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100 Anos da Cosmologia Relativística (1917–2017). Parte I: Das Origens à Descoberta da Expansão Universal (1929)

100 Years of Relativistic Cosmology (1917–2017). Part I: From Origins to the Discovery of Universal Expansion (1929)

Resumos

Estamos vivenciando um período de extrema efervescência intelectual na área da cosmologia. Um volume enorme de dados observacionais em quantidade e qualidade sem precedência e um arcabouço teórico mais consistente, impeliram a cosmologia para uma era da precisão, transformando a disciplina em área de ponta da ciência contemporânea. Observações com Supernovas do tipo Ia (SNe Ia) mostraram que o Universo está expandindo aceleradamente, um fato sem explicação no modelo desacelerado tradicional. Identificar a causa dessa aceleração é hoje o problema mais fundamental da área. Tal como ocorreu no renascimento científico, a solução norteará os rumos da disciplina no futuro próximo e as possíveis respostas (se energia escura, alguma extensão da relatividade geral ou um mecanismo ainda desconhecido) deverão também alavancar o desenvolvimento da física. Nesse contexto, sem abdicar de uma abordagem pedagógica, apresentamos uma visão geral tanto dos principais resultados teóricos quanto das descobertas observacionais mais significativas da cosmologia nos últimos 100 anos. A saga da cosmologia moderna será apresentada numa trilogia. Neste artigo (Parte I), com base nos artigos de Einstein, de Sitter, Friedmann, Lemaître e Hubble, descreveremos o período decorrido entre as origens da cosmologia e a descoberta da expansão Universal (1929). Na Parte II veremos o período de 1930–1997, finalizando com o velho modelo padrão desacelerado. A Parte III será inteiramente dedicada ao modelo acelerado do Universo, o paradigma cósmico do século XXI.

Palavras-chave:
Cosmologia; Astronomia Extragaláctica; Expansão do Universo; Lei de Hubble


We are experiencing a period of extreme intellectual effervescence in the area of cosmology. A huge volume of observational data in unprecedented quantity and quality and a more consistent theoretical framework propelled cosmology to an era of precision, turning the discipline into a cutting-edge area of contemporary science. Observations with type Ia Supernovae (SNe Ia), showed that the expanding Universe is accelerating, an unexplained fact in the traditional decelerated model. Identifying the cause of this acceleration is the most fundamental problem in the area. As in the scientific renaissance, the solution will guide the course of the discipline in the near future and the possible answers (whether dark energy, some extension of general relativity or a still unknown mechanism) should also leverage the development of physics. In this context, without giving up a pedagogical approach, we present an overview of both the main theoretical results and the most significant observational discoveries of cosmology in the last 100 years. The saga of cosmology will be presented in a trilogy. In this article (Part I), based on the articles by Einstein, de Sitter, Friedmann, Lemaître and Hubble, we will describe the period between the origins of cosmology and the discovery of Universal expansion (1929). In Part II we will see the period from 1930 to 1997, closing with the old standard decelerated model. The Part III will be entirely devoted to the accelerated model of the universe, the cosmic paradigm of the XXI century.

Keywords:
Cosmology; Extragalactic Astronomy; Expanding Universe; Hubble Law


1. Introdução

Cosmologia é a disciplina que investiga a formação e evolução da estrutura de grande escala do Universo (galáxias, aglomerados e superaglomerados de galáxias). Seu objetivo é estabelecer um modelo cosmológico que prediga e explique os resultados das observações astronômicas. A busca maior é a construção de um cenário que permita reconstituir o passado do Universo, entender o presente e conjecturar sobre o futuro do Cosmos.

O estudo da cosmologia é atualmente baseado na melhor teoria de gravitação existente, a relatividade geral de Albert Einstein. Seu progresso depende por um lado, dos desenvolvimentos teóricos nas áreas de física e astronomia e, por outro, de observações extremamente sofisticadas que podem atualmente ser consideradas como verdadeiros experimentos astronômicos.

Na Figura 1, apresentamos uma cronologia dos principais avanços teóricos e descobertas observacionais da cosmologia nos últimos 100 anos. Após um início esplendoroso onde destacamos [2[2] Textos Fundamentais da Física Moderna, Trad. do original alemão, Das Relativitatssprinzip (Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1971)., 3[3] Cosmological Constants - Papers in Modern Cosmology, edited by J. Bernstein and G. Feinberg (Columbia University, New York, 1986).]: (i) o primeiro modelo cosmológico relativístico obtido por Einstein (1917) [4[4] A. Einstein, in: Textos Fundamentais da Física Moderna, op. cit. [2], p. 225. Ver também op. cit. [3], p. 16.], (ii) o modelo expansionista de Friedmann [5[5] A. Friedmann, in: Cosmological Constants - Papers in Modern Cosmology, op. cit. [3], p. 49.], e (iii) a descoberta da expansão do Universo por Hubble [6[6] E. Hubble, Proceedings of the National Academy of Sciences 15, 168 (1929).], a área progrediu lentamente até meados dos anos 60. Podemos dizer que o intervalo entre 1929 e 1965 foi um período de ciência normal no sentido de Khun [7[7] T.S. Kuhn, A Estrutura das Revoluções Científicas, Coleção Debates, Trad. B.V. Boeira e N. Boeira (Editora Perspectiva, São Paulo, 1982), p. 29.], uma espécie de “idade média” tardia da cosmologia moderna; culminando numa sequência de descobertas fundamentais.

Figura 1
Linha do tempo mostrando as principais avanços teóricos e observacionais da Cosmologia Moderna [1[1] J.A.S. Lima, Brazilian Journal of Physics 34, 194 (2004), astro-ph/0402109.].

Em 1965, Arno Penzias e Robert Wilson [8[8] A.A. Penzias and R.W. Wilson, Astrophys. J. 142, 419 (1965).] detectaram a radiação cósmica de fundo1 1 A temperatura da radiação é cerca de 3K e seu pico encontra-se na banda de microondas. Na literatura inglesa é conhecida pelo acrônimo CMB (cosmic microwave background). (RCF) e foram premiados com o Nobel de 1978. Foi um verdadeiro salto em direção à cosmologia física.

As condições gerais reinantes nos estágios iniciais da evolução cósmica (na chamada era da radiação) foram enfim compreendidas quase completamente. Em particular, foi possível determinar teoricamente, a abundância dos núcleos atômicos leves (D, He3, He4 e Li7), formados por fusão termonuclear durante esta fase; um processo que ficaria conhecido como nucleossíntese primordial [9[9] R.V. Wagoner, W.A. Fowler and F. Hoyle, Astrophys. J. 148, 3 (1967).].

No início dos anos 70, veio a confirmação da existência de matéria escura, através das curvas de rotação de galáxias analisadas por Keneth Freeman [10[10] K.C. Freeman, Astrophys. J. 161, 802 (1970).], Vera Rubin [11[11] V. Rubin and W.K. Ford Jr., Astrophys. J. 159, 379 (1970); V.C. Rubin, Science 220, 1339 (1983).] e outros. A matéria escura não brilha, sendo identificada apenas por seus efeitos gravitacionais. Como veremos na Parte II, a principal candidata para essa componente é uma substância inerte e não-relativística, usualmente denominada matéria escura fria (”cold dark matter - CDM). Posteriormente, a matéria escura fria, supostamente de origem primordial, tornou-se um ingrediente chave na compreensão do processo de formação de estruturas no Universo [12[12] D.M. Efsthatiou, C.S. Frenk and S.D.M. White, Astrophys. J. 292, 371 (1985).].

Em 1990, as medidas do espectro planckiano e as flutuações da RCF, obtidas com dados do satélite COBE (cosmic background explorer), premiaram os líderes do experimento, John Mather e George Smoot [13[13] G.F. Smoot, C.L. Bennett, A. Kogut, E.L. Wright, J. Aymon, N.W. Boggess, E.S. Cheng, G. de Amici, S. Gulkis, M.G. Hauser, et al., Astrophys. J. 396, L1 (1992).] com o Nobel da Física de 2006. O levantamento do espectro planckiano completo foi o passo definitivo para confirmar a história térmica do Universo. Esse primeiro levantamento das flutuações intrínsicas da RCF (o termo de quadrupolo), foram também essenciais para mostrar que a idéia de inflação, proposta no início dos anos 80 por Alan Guth [14[14] A. Guth, Phys. Rev. D 23, 347 (1981).], se tornaria um elemento chave para entender os estágios mais primitivos do Universo.

Tais descobertas deram sustentação para um cenário cosmológico expansionista, desacelerado e preenchido por matéria não-relativística (escura + bariônica); o modelo cosmológico padrão até 1997.

