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Implementação de um aplicativo para smartphones como sistema de votação em aulas de Física com Peer Instruction

Implementing an application for smartphones as a voting system in physics classrooms with peer instruction

Resumos

Este trabalho investigou o desenvolvimento e implementação de um aplicativo para smartphones que realiza o envio de respostas ao professor durante a resolução de testes conceituais nas aulas. Foram desenvolvidas aulas de Física em uma turma de Ensino Médio utilizando-se do Peer Instruction nas atividades escolares, buscando melhorar o ensino e a aprendizagem de Física. Durante as aulas, os estudantes resolviam testes conceituais e enviavam a respostas através do aplicativo, diretamente para o notebook do professor. Os resultados mostraram que o aplicativo foi bem aceito pelos estudantes, tem potencial para melhorar a concentração nas atividades de resolução de problemas e para realizar o envio das respostas ao professor. Desta forma, o professor tem a opção de salvar as respostas dos estudantes no notebook e fazer uma verificação da aprendizagem destes. O Peer Instruction mostrou-se como uma potente ferramenta para estimular a aprendizagem na resolução individual de problemas, promovendo um aumento na concentração e, também, fomentando discussões em grupos durante a resolução coletiva dos testes conceituais.

Palavras-chave:
Ensino de Física; Peer Instruction; Aplicativo; Sistema de votação


This work investigated the development and implementation of a smartphone application that sends the answers to the teacher during the resolution of conceptual tests in class. Physics classes were developed in a high school class using Peer Instruction in school activities to improve the teaching and learning of Physics. During classes, students would solve conceptual tests and send responses through the application directly to the teacher's notebook. The results showed that the application was well accepted by the students, that it has the potential to improve concentration on problem solving activities and to send the answers to the teacher. In this way, the teacher has the option to save the students' answers in the notebook and assess their learning. Peer Instruction has proved to be a powerful tool for stimulating learning, solving problems individually, promoting an increase in concentration, and also fostering group discussions during the collective resolution of conceptual tests.

Keywords:
Physics Teaching; Peer Instruction; Application; Voting system


1. Introdução

Em aulas de Física, durante as atividades, pode-se constatar que as dificuldades conceituais dos estudantes, a falta de concentração e a desmotivação para aprender constituem grandes desafios para os professores. Percebe-se que sempre há um percentual de estudantes apresentando dificuldades conceituais, causadas pelas mais diversas causas.

Entres as causas, têm-se a ausência de hábitos de estudos, pouca concentração durante as atividades escolares e também ausência de estratégias de ensino que envolvam a experimentação, simulação e uso de tecnologias que possam favorecer uma aprendizagem mais duradoura. Esses fatores contribuem para um ensino fragmentado e fomentam a que os estudantes desenvolvam uma visão de ensino difícil de ser aprendido.

Diversas estratégias de ensino-aprendizagem têm surgido nas últimas décadas na tentativa de resolver problemas de sala de aula, assim como os citados. Dentre elas, destaca-se o Peer Instruction [1[1] E. Mazur, Peer Instruction: A User's Manual (Prentice Hall, Inc., Upper Saddle River, 1997).], pela interatividade entre os participantes, bem como a exigência de os estudantes se tornarem corresponsáveis pelo sucesso da aprendizagem - a aprendizagem ativa. O Peer Instruction (PI) foi desenvolvido no início dos anos de 1990 pelo professor Eric Mazur, na Universidade de Harvard (EUA), e utilizado por anos seguidos a fim de promover uma aprendizagem ativa nos cursos de Física, em nível universitário e também promover uma compreensão crítica dos temas estudados.

A relação de tecnologias, por exemplo os aparelhos celulares e smartphones, como ferramentas para mediar práticas pedagógicas, com potencial para reforçar o interesse e atrair a atenção dos estudantes [2[2] M.A. Gonzalez, M.E. Martín, C. Llamas, Ó. Martínez, J. Vegas, M. Herguedas e C. Hernández, Journal of Cases on Information Technology 17, 1 (2015)., 3[3] A.F. Miquelin, Contribuições dos Meios Tecnológicos Comunicativos Para o Ensino de Física na Escola Básica. Tese de Doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2009., 4[4] A.S. Ribas, Telefone Celular Como Um Recurso Didático: Possibilidades Para Mediar Práticas do Ensino de Física. Dissertação de Mestrado, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Ponta Grossa, 2012.], pode ser um caminho promissor para fortalecer o ensino e a aprendizagem. Percebendo que os estudantes utilizam o celular para várias atividades da sua vida, como comunicação, entretenimento, lazer, redes sociais, compras, vendas, entre outras atividades, consideramos tudo isso como um indicativo de que há uma forte relação de convivência ou dependência dos estudantes com esta tecnologia. Isto também sugere que eles já tenham adquirido certas habilidades no manuseio do equipamento, seus aplicativos e funções o que poderá tornar seu uso didático mais espontâneo.

