Acessibilidade / Reportar erro

Investigando o impulso em crash tests utilizando vídeo-análise

Investigating the impulse in crash tests using video-analysis

Resumos

Utilizamos vídeos disponíveis na web que mostram testes de colisões de automóveis para investigar as propriedades do impulso de uma força. Este tema, pouco abordado em sala de aula, possui, em colisões de automóveis, uma possibilidade de aplicação em problemas reais e importantes para a compreensão de fenômenos presentes em nosso cotidiano. Segundo os PCN+, o dispositivo de airbag seria um excelente exemplo para ilustrar as propriedades do impulso. Para a investigação deste problema através de vídeos, utilizamos o software livre Tracker, onde determinamos propriedades físicas, tais como de posição, velocidade e aceleração, relacionadas ao movimento dos carros e manequins utilizados nos testes.

impulso; Tracker; vídeo-análise


We use videos that are available on the web to investigate the crash tests of cars and the properties of the impulse of a force. Although it is rarely addressed in the classroom, for automobile collisions this topic has a possibility of application in real and important problems to the understanding of phenomena of our everyday lives. Also, according to the PCN+, the airbag device would be an excellent example to illustrate the properties of the impulse. To investigate this problem, we use the Tracker free software, through which we determine some physical properties as position, velocity and acceleration related to the movement of cars and dummies used in these tests.

impulse; Tracker; video-analysis


DESENVOLVIMENTO EM ENSINO DA FÍSICA

Investigando o impulso em crash tests utilizando vídeo-análise

Investigating the impulse in crash tests using video-analysis

Ana Cláudia WrasseI; Louise Patron EtcheverryI; Guilherme Frederico MarranghelloI, 1 1 E-mail: gfmarranghello@gmail.com. ; Fábio Saraiva da RochaII

ICampus Bagé, Universidade Federal do Pampa, Bagé, RS, Brasil

IICentro de Integração do Mercosul, Universidade Federal de Pelotas, RS, Brasil

RESUMO

Utilizamos vídeos disponíveis na web que mostram testes de colisões de automóveis para investigar as propriedades do impulso de uma força. Este tema, pouco abordado em sala de aula, possui, em colisões de automóveis, uma possibilidade de aplicação em problemas reais e importantes para a compreensão de fenômenos presentes em nosso cotidiano. Segundo os PCN+, o dispositivo de airbag seria um excelente exemplo para ilustrar as propriedades do impulso. Para a investigação deste problema através de vídeos, utilizamos o software livre Tracker, onde determinamos propriedades físicas, tais como de posição, velocidade e aceleração, relacionadas ao movimento dos carros e manequins utilizados nos testes.

Palavras-chave: impulso, Tracker, vídeo-análise.

ABSTRACT

We use videos that are available on the web to investigate the crash tests of cars and the properties of the impulse of a force. Although it is rarely addressed in the classroom, for automobile collisions this topic has a possibility of application in real and important problems to the understanding of phenomena of our everyday lives. Also, according to the PCN+, the airbag device would be an excellent example to illustrate the properties of the impulse. To investigate this problem, we use the Tracker free software, through which we determine some physical properties as position, velocity and acceleration related to the movement of cars and dummies used in these tests.

Keywords: impulse, Tracker, video-analysis.

1. Introdução

De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCN+) [1], ao desenvolvermos atividades relativas ao tema n. 1 Movimentos: variações e conservações, dentro da unidade temática n. 2, Variação e conservação da quantidade de movimento, o estudante deve:

Reconhecer as causas da variação de movimentos, associando as intensidades das forças ao tempo de duração das interações para identificar, por exemplo, que na colisão de um automóvel o airbag aumenta o tempo de duração da colisão para diminuir a força de impacto sobre o motorista.