Em 1998, dois grupos distintos de pesquisadores utilizando SNe Ia como vela padrão, mostraram que o Universo está expandindo aceleradamente [15[15] A.D. Riess, A.V. Filippenko, P. Challis, A. Clocchiattia, A. Diercks, P.M. Garnavich, R.L. Gilliland, C.J. Hogan, S. Jha, R.P. Kirshner, et al., Astron. J. 16, 1009 (1998)., 16[16] S. Perlmutter, G. Aldering, G. Goldhaber, R.A. Knop, P. Nugent, P.G. Castro, S. Deustua, S. Fabbro, A. Goobar, D.E. Groom, et al., Astrophys. J. 517, 565 (1999).]. Esta descoberta tornou a busca de um novo paradigma cosmológico uma tarefa inadiável [1[1] J.A.S. Lima, Brazilian Journal of Physics 34, 194 (2004), astro-ph/0402109., 17[17] I. Waga, RBEF 27, 157 (2005).]. Seus líderes, Saul Perlmutter (Supernova Cosmology Project) e Bryan Schmidt & Adam Riess (High-z Supernova Search Team), compartilharam o prêmio nobel de 2011.

Em 2001, foi lançado o satélite WMAP (“Wilkinson Microwave Anisotropy Probe”), o sucessor do COBE. Os dados liberados em 2003, mostraram o espectro completo das flutuações de temperatura (espectro angular de potências). A combinação de Supernovas com o WMAP (e depois com os dados do satélite Planck [18[18] P.A.R. Ade, N. Aghanim, M. Arnaud, M. Ashdown, J. Aumont, C. Baccigalupi, A.J. Banday, R.B. Barreiro, J.G. Bartlett, N. Bartolo, et al., A&A 594, A13 (2016).]), além de uma bateria de testes, incluindo: (i) as oscilações acústicas dos bárions, (ii) a idade do Universo, (iii) dados de raios-X provenientes dos aglomerados de galáxias, e (iv) lentes gravitacionais representou um enorme avanço. Em particular, determinou-se um novo “modelo cosmológico padrão”, comumente referido como modelo de concordância cósmica (MCC) ou ΛCDM, onde Λ é a constante cosmológica ou densidade de energia do vácuo, introduzida por Einstein em 1917 (ver seção 5).

Tais contribuições sugerem uma subdivisão na linha do tempo da cosmologia moderna em 4 períodos distintos, marcados por avanços e/ou profundas mudanças na visão do Cosmos: Idade Antiga, Média, Moderna e Contemporânea ou do Século XXI (ver Figura 1).

O MCC ou ΛCDM, está de acordo com as observações existentes, mas permanece misteriosa a verdadeira causa da aceleração recente do Universo, pois a densidade de energia do vácuo (Λ) não é medida diretamente. Portanto, a existência de duas componentes desconhecidas (matéria e energia escuras) é uma circunstância muito desconfortável, tanto do ponto de vista teórico quanto observacional. Portanto, apesar do sucesso, é também um momento de dúvidas e conflitos numa disciplina centenária.

Por outro lado, as dificuldades apontadas devem ser encaradas como uma grande oportunidade para os espíritos mais criativos. Tal como no renascimento científico, sua elucidação norteará os rumos da disciplina no futuro próximo e as respostas farão avançar o desenvolvimento da física [19[19] J.A.S. Lima, in: Scientific American Brasil: Coleção Gênios da Ciência - Stephen Hawking (Editora Segmento, São Paulo, 2005), p. 76.].

Nesse contexto, sem esquecer aspectos pedagógicos, acreditamos ser instigante para graduandos e professores do ensino médio ter um panorama da área, seus principais resultados teóricos e as descobertas observacionais mais significativas dos últimos 100 anos2 2 As novas idéias e descobertas, tanto quanto possível, serão apresentadas na sequência historicamente estabelecida. .

Tendo em vista a quantidade de eventos marcantes, dividimos o material disponível em 3 artigos subsequentes (trilogia). Na Parte I, cobrimos desde as origens até a descoberta da expansão universal (1929). Na Parte II veremos o período de 1930–1997, fechando com o modelo padrão desacelerado. A Parte III será inteiramente dedicada ao modelo acelerado do Universo, o paradigma cósmico do século XXI.

O presente artigo (Parte I) está organizado como segue. Na seção 2, identificamos no legado cosmológico newtoniano o que ainda era relevante no século XX. Na seção 3, apresentamos as sementes teóricas e observacionais da cosmologia moderna. Na seção 4, discutimos as idéias básicas da relatividade geral; o alicerce da cosmologia moderna. A seção 5 é dedicada ao modelo estático de Einstein e ao significado físico da constante cosmológica, Λ. Nas seções 6 e 7, revisamos a previsão teórica do “big-bang” e a descoberta da expansão universal. Na seção 8, contextualizamos as contribuições não imediatamente repercutidas de Lemaître e, finalmente, na seção 9, apresentamos as principais conclusões dessa Parte I.

2. O Legado Cosmológico Newtoniano

“I have proposed the force of gravity but I have not yet assigned a cause to gravity”(Isaac Newton) 3 3 “Eu propus a força da gravidade, mas eu ainda não atribuí uma causa à gravidade”.

A física e astronomia estudadas hoje foram profundamente impactadas pelas leis de movimento e gravitação universal de Isaac Newton (1643–1727). Sabemos que a possibilidade de fazer cosmologia muito além do heliocentrismo copernicano, das leis de Johannes Kepler (1571–1630) e das observações de Galileo Galilei (1564–1642), foi um legado da gravitação newtoniana.

Combinando suas leis da mecânica e gravitação universal, Newton estabeleceu as bases para o desenvolvimento futuro da ciência (em várias direções e por mais de 2 séculos), alterando profundamente não apenas a noção vigente de Universo, mas também a própria arte de inventar ou criar teorias científicas.

Newton deduziu todas as leis de Kepler do movimento planetário e também previu novos e importantes resultados. Para exemplificar, consideremos a primeira lei de Kepler ou lei das órbitas: os planetas giram em torno do Sol descrevendo órbitas elípticas (1609). Sem fazer observações, Newton demonstrou que a curva traçada pelos corpos celestes sob ação da gravidade seria em geral representada por cônicas (círculo, elipse, parábola e hipérbole), explicando simultaneamente o movimento dos planetas, satélites, cometas e demais asteróides [20[20] K.S. Oliveira Filho e M. F. O. Saraiva, Astronomia & Astrofísica (Editora Livraria da Física, São Paulo, 2014), 3ª ed., v. 1.]. Um exemplo antigo e marcante de como a teoria permite ver bem além do empirismo em termos de fundamentação e compreensão lógica.

A segunda lei de Newton e a gravitação universal, garantiram que os “graves”não precisavam cair em direção ao centro, na eterna busca aristotélica de um “lugar natural”. Na verdade, planetas e satélites sustentam suas órbitas em torno de centros atratores devido as forças centrípetas de origem puramente gravitacional. Uma explicação matemática rigorosa para a surpresa que teve Galileu e a elite intelectual da época, quando o pai da ciência moderna apontou sua luneta e observou os 4 maiores satélites de Júpiter.

Newton também ampliou nossa visão do Universo. Diferente de Copérnico e do Cosmos grego4 4 Desde Aristóteles o Universo era considerado finito e limitado pela “esfera das estrelas”, uma visão também compartilhada por Copérnico e Kepler [21]. , o Universo observado para Newton seria espacialmente infinito e dotado a priori de uma geometria euclidiana.

Numa de suas famosas cartas [22[22] Newton Project, Letter from Newton to Richard Bentley, December 10th, 1692. A carta pode ser lida no site http://www.newtonproject.ox.ac.uk.
http://www.newtonproject.ox.ac.uk...
] respondendo algumas indagações do escolástico e reverendo Richard Bentley (1662–1742), Newton sintetizou sua visão cosmológica5 5 “…But if the matter was evenly disposed throughout an infinite space, it could never convene into one mass; but some of it would convene into one mass and some into another, so as to make an infinite number of great masses, scattered at great distances from one to another throughout all that infinite space.” : “…Mas se a matéria estava distribuída no espaço infinito, ela nunca poderia se agregar numa única massa; parte dela se aglutinaria numa massa aqui e outra acolá, de modo a formar um número infinito de grandes massas, espalhadas a grandes distâncias uma das outras preenchendo todo espaço infinito”.

A visão unificada proporcionada pela gravitação universal, aliada com as leis da mecânica, originou uma nova visão do Universo. O Cosmos seria representado por um modelo infinito, estático e sem éter cósmico6 6 Na tradição filosófica grega, o éter (5o. elemento) seria a substância formadora dos corpos celestes. , uma concepção que influenciaria o pensamento cosmológico por mais de 200 anos (ver Figura 2).

Figura 2
Cosmologia pós-renascentista. Na visão de Newton, o Universo seria estático, infinito e euclidiano, com a matéria localmente agregada pela atração gravitacional. Uma visão que predominou até o século XX (ver texto).