Neste trabalho, apresentamos a construção e a implementação de um aplicativo para smartphones, o qual tem potencial para ser utilizado como sistema de votação em aulas com o Peer Instruction. A utilização do aplicativo em sala de aula foi desenvolvida em uma escola pública de Educação de Jovens e Adultos.

2. Peer Instruction

O Peer Instruction (PI) é um método interativo de ensino desenvolvido por Eric Mazur, do Departamento de Física da Universidade de Harvard (EUA), no início dos anos 1990 [1[1] E. Mazur, Peer Instruction: A User's Manual (Prentice Hall, Inc., Upper Saddle River, 1997).]. Trata-se de uma metodologia que potencializa as inter-relações entre os estudantes e dos estudantes com o professor, rompendo com as tradicionais aulas unicamente expositivas em que apenas o professor explica os conceitos.

Neste método (PI), o professor realiza uma fala inicial dos conhecimentos centrais (estruturantes) da aula por não mais de 20 minutos, e lança um teste conceitual de múltipla escolha, que é uma questão ou problema relacionado aos conhecimentos estudados. Os estudantes têm alguns minutos para pensar e indicar individualmente a resposta correta, através de algum sistema de votação ou de cartões de resposta (flashcards) ou meios eletrônicos (clickers). O professor verifica a distribuição das respostas e, de acordo com Araújo e Mazur [5[5] I.S. de Araújo e E. Mazur, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 30, 2 (2013).]:

  • se a frequência dos acertos for menor de 30%: deve-se revisar o conteúdo, começando-se novamente a sequência da aula. Pode haver problemas com a estrutura do teste conceitual (TC), ou que não há entendimento suficiente, por parte dos estudantes, para a resolução. É aconselhável que o professor refaça a explicação conceitual, preferencialmente utilizando outra abordagem;

  • se a frequência dos acertos estiver entre 30% e 70%: formam-se grupos de 2 a 5 estudantes para discussão do problema, preferencialmente que tenham escolhido respostas diferentes para o TC, na tentativa de produzir discussões e argumentações que os encaminhe à resposta correta. Neste momento - o ponto forte do PI - os argumentos daqueles que acertaram e a falta de sustentação do discurso daqueles que escolheram alguma resposta errada conduzem os estudantes para a resposta correta. “Cria-se com isso, entre os estudantes, um ambiente de amplo debate e discussões a respeito dos conceitos físicos presentes na questão analisada, levando a uma melhor compreensão dos conceitos” [6[6] V. Oliveira, E. Veit e I.S. de Araújo, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 32, 1 (2015).];

  • se a frequência dos acertos for maior de 70%: o professor poderá informar a resposta correta, inclusive com uma breve explicação das demais alternativas [6[6] V. Oliveira, E. Veit e I.S. de Araújo, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 32, 1 (2015).]. Pode-se lançar outro teste conceitual ou passar ao próximo conteúdo da aula.

De forma esquemática, o diagrama a seguir, na Figura 1, ilustra a sequência das etapas do Peer Instruction. Durante a discussão em grupos, o professor circula pela sala sanando dúvidas e orientando a resolução dos problemas. Distancia-se da postura tradicional de apenas o professor lançar os conteúdos e orientá-los para a resposta correta nas questões. É o momento em que os estudantes buscam, de forma autônoma, mais conhecimento para resolver os problemas e outras explicações para convencer os colegas onde há uma busca no significado dos conhecimentos.

Figura 1
Diagrama da implementação do PI nas aulas. Fonte: Araújo e Mazur, [5[5] I.S. de Araújo e E. Mazur, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 30, 2 (2013).], p.370.