Este tema está diretamente relacionado ao conceito de impulso de uma força, conceito este pouco trabalhado nas salas de aula da educação básica. Esta dificuldade em abordar o impulso, de uma forma consistente, no ensino médio se deve, dentre outros motivos, à sua complexidade matemática. Esta discussão fica, geralmente, restrita ao uso de forças constantes. Para Chevallard, ao discutirmos a transposição didática, este é um conteúdo de baixa Operacionalidade, necessitando de uma simplificação (força constante) para ser incluída no currículo escolar [2]. Com a finalidade de desenvolver uma atividade que seja capaz de inserir este conceito em consonância com o texto exposto nos PCN+, associamos o uso de tecnologias computacionais às aulas de física. O computador é uma ferramenta presente nas escolas - talvez mais presente que o laboratório didático experimental - capaz de dinamizar uma aula de física, seja através de modelagem, aquisição de dados e simulações ou através de consulta a materiais disponíveis na web. Esperamos com isso, introduzir o conceito de impulso de uma força variável, através de um problema real e de grande relevância, uma vez que o uso combinado do cinto de segurança e airbag previnem cerca de 47% a 52% das fatalidades [3].

Veit e cols. [4] descrevem a possibilidade de trabalhar com a segunda lei de Newton através do aplicativo Modellus como forma de não limitar mecânica "à física de centenas de anos atrás", além de propor que "física e matemática sejam ensinadas de modo integrado". De forma similar, utilizamos o aplicativo Tracker [5]. O Tracker é um programa não proprietário utilizado para o desenvolvimento de vídeo-análise. Este programa está disponível na internet e pode ser utilizado para o ensino de diferentes áreas da física [6, 7]. Em nosso problema, como veremos a seguir, utilizamos o Tracker para determinar a posição de veículos e bonecos manequins (dummies) utilizados em testes de colisão de automóveis. Utilizamos os vídeos disponíveis no sítio web da Latin NCAP (New Car Assessment Programme), onde é possível escolher vídeos de colisões de carros das mais distintas marcas disponíveis no Brasil [8]. Segundo este sítio da web, os testes são desenvolvidos de forma a acompanhar o desempenho e fazer novas propostas sobre o uso e desenvolvimento de dispositivos de segurança dos veículos.

A seguir, apresentamos o trabalho na seguinte sequência: 1) explicamos a forma como os testes de segurança são desenvolvidos; 2) revisamos brevemente o conceito de impulso; 3) comentamos alguns aspectos da vídeo-análise; 4) apresentamos as considerações finais sobre o trabalho.

2. Testes de segurança

A Latin NCAP é uma iniciativa conjunta de diversas insituições, dentre elas a Federação Internacional do Automóvel (FIA), a Global New Car Assessment Programme (GNCAP) e o Banco Interamericano de Desenvolvimento. Os seus principais objetivos são [8]:

[...] oferecer aos consumidores da América Latina e do Caribe avaliações independentes e imparciais de segurança dos carros novos; estimular os fabricantes a melhorarem o desempenho em segurança de seus veículos à venda na região da América Latina e do Caribe; incentivar os governos da América Latina e do Caribe a aplicarem as regulamentações exigidas pelas Nações Unidas quanto aos testes de colisão para os veículos de passageiros.

Os testes disponíveis que analisamos no sítio da Latin NCAP são colisões de impacto frontal. A velocidade de colisão é de 64 km/h e esta velocidade deve corresponder a uma colisão entre dois carros que viajam a velocidades de 55 km/h. Esta relação se deve, em parte, à estrutura contra a qual o veículo irá colidir, uma estrutura deformável de alumínio alveolar. A colisão ocorre de forma a que 40% da parte frontal do carro se choque contra a barreira (veja a Fig. 1). Este tipo de colisão simula os acidentes mais frequentes em estradas cujas vítimas apresentam lesões graves ou fatais.


Sensores dispostos nos bonecos manequins dão informações sobre o impacto que motoristas e passageiros humanos sentiriam nestas situações. Um esquema de classificação de danos é representado por cores, segundo a Fig. 2. Através do sítio web da Latin NCAP é possível escolher dentre algumas das marcas e modelos dos veículos mais vendidos no Brasil.


Os veículos que escolhemos, o Gol Trend da Volkswagen, com e sem airbag, foram testados e, segundo esta classificação, apresentaram desempenho: 1) com airbag - marginal na região dos quadris e fraco na região dos pés e 2) sem airbag - fraco na região do tórax e pobre na região da cabeça. Os principais motivos pelos quais escolhemos estes veículos são: a sua grande inserção no mercado nacional; a possibilidade de análise com e sem airbag e a não obstrução das imagens por destroços do veículo durante a colisão.

