. "Introdução aos microscópios eletrônicos de varredura e tunelamento'' [29] poderá auxiliar na leitura do texto "Microscopia eletrônica'' e aprofundar os conhecimentos ali contidos. O autor apresenta uma introdução aos princípios básicos da microscopia óptica e da microscopia eletrônica e realiza discussão de como são produzidas as imagens no microscópio eletrônico de varredura (MEV).

2. "O mundo nanométrico: a dimensão do novo século'' [30] descreve estudos científicos e tecnológicos desenvolvidos em escala nanométrica, realizados nos últimos anos. Fatos históricos, aplicações e perspectivas de aplicações em diversos campos de estudos são descritos numa linguagem que pode ser acessível ao cidadão comum, interessado em conhecer a evolução de uma tecnologia que parece pretender mudar as atividades da sociedade atual. O texto é bem ilustrado e contém muitos exemplos de aplicações, imagens coloridas e uma linguagem que contribui para que a leitura técnica seja mais agradável. A ênfase é dada ao potencial que o desenvolvimento das nanotecnologias pode oferecer para beneficiar a sociedade.

3. "Nanotecnologia: os riscos da tecnologia do futuro. Saiba mais sobre produtos invisíveis que estão no nosso dia-a-dia e o seu impacto na alimentação e na agricultura'' [31] enfatiza os riscos que as nanotecnologias poderão trazer para a sociedade. Inicialmente, são explicitados conceitos de nanotecnologia e as implicações - relativas ao controle, à saúde e à segurança - que essa tecnologia poderá desencadear sobre a vida das pessoas. Em seguida, o texto discute a migração da agricultura para a nanoescala e as consequências que esse novo tipo de produção de alimentos tem trazido e poderá trazer para a sociedade. O grupo responsável pelo texto defende que o destino das tecnologias em escala nanométrica deve envolver um amplo debate com os movimentos sociais.

Certamente os textos selecionados, básicos e complementares, não esgotam as possibilidades de encontrar outros da mesma natureza, mas o seu conjunto oferece aspectos bastante relevantes para a formação do professor de física do Ensino Médio. Consideramos que a produção de significados que esses textos podem mediar não apenas possibilita uma introdução a um conteúdo relevante da física moderna, mas também propicia ao futuro professor interpretações sobre o desenvolvimento tecnológico, sobre alguns aspectos da construção científica e suas relações com a sociedade.

4. Considerações finais

Pretendemos contribuir para o fortalecimento de conhecimentos que são essenciais para o futuro professor do EM e/ou do Ensino Fundamental, capacitando-o para trabalhar com seus futuros alunos, numa perspectiva multidisciplinar que permita formar cidadãos que tenham condições de refletir sobre as novas tecnologias e, principalmente, de compreender e de assumir posições favoráveis ou contrárias às inovações delas decorrentes.

O fato de a seleção dos textos ter-se pautado num estudo prévio em sala de aula nos possibilita acreditar num trabalho eficaz com esse conjunto de textos, como parte de outros currículos de Licenciatura em Física. Entretanto, julgamos que aspectos mais detalhados do seu funcionamento dependerão de cada condição específica em que os textos forem desenvolvidos. A ênfase em um ou em outro aspecto de cada texto caberá ao professor, de acordo com a ementa que se propuser a cumprir.

Para finalizar, destacamos o papel cultural que a leitura dos textos que compõem a unidade pode representar para os estudantes, além da contribuição para que se habituem a buscar leituras diferenciadas das do livro didático, tendo em vista, inclusive, a facilitação de um imaginário com o qual se vejam com possibilidade de ensinar a ciência contemporânea no nível básico.

Agradecimentos

As autoras agradecem o suporte financeiro parcial recebido da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão - FAPEMA e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq para o desenvolvimento deste trabalho.

Recebido em 5/2/2012; Aceito em 20/5/2012; Publicado em 7/12/2012

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  • [15] C. Joachim e L. Plévert, op. cit., p. 27.
  • [16] C. Joachim e L. Plévert, op. cit., p 25-26.
  • [17] R.P. Feynman, op. cit., p 1-2.
  • [18] M.J.P.M. Almeida, in: Divulgação Científica e Práticas Educativas, organizado por G.A. Pinto (Editora CRV, Curitiba, 2010), p. 11-24.
  • [19] C. Joachim e L. Plévert, op. cit., p 13-24.
  • [20] E.S. Medeiros, L.G. Paterno e L.H.C. Matosso, in: Nanotecnologia: Introdução, Preparação e Caracterização de Nanomateriais e Exemplos de Aplicação, organizado por N. Durán, L.H.C. Mattoso e P.C. Morais (Artliber Editora Ltda, São Paulo, 2006), p. 13-29.
  • [21] I. Zanella at al, in: Anais do XVIII Simpósio Nacional de Ensino de Física, T0556-1, 2009. Disponível em http://www.sbf1.sbfisica.org.br/eventos/snef/xviii/sys/resumos/T0556-1.pdf . Acesso em 29/9/2011.
  • [22] C. Joachim e L. Plévert, op. cit., p 25-53.
  • [23] R.B. Azevedo, in: Nanotecnologia: Introdução, Preparação e Caracterização de Nanomateriais e Exemplos de Aplicação, organizado por N. Durán, L.H.C. Mattoso e P.C. Morais (Artliber Editora Ltda, São Paulo, 2006), p. 101-109.
  • [24] E.C. Valadares, A. Chaves e E.G.Alves, in: Aplicações da Física Quântica: Do Transistor à Nanotecnologia (Editora Livraria da Física, São Paulo, 2005), p. 51-70.
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  • [27] P.A.B. Schultz, op. cit., p. 105-111.
  • [28] J.M.C. Escalante, in: Nanotecnologia, Sociedade e Meio Ambiente, organizado por P.R. Martins (Xamã, São Paulo, 2006), p. 259-262.
  • [29] E.C. Valadares, Revista Brasileira de Ensino de Física 2, 63 (1992).
  • [30] H.E. Toma, O Mundo Nanométrico: A Dimensão do Novo Século (Oficinas de Textos, São Paulo, 2009), 2 ed.
  • [31] Grupo ETC, Nanotecnologia: Os Riscos da Tecnologia do Futuro: Saiba Mais Sobre Produtos Invisíveis Que Já Estão no Nosso Dia-a-Dia e o Seu Impacto na Alimentação e na Agricultura (L&PM, Porto Alegre, 2005).
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    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      31 Jan 2013
    • Data do Fascículo
      Dez 2012

    Histórico

    • Recebido
      05 Fev 2012
    • Aceito
      20 Maio 2012
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