Vários estudos (na sequência), revelam que as discussões e a cooperação dos participantes potencializam a aprendizagem e o desenvolvimento dos estudantes. O PI envolve os estudantes durante as aulas através de atividades que requerem que estes construam argumentos e expliquem aos colegas que ainda não compreenderam o tema, assim envolvendo todos os estudantes da turma [7[7] C. Crouch and E. Mazur, American Journal of Physics 69, 9 (2001).]. Miller et al. [8[8] K. Miller, J. Schell, A. Ho, B. Lukoff and E. Mazur, Physical Review Special Topics - Physics Education Research 11, 1 (2015).] destaca que pesquisadores têm indicado que o PI é uma estratégia de ensino que é superior em promover a compreensão conceitual e habilidades em resolução de problemas, se comparado a aulas tradicionais.

O sucesso na utilização do PI está fortemente relacionado à motivação dos participantes. “PI requer que os estudantes sejam mais ativamente envolvidos e independentes na aprendizagem do que as turmas em ensino convencionais” (CROUCH et al. [9[9] C. Crouch, J. Watkins, A. Fagen and E. Mazur, Research-Based Reform of University Physics 1, 1 (2007).], p.20). Segundo este autor, no início é comum que alguns não acreditem nesta forma de instrução, então, motivar os estudantes é essencial. É preciso incluir questões conceituais para a discussão nas aulas e nas avaliações, de forma a deixar claro que são os conceitos estruturantes mais importantes para a aprendizagem, distanciando de práticas tradicionais de excessivos problemas quantitativos. Da mesma forma, é essencial deixar claro que o foco do ensino não é a repetição daquilo que está nos livros ou na explicação do professor, mas que é preciso ir além, conhecer e interpretar além do que lhe é fornecido na escola (idem).

Outro fator que indica o sucesso em PI é criar um ambiente de cooperação em sala de aula, por meio do qual os estudantes sintam-se livres para dialogar, perguntar, afirmar e defender suas respostas. Um ambiente competitivo é incompatível com atividades colaborativas [1[1] E. Mazur, Peer Instruction: A User's Manual (Prentice Hall, Inc., Upper Saddle River, 1997).]. A colaboração é fundamental no momento em que os estudantes tentam convencer os outros nas discussões sobre as respostas [9[9] C. Crouch, J. Watkins, A. Fagen and E. Mazur, Research-Based Reform of University Physics 1, 1 (2007).].

Além do ambiente favorável, os testes conceituais também cumprem um papel importante. Uma das maiores preocupações está em desenvolver bons testes conceituais, com questões que sejam significativas e exijam algum nível de raciocínio. Embora podendo-se utilizar questões de vestibulares e ENEM disponíveis na internet, aqui reside um desafio ao trabalho docente, que é ter ou produzir um banco de testes conceituais para os conteúdos específicos que tenham sentido para o processo de ensino. A relação de melhorias na aprendizagem com PI está fortemente ligada à qualidade dos testes conceituais que serão utilizados nas aulas. Testes adequadamente elaborados favorecem a discussão sobre os conhecimentos estudados e a interação dos estudantes.

Questões cuidadosamente escolhidas fornecem aos estudantes a oportunidade para descobrirem e retificarem seus erros e, no decorrer do processo, proporcionam a aprendizagem de conceitos relevantes por meio das discussões entre colegas. Na medida do possível, os grupos devem ser organizados de modo que reúnam estudantes que optaram por diferentes alternativas na questão conceitual. Nesse momento, há um processo de interação e convencimento entre os estudantes; os que apresentam argumentos mais plausíveis encorajam os demais a substituir suas respostas [10[10] M.G. Müller, Metodologias Interativas de Ensino na Formação de Professores de Física: Um Estudo de Caso com o Peer Instruction. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013.] (p.19). Testes conceituais com potencialidade para o PI devem incluir alternativas incorretas plausíveis, ou seja, não devem ser aleatórias ou com resultados absurdamente distantes da realidade. É recomendável, de acordo com Müller [10[10] M.G. Müller, Metodologias Interativas de Ensino na Formação de Professores de Física: Um Estudo de Caso com o Peer Instruction. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013.], que estas respostas sejam amparadas nos conhecimentos de senso comum dos estudantes e contemplem os mal-entendidos comuns.