3. Impulso

Usualmente os livros didáticos e, consequentemente, os professores que os utilizam, trabalham apenas com forças constantes, entretanto, esta é apenas uma modelagem para fatos que ocorrem na natureza. O impulso é uma propriedade capaz de alterar o momentum de um objeto, levando em consideração a força aplicada neste e o tempo durante o qual esta força está sendo aplicada. Como esta força varia, fatalmente acaba sendo modelada por uma força média aplicada ao objeto.

O impulso é uma propriedade que está diretamente ligada aos conceitos de segurança expostos até o momento. O impulso da força resultante é definido, para o caso de força constante, como sendo a força resultante multiplicada pelo intervalo de tempo:

onde J representa o impulso, é a soma de todas as forças que atuam no sistema (ou força resultante) e Δt é o intervalo de tempo em que a força está atuando. O teorema do impulso-momento linear diz que: a variação do momento linear durante um intervalo de tempo é igual ao impulso da força resultante que atua sobre uma partícula durante esse intervalo. Assim, a definição geral do impulso, calculado entre os instantes de tempo t1 e t2 é

Usualmente ilustrado em livros didáticos através da deformação de uma bola de tênis, a sua importância não ultrapassa em muito a determinação da força média e uma breve discussão sobre o tempo de duração da colisão, finalizando com a relação entre o impulso e a variação da quantidade de movimento,

Entretanto, este é um tema de elevada importância, principalmente nos dias atuais, quando o número de mortes em acidentes de trânsito ultrapassam os números fornecidos por guerras ou epidemias, necessitando de uma discussão mais aprofundada que a determinação de uma força média. O problema da modelagem científica e a descrição da realidade são constantemente discutidos [9] e, conforme já mencionamos, os PCN+ sugerem a implementação de tal conteúdo, relacionando-o com o uso de dispositivos de airbag, capazes de prolongar o tempo de colisão e, consequentemente, diminuir os danos causados por uma colisão automobilística.

4. A vídeo-análise

Tradicionalmente, os vídeos vêm desempenhando um papel destacado como recurso de mídia para fins didáticos [10]. Este recurso é aproveitado para reforçar conteúdos em uma disciplina, curso de formação profissional, entre outras aplicações. É um recurso que hoje não envolve alto custo financeiro e, se usado de forma reflexiva, pode significar garantia de motivação e grande envolvimento por parte dos alunos. Em se tratando de Ensino a Distância (EaD), o vídeo educativo faz parte de um cardápio obrigatório na maioria dos cursos desta modalidade de ensino. Com o desenvolvimento tecnológico das câmeras de vídeo de qualidade profissional "câmeras rápidas", alguns cientistas se apoderaram da técnica para estudar diversos eventos naturais que são de difícil visualização através dos olhos humanos. Na perspectiva educacional, câmeras rápidas de resolução temporal com taxa de aquisição de vídeo de cerca de 1000 quadros por segundo, ou taxa superior, são usadas, por exemplo, para análise cinemática e dinâmica de movimentos de artes marciais [11]. Com a popularização das câmeras de vídeo, principalmente as acopladas a aparelhos celulares e computadores, e o advento de programas computacionais que reproduzem e editam vídeos com facilidade, entramos numa fase em que se tornou possível uma maior interação dos alunos de uma classe diretamente com os vídeos de forma mais participativa. A vídeo-análise pode proporcionar uma interação desejável entre o aluno, o evento estudado e o vídeo produzido neste estudo, promovendo uma dinamização do poder de investigação da natureza das ciências também em nível escolar.

A vídeo-análise para fins educacionais consiste em fazer uma tomada de vídeo (ou importar um vídeo da web, por exemplo) de um fenômeno ou experimento e depois realizar uma análise sobre o vídeo através de ferramentas que relacionem o fenômeno que se quer estudar com grandezas da física. É possível estudar, por exemplo, grandezas da mecânica como posição, velocidade, aceleração e força sobre um corpo [12, 13]. O princípio fundamental para estudar movimentos da cinemática é utilizar a base de tempo do equipamento que vai filmar o evento (câmera de vídeo, celular, web cam) e durante a análise do vídeo informar ao programa qual é o fator de escala entre o espaço físico real e a relação de espaço do vídeo expressa em pixel na imagem em si. Isso pode ser feito facilmente se, ao filmarmos, tivermos o cuidado de medir previamente o tamanho real de algum objeto que fará parte do filme. Este objeto deve estar posicionado no plano do movimento a ser analisado.

