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As frequências naturais de uma corda de instrumento musical a partir de seus parâmetros geométricos e físicos

Natural frequencies of a string musical instrument from its geometric and physical parameters

Resumos

O comprimento da escala, o diâmetro, a tensão e o material de que é feita uma corda de instrumento musical são, via de regra, fornecidos pelos fabricantes, e com esses dados a frequência do harmônico fundamental pode ser facilmente calculada, como é mostrado nesse trabalho. Os resultados, adequados para as cordas de violão (ou guitarra) não encapadas, deixam de sê-lo quando cordas de maior calibre, cuja massa foi aumentada por meio de um enrolamento adicional de fio de bronze ou níquel, são consideradas. O cálculo é então aperfeiçoado para levar em conta esse fator; um modelo desenhado para o laboratório de física é proposto. Os resultados da teorização proposta revelam-se acurados, tanto para as cordas encapadas quanto para o modelo didático proposto.

harmônico fundamental de cordas; frequências naturais de oscilação de uma corda; física e música


The manufacturers of stings usually supply the scale length, diameter, tension and material of a musical instrumentstring. With these data the fundamental harmonic frequency is easily calculated. The results are accurate for the first three guitar strings, but they are not for the larger diameter ones, in which the mass is increased by an additional winding brass or nickel wire. The calculation is then refined to take into account this factor. A model designed for the physics laboratory is proposed. The results of theorization prove to be accurate, both for strings with additional winding wire as for the proposed didacticmodel.

fundamental harmonicmode of a string; string natural frequencies of oscillation; physics and music


ARTIGOS GERAIS

As frequências naturais de uma corda de instrumento musical a partir de seus parâmetros geométricos e físicos

Natural frequencies of a string musical instrument from its geometric and physical parameters

Francisco CatelliI, 1 1 E-mail: fcatelli@ucs.br ; Gabriel Abreu MussatoII

IMestrado em Educação e Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática, Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul, RS, Brasil

IIMestrado em Educação, Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul, RS, Brasil

RESUMO

O comprimento da escala, o diâmetro, a tensão e o material de que é feita uma corda de instrumento musical são, via de regra, fornecidos pelos fabricantes, e com esses dados a frequência do harmônico fundamental pode ser facilmente calculada, como é mostrado nesse trabalho. Os resultados, adequados para as cordas de violão (ou guitarra) não encapadas, deixam de sê-lo quando cordas de maior calibre, cuja massa foi aumentada por meio de um enrolamento adicional de fio de bronze ou níquel, são consideradas. O cálculo é então aperfeiçoado para levar em conta esse fator; um modelo desenhado para o laboratório de física é proposto. Os resultados da teorização proposta revelam-se acurados, tanto para as cordas encapadas quanto para o modelo didático proposto.

Palavras-chave: harmônico fundamental de cordas, frequências naturais de oscilação de uma corda, física e música.

ABSTRACT

The manufacturers of stings usually supply the scale length, diameter, tension and material of a musical instrumentstring. With these data the fundamental harmonic frequency is easily calculated. The results are accurate for the first three guitar strings, but they are not for the larger diameter ones, in which the mass is increased by an additional winding brass or nickel wire. The calculation is then refined to take into account this factor. A model designed for the physics laboratory is proposed. The results of theorization prove to be accurate, both for strings with additional winding wire as for the proposed didacticmodel.

Keywords: fundamental harmonicmode of a string, string natural frequencies of oscillation, physics and music.

1. Introdução

A acústica musical vem sendo um tema recorrente nos periódicos ligados à física e (ou) ao seu ensino - aprendizagem. T.D. Rossing, em uma exaustiva revisão bibliográfica sobre o tema de acústica musical [1], apresenta 414 referências. Há diversas publicações, feitas em periódicos brasileiros, relacionados ao ensino e à aprendizagem da física [2-4]; um trabalho, também ligado à acústica musical, foi publicado na RBEF recentemente [5]. Trabalhos, também recentes, em periódicos internacionais, [6-9] confirmam: o tema não perde a atualidade. Especificamente sobre o tema do qual trata este trabalho - a acústica de cordas de instrumentos musicais - há diversas referências; duas delas [8, 9] são destacadas como exemplo.