3. O Ensino de Física e as Tecnologias da Informação e Comunicação

O uso de TIC como smartphones e tablets, por exemplo, tem aberto novas possibilidades para os processos de ensino-aprendizagem com a utilização de aplicativos, aliada às funcionalidades da conexão sem fio. Há significativa mudança nas relações que temos com a informação e a produção de conhecimentos e tem potencial capacidade de transformação das maneiras de ensino e de aprendizagem [11[11] A.G. Nichele e E. Schlemmer. Novas Tecnologias na Educação, 12, 2 (2014)].

Entre as potencialidades, podem-se citar a mobilidade, a rápida transmissão de informações, a possibilidade de trabalho colaborativo, mesmo estando em locais geograficamente distantes ou em horários alternativos com comunicação não simultânea com e-mails, AVA (ambientes virtuais de aprendizagem), wikis, fóruns, etc. Vários autores citam a potencialidade do uso de TIC no Ensino [3[3] A.F. Miquelin, Contribuições dos Meios Tecnológicos Comunicativos Para o Ensino de Física na Escola Básica. Tese de Doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2009., 4[4] A.S. Ribas, Telefone Celular Como Um Recurso Didático: Possibilidades Para Mediar Práticas do Ensino de Física. Dissertação de Mestrado, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Ponta Grossa, 2012., 12[12] F.T. Frederico e D.E. Gianotto, Diálogos & Saberes, Mandaguari 9, 39 (2013). e 13[13] R. Duda e S. de C.R. da Silva, Revista Conexão UEPG 11, 310 (2015).].

Nesse sentido é que implementamos a ideia de mediar os smartphones dos estudantes para instalar um aplicativo que opere como um sistema de votação de respostas em aulas com o Peer Instruction. Durante as aulas, nas atividades de resolução de problemas nos moldes de PI, a votação na resposta correta pode ser realizada com um App e enviada eletronicamente ao professor, tornando-a mais prática e eficiente em relação ao uso de cartões-respostas. Dessa forma, acreditamos que a implementação de um App para votação nas aulas pode potencializar o envolvimento dos estudantes nas atividades, facilitar o envio das respostas ao professor e proporcionar o arquivamento dessas respostas. Além disso, existe a possibilidade de utilização de uma tecnologia (smartphone) que é uma ferramenta ainda sem aplicações didáticas na maioria das escolas.

Os aplicativos, assim como a maioria das TIC, têm potencial para utilização em sala de aula e além dela. A possibilidade de estudos fora da sala de aula é um recurso que fortalece a aprendizagem, a autonomia e conduz a ter hábitos de estudos. Também é possível manter contato com colegas e executar trabalhos colaborativos.

Entendemos que a utilização de dispositivos móveis para as votações em sala pode trazer agilidade na votação, tratamento, arquivamento e compartilhamento dos dados, agilidade no feedback de aprendizagem para o professor. Da mesma forma, também ser uma ferramenta divertida que viabilize formas de trabalho, as quais não seriam possíveis, caso as votações fossem com cartões de resposta. Destacamos a confidencialidade das respostas, de forma que um estudante não tenha chances de ter sua escolha influenciada pelas respostas dos colegas.

Nesse sentido, estamos alinhados à ideia de que a utilização de App em sala de aula pode trazer avanços nas relações de aprendizagem, alterando as relações entre os sujeitos e destes com o conteúdo de estudos. Fazer atividades com o App favorece o desvelar desta tecnologia, uma oportunidade para a discussão sobre sua utilização, de modo que os estudantes superem o que Miquelin [3[3] A.F. Miquelin, Contribuições dos Meios Tecnológicos Comunicativos Para o Ensino de Física na Escola Básica. Tese de Doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2009.] chama de usuários-leigos, ou seja, os que utilizam a tecnologia sem ter noção das suas implicações. Esta ausência de conhecimentos e criticidade encaminha o usuário-leigo ao uso cego da tecnologia, sem um mínimo de percepção.