Um grupo de professores de física [14] oferece uma série de vídeos gratuitos dispostos na proposta de oficinas didáticas que abordam diversos ramos da física como mecânica, ondulatória, termodinâmica, ótica, entre outros. Estes vídeos são resultado de diversos "workshops" preparados para professores de ensino de física. Servem, por exemplo, para professores ilustrar atividades voltadas para ensino médio ou superior e estimular os alunos a produzirem seus próprios vídeos de qualidade. Os vídeos disponíveis já possuem as informações de escala espacial e taxa de quadros por segundo impressos no primeiro quadro que compõe o vídeo. O endereço eletrônico dispõe também de vinhetas de vídeo interativo que incorporam parâmetros de experimentos reais. Estas vinhetas servem como exercícios para complementar a leitura de livros didáticos ou servem como atividades de aula de pré-laboratório. Cada vinheta combina narração, um vídeo do mundo real, e ferramentas de análise de vídeo para permitir que os alunos dominem os conceitos enquanto aprendem como coletar e analisar os dados.

No presente trabalho utilizamos vídeos disponíveis no sítio web da Latin NCAP. Os vídeos foram tomados numa câmera rápida e dispostos no formato .wmv que pode ser importado diretamente pelo Tracker. O veículo escolhido foi do modelo Gol, da marca Volkswagen, pois este apresentava a possibilidade de realizar estudos com e sem o dispositivo de airbag, além de ser este um dos carros mais vendidos no Brasil. Primeiramente, para ajustar a escala de tamanho no Tracker, utilizamos a distância entre eixos do veículo (2,465 m). A barra de ferramentas do Tracker proporciona uma ferramenta para este ajuste de escala. É necessário então que escolhamos um ponto para acompanhar o movimento ao longo de toda a trajetória. Este ponto não pode ser localizado, por exemplo, na parte frontal do veículo, que sofrerá deformações durante o choque. Para fazermos a análise do percurso realizado pelo veículo, o ponto que escolhemos foi na maçaneta da porta. O programa oferece duas opções: marcação manual, quadro a quadro ou marcação automática (autotracking). Escolhemos a segunda opção onde o próprio programa se encarrega de realizar as marcações de posição e tempo a cada quadro. Isto permite uma aquisição mais rápida, com maior número de pontos.

A Fig. 3 exibe uma captura de tela do programa onde é possível observar, à direita, a tabela e o gráfico gerados conforme o programa captura a posição do veículo durante a colisão.


Tendo coletado os dados, ajustamos a escala de tempo que está propositalmente alterada no vídeo apresentado no site, de forma a melhorar a visualização da colisão. A escala de tempo do vídeo não corresponde a escala real de tempo da colisão por um fator de cerca de 60 vezes a julgar pelo tempo real mostrado no cronômetro que aparece na filmagem e o tempo que se leva para observar todo o choque em câmera lenta. O ajuste da escala pode ser feito de duas formas: 1) conhecendo a velocidade do veículo antes do impacto (constante) e a distância por ele percorrida sendo possível determinar o intervalo de tempo entre cada quadro do filme ou 2) os filmes escolhidos apresentam um cronômetro, informando o tempo de duração da colisão. Escolhemos a primeira opção, comparando e confirmando o resultado através da segunda opção. Sabendo que o veículo se desloca a uma velocidade v e que o veículo se desloca, ao longo de n quadros do filme, por uma distância x, podemos determinar o tempo real do vídeo. O próprio programa apresenta um tempot, que deve ser corrigido então através da equação que determina o intervalo de tempo Δt' entre cada quadro:

Foram coletados os dados de posição versus tempo para o boneco manequim (com e sem airbag) e para o veículo. Em seguida, utilizamos outro programa computacional livre, o SciDaVis [15] para efetuar as derivadas que levam aos dados de velocidade () e aceleração (). Cabe salientar que os dados de posição coletados pelo Tracker apresentam oscilações que, ao final de duas derivações, produzem muito ruído. Estas oscilações são causadas pelo ajuste automático do ponto selecionado para a coleta dos dados. A fim de eliminar este ruído, ainda utilizando o programa de análise e tratamento de dados SciDaVis, através do qual fizemos uma suavização das curvas utilizando a função Smooth e o método de média de primeiros vizinhos. Outra forma de minimizar este ruído é através da coleta manual de pontos, selecionando um número inferior de pontos, por exemplo, um ponto a cada dez quadros. Os resultados do tratamento numérico dos dados que apresentamos poderiam ser obtidos mesmo manualmente através de gráficos, ou usando planilhas.