A física e astronomia posterior a Newton, incluindo a mecânica dos fluidos, termodinâmica e teoria cinética dos gases, não produziram um novo pensamento cosmológico. Nada substancial foi acrescentado a visão teórica newtoniana de um universo estático, infinito, euclidiano e regido por sua auto-gravitação; desde William Herschel (1738–1822)7 7 Herschel descobriu o planeta Urano e foi o maior construtor de telescópios do século XVIII. Em 1789, ele publicou um catálogo com mais de 1000 nebulosas [23]. Alguns desses objetos eram observados a olho nu. Mas todos apareciam de forma difusa mesmo quando observadas pelos maiores telescópios da época. O filósofo Imannuel Kant (1724–1804) sugeriu em 1755 que as nebulosas, tal como a Via Láctea, seriam “Universos-Ilha” formados por estrelas. - o mais famoso astrônomo do século XVIII - até a emergência da cosmologia moderna em pleno século XX [23[23] M.J. Crowe, Modern Theories of the Universe - From Herschel to Hubble (Dover publication, New York, 1994).].

3. Origens da Cosmologia Moderna

As sementes da cosmologia moderna foram plantadas até meados da terceira década do século XX. A nova visão do Cosmos, distinta do legado newtoniano, foi também estimulada pelos mesmos ingredientes do tardio renascimento científico, a combinação de teoria, novas tecnologias e observações astronômicas.

Do lado teórico, as revoluções científicas marcando o início da física moderna: mecânica quântica (1900), relatividade especial (1905) e relatividade geral (1915), foram decisivas [24[24] A. Pais, Sútil é o Senhor - Vida e Pensamento de Albert Einstein, trad. de F. Parente e V. Esteves (Gradiva, Lisboa, 1982)., 25[25] M. Paty, A Física do Século XX (Idéias & Letras, São Paulo, 2009).].

Inicialmente, a relatividade especial (ou restrita) [26[26] A. Einstein, op. cit. [2], p. 47.] revelou-se bem mais importante para a cosmologia do que a mecânica quântica8 8 As idéias da microfísica e da teoria de radiação se revelariam inestimáveis a partir de 1965, com a descoberta da radiação cósmica de fundo (ver linha do tempo na Figura 1). , pois requereu uma modificação imediata da teoria gravitacional de Newton. De fato, a noção de ação à distância era incompatível com as idéias de causalidade da relatividade restrita, segundo a qual os campos físicos deveriam se propagar com velocidade finita. Em 1905, Henri Poincaré (1854–1912) já havia argumentado que uma descrição matemática consistente do campo gravitacional deveria prever a existência de radiação gravitacional [27[27] H. Poincaré, C. R. Acad. Sci. Paris 140, 1504 (1905); Oeuvers Completes (Gauthier-Villars, Paris, 1954) v. 9, p. 489.].

Einstein começou sua busca por uma descrição relativística da gravitação em 1907 ao escrever seu primeiro artigo de revisão da relatividade [28[28] A. Einstein, Jahrb. Radioakt. ElektroniK 4, 411 (1907). Correções de Einstein em Jahrb. Radioakt. ElektroniK 5, 512 (1908). A parte relacionada com a gravitação pode ser lida (com notas) em H.M. Schwartz, Amer. J. Phys. 45, 899 (1977).], provavelmente, estimulado pelos questionamentos de Poincaré. Em 1915, depois de muitas tentativas e erros durante os 3 últimos e mais intensos anos de sua busca9 9 Uma descrição vívida e detalhada desse período decisivo (1912–1915), pode ser vista em [24]. , Einstein finalmente propôs a relatividade geral [29[29] A. Einstein, in: Textos Fundamentais da Física Moderna, op. cit. [2], p. 141.]. Em 1916, com a nova teoria ele demonstrou a conjectura de Poincaré10 10 As ondas gravitacionais previstas por Einstein em 1916 foram observadas 100 anos depois [30]. .

Em 1917, Einstein aplicou suas equações para descrever o Universo, iniciando a cosmologia teórica do século XX (ver seção 5). Para obter uma solução estática, Einstein modificou as equações de 1915, introduzindo a constante cosmológica Λ. Em dois artigos subsequentes, Friedmann (1922, 1924) demonstrou que existiam soluções expansionistas (com e sem Λ), encerrando as contribuições teoricamente mais relevantes até o final da década.

Na Figura 3, mostramos a conexão entre as sementes teóricas que originaram a cosmologia moderna. Diferente da gravitação newtoniana, o eletromagnetismo maxwelliano e a mecânica estavam contidos na relatividade especial11 11 O eletromagnetismo revelou-se uma teoria relativística (sendo apenas despojado do conceito de éter luminífero), enquanto a mecânica foi imediatamente generalizada para satisfazer o critério relativístico especial de causalidade, V≤c. . A contradição com a gravitação foi completamente resolvida pela relatividade geral e 2 anos depois Einstein inicia a cosmologia teórica moderna (1917), como um novo ramo da física.

Figura 3
Sementes teóricas da cosmologia moderna. A contradição entre relatividade especial e gravitação newtoniana foi resolvida pela relatividade geral (1915). Em 1917, Einstein fundou uma nova área de pesquisa (Cosmologia), aplicando sua teoria e tratando o Universo como um sistema físico.

Do lado tecnológico/observacional, a cosmologia foi impulsionada pela construção dos grandes telescópios e também pelo aprendizado adquirido sobre medidas de velocidades e distâncias das nebulosas (como as galáxias eram chamadas na época).

Em julho de 1917, entrou em operação o grande telescópio Hooker (refletor) de 2,5m de diâmetro, localizado no Monte Wilson (Califórnia), o mamute da época12 12 Em celebração ao centenário da primeira luz do Hooker, foi disponibilizado pelo Observatório de Monte Wilson o histórico de instalação desse importante instrumento para o pioneiro estudo das galáxias [31] . Naquela altura ainda persistia o debate entre astrônomos para determinar o tamanho da Via Láctea. O problema era saber se as nebulosas eram parte da nossa galáxia ou seriam outros “Universos-Ilha” como especulado por Kant (ver nota de rodapé 7). Na segunda década do século XX, esta dúvida ainda não resolvida já tinha mais de 150 anos.

A polêmica estava relacionada com as dificuldades na determinação de distâncias em astronomia. Em 1920, essa controvérsia foi o tema escolhido para duas apresentações que ficariam conhecidas como o Grande Debate entre os astrônomos Harlow Shapley (1885–1972) e Heber Curtis (1872–1942). O debate terminou inconclusivo, mas acelerou o desenvolvimento e o interesse pela imensidão do Cosmos, uma área do conhecimento que no futuro próximo seria chamada de astronomia extragaláctica [32[32] E.P. Hubble, The Realm of the Nebulae, (New York, Dover Publications, 1958), 2ª ed.35[35] J. Lamon e J.A.S. Lima, O Grande Debate e a Descoberta da Expansão do Universo, em preparação.].

Por outro lado, medidas de velocidades radiais de afastamento (ou de aproximação) das nebulosas vinham sendo medidas desde 1914 pelo astrônomo americano Vesto Slipher (1875–1969). Tais medidas são relativamente simples e de grande precisão, pois são baseadas no chamado efeito Doppler da luz emitida pelos corpos celestes. Para objetos que se aproximam (z negativo) ou se afastam (z positivo), tal efeito se traduz no desvio para o vermelho ou azul de suas linhas espectrais

(1) z ( λ 0 - λ ) λ = V c , ( V << c )

onde z é o parâmetro de “redshift”, V é a velocidade da fonte e λ0, λ são, respectivamente, os comprimentos de onda recebido pelo observador e emitido pela fonte.

Em 1923, uma tabela com 41 medidas, das quais 36 com redshifts positivos (z0.006) e apenas 5 com valores negativos, incluindo Andromeda (M31) com z=-0.001, foi publicada no prestigiado livro de relatividade geral13 13 A tabela solicitada por Eddington foi preparada por Slipher e incluia seus últimos dados. Alguns não haviam sido publicados. do astrofísico inglês Arthur Eddington (1882–1944) [36[36] A. Eddington, The Mathematical Theory of Relativity (Cambridge UP, Cambridge, 1924), 2ª ed., p. 162.]. Contudo, na época não estava ainda claro o seu significado físico, pois não se sabia como estimar as distâncias para as nebulosas.

Ainda em 1923, Edwin Hubble (1889–1953), utilizando o telescópio Hooker (ver Figura 4), descobriu estrelas variáveis Cefeídas em Andrômeda. Usando essas estrelas como vela-padrão14 14 As pulsantes Cefeídas foram calibradas por Henrietta Leavitt (1868–1921) permitindo medir distâncias extragalácticas, uma possibilidade levantada por Harlow Shapley em 1920, durante o Grande Debate. Hubble determinou a distância para a galáxia de Andrômeda (M31) estabelecendo que estava efetivamente fora da Via Láctea. Essa solução para o Grande Debate marcou o início da astronomia extragaláctica [38[38] E.P. Hubble, Astrophys. J. 64, 321 (1926).]. Finalmente, a verdadeira cosmologia observacional dava seus primeiros passos. Em breve começaria o acoplamento entre teoria e observação.