4. O Desenvolvimento de um Aplicativo como Sistema de Votação

Visando suprir a carência de um sistema de votação eletrônico de baixo custo, desenvolvemos um aplicativo para smartphones, chamado de PInApp. Seu nome vem da junção das palavras Peer Instruction e aplicativo. Tanto o aplicativo quanto a base de dados foram desenvolvidos por um profissional de Sistemas para a internet, juntamente com o professor de Física que o implementou nas atividades escolares. Esta parceria foi determinante para que ajustar o aplicativo às necessidades/demandas que iam surgindo em sala de aula, bem como para propor novas configurações.

A função deste App é auxiliar na resolução e envio das respostas dos testes conceituais (TC) ao professor. Este processo pode ser chamado de sistema de votação, por meio do qual os estudantes “votam” na resposta correta. É um aplicativo para smartphone que foi distribuído gratuitamente e tem potencial para o envio de respostas dos testes conceituais em um sistema de votação durante as aulas. A versão do aplicativo testada nesta pesquisa pôde ser executada unicamente por smartphones com sistema operacional Android. Ainda não há versões do App para outras sistemas operacionais.

Com o PInApp o professor recebe as respostas em seu notebook através de conexão de rede sem fio com os smartphones. Assim, tem a possibilidade de liberar o início do envio das respostas e também o seu término, flexibilizando a duração e alinhando-se com o tempo de votação que se apresentar mais eficiente na busca pela resposta correta ao TC. A base de dados é instalada no notebook do professor ou seja, os testes conceituais, as respostas e o gerenciamento das funções do aplicativo como o início e término das votações. O PInApp é instalado no smartphones dos estudantes, que se comunicam ao notebook através de uma rede wireless, esquematizado na figura 2 a seguir.

Figura 2
esquema da conexão notebook-roteador-smartphones para o funcionamento do App.

Para o desenvolvimento do App, da base de dados e da comunicação entre notebook e smartphones foram utilizadas as seguintes ferramentas:

  • Android Studio IDE - Software gratuito oficial da Google para desenvolvimento mobile para Android utilizada para desenvolver o aplicativo.

  • MySQL - distribuída pela Oracle, é um sistema gerenciador de banco de dados utilizado no aplicativo para armazenar e gerenciar as informações do aplicativo.

  • NetBeans IDE - Ferramenta para desenvolvimento Web gratuita, distribuída pela Oracle, utilizada para desenvolver o painel administrativo.

  • WAMP Server - Servidor de aplicações Web, utilizado para “traduzir” os códigos na linguagem PHP para a linguagem HTML, que os navegadores comuns (Chrome, Firefox, IE, etc) conseguem traduzir e mostrar para o usuário. Além disso, neste software ficará instalado o banco de dados MySQL, acessado durante a utilização do aplicativo. Esse software é gratuito e foi desenvolvido por Romain Bourdon, que o distribui gratuitamente.

  • Apache Tomcat - Servidor de aplicações Java, utilizado como “intermediário” entre a base de dados e o aplicativo Android. É uma ferramenta gratuita desenvolvida e distribuída pela Apache Software Foundation.

  • Java JDK - Kit de ferramentas para desenvolvedores Java gratuita, distribuída oficialmente pela Oracle.

Para a instalação e o funcionamento do App, o notebook do professor deverá ter os seguintes pré-requisitos, ou seja, os softwares: WAMP, Apache Tomcat e PostgreSQL instalados no servidor (notebook). Assim:

  • O painel administrativo ficará hospedado localmente, utilizando o servidor de aplicações Web WAMP.

  • O Apache Tomcat é utilizado para hospedar os serviços Java, necessários para que o aplicativo se comunique com os dados contidos na base de dados.

  • PostgreSQL é a ferramenta utilizada para armazenar os dados e permitir a leitura dos mesmos pelo aplicativo e painel administrativo.

Além destes softwares, um roteador wireless deverá ser configurado para que a máquina servidor fique visível para todos os smartphones que possuem o aplicativo instalado. O roteador deverá possuir a funcionalidade de DHCP estático, utilizado para “cadastrar” a máquina servidor em um endereço IP fixo, utilizado no aplicativo. O roteador pode ou não ter acesso à Internet.

O processo de gerenciamento dos dados é feito por uma interface no notebook, que chamamos de painel administrativo. Na Figura 3, tem-se a tela de acesso ao painel administrativo do App, à qual o professor pode acessar em seu notebook por um navegador de internet (Internet Explorer, Mozilla Firefox, Google Chrome, etc) digitando na barra de endereços: localhost/app. Nesta figura, o acesso foi obtido pelo navegador Google Chrome.