As referências tomadas como base para a modelagem teórica de uma corda de um instrumento musical são abundantes, e em graus diversos de aprofundamento; para as finalidades desse trabalho foram tomadas como base as Refs. [9, 10], por serem adequadas aos propósitos didáticos que os autores tinham em mente. Para o objeto modelo didático de uma corda, proposto nesse trabalho, o referencial teórico fundamentou-se nas Refs. [12, 13].

A frequência de uma corda de instrumento musical pode ser prevista a partir de parâmetros tais como o comprimento da escala na qual a corda é montada, seu diâmetro e o material com o qual ela é feita. A maior parte desses parâmetros (em alguns casos, todos) é fornecida na embalagem dos encordoamentos. Do ponto de vista de um professor de física, o mais interessante talvez seja a simplicidade da física ondulatória necessária para uma primeira verificação, o que é o foco do que é proposto a seguir.

2. Modelos teóricos

A velocidade v de um pulso em uma corda, em termos de µ (densidade linear de massa, dada por ) e T, a tensão da corda, é [10, p. 112]

O parâmetro L é o comprimento da corda livre, medido entre as suas duas extremidades fixas. Tomando a massa m da corda em função da massa específica do material que a compõe (D é o diâmetro da corda), pode-se escrever

A densidade linear de massa fica então igual a

Outra expressão fundamental é a da velocidade de propagação de uma onda transversal, em termos de sua frequência λ e comprimento de onda f

As ondas mecânicas nas cordas de um instrumento musical são ondas estacionárias; o comprimento de onda do harmônico fundamental é igual a 2L [11, p. 134-136]. A Eq. (4) fica então

Substituindo agora as Eqs. (3) e (5) na Eq. (1) e rearranjando, temos

Um modo imediato e direto de proceder a esta verificaçãoconsiste então em tomar os dados de um fabricante2 2 Ver, por exemplo, http://www.daddario.com/DADProductDetail.Page?ActiveID=3769{\&}productid=13&productn ame=EXL110_Nickel_Wound__Regular_Light__10_46. para, por exemplo, a corda mi, aguda, retirados de uma embalagem do produto (Fig. 1, ou endereço eletrônico fornecido na nota 3); os dados são os que seguem: comprimento padrão da escala L, 648 mm (25 1/2"); diâmetro da corda (D, no texto) 0,010", ou 0,254 mm; carga3 3 É hábito entre os fabricantes de cordas apresentarem a tensão em kg. Pode-se interpretar esse dado assim: a corda deve ser submetida a uma tensão equivalente à que ela experimentaria quando submetida a uma carga de, digamos, 7,35 kg. Essa força, como mencionado no texto, equivale à massa de 7,35 kg multiplicada pela aceleração da gravidade, g Ver também a Fig. 1. para a afinação mi (329,6 Hz) 7,35 kg (para obter a tensão T basta multiplicar pela aceleração da gravidade, 9,8 m/s2: 72,03 N). Para os cálculos que seguem, serão atribuídas as seguintes incertezas:4 4 As incertezas foram estimadas da seguinte maneira: no comprimento padrão L da escala, adotou-se uma incerteza (± 1 mm) facilmente detectável por um instrumento afinador; no diâmetro da corda, foi adotada uma incerteza típica de um micrômetro que mede milésimos de mm, devidamente aferido, ± 0,002 mm, e na carga (7,35 kg, Fig. 1), foi introduzida uma incerteza de ± 0,050 kg, que também seria detectável pelo mesmo instrumento afinador. Dentro da incerteza adotada para a massa específica do aço, (7900 ± 50) kg/m3, estão as ligas de aço mais comuns. A incerteza no diâmetro da corda mi grave (6a.) também foi estimada em ± 0,002 mm, e a carga (10,52 kg, Fig. 1), ± 0,050 kg L = (0,648 ± 0,001) m, D = (0,254 ± 0,002) × 10-3 m, T = (72,03 ± 0,05) N.


A verificação prossegue da seguinte maneira: calcula-se, com os dados do fabricante e as fórmulas do texto, a frequência que a corda deveria apresentar quando montada numa escala de comprimento padrão, e corretamente afinada, e a frequência assim obtida é comparada com o valor especificado. Mas, para proceder ao cálculo, será necessária a massa específica do material com o qual a corda é feita; esse material é ferro (na verdade, o material é uma liga de aço, na qual predomina largamente o ferro); a massa específica usada aqui (como aproximação) será p =(7900 ± 50) kg/m3 ([13, apêndice D; ver também nota 5]).