Figura 4
Hubble no telescópio Hooker no Observatório do Monte Wilson (Califórnia). Crédito da imagem: [37[37] http://time.com/3586145/edwin-hubble-photo-of-a-genius-at-work/, acessado em 13/06/2017.
http://time.com/3586145/edwin-hubble-pho...
].

É importante enfatizar que do ponto de vista teórico ocorreram duas rápidas mudanças paradigmáticas em relação as idéias newtonianas. De um lado, uma nova teoria de gravidade mais precisa do que a newtoniana e de outro, um novo modelo cosmológico foi proposto, mas agora como solução matemática da relatividade geral. Devido algumas nuances e sutilezas que precisam ser compreendidas, examinaremos os passos fundamentais da transição Relatividade Geral-Cosmologia nas duas seções a seguir. Como veremos, o resultado dessa sinergia entre teoria e observação será não apenas a previsão teórica, mas também a descoberta da expansão Universal.

4. Gravitação Einsteiniana: Relatividade Geral

Em 1907, Einstein percebeu que a força gravitacional newtoniana era de certa forma ilusória, pois um observador em queda livre não sente seu próprio peso. A possibilidade de anular localmente a gravidade indo momentaneamente para o sistema em queda livre, significa que a interação gravitacional pode ser pensada como uma força fictícia. Inversamente, um campo gravitacional estático e homogêneo, g, pode também ser simulado por um referencial uniformemente acelerado com a=-g, um atributo válido na gravidade newtoniana.

Em 1912, Einstein nomeou essa propriedade de Princípio de Equivalência (PE). Na verdade, Einstein entendera desde 1907 a existência de uma equivalência física entre efeitos gravitacionais e acelerativos, cujas consequências precisavam ser investigadas15 15 Após o artigo de 1907, Einstein retornaria ao problema gravitacional somente em meados de 1911. . Contudo, apesar de algumas tentativas mal sucedidas, até meados de 1912, ainda não estava claro para Einstein como essa equivalência seria utilizada para construir uma teoria relativística da gravitação. Einstein entrara no labirinto de teorias com velocidade da luz variável (devido a presença da gravitação), provavelmente, pela perda de um atalho precioso em sua busca; a noção de espaço-tempo métrico e suas conexões.

Em 1908, Herman Minkowski (1864–1909)16 16 Minkowski foi professor de Einstein na graduação do Instituto Federal de Tecnologia em Zurique (ETHZ). havia proposto um conceito que seria muito importante para a relatividade geral; a noção de um contínuo espaço-tempo e sua descrição métrica [39[39] H. Minkowski, in: Textos Fundamentais da Física Moderna, Op. cit. [2], p. 93.]. Ele demonstrou que a propriedade que distingue as transformações de Lorentz e de Galileo é a invariância da métrica (elemento de linha) quadrimensional:

(2) d s 2 = c 2 d t 2 - d x 2 - d y 2 - d z 2 = η α β d x α d x β ,

onde ηαβ é o tensor métrico ou matriz de Minkowski, o 4-vetor xα(ct,x,y,z) e os índices gregos α,β=0,1,2,3. Note que na segunda igualdade foi adotada a convenção de Einstein - índices repetidos indicam soma. Da primeira igualdade lemos diretamente os coeficientes métricos η00=1,η0i=0,ηij=-δij (i,j=1,2,3). Portanto, a matriz é definida apenas pelos elementos diagonais, ηαβ diagonal(+1,-1,-1,-1).

Embora seja uma métrica pseudo-euclidiana17 17 Diferente do caso pseudo-euclideano, uma métrica euclidiana 4-dimensional tem diagonal (+1, +1, +1, +1). , é possível mostrar que a curvatura riemanniana do espaço-tempo de Minkowski é nula, ou seja, o espaço-tempo quadrimensional é plano. Podemos afirmar que Minkowski substituiu as duas métricas separadas da mecânica newtoniana (tempo absoluto e espaço absoluto), ambas invariantes por transformações de Galileo

(3) ( I ) d t 2 = d t 2 , ( I I ) d 2 = d x 2 + d y 2 + d z 2 = d 2 ,

pelo contínuo 4-dimensional (2), absoluto, plano e invariante por transformações de Lorentz (cf. (2)).

A nova linguagem matemática baseada em 4-vetores e 4-matrizes ou, mais geralmente, em tensores, simplificou consideravelmente a relatividade especial. Tal como aconteceu com a unidade entre espaço e tempo, foi também possível unificar os conceitos de energia e momentum, no 4-vetor de energia-momentum, Pμ(Ec,p). Para um meio material contínuo ou um campo físico com densidades de energia e momentum, a unidade é estabelecida pelo 4-tensor de energia-momento, Tμν. Na época, a radicalidade dessas contribuições de Minkowski não foi percebida por Einstein18 18 Ao ter conhecimento do artigo de Minkowski, Einstein o classificou como erudição supérflua [40]. Anos depois mudaria de idéia. .

Uma conexão anterior entre o formalismo de Minkowski e o princípio de equivalência teria abreviado sua busca, como Einstein posteriormente reconheceria. De fato, se todos os referenciais são igualmente adequados para descrever a física, então a geometria euclidiana não pode ser válida em todos eles já que os referenciais acelerados afetam as réguas e o tic-tac dos relógios. Isto significa que os coeficientes da métrica do espaço-tempo, não podem se reduzir em todos os lugares a forma de Minkowski. Por outro lado, a equivalência entre efeitos acelerativos e gravitacionais sugeria claramente uma teoria geométrica para a gravitação baseada numa geometria não-euclidiana. Einstein encontrara as variáveis que descreviam o campo gravitacional, mas faltavam suas equações dinâmicas.

Em 1913, inspirado por diferentes conceitos físicos e matemáticos, incluindo: (i) o Princípio de Equivalência, (ii) a idéia de espaço-tempo introduzido por Minkowski e, (iii) os estudos de Bernhard Riemann (1826–1866), Gregorio Ricci (1853–1925) e outros geômetras sobre espaços curvos de dimensões arbitrárias, Einstein associou corretamente o efeito da gravitação a modificação da métrica do espaço-tempo Minkowskiano:

(4) d s 2 = g α β d x α d x β ,

onde as componentes de gαβ são funções da posição e do tempo que em geral não podem ser globalmente reduzidas a forma de Minkowski dada por (2). Isso pode ocorrer apenas numa vizinhança espaço-temporal suficientemente pequena (para atender o PE), ou na ausência total de matéria, quando a solução global esperada seria a relatividade especial e a métrica de Minkowski, gαβηαβ. Faltava apenas as equações satisfeitas pelo tensor métrico.

Em 1915, Einstein finalmente propôs as equações descrevendo a interação gravitacional ou, equivalentemente, a geometria de um espaço-tempo curvo na relatividade geral [29[29] A. Einstein, in: Textos Fundamentais da Física Moderna, op. cit. [2], p. 141.]:

(5) G μ ν R μ ν - 1 2 g μ ν R = χ T μ ν ,

onde χ=8πGc4 é a constante de Einstein19 19 A presença da constante gravitacional de Newton (G) e da velocidade da luz (c) na constante de Einstein, significa que a Relatividade Geral é uma teoria de gravidade relativística. , Rμν é o chamado tensor de Ricci que descreve a geometria, gμν é o tensor métrico do espaço-tempo, R=gμνRμν é o escalar de curvatura de Ricci e Tμν o tensor de energia-momentum, representando o conteúdo energético-material do Universo (μ,ν=0,1,2,3).

Note que todas as quantidades acima (tensores) são matrizes simétricas 4×4 (Gμν=Gνμ, Tμν=Tνμ). Isto significa que no caso geral (sem simetrias) as equações acima reduzem-se a 10 equações diferenciais parciais acopladas independentes.

Na Figura 5 ilustramos pictoricamente a conexão entre geometria, espaço-tempo e curvatura numa situação simples, o caso de uma massa isolada. Qualitativamente, as equações de Einstein podem ser entendidas como um compromisso entre a curvatura (geometria) e o conteúdo material-energético do espaço-tempo representado pelo tensor de energia-momentum. A geometria passa a ser um campo dinâmico determinado pela distribuição de matéria. Qualitativamente, as equações de Einstein (5) podem ser representadas da seguinte forma:

M a t r i z d e s c r e v e n d o a g e o m e t r i a d o E s p a ç o T e m p o = M a t r i z d a s f o n t e s m a t é r i a e n e r g i a d o E s p a ç o T e m p o

ou ainda, nas palavras de John Wheeler [41[41] J.A. Wheeler, em Geons, Black Holes & Quantum Foam - A Life in Physics (W.W. Norton & Company, New York, 1998), p. 235.]