Figura 3
Tela de acesso ao painel administrativo do PInApp

Após instalado no smartphone, o App pode ser acessado através de um cadastro, login e senha. Na figura 4, a seguir, tem-se um print de tela do smartphone mostrando a logo do App e a tela de login para acesso. Após o login, os estudantes têm acesso à lista de TC liberados pelo professor no painel administrativo.

Figura 4
A tela de login do PInApp.

5. Implementação do PInApp como Sistema de Votação

Para a implementação do PInApp como um sistema eletrônico de votação em aulas desenvolvidas com o PI, foram lecionadas aulas de Física em uma turma de Ensino Médio em Escola de Educação de Jovens e Adultos (EJA). Previamente às aulas, estudantes recebiam um texto para ser lido com antecedência, contendo algumas questões que deveriam ser respondidas de acordo com os conceitos presentes na leitura. O conteúdo do texto era composto pelos conhecimentos que seriam estudados na aula seguinte.

No início da cada aula, após uma breve explanação dos conteúdos, o professor fornecia testes conceituais para serem respondidos em alguns minutos através do App. De acordo com as respostas informadas pelos estudantes, observando a porcentagem de acertos e as etapas descritas na Figura 1, o professor poderia informar a resposta correta do teste, promover uma discussão em pequenos grupos ou re-ensinar os conhecimentos da aula.

Apresentamos, a seguir, os resultados de votações das respostas aos testes conceituais resolvidos pelos estudantes durante as aulas. Os dados foram coletados através de prints de tela do notebook, quando havia o resultado das votações e as falas dos estudantes foram registradas pelo professor em um caderno de anotações.

Nas figuras 5 e 6, a seguir, tem-se os resultados das votações para um teste conceitual antes e depois da discussão em grupos, respectivamente, de acordo as etapas do PI

Figura 5
Votação no TC n° 27 antes da discussão em grupos.
Figura 6
Votação no TC n° 27 após a discussão em grupos

Após a conferência, pelo professor, do índice de acertos (58%) na resolução individual, os estudantes formaram equipes de dois ou três estudantes para a discussão do TC. Durante esta etapa, o professor circulava pela sala sanado dúvidas e ouvindo as explicações que os estudantes davam às suas respostas. À medida que iam decidindo suas respostas, faziam o envio e o professor acompanhava cada voto pelo painel administrativo de PInApp. E o resultado da votação segue na Figura 6.

Comparando os resultados nas Figuras 5 e 6, percebe-se que os acertos foram de 58% na resolução individual, antes da discussão, e de 83% após a instrução pelos colegas. Observou-se que, durante a discussão, os estudantes mais habilidosos ensinaram passo a passo como interpretar o enunciado e como resolver os cálculos matemáticos a aqueles que apresentaram maiores dificuldades na primeira resolução. Este é um resultado que mostra como o PI tem potencial para promover uma melhor compreensão dos conceitos.

Os estudantes identificadas por “el” e “ma” na Figura 5, formaram uma dupla para a discussão e não acertaram a resposta correta também na segunda votação, apenas mudando de alternativa incorreta (de “E” para “A”). Este é mais um dado para que, dentro do possível, sejam formados grupos nos quais pelo menos um deles tenha acertado a resposta na primeira votação.

Na sequência, o professor explicou detalhadamente a resolução no quadro. Em seguida, o foi liberado outro TC, identificado como TC n° 29, e o resultado da votação está na Figura 7.

Figura 7
Votação no TC n° 29

Devido à alta percentagem de acertos (92%), neste problema não houve a discussão em grupos. O professor realizou uma explicação sobre a resposta correta e passou para o próximo TC, identificado com n° 21.

O resultado da votação do TC n° 21 está na figura 8, a seguir, onde constatou-se que apenas 16% dos votantes acertaram a resposta na resolução individual. Embora o índice de acertos estivesse abaixo do mínimo recomendado de 30%, conforme estabelecido por Mazur [1[1] E. Mazur, Peer Instruction: A User's Manual (Prentice Hall, Inc., Upper Saddle River, 1997).] e Araújo e Mazur [5[5] I.S. de Araújo e E. Mazur, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 30, 2 (2013).] para iniciar a discussão em grupos, optamos por fazê-lo para ver como os estudantes reagiriam e se a discussão poderia encaminhá-los para a resposta correta. As discussões foram fundamentais para a compreensão do problema e sua resolução.