Antes de prosseguir, cabe notar um aspecto relativo à massa por unidade de comprimento das cordas (µ, na expressão 3): as três primeiras cordas5 5 Em alguns encordoamentos "mais pesados", a terceira corda é revestida por um fio enrolado nela. (agudas) são em geral de metal maciço, um fio, enquanto que as demais são feitas com fios de diâmetros semelhantes aos das três primeiras cordas, porém com suas massas aumentadas através de um segundo fio, este em geral de bronze (mais empregado em cordas para violões acústicos) ou níquel (mais empregado em cordas para guitarras), enrolado nas cordas em forma helicoidal (Fig. 2). Então, o fio central ("miolo", de aço) é responsável pela tensão destas cordas de maior calibre, enquanto que o fio adicional (bronze ou níquel) enrolado em volta é responsável pelo aumento da densidade linear de massa µ; o fio enrolado não afeta a tensão da corda. A adição de massa, provida pelo fio enrolado, faz com que as frequências naturais de oscilação da corda diminuam.


Agora, o cálculo: com os dados acima, obtémse a frequência da corda por meio da Eq. (6); o resultado indica, para o harmônico fundamental, uma frequência de 327,8 ± 4,3 Hz. A comparação com o valor padrão da escala temperada6 6 Pode-se chegar à frequência da nota mi (ou de qualquer outra nota) da escala temperada multiplicando (ou dividindo) sucessivamente a frequência de partida pelo fator12√(2) (≈1,05946). Cada multiplicação (ou divisão) eleva (ou abaixa) a frequência de um semitom. No caso do texto, divida 440,0 Hz ( nota lá) pelo fator mencionado cinco vezes seguidas. A cada divisão, as seguintes frequências serão geradas: lá b, sol, sol b, fá e mi. (A sequência completa de semitons é, do agudo para o grave: lá b, sol, sol b, fá, mi, mi b, ré, ré b, dó, si, lá b, lá). Para o leitor menos familiarizado com o tema, todas as notas adicionadas de " b" (bemol) correspondem às teclas pretas de um piano; as demais, a teclas brancas. 329,6 Hz, está dentro da margem de erro. Convém lembrar: o cálculo efetuado refere-se à frequência do harmônico fundamental (ou primeiro harmônico) da corda. Esse cálculo fornece resultados igualmente convincentes para as duas cordas seguintes (si e sol), quando feitas de metal maciço (não encapadas).

O mesmo cálculo, aplicado às notas que correspondem às cordas de maior calibre (ré, lá e mi), encapadas com enrolamento adicional de bronze, já não dá resultados igualmente acurados. A título de comparação, a frequência para a nota mi grave, encapada com bronze, mas calculada da maneira apresentada acima (supondo-a como sendo integralmente constituída de aço), dá como resultado (78,3 ± 0,5) Hz, diferente da frequência esperada, 82,4 Hz, mesmo considerando a incerteza. Essa discrepância se deve predominantemente ao fato de que a massa específica utilizada, a do ferro, já não é mais uma boa aproximação: de fato, parte da corda (o "miolo") é de aço (predominantemente ferro), mas o fio enrolado sobre a corda (níquel ou bronze) possui massa específica diferente. Como referência, a massa específica do bronze é de (8900 ±50) kg/m3 ([11, apêndice E]), significativamente maior que a do ferro (7900 ±50)kg/m3; a massa específica da corda como um todo ("miolo" mais enrolamento) fica, portanto, maior, com um valor intermediário entre a do ferro e a do níquel.

Entretanto, o cálculo que leva em conta o material do enrolamento deste tipo de corda pode ser significativamente melhorado. A sexta corda (mi grave) de um encordoamento de violão, tomada aqui como exemplo, consiste em um fio de aço em torno do qual é enrolado um fio de bronze fosforoso. O diâmetro externo da corda (incluindo o fio enrolado) é de (1,27± 0,002) mm, fornecido pelo fabricante (e aferido pelos autores com um micrômetro). O diâmetro da corda de aço, interna (não fornecido pelo fabricante; medido pelos autores) é de (0,47± 0,002) mm.