G e o m e t r i a d i z c o m o M a t é r i a - E n e r g i a d e v e m MOVER - SE = M a t é r i a - E n e r g i a o b r i g a G e o m e t r i a a CURVAR - SE
Figura 5
Geometria, curvatura e matéria. De acordo com as equações (5) propostas por Einstein, a geometria do espaço-tempo depende da presença da matéria. Numa situação estática como na figura, vemos que a relatividade especial é válida longe das fontes. Neste caso, o contínuo espaço-tempo é descrito pela métrica (2) descoberta por Minkowski.

A radicalidade da teoria de Einstein é precisamente o fato da geometria do espaço-tempo não ser mais um dado a priori como na física newtoniana ou mesmo na relatividade especial. O espaço-tempo em geral passa a ter uma dinâmica.

É interessante que a cosmologia relativística foi iniciada por Einstein antes mesmo da relatividade geral tornar-se uma teoria bem aceita ou conhecida. De fato, foi a experiência da deflexão da luz das estrelas pelo Sol - realizada no eclipse solar total em maio de 1919 - que disparou o processo de reconhecimento da teoria.

O experimento foi realizado simultaneamente na Ilha do Príncipe (na costas da Guiné Equatorial) e na cidade de Sobral, no Ceará. A consagração da teoria (e do autor) ocorreu em 6 novembro do mesmo ano, numa reunião conjunta da Royal e da Astronomical Society em Londres. Na ocasião, o físico J. J. Thompson fez o seguinte anúncio: ”…a previsão e confirmação da deflexão da luz é o resultado mais importante relacionado com a teoria da gravitação desde os tempos de Newton e representa uma das maiores conquistas do pensamento humano” [24[24] A. Pais, Sútil é o Senhor - Vida e Pensamento de Albert Einstein, trad. de F. Parente e V. Esteves (Gradiva, Lisboa, 1982)., 42[42] J.A.S. Lima, Boletim da SAB 18, 43 (1999).]. Podemos afirmar hoje que um dos maiores bônus intelectuais de Einstein pela descoberta da Relatividade Geral, foi o imediato lançamento da pedra fundamental da cosmologia moderna, como um novo ramo da física (ver Figura 3).

5. O Universo Estático de Einstein (1917)

Why Λ or not Λ became the great doubt of cosmology? 20 20 Por que Λ ou não-Λ tornou-se a grande dúvida da cosmologia?

A falta de observações do universo profundo, aliada as considerações cosmológicas de Newton sobre um Universo infinito e estático, bem como as suas dificuldades conceituais relativas as condições de fronteira no infinito, induziram Einstein [4[4] A. Einstein, in: Textos Fundamentais da Física Moderna, op. cit. [2], p. 225. Ver também op. cit. [3], p. 16.] a propor um modelo de Universo baseado em três hipóteses:

  1. Matéria cósmica descrita por um fluido perfeito sem pressão,

  2. “Princípio Cosmológico”(homogeneidade e isotropia espacial),

  3. Universo finito e estático.

A hipótese (i) significa que Einstein optou por uma descrição hidrodinâmica. Na época, o universo inteiro era a Via Láctea e como o gás de estrelas é muito diluído, a matéria poderia se comportar como um fluido perfeito sem pressão.

O postulado (ii) é de origem puramente geométrica. Fisicamente, significa que todas as quantidades observáveis serão invariantes por translação (homogeneidade) e rotação (isotropia). É uma hipótese simplificadora, pois a geometria espacial fica dotada da maior simetria possível; restringindo assim o número de quantidades geométricas para descrever o modelo.

Um teorema da geometria diferencial garante que essa hipótese é compatível com 3 geometrias espaciais distintas, especificadas pelo parâmetro de curvatura, k=+1 (fechado e finito), k=-1 (universo hiperbólico, infinito), k=0 (universo plano, infinito).

Einstein adotou o caso fechado (esfera S3). A escolha foi apresentada por ele como vantajosa pois resolvia o problema de condições de contorno ou de fronteira do Universo.

A hipótese (iii) é sem dúvida a mais severa e restritiva delas, pois um Universo estático não seria compatível com as equações propostas por Einstein em 1915. A razão física é bem simples: um fluido autogravitante, sem pressão, estático, homogêneo e isotrópico, colapsaria totalmente numa escala de tempo finita.

Para compatibilizar um modelo matemático com as idéias de um Universo estático vigentes desde a antiguidade grega e ainda sobreviventes até o século XX, Einstein modificou de forma “ad hoc”sua teoria. Uma iniciativa nada trivial.

Em 1917, um Einstein receoso escreveu numa carta para seu amigo Paul Ehrenfest: “…fiz uma coisa no que se refere a gravitação que de algum modo me expõe ao perigo de ser internado num hospital de malucos” [43[43] A. Pais, em Sútil é o Senhor - Vida e Pensamento de Albert Einstein, op. cit. [24], p. 350.].

Einstein surpreendia mais uma vez. Introduzindo um termo proporcional a uma constante (Λ), ele alterou o sistema original de equações (5) para a seguinte forma:

(6) R μ ν - 1 2 g μ ν R - Λ g μ ν = χ T μ ν ,

onde Λ ficou conhecida como constante cosmológica21 21 Na introdução de Λ, Einstein foi muito influenciado pelas idéias de Ernest Mach (1838–1916) na sua crítica aos fundamentos da mecânica newtoniana. Segundo Mach, a inércia de um corpo seria um efeito coletivo da presença de todas as outras massas do Universo; uma idéia que poderia ser concretizada através de um modelo cosmológico finito [44]. .

O efeito físico de Λ é muito fácil de entender. Na aproximação newtoniana, o campo gravitacional pode ser descrito pela famosa equação de Poisson, 2ϕ=4πGρ, onde ϕ é o potencial gravitacional (por unidade de massa) e ρ a densidade de matéria. Essa equação é também obtida de (5) na aproximação de campo fraco e baixas velocidades. Contudo, na modificação de 1917, o limite é alterado para a seguinte expressão:

(7) 2 ϕ = 4 π G ρ - c 2 Λ .

Para uma distribuição esférica de matéria com densidade constante, a solução para ϕ a uma distância r (M é a massa dentro do raio r), é dada por:

(8) ϕ = - G M r - c 2 Λ 6 r 2 F m = - | ϕ | = - G M r 2 + 1 3 c 2 Λ r .

Da segunda equação acima vemos que Λ tem dimensão de (comprimento)-2 e gera um campo de força gravitacional repulsivo proporcional à distância22 22 No seu artigo original [4], Einstein escreveu: ∇2ϕ-Λϕ=4πGρ, uma equação que não coincide com o limite de campo fraco e baixas velocidades de sua teoria com o termo Λ [45–47]. .

Na Figura 6, mostramos o efeito de Λ provocando uma força repulsiva proporcional a distância, |F|=mΛc2r3, sobre qualquer partícula de massa m.

Figura 6
Efeito de Λ sobre uma massa m. A constante cosmológica é equivalente a existência de uma força repulsiva proporcional a distância. A gravidade repulsiva de Λ contrabalança o efeito da auto-gravitação da matéria evitando o colapso do modelo estático de Einstein.

Por outro lado, é possível mostrar que as 10 equações de campo (6) combinadas com as hipóteses (i)–(iii) reduzem-se trivialmente para apenas duas equações independentes:

(9) 8 π G ρ + Λ c 2 = 3 c 2 a 2 ,
(10) Λ = 1 a 2 .

Na equação (10) acima a é o raio do Universo espacialmente fechado (esfera S3 de volume V=2π2a3). Combinando (9) e (10) segue que ρ=Λc24πG. A constante cosmológica determina a densidade média de matéria e o raio do modelo estático. A massa total do modelo de Einstein é finita, M=ρ×2π2a3=πc4GΛ.

Tais resultados demostram também que a constante cosmológica é desprezível na física do sistema solar, mas pode ter importância crucial nas grandes escalas cosmológicas. No modelo de Einstein, por exemplo, Λ anula o efeito atrativo da auto-gravitação do fluido, evitando o colapso da matéria cósmica e possibilitando uma solução estática e finita.

É interessante que o Cosmos newtoniano homogêneo e infinito (Figura 2) é problemático devido ao fato do potencial gravitacional divergir no infinito, enquanto o resultado exato de Einstein segue diretamente das hipóteses (i)-(iii) e da relatividade geral. Observe que o modelo obtido não descreve uma aproximação como na discussão do significado de Λ, onde apelamos para uma aproximação de campo fraco da relatividade geral (incluindo o termo Λ).

Nas conclusões do seu artigo, Einstein afirma que não discutirá se o modelo é defensável do ponto de vista observacional. Além disso, confessa que o resultado foi obtido introduzindo uma extensão das equações de campo (o termo Λ) que não se justificava pelo conhecimento gravitacional da época23 23 ”In order to arrive to this consistent view, we admittedly had to introduce an extension of the field equations of gravitation which is not justified by our actual knowledge of gravitation.” . Finaliza dizendo que o termo Λ é necessário apenas para tornar possível uma distribuição estática de matéria, como requerida pelas pequenas velocidades estelares. Nesse ponto vemos que Einstein não tinha conhecimento das medidas de velocidade das nebulosas.