Figura 8
Votação no TC n° 21 antes da discussão em grupos.

Após a votação da resolução individual, foram formados 3 grupos com 3 integrantes e um grupo com 2. Depois de 4 minutos de discussão em grupo, eles puderam votar novamente na mesma questão. Os resultado da votação seguem na Figura 9.

Figura 9
Votação no TC n° 21 após a discussão em grupos.

Os acertos, mostrados na figura 9, podem ser considerados satisfatórios pela elevação da porcentagem de respostas corretas (de 16% para 54%). Durante a discussão e resolução coletiva, novamente o professor circulava pela sala, os estudantes argumentavam sobre as respostas corretas e o professor fornecia orientações, mas sem indicar a resposta certa. Foi possível perceber o esforço da maioria, dos que acertaram tentando convencer os que erraram, e estes em saber o porquê. Mesmo nos grupos em que todos haviam errado na primeira votação, o encaminhamento para a resposta correta ocorreu acima do esperado, conforme resultado na figura 9. Cabe, aqui, observar que 54% de acertos em um TC ainda é baixo. É desejável que todos os estudantes obtenham êxito na resolução. Entretanto, o que se enfatiza é o aumento que se observou na quantidade de respostas corretas após a discussão em grupos.

Verificou-se que as atividades com o PI e com o PInApp podem ser eficazes para a compreensão dos conceitos de Física. No entanto, para Müller [10[10] M.G. Müller, Metodologias Interativas de Ensino na Formação de Professores de Física: Um Estudo de Caso com o Peer Instruction. Dissertação de Mestrado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2013.], “os gastos para a aquisição de sistemas eletrônicos por parte das escolas não é desprezível e pode ser um empecilho para que o IpC [PI] chegue à sala de aula.” (p.14), a distribuição gratuita do PInApp para os professores poderá atender a esta demanda. Nesse sentido, atividades didáticas que sejam realizadas com o PI podem ser potencializadas, como as funções de apresentar as respostas de forma rápida e precisa, além de permitir o registro e arquivamento das informações com mais facilidade em relação às demais formas de votação, como anunciado por Lasry [14[14] N. Lasry, The Physics Teacher 46, 4 (2008).].

6. Considerações Finais

Nesta pesquisa percebeu-se que as atividades com PI são fortalecidas como uso do PInApp como o sigilo na votação, onde cada um vota de acordo com o seu tempo de resolução. Há maior liberdade para pensar e resolver de acordo com as suas habilidades. Para a EJA, em que o perfil dos estudantes é heterogêneo, isso é importante por respeitar o tempo de cada um.

Foi possível notar que durante as resoluções de TC no PInApp algumas potencialidades, como a possibilidade de cada estudante ler e responder os testes da maneira mais confortável e autônoma, sem influência dos colegas. A confidencialidade no envio das respostas é um ponto forte que estimulava os de menor rendimento a ser esforçarem e centrarem-se no seu desempenho individual.

As resoluções dos TC, com o envio de respostas pelo App, dinamizavam as aulas e aumentavam a discussão sobre os conhecimentos estudados. Entretanto, a respeito da constatação se houve aprendizagem, não foi possível estabelecer meios efetivos para verificação da aprendizagem. Foram observados indícios de que a aprendizagem ocorreu, quando passamos de atividades mais simples para as mais complexas e, nestas percebemos que os estudantes tinham adquirido as habilidades necessárias para resolver problemas com nível de dificuldade mais elevado.

O uso do App favoreceu o trabalho do professor pois este pode circular pela sala sanado dúvidas e orientando a resolução em grupos. Também permite um registro nominal das votações que torna possível avaliar o desempenho de cada estudante após a resolução de cada TC, já que as respostas podem ser facilmente arquivadas no notebook. O professor insere os TC na plataforma e libera os testes que são mais pertinentes ao encaminhamento da aula e das necessidades dos estudantes. O banco de questões pode ser mais uma estratégia didática disponível em sala. Não há necessidade da impressão em papel de materiais para a aula.