Para a corda central, de aço, o procedimento é idêntico ao descrito acima, o que interessa agora é o volume dessa corda (1,124 ± 0,013 x 10-7m3) e sua massa (mferro= (8,88 ± 0,16)x 10-4 kg). Para o revestimento em bronze, o cálculo é algo mais trabalhoso. Pode-se considerar que esse revestimento consiste em um certo número de anéis (aproximação bastante boa, dada a forma helicoidal do fio enrolado). O diâmetro do fio de bronze será igual a , ou (4 ± 0,02) x 10-4 m; esse diâmetro será denominado d. Dividindo o comprimento padrão da escala, L= (0,648 ± 0,001) m, por esse valor, chega-se ao número de anéis de fio de bronze do enrolamento, (1620 ± 11) voltas

O volume de um destes anéis é dado por

onde D* = D+d (Fig. 3; D é o diâmetro do "miolo" de aço).


O volume de um anel calculado desta forma, é de (3,43 ± 0,05) x 10-10 m3, e multiplicado pelo número de anéis dá o volume total de bronze da corda; conhecida a densidade do bronze, chega-se à massa, mbronze= (4,95 ± 0,13) x 10-3 kg (mais de 5 vezes e meia a massa de ferro da corda central). Com esses dados, e com a expressão 3, é possível calcular a densidade linear da corda como um todo

Por fim, as Eqs. (1) e (4) permitem chegar à frequência f: (82,6 ± 2,2) Hz, dessa vez igual à frequência esperada para a nota mi (escala temperada), 82,4 Hz, desde que considerada a incerteza. Resultados igualmente próximos são obtidos com as outras duas cordas, lá e ré.

3. Objeto modelo didáticode uma corda

A função primeira dos modelos didáticos é a de "ensinar e aprender" [12]. Quando um modelo, destinado ao ambiente escolar, assume a forma de um "objeto", ele é então denominado "objeto modelo didático" [13]. No contexto deste trabalho, é então proposto um objeto modelo didático de uma corda com miolo de aço (que suporta a tensão) e um enrolamento de fio de bronze (que aumenta a massa), o qual pode ser construído de maneira bastante simples. O material necessário é o que segue: dois segmentos de elástico, de secção reta circular, de aproximadamente 2,5 mm de diâmetro e 1 m de comprimento (não tensionado), encontrados facilmente em lojas de tecidos; um segmento de mangueira de látex, de diâmetro externo igual a 6 mm e interno, de 3mm, e comprimento de 1,5 m, a qual pode ser encontrada em lojas de artigos médicos. Um dos segmentos de elástico constituirá uma "corda" e o outro, após ter sido "revestido" pela mangueira de látex7 7 A operação de introduzir o elástico no interior da mangueira pode ser facilitada com o uso de um arame longo e rígido, de aproximadamente 1 mm de diâmetro. Esse arame é introduzido no interior da mangueira de látex, e na sua extremidade posterior é preso o elástico. O arame é então retirado da mangueira pela extremidade oposta, arrastando o elástico para dentro desta. Essa operação fará com que a mangueira de látex fique contraída; a ação de esticar até o comprimento de 1,5 m e montar no sistema oscilador a corda assim formada, fará com que a mangueira de látex retome sua forma original não tensionada ( Fig. 5). constituirá a mesma corda (é o elástico central que suporta a tensão), porém munida da massa adicional da mangueira que lhe é sobreposta. A massa do elástico sem revestimento, cujo comprimento não tensionado é de 1 m, é de (4,1 ± 0,1) g, considerado o comprimento do elástico compreendido entre os dois suportes de fixação para a produção de ondas estacionárias. A massa do segundo elástico, idêntico ao descrito acima, mas acrescido de 1,5 m da mangueira de látex, sobreposta, é de (27,4 ± 0,1) g.

As duas "cordas" podem ser vistas na Fig. 4.


A montagem se dá da seguinte maneira: inicialmente, o elástico de 1 m (à direita, na Fig. 4) é esticado até um comprimento de 1,5 m e posto a oscilar no seu modo fundamental através do oscilador (Fig. 5). O dispositivo oscilador fornece também a frequência, nesse caso de (12,7 ± 0,6) Hz. A incerteza na frequência foi estimada da seguinte maneira: a partir de 12,1 Hz, o sistema começa a mostrar claramente a ressonância, em seu modo fundamental. Em 12,7 Hz a amplitude da onda estacionária parece ser máxima, e em 13,4 Hz percebe-se também claramente o início da "degradação" da forma da onda. A imagem superior da Fig. 5 mostra o primeiro harmônico da corda (elástico), na sua maior amplitude.