Em 1917, Willem de Sitter (1872–1934) obteve outra solução estática24 24 Em 1929, Howard Robertson (1903–1961) mostrou que as soluções de Einstein e de Sitter eram as únicas soluções cosmológicas estáticas das equações de Einstein [49]. das equações de Einstein tendo Λ0, mas sem matéria [48[48] W. de Sitter, Monthly Notices Royal Astron. Soc. 78, 3 (1917).]. Essa solução não segue das equações de Einstein (9)(10) tomando o limite ρ0, pois a geometria é completamente distinta. Na solução de de Sitter, a curvatura escalar R do espaço-tempo (escalar de Ricci) é determinada por Λ. De fato, na ausência de matéria (Tμν0), o traço da equação (5) reduz-se para R=4Λ.

A solução de Einstein continha matéria sem movimento, enquanto a de de Sitter permitia movimento sem matéria. Como isso é possível tendo ρ=0? Na verdade, toda a matéria observada, incluindo as nebulosas, seriam partículas de teste na geometria de de Sitter e, sob ação de Λ, adquirem uma velocidade de afastamento. Posteriormente, de Sitter e outros tentaram associar esse efeito ao desvio Doppler observado nas linhas espectrais, o que ficou conhecido como Efeito de Sitter25 25 A nova solução revelou-se também um duro golpe na relatividade da inércia que Einstein chamava de “Princípio de Mach”. Ao contrário do que pensava Einstein, Λ não proibia uma inércia relativa ao espaço. .

Einstein pagou um preço excessivo pela modificação de suas equações de campo. A introdução de Λ custou-lhe o que seria mais uma fantástica previsão de sua lavra, a recessão das galáxias (numa visão mais newtoniana), ou a expansão do Universo, segundo a relatividade geral. Podemos afirmar que uma conjectura científica bem articulada e psicologicamente enraizada na cultura (a idéia de Universo estático) afetou também um virtuose da física acostumado a fazer previsões surpreendentes. Como veremos, a constante Λ foi enterrada e ressuscitada diversas vezes nos últimos 100 anos. Alegoricamente, como nas histórias de Aladdin e o gênio, podemos dizer que Λ havia saído da garrafa e recusava-se a entrar novamente.

6. Modelos Expansionistas do Universo (1922)

Em 1922, o meteorologista e cosmólogo russo, Alexander Friedmann (1888–1925), tornou-se o pai da teoria do “Big-Bang”26 26 A designação modelos de Big-Bang para as soluções expansionistas foi sugerida por Fred Hoyle, numa entrevista a BBC de Londres em 1949. Era uma crítica, mas revelou-se um tremendo sucesso. . Ele mostrou que as equações de Einstein com curvatura positiva (k=+1) previam soluções expansionistas para um fluido sem pressão, tanto na teoria de Einstein original (1915), quanto na reformulação de 1917 incluindo Λ [5[5] A. Friedmann, in: Cosmological Constants - Papers in Modern Cosmology, op. cit. [3], p. 49.]. Em 1924, Friedmann obteve novas soluções expansionistas (com e sem Λ) para o caso hiperbólico (k=-1) [50[50] A. Friedmann, in: Cosmological Constants - Papers in Modern Cosmology, op. cit. [3], p. 59.].

A métrica dos modelos expansionistas homogêneos e isotrópicos, ou seja, cuja seção espacial (t=const.) satisfaz o princípio cosmológico, pode ser escrita como [51[51] P.J.E. Peebles, Principles of Physical Cosmology (Princeton, New Jersey, 1993).]:

(11) d s 2 = c 2 d t 2 - a 2 ( t ) d r 2 1 - k r 2 + r 2 d θ 2 + r 2 s e n 2 θ d ϕ 2 ,

onde (r,θ,ϕ) são coordenadas esféricas adimensionais (números puros). Essas coordenadas são ditas comóveis, pois os elementos de volume do fluido estão em repouso (ver Figura 8). O fator de escala a(t) - a única quantidade desconhecida na geometria - tem dimensão de comprimento e k=±1,0 é o parâmetro de curvatura associado aos modelos fechado, aberto (hiperbólico) e plano, respectivamente27 27 Na literatura moderna, o elemento de linha (11) é bastante referido como métrica de Friedmann-Robertson-Walker (FRW). Em meados dos anos 30, Robertson [52] e e Walker [53] mostraram que a métrica é independente da relatividade geral. . Para k=+1 e a=constante, a métrica acima se reduz a forma adotada por Einstein no seu modelo estático.

No caso de modelos fechados (k=+1), o fator de escala é o próprio raio (variável) do Universo, cuja seção espacial finita é representada pela esfera S3 de volume V(t)=2π2a3(t). Obviamente tal interpretação não é válida para os outros casos (k=-1,0), pois são espaços de volumes infinitos e com topologias (propriedades globais do espaço 3-dimensional) completamente diferentes da esfera S3. No entanto, independente da curvatura, cada comprimento espacial finito ainda satisfaz a lei de escala, La(t), ou seja, um volume finito qualquer varia satisfazendo, V(t)a3(t).

Essa geometria deve ser compatibilizada via equações (6) com uma fonte de curvatura. Para um fluido perfeito com densidade de energia, ϵ=ρc2 e sem pressão p=0 (o mesmo fluido adotado por Einstein), o tensor de energia-momentum tem forma, Tμν=ρc2uμuν, onde uμ=δμ0(1,0,0,0), as equações de Einstein se escrevem:

(12) 8 π G ρ + Λ c 2 = 3 a ˙ 2 a 2 + 3 k c 2 a 2 ,
(13) Λ c 2 = 2 a ¨ a + a ˙ 2 a 2 + k c 2 a 2 ,

onde um ponto denota derivada em relação ao tempo e a(t) é o fator de escala.

É instrutivo verificar como o modelo estático de Einstein é prontamente recuperado das equações acima. Considerando a˙=a¨=0, segue diretamente de (13) que Λ=ka2 e substituindo em (12), obtemos 4πGρ=kc2a2; o que permite uma solução com densidade de matéria positiva somente se k=+1. Nessas condições o sistema (12)(13) se reduz ao sistema (9)(10). As equações mais gerais de Friedmann não apenas recuperam o resultado esperado, Λ=1a2, mas também explicam a escolha geométrica de Einstein28 28 Note que no caso estático os valores k=0,-1 não permitem soluções fisicamente consistentes (ρ≤0). Algo impossível de se perceber da leitura do artigo de Einstein! .

Friedmann obteve as soluções gerais das equações acima considerando k=±1 e também Λ=0 e Λ0. A quantidade de matéria total dos modelos é constante, sendo finita no modelo fechado e infinita no modelo aberto. A densidade de matéria diminui com a expansão, ρa-3(t), ou equivalentemente, ρ=ρ0(a0a)3, onde ρ0 e a0 são a densidade de matéria e o fator de escala hoje29 29 Daqui em diante, o valor de uma quantidade qualquer com sub-índice zero, X0, denotará o valor da quantidade X(t) em t=t0, seu valor atual. .

Nos modelo de Einstein Λ determinava a densidade de matéria e o raio do Universo. Contudo, Friedmann percebeu que Λ nos modelos expansionistas é simplesmente um parâmetro livre, ou seja, uma constante arbitrária e que as soluções são extremamente simples no caso Λ=0. No caso geral pode-se mostrar que as soluções são funções elípticas, do tipo t(a) que não podem ser invertidas para obter a(t).

Einstein relutou em aceitar as soluções expansionistas de Friedmann, chegando mesmo a publicar um curto artigo em 1922, alegando a existência de um erro matemático [54[54] A. Einstein, in: Cosmological Constants - Papers in Modern Cosmology, op. cit. [3], p. 66.]. Friedmann escreveu para Einstein demonstrando que seu artigo estava correto, mas sem receber resposta, decidiu enviar também um emissário de nome Krutkoff que refez pessoalmente os cálculos com Einstein.

Convencido, Einstein reagiu de imediato, publicando na mesma revista outro pequeno artigo reconhecendo seu erro [55[55] A. Einstein, in: Cosmological Constants - Papers in Modern Cosmology, op. cit. [3], p. 67.]. Afirmou também que as soluções de Friedmann estavam corretas, eram esclarecedoras e que de fato existiam soluções expansionistas espacialmente homogêneas e isotrópicas permitidas por suas equações de campo30 30 “I am convinced that Mr. Friedmann’s results are both correct and claryfying. They show that in addition to the static solutions to the field equations there are time varying solutions with a spatially symmetric structure” (Einstein [55]). .