O App também foi fundamental para o trabalho dos estudantes com um aumento na concentração. A privacidade na votação também inspirou estudantes que se sentiam envergonhados em emitir respostas erradas perante os demais colegas e que diziam estar inseguros. Outro ponto forte é a individualidade das respostas, em que cada um escolhe as respostas de acordo com o seu tempo de resolução e é difícil ver a resposta escolhida pelo colega. As letras miúdas na tela exigem maior atenção durante a leitura.

O envio das repostas ao professor através do PInApp favoreceu a dinamização das atividades nas aulas. A confidencialidade e a precisão no arquivamento das informações são pontos fortes que contribuem para que o professor organize os registros da classe. Não obstante, no App os estudantes não conseguem ler os votos dos colegas minimizando as possibilidades da alternativa mais votada influenciar no voto dos indecisos e nas discussões seguintes.

A utilização dos smartphones nas aulas foi bem recebida pelos estudantes. A maioria mostrou-se curiosa em utilizar essa TIC como recurso de aprendizagem. Este foi um ponto forte da ação em sala de aula: perceber que o que antes apenas se configurava como fonte de entretenimento, agora torna-se agente de trabalho e desenvolvimento.

Estabelecer a conexão dos smartphones dos estudantes com o notebook através de uma rede particular, independente da ação de terceiros, sinalizou um ganho de autonomia para o professor, uma vez que ele mesmo gerencia a rede e as conexões. Nesse sentido, não depender de computadores, tablets e nem de redes ou conexão à internet possibilita a implementação do PInApp numa grande quantidade de escolas, independente da estrutura destas.

De início, havia a preocupação se os estudantes teriam smartphones para realizar as atividades e, por isso, o professor tinha dois aparelhos-reserva disponíveis para empréstimo. Entretanto, o que se constatou é que todos os estudantes tinham smartphones, eliminando a nossa preocupação com o custo da tecnologia.

Alguns cuidados são recomendados, para melhor sequência das atividades planejadas de aula, como o professor ter alguns aparelhos reservas para substituírem os sem carga na bateria, outros em que porventura não seja possível a instalação do App ou com Sistema Operacional incompatível. O fato de haver vários pontos de energia elétrica na sala é útil para recarregar a bateria dos aparelhos durante a aula.

Sabe-se que também existem outras tecnologias com potencial para serem utilizadas como sistemas de respostas, como os Plickers e o Socrative, praticamente sem custos. Entretanto, salientamos que o PInApp tem a vantagem de que cada estudante possa enviar sua resposta de acordo com o seu tempo de resolução, enquanto com os plickers, todos votam juntos, ao mesmo tempo. Na EJA, com a diversidade de desempenho dos estudantes, respeitar o tempo de cada participante pode ser o limiar entre acertar a resposta ou desmotivá-lo pelo insucesso. Ainda com relação às plickers, o fato de resolver o TC lendo-o na tela do smartphone mostrou-se como estímulo à concentração, ao contrário da resolução de problemas na forma tradicional com lápis e papel. O fato do App estar em língua portuguesa favorece a um manuseio mais confortável por parte dos usuários, se comparado a dispositivos importados.

Salientamos que ainda há importantes caminhos a trilhar, como desenvolver novas versões do App que operem em outros sistemas operacionais. Também não foi observada a limitação da quantidade de aparelhos conectados à rede, já que a turma era pequena. Sugere-se testar o aplicativo em turmas maiores.

Referências

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    M.A. Gonzalez, M.E. Martín, C. Llamas, Ó. Martínez, J. Vegas, M. Herguedas e C. Hernández, Journal of Cases on Information Technology 17, 1 (2015).
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    A.F. Miquelin, Contribuições dos Meios Tecnológicos Comunicativos Para o Ensino de Física na Escola Básica Tese de Doutorado, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2009.
  • [4]
    A.S. Ribas, Telefone Celular Como Um Recurso Didático: Possibilidades Para Mediar Práticas do Ensino de Física Dissertação de Mestrado, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Ponta Grossa, 2012.
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    I.S. de Araújo e E. Mazur, Caderno Brasileiro de Ensino de Física 30, 2 (2013).
  • [6]
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    22 Mar 2017
  • Revisado
    10 Maio 2017
  • Aceito
    14 Maio 2017
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