A imagem inferior da Fig. 5 mostra um elástico equivalente, revestido pela mangueira de látex, também esticado até o mesmo comprimento, 1,5 m. É importante ressaltar que as extremidades desse elástico é que são presas, de um lado a um suporte, e do outro lado, a um fio fino; nesse último é acoplado o oscilador. Então, é o elástico que garante a tensão da "corda" assim formada; o látex é responsável apenas pelo aumento da densidade linear de massa. Tudo isso pode ser visualizado na imagem inferior da Fig. 5. A mangueira de látex que reveste o elástico, quando esse é tensionado até atingir 1,5 m de comprimento, assume seu comprimento natural, não tensionado. Fica então claro que a tensão à qual as duas cordas são submetidas é (muito aproximadamente) a mesma, mas a massa da segunda é quase sete vezes maior. A frequência do modo fundamental nessa segunda corda é de (4,5 ± 0,3) Hz, com a incerteza estimada tal como descrito no parágrafo anterior.

Agora a análise dos dados obtidos com o modelo de corda proposto: ao elástico será associado o índice "1", e ao elástico encapado com a mangueira de látex, o índice "2". Dado que é apenas o elástico o responsável pela tensão das duas cordas, e que o harmônico fundamental é considerado nos dois casos, pode-se então afirmar que L (o comprimento do elástico tensionado) D (o diâmetro do elástico) e a tensão T são todos (muito aproximadamente) idênticos nas duas cordas. Escrevendo a Eq. (6) para a primeira e para a segunda corda, dividindo uma pela outra e simplificando, obtém-se

onde m1 e m2 são as massas da porção das cordas compreendida entre os dois pontos de fixação, e f1 e f2 são as frequências dos respectivos harmônicos fundamentais. Os resultados numéricos apontam que a razão f1/f2, consideradas as incertezas mencionadas no texto8 8 Como cada uma das duas cordas e montada uma apos a outra nos mesmos suportes, e razoavel supor que o comprimento de ambas seja o mesmo, dentro de uma incerteza muito pequena. Então, a simplicação do comprimento na passagem da raiz das densidades lineares de massa para as massas, na Eq. (9), se justica. é igual a 2,8 ± 0,3. Já a razão da raiz quadrada das dá como resultado 2,58 ± 0,04. A Eq. (8) é então verificada, dentro das incertezas consideradas.

Se o dispositivo oscilador não estiver disponível, ainda assim vale a pena executar a montagem: as cordas poderão ser postas a oscilar manualmente (mais ou menos como se faria com uma corda de violão), deslocando-as de suas posições de equilíbrio na sua região central e liberando-as para oscilar naturalmente. A diferença (qualitativa) nas frequências naturais de oscilação é percebida claramente a olho nu.

4. Comentários finais

Seguramente, não há uma "receita" única para aprender, e uma conjetura bastante plausível pode então ser enunciada: o interesse pelo tema a estudar pode aumentar as chances de aprendê-lo. Este trabalho sugere uma (dentre muitas) fonte de motivação: a possibilidade de a aprendizagem ser significativa aumenta quando esse duplo interesse pela física e pela música está presente; essa é a meta principal deste trabalho.

Não é costume apresentar "contas que não funcionam", como a da primeira estimativa da frequência da sexta corda (grave, encapada com um fio de bronze), modelando-a como se ela fosse feita integralmente de aço. Essa é uma ocasião muito especial para lembrar aos estudantes que os "erros" são uma fonte de desafio e podem motivar novas explorações. Se a conta - mesmo com a hipótese de partida bastante frágil - tivesse "funcionado", uma excelente oportunidade para avançar teria sido possivelmente perdida.

Quanto aos modelos, pode-se dizer que eles servem (no contexto escolar) para aprender (e, certamente, para ensinar). E esse aprendizado se manifesta desde a concepção, passando pela exploração e desembocando na avaliação crítica dos resultados que o modelo pode fornecer. Nessa etapa final, a da avaliação crítica, o ponto alto é sem dúvida a exploração dos limites de validade do modelo concebido, construído e explorado.