A Fig. 4 mostra a posição do veículo e do motorista ao longo do tempo. Estes dados foram coletados marcando pontos na porta do veículo e na nuca do motorista. É possível perceber claramente os efeitos da inércia, quando o carro já está em colisão com o anteparo e o motorista segue sua trajetória, praticamente sem perceber que o carro está colidindo. Isto ocorre devido ao fato de, durante os instantes iniciais da colisão, os pontos de coleta de dados continuarem com velocidade praticamente constante devido à elevada deformação do veículo e do anteparo. O motorista do veículo que não possui o dispositivo de airbag, além de se deslocar mais adiante na trajetória, ainda retorna por uma distância maior, batendo na proteção de pescoço posicionada no banco do motorista.


Na Fig. 5 exploramos a aceleração do carro e do motorista, avaliada em relação ao tempo, nos casos com e sem airbag. É possível enxergar uma força variável atuando nestes casos, cuja integral nos fornecerá a informação sobre o impulso. O carro apresenta uma aceleração máxima de 200 m/s, valor inferior às acelerações obtidas para os motoristas nos casos com () e sem () airbag. Entretanto, a largura do pico para o caso do veículo é muito maior, resultando em valores muito próximos para a fração impulso/massa . Ao multiplicarmos a massa do veículo (934 kg) e do manequim motorista (80 kg), salientando que o carro viaja com o motorista, um boneco passageiro e um boneco do tamanho de um criança durante os testes de colisão (~1230 kg)), obtivemos: J = 20 kN ∙ s para o veículo, J = 1341 N ∙ s e J=1272 N∙ s para os motoristas dos casos com e sem o dispositivo de airbag.


5. Discussão

O valor final para o impulso é bastante similar, seja no caso com airbag, como no caso onde o dispositivo não é utilizado. Isto pode levar o leitor erroneamente à conclusão de que o dispositivo de airbag é pouco eficaz. Devemos ressaltar a grande diferença encontrada para o valor máximo da aceleração obtida nos dois casos: cerca de 30 g para o caso com airbag e 40 g para o caso sem airbag. Aliado a uma diferença de cerca de 10 g na aceleração dos dois motoristas, está a distribuição do impacto ao longo do tórax e face, que pode ser muito mais pontual quando não se utiliza o dispositivo de airbag, causando uma pressão (P = F/A) muito maior e, consequentemente, maiores danos físicos. O comparativo da Latin NCAP para estes veículos indicam, conforme já mencionamos uma proteção boa para tórax e cabeça no veículo com airbag e muito ruim para o caso sem o dispositivo de airbag. Lembrando que os dados foram coletados na nuca do motorista por uma questão de necessidade da vídeo-análise, uma vez que a face do motorista é rapidamente encoberta pelo airbag ou por destroços da colisão. A coleta de dados através de pontos localizados na face dos motoristas devem apresentar uma leve diferença, onde acreditamos que a distinção entre a aceleração dos dois casos seria ainda mais acentuada. Podemos ainda comparar estes resultados àqueles discutidos por Barnes e Morris [16] que apresentam como 60 g aceleração limite para o tórax do motorista. Este critério está baseado em estudos feitos a partir de manequins antropomórficos, preparados com vários sensores, que representam os seres humanos nos testes dinâmicos de colisões.

É importante salientar que, devido ao fato da colisão não ocorrer de forma totalmente frontal, o carro irá se movimentar também nas direções y e z. Assim, além do movimento de recuo do veículo após a colisão, este também irá rotacionar ao redor destes eixos. Dependendo da posição que escolhemos como referência, podemos observar movimentos que se diferem. Na Fig. 6, podemos observar o movimento de três pontos distintos marcados no automóvel: na parte frontal, no meio e na traseira do veículo. É possível ver que um ponto localizado na traseira do automóvel permanece praticamente parado, na direção x, após a colisão, devido ao movimento combinado de recuo na direção x e de rotação. Já um ponto localizado na frente do veículo recua, na direção x, cerca de meio metro após a colisão.