Faltava ainda as soluções expansionistas mais simples, a do caso plano (k=0). Considerando Λ=k=0, o leitor pode verificar da equação (13) que a solução do fator de escala neste caso pode ser escrita na seguinte forma:

(14) a ( t ) = a 0 t t 0 2 3 ,

onde t0 é a idade do Universo medida hoje, ou seja, o tempo total de expansão decorrido desde a singularidade (t=0).

A solução acima foi obtido por Einstein e de Sitter31 31 Einstein e de Sitter seguiram explicitamente a sugestão do astrofísico Otto Heckmann (1901–1983). em 1932 [56[56] A. Einstein and W. de Sitter, Proceedings of the National Academy of Sciences 18, 213 (1932).], quando Einstein já havia renegado a constante cosmológica32 32 A primeira negação ocorreu no cartão postal de 23/05/1923 enviado para o matemático e cosmólogo Herman Weyl (1885–1955). Os autores acreditam que o abandono foi uma decorrência natural do conhecimento de Einstein do modelo de Friedmann (1922), sem o qual não faria sentido eliminar Λ. Einstein escreveu: ”Se não existe um mundo quase estático, então mandemos embora o termo cosmológico” [57]. , completando o que ficaria conhecido na literatura como a classe de soluções cosmológicas do tipo Friedmann33 33 Friedmann faleceu em 1925 na cidade de Kiev, vítima de um surto de febre tifo que grassou na Rússia pós-revolucionária. Provavelmente, foi esse trágico acontecimento que lhe impediu de obter a solução mais simples (k=0), derivada por Einstein e de Sitter 7 anos depois. .

Na Figura 7, apresentamos qualitativamente a evolução temporal do fator de escala para os três tipos de modelos (k=0,±1), considerando Λ=0. Os modelos expandem a partir da singularidade em t=0 (“Big-Bang”). No caso fechado, os modelos são cíclicos, evoluindo entre a grande explosão e a grande implosão (“Big-Crunch”). Além disso, fixando a massa do Universo, M=5×1021 massas solares, Friedmann estimou um valor para o período T da ordem de 10 bilhões de anos.

Figura 7
Expansão do Universo em modelos do tipo Friedmann com Λ=0. A solução do caso plano (k=0) foi determinada por Einstein e de Sitter em 1932 (ver texto). Ao lado vemos os análogos em 2 dimensões das geometrias espaciais 3-dimensionais, homogêneas e isotrópicas.

É importante enfatizar que para os três modelos não existe um centro de expansão. A homogeneidade e isotropia espacial (princípio cosmológico) garantem a mesma visão típica de qualquer galáxia. Em outras palavras, as galáxias estão paradas, cada uma na sua própria coordenada, mas o espaço entre elas expande continuamente. O efeito resultante é uma recessão galáctica em qualquer linha de visada.

Na Figura 8, mostramos para o caso fechado uma analogia bidimensional desse fenômeno de expansão sem centro. Tudo funciona como se galáxias fossem pontos pintados nas coordenadas (θ,ϕ) fixas na superfície de uma bexiga sendo inflada (são análogas as coordenadas comóveis da métrica do tipo FRW). A área da esfera simula o espaço curvo, real, disponível. Note que os observadores de qualquer galáxia compartilham a mesma visão típica do Universo. Qualquer galáxia pode ser considerada o centro34 34 As galáxias efetivamente não aumentam de tamanho, pois são inomogeneidades locais de matéria cuja densidade é várias ordens de grandeza maior do que a densidade média do Universo. . Essa analogia bidimensional da expansão sem centro é válida para todos os valores de k na Figura 7. A diferença é que no modelo fechado (k=+1), o raio do Universo vai efetivamente a zero no instante t=0, enquanto nos outros casos dizemos que o fator de escala a(t) vai a zero; o que também, efetivamente, colapsa as distâncias físicas no “Big-Bang”. Na verdade, a visão de uma expansão sem centro continua válida até mesmo quando incluímos Λ.

Figura 8
Fenômeno da expansão sem centro. As coordenadas das galáxias pintadas na superfície do balão são fixas, mas o espaço entre elas expande aumentando a distância relativa. Um observador em qualquer galáxia dirá que as outras se afastam, pois observa um redshift (recessão cósmica).

Neste ponto é conveniente introduzir os parâmetros cinemáticos observáveis que emergem das equações de Friedmann: H (parâmetro de Hubble) e q (parâmetro de desaceleração):

(15) H ( t ) = a ˙ a , q ( t ) = - a a ¨ a ˙ 2 ,

H(t) tem dimensão de inverso de tempo e mede a taxa de expansão do volume [V˙/V=3H(t)], q(t) mensura a variação da taxa de expansão, ou seja, se o universo acelera (a¨>0) ou desacelera (a¨<0)35 35 Como a gravidade é atrativa, a crença de que a expansão seria desacelerada era tão forte que os astrônomos introduziram o sinal negativo na definição do parâmetro de desaceleração, de forma que a¨<0 implicaria q>0.

Observacionalmente, os astrônomos determinam os valores dessas quantidades hoje (H0, q0) e via equações de Friedmann, podemos propagá-las para o passado e também para o futuro [58[58] J.V. Cunha, L. Marassi and J.A.S. Lima, Monthly Notices of the Royal Astron. Soc. 379, L1 (2007).,59[59] A.C.C. Guimarães and J.A.S. Lima, Classical and Quantum Gravity 28, 125026 (2011), arXiv:1005.2986.].

Para exemplificar, considere as equações de Friedmann (12)(13) para Λ=0. Neste caso é fácil deduzir a seguinte relação:

(16) a ¨ a = - 4 π G 3 ρ ,

válida para todos os valores de k=0,±1 . Note que a expansão será sempre desacelerada (a¨<0), ou seja, q>0, pois a densidade de matéria é positiva. Isso também explica a introdução (desnecessária) do sinal negativo na definição do parâmetro de desaceleração.

Os artigos de Friedmann já haviam consolidado a possibilidade de um modelo dinâmico no âmbito da Relatividade Geral, mas não existia ainda qualquer sugestão de comprovação observacional. Essa incompleteza teórico/observacional não duraria muito tempo.

7. Descoberta da Expansão Universal (1929)

Desde os anos 20, o Grande Debate demonstrara o interesse pela distância das nebulosas. As potencialidades do telescópio Hooker (ver nota de rodapé 12), também garantira um rápido desenvolvimento da recém-descoberta astronomia extragaláctica. Como resultado, os astrônomos finalmente definiram um método mais confiável para a determinação de distâncias em cosmologia.

Nosso Universo era realmente bem maior do que o imaginado quando Einstein abriu a trilha teórica da cosmologia moderna.

A sinergia nessa combinação entre teoria, tecnologia e observações astronômicas, provocaria uma profunda mudança de paradigma. O uso intensivo do telescópio Hooker por Hubble, o transformaria numa espécie de Galileo da astronomia do século XX. Um campo inteiramente novo de pesquisa observacional tinha sido descoberto, lançando a humanidade na última fronteira astronômica, a pesquisa na vastidão do Cosmos. Uma vívida exposição, envolvendo o período até 1936, pode ser vista no livro de Hubble, entitulado “O Domínio das Nebulosas” (The Realm of the Nebulae) [32[32] E.P. Hubble, The Realm of the Nebulae, (New York, Dover Publications, 1958), 2ª ed.].

Em 1929, Hubble mediu distâncias até as nebulosas próximas, utilizando um número maior de estrelas Cefeídas como vela-padrão. Dois importantes resultados foram obtidos: (i) Confirmou-se para uma amostra maior (22 galáxias) que de fato as “nebulosas” não pertencem a Via Láctea, resolvendo definitivamente o debate sobre as “nebulosas” e o tamanho da Via Láctea; (ii) As galáxias estão se afastando com uma velocidade proporcional a distância, ou seja exibem “redshift” ou desvio para o vermelho das linhas espectrais.

Na Figura 9, apresentamos uma versão adaptada do diagrama original de Hubble [60[60] E.P. Hubble, Proc. Nat. Acad. Sci. 15, 168 (1929).]. A expansão universal prevista primeiramente por Friedmann em 1922 estava observacionalmente confirmada. Os dados revelaram um valor muito alto da constante na relação linear velocidade-distância, H0=536Km.s-1.Mpc-1. Essa constante tem dimensão de (tempo)-1, sendo hoje conhecida como constante de Hubble.

Figura 9
Lei de Hubble. Em 1929 Hubble utilizou medidas de redshift z=Vc e de distância para 24 galáxias (discos pretos). A linha sólida é o melhor ajuste. A linha tracejada foi obtida para os mesmo dados binados (círculos). A cruz representa a velocidade média correspondendo a distância média de 22 galáxias cujas distâncias não puderam ser individulamente estimadas. Os dois conjuntos de dados sugerem um grosseiro comportamento linear entre a velocidade e a distância que ficaria conhecida como a Lei de Hubble.

É extremamente simples mostrar que a lei de Hubble pode ser obtida da métrica de Friedmann como uma aproximação de baixos redshifts [61[61] S. Weinberg, Cosmology (Oxford UP, New York, 2008).]. Expandindo a(t) em torno de t0 temos:

(17) a ( t ) a ( t 0 ) [ 1 + H 0 ( t - t 0 ) + . . . ] , H 0 = a ˙ ( t 0 ) a ( t 0 ) .

Por outro lado, a razão dos fatores de escala em função do redshift é a(t)=a01+z (ver apêndice A). Na mesma aproximação podemos escrever a lei de Hubble,

(18) c z V = H 0 c ( t 0 - t ) + . . . = H 0 d ,

onde aproximamos, dc(t0-t), para distâncias próximas.

A descoberta da expansão representou uma profunda quebra de paradigma do Universo estático, uma visão aceita até 1922. Para os cosmólogos nunca houve dúvidas de que a descoberta de Hubble de fato representava a expansão do espaço (ver seção 8).

Nas últimas linhas do seu artigo, Hubble enfatizou que a relação linear obtida é apenas uma primeira aproximação, pois as nebulosas imageadas estavam relativamente próximas; os dados obtidos se referem a um intervalo muito restrito de distância36 36 “…It may be emphasized that the linear relation found in the present discussion is a first approximation representing a restricted range in distance” [6]. .

Embora não tendo citado o trabalho de Friedmann, Hubble se referiu a cosmologia obtida por de Sitter (também sem citar o trabalho!), dizendo que a relação distância-velocidade poderia representar o chamado efeito de Sitter (seção 5). Concluiu com um comentário ainda mais interessante, ao afirmar que dados númericos devem ser considerados nas discussões relativas a curvatura do espaço37 37 “The outstanding feature, however, is the possibility that the velocity-distance relation may represent the de Sitter effect, and hence that numerical data may be introduced into discussions of the general curvature of space”. . Hubble estava consciente da relação entre o seu trabalho e as idéias relativísticas de espaço-tempo curvo mas, provavelmente, desconhecia os artigos de Friedmann, publicados em alemão.

O valor de H0 medido por Hubble gerou um problema teórico para a cosmologia, o chamado problema da idade do Universo.

Combinando (15) com a solução (14) segue que H(t)=23t e, portanto, a idade do Universo é dada por t0=2H0-13. Isto implica que o fator de escala na solução de Einstein-de Sitter (14) pode ser escrito como (ver [62[62] J.A.S. Lima, Amer. J. Phys. 69, 1245 (2001).] para soluções gerais para fluidos perfeitos com pressão):

(19) a ( t ) = a 0 ( 3 2 H 0 t ) 2 3 .

Vemos que o inverso de H0 determina o tempo de expansão desde o “Big-Bang”. No entanto, o valor obtido por Hubble era muito alto, resultando numa idade do Universo muito baixa, em torno de 1,5 bilhão de anos para o modelo plano, ou seja, menor do que a idade da terra (a idade do modelo fechado era menor ainda e a do modelo hiperbólico um pouco maior). Como veremos a seguir, tal problema pode ser resolvido pela constante cosmológica.

8. Sobre os Contributos de Lemaître

Em 1927, Georges Lemaître (1894–1966) publicou um artigo importante no pouco divulgado Anais da Sociedade Científica de Bruxelas [63[63] G. Lemaître, Annals of the Scientific Society of Brussels (in French) 47A, 41 (1927). Ver também a tradução parcial para o inglês feita por Lemaître na ref. [64].]. O artigo foi publicado em francês e, por razões óbvias, não repercutiu na pequena comunidade da época trabalhando em cosmologia teórica e/ou astrofísica extragaláctica. Sua influência começou apenas em 1931, quando o editor da Monthly Notices (MNRAS) solicitou a Lemaître uma versão do artigo para publicação. Lemaître prontamente concordou e ele próprio traduziu para o inglês [64[64] G. Lemaître, Monthly Notices of the Royal Astron. Soc. 91, 483 (1931).], cortando partes substanciais que julgou sem interesse devido ao trabalho de Hubble (1929).

O artigo tem 4 resultados interessantes: (i) A conexão entre o desvio para o vermelho das linhas espectrais (redshift) e a expansão do Universo, (ii) Uma dedução da lei de Hubble para pequenos redshits, (iii) alguns possíveis efeitos físicos de uma segunda componente cósmica, um fluido radiativo em equilíbrio termodinâmico de pressão p=ρ3, e (iv) uma estimativa de H0=625kmsMpc, da mesma ordem de grandeza do valor de Hubble38 38 No entanto, diferente do resultado de Hubble, o seu valor foi obtido como uma distância média estimada das nebulosas para exibir o valor de H0. .

O artigo não foi citado por Hubble e, provavelmente, por nenhum autor entre 1927 e 1929, incluindo o artigo de Robertson sobre os fundamentos da cosmologia [49[49] H.P. Robertson, Proc. Nat. Acad. of Sciences 15, 822 (1929). Ver também op. cit. [3], p. 68.]. Certamente teria repercutido antes do artigo de Hubble, caso tivesse sido publicado numa revista tradicional. Apesar disso, a tradução com supressão de seções efetuada pelo próprio Lemaître, na prestigiada Monthly Notices (MNRAS)39 39 Este fato foi recentemente esclarecido pelo astrônomo Mario Lívio [65], ao consultar os arquivos da MNRAS. em 1931, contribuiu para uma aceitação maior da expansão do espaço e, portanto, para o modelo relativístico de big-bang tornar-se o modelo padrão da cosmologia40 40 Como veremos na Parte II, o modelo de Einstein-de Sitter (k=0) foi aos poucos se estabelecendo como modelo cosmológico padrão desacelerado para as idades média e moderna da cosmologia relativística (ver Figura 1) .

Por outro lado, existia o problema da idade. Uma solução possível seria um erro no valor estimado por Hubble para H0, talvez devido a um problema de calibração nas Cefeídas. Um valor menor de H0 aumentaria a idade do Universo, o que de fato comprovou-se nas gerações seguintes (ver Partes II). Outra possibilidade seria considerar uma solução teórica, tal como sugerida por Lemaître ao apelar para a constante cosmológica.

Em 1931, Einstein já havia abjurado definitivamente a constante cosmológica, a ponto de não considerá-la na sua solução de 1932 para o caso plano em colaboração com de Sitter (cf. seção 6 e nota de rodapé 32).

No entanto, Lemaître argumentou que a constante cosmológica (sendo uma força repulsiva), acelerava o Universo e aumentava a idade, potencialmente, resolvendo a contradição com o alto valor de H0. O argumento é extremamente simples. Combinando as equações de Friedmann (12)(13) é fácil deduzir a seguinte relação:

(20) a ¨ a = - 4 π G 3 ρ - Λ 4 π G .

Note que para Λ=0 a expressão acima reduz-se a relação (20) dos modelos desacelerados (a¨<0). No entanto, se Λ>0, como a densidade de matéria diminui com o tempo, o modelo pode acelerar quando ρ(t)<Λ4πG, ou seja, quando q<0.

Modelos acelerados tem uma idade maior e a razão é bem simples. Todos os modelos (acelerados ou não) devem chegar ao presente valor do fator de escala. Isso significa que modelos acelerados partem de um instante anterior e, portanto, gastam um tempo de expansão maior para atingir o estágio atual. Uma prova baseada no cálculo explícito da idade do Universo será apresentada na Parte III.

9. Conclusão da Parte I

Durante mais de 2 séculos, nada de substancial foi acrescentado a visão teórica newtoniana de um universo estático, infinito e euclidiano, regido por sua auto-gravitação (cf. seção 2).

De posse deste legado, Einstein demorou de 1907 à 1915 para obter a relatividade geral (uma descrição da gravitação mais precisa do que a teoria newtoniana) e apenas dois anos para iniciar a cosmologia relativística com seu modelo estático de 1917 (ver Figura 3). No mesmo ano, de Sitter obteve uma segunda solução estática (sem matéria) e apenas 5 anos depois (1922), Friedmann obteve as primeiras soluções expansionistas para o caso fechado com e sem Λ, repetindo para o caso aberto (k=-1) em 1924. Como visto na seção anterior, as importantes contribuições de Lemaître (1927), repercutiram apenas depois 1931. Mesmo assim, Edwin Hubble, o pai da astronomia extragaláctica descobriu a expansão do Universo em 1929.

Na Figura 10, mostramos os pioneiros da cosmologia moderna e suas maiores contribuições até a descoberta da expansão.

Figura 10
Os fundadores da cosmologia. O quarteto fantástico (Einstein, de Sitter, Friedmann e Lemaître) resolveu os principais desafios teóricos da época, enquanto Hubble fundou a astronomia extragaláctica e descobriu a expansão do Universo.

É importante enfatizar que Hubble estava consciente da possível conexão entre sua descoberta e as idéias relativísticas, embora não tenha citado os trabalhos de Friedmann e de Sitter explicitamente (ver seção 7 