Mas os modelos propiciam também ocasião para pequenas surpresas. No caso deste trabalho, fica claro: cordas mais grossas não são submetidas a tensões proporcionalmente maiores, como a intuição poderia sugerir. O modelo didático aqui apresentado deixa esse aspecto bastante evidente. O "mundo real" das cordas que os músicos utilizam pode ser invocado nesse momento. Um fabricante, num lançamento recente9 9 Ver Guitar Player Brasil, de Outubro de 2013, p. 1, ou o endereco http://www.daddario.com/balanced_tension.page. apregoa que seu produto consiste de cordas (de guitarra) projetadas de modo que todas atingem suas afinações quando submetidas a tensões praticamente idênticas. Este trabalho ajuda a entender, a partir de elementos de física ondulatória, como isso é possível.

Então, a física, e em especial seu ensino, se aproximam frequentemente da música [14]. O fato de poder explorar na física parâmetros das cordas que são importantes para os músicos pode ser um fator adicional de motivação, para os que se interessam por esses dois campos do conhecimento. Para essas pessoas - que se interessam pela física e pela música - o conhecimento produzido na intersecção dessas duas disciplinas seguramente será significativo.

Recebido em 07/8/2013

Aceito em 07/11/2013

Publicado em 11/5/2014

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    E-mail:
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    Ver, por exemplo,
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    É hábito entre os fabricantes de cordas apresentarem a tensão em kg. Pode-se interpretar esse dado assim: a corda deve ser submetida a uma tensão equivalente à que ela experimentaria quando submetida a uma carga de, digamos, 7,35 kg. Essa força, como mencionado no texto, equivale à massa de 7,35 kg multiplicada pela aceleração da gravidade,
    g Ver também a
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    As incertezas foram estimadas da seguinte maneira: no comprimento padrão
    L da escala, adotou-se uma incerteza (± 1 mm) facilmente detectável por um instrumento afinador; no diâmetro da corda, foi adotada uma incerteza típica de um micrômetro que mede milésimos de mm, devidamente aferido, ± 0,002 mm, e na carga (7,35 kg,
    Fig. 1), foi introduzida uma incerteza de ± 0,050 kg, que também seria detectável pelo mesmo instrumento afinador. Dentro da incerteza adotada para a massa específica do aço, (7900 ± 50) kg/m3, estão as ligas de aço mais comuns. A incerteza no diâmetro da corda mi grave (6a.) também foi estimada em ± 0,002 mm, e a carga (10,52 kg,
    Fig. 1), ± 0,050 kg
  • 5
    Em alguns encordoamentos "mais pesados", a terceira corda é revestida por um fio enrolado nela.
  • 6
    Pode-se chegar à frequência da nota mi (ou de qualquer outra nota) da escala temperada multiplicando (ou dividindo) sucessivamente a frequência de partida pelo fator12√(2) (≈1,05946). Cada multiplicação (ou divisão) eleva (ou abaixa) a frequência de um
    semitom. No caso do texto, divida 440,0 Hz ( nota lá) pelo fator mencionado cinco vezes seguidas. A cada divisão, as seguintes frequências serão geradas: lá
    b, sol, sol
    b, fá e mi. (A sequência completa de semitons é, do agudo para o grave: lá
    b, sol, sol
    b, fá, mi, mi
    b, ré, ré
    b, dó, si, lá
    b, lá). Para o leitor menos familiarizado com o tema, todas as notas adicionadas de "
    b" (bemol) correspondem às teclas pretas de um piano; as demais, a teclas brancas.
  • 7
    A operação de introduzir o elástico no interior da mangueira pode ser facilitada com o uso de um arame longo e rígido, de aproximadamente 1 mm de diâmetro. Esse arame é introduzido no interior da mangueira de látex, e na sua extremidade posterior é preso o elástico. O arame é então retirado da mangueira pela extremidade oposta, arrastando o elástico para dentro desta. Essa operação fará com que a mangueira de látex fique contraída; a ação de esticar até o comprimento de 1,5 m e montar no sistema oscilador a corda assim formada, fará com que a mangueira de látex retome sua forma original não tensionada (
    Fig. 5).
  • 8
    Como cada uma das duas cordas e montada uma apos a outra nos mesmos suportes, e razoavel supor que o comprimento de ambas
    seja o mesmo, dentro de uma incerteza muito pequena. Então, a simplicação do comprimento na passagem da raiz das densidades
    lineares de massa para as massas, na Eq. (9), se justica.
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    Ver Guitar Player Brasil, de Outubro de 2013, p. 1, ou o endereco
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Jul 2014
    • Data do Fascículo
      Jun 2014

    Histórico

    • Aceito
      07 Nov 2013
    • Recebido
      07 Ago 2013
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