6. Conclusões

Motivados pelas proposições encontradas nos PCN+, apontamos o programa Tracker como uma ferramenta para o desenvolvimento de vídeo-análise dos movimentos de um veículo e de seu boneco manequim motorista durante testes de colisão. Os resultados indicam uma diferença de cerca de 10 g entre as acelerações dos manequins motoristas que utilizaram, ou não, o dispositivo de airbag. Esperamos que, através desta atividade, o professor se sinta motivado a introduzir o conceito de impulso, ilustrado-o através de um problema real e de relevância social. Retornando à discussão sobre transposição didática, conforme descrito em [2], o impulso, apresentado através do uso de novas tecnologias e contextualizado na proteção aos motoristas de automóveis, passa a possuir as características de um Saber Consensual e de Atualidade Moral. Ainda sugerimos ao professor a associação deste trabalho aos estudos realizados sobre o movimento de veículos expostos em [17-19], de forma a reforçar o contexto sobre movimento de veículos reais.

Recebido em 24/4/2013

Aceito em 1/7/2013

Publicado em 6/2/2014

  • [1] Brasil, PCN+ Ensino Médio: Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares Nacionais: Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias (MEC-SEMTEC, Brasília, 2002).
  • [2] G. Brockington e M. Pietrocola, Investigação em Ensino de Ciências 10, 387 (2005).
  • [3] M. Bertocchi, "AIR BAG" - Tecnologia Em Desenvolvimento Para Sua Proteção Disponível em http://www.estradas.com.br/materia_air_bag/materia_air_bag.htm Acesso em 27/7/2012.
  • [4] E.A. Veit, P.M. Mors e V.D. Teodoro, Revista Brasileira de Ensino de Física 24, 176 (2002).
  • [5] D. Brown, Tracker: Free Video Analysis and Modeling Tool for Physics Education Disponível em http://www.cabrillo.edu/~dbrown/tracker Acesso em 10/7/2012.
  • [6] J.S. Figueira, Revista Brasileira de Ensino de Física 33, 4 (2011).
  • [7] A. Doff, J.S. Figueira e J.C. Gentilini, Revista Brasileira de Ensino de Física 33, 1 (2011).
  • [8] Latin New Car Assessment Programme. Disponível em http://latinncap.com/_po/ Acesso em 10/7/2012.
  • [9] R.V. Brandão, I.S. Araujo e E.A. Veit, Física na Escola 9, 10 (2008).
  • [10] A.B. Clebsch e P.M. Mors, Revista Brasileira de Ensino de Física 26, 323 (2004).
  • [11] O.P. Neto, M. Magini e M.M.F. Saba, Revista Brasileira de Ensino de Física 28, 235 (2006).
  • [12] P. Laws and H. Pfister, The Physics Teacher 36, 282 (1998).
  • [13] L.I. Leitão, P.F.D. Teixeira y F.R. da Rocha, Revista Electrónica de Investigación en Educación en Ciencias 6, 18 (2011).
  • [14] R. Teese, A. Allbaugh, P. Cooney, P. Laws, E.F. Redish, D. Sokoloff, R. Thornton and M. Willis, Live Photo Physics Disponível em http://livephoto.rit.edu Acesso em 22/3/2013.
  • [15] B. Tilman and F. Knut, Scientific Data Visualization Disponível em http://scidavis.sourceforge.net/ Acesso em 10/7/2012.
  • [16] J.S. Barnes and A.P. Morris, Airbag Effectiveness in Real World Crashes The Road Safety Research, policing and Education Conference, 2001. Disponível em http://hypertextbook.com/facts/2003/MichelleYee.shtml Acesso em 22/3/2013.
  • [17] F.L. da Silveira, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 28, 468 (2011).
  • [18] F.L. da Silveira, Revista Brasileira de Ensino de Física 33, 1304 (2011).
  • [19] F.L. da Silveira, Física na Escola 8, 16 (2007).
  • 1
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      29 Abr 2014
    • Data do Fascículo
      Mar 2014

    Histórico

    • Recebido
      24 Abr 2013
    • Aceito
      01 Jul 2013
    Sociedade Brasileira de Física Caixa Postal 66328, 05389-970 São Paulo SP - Brazil - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: marcio@sbfisica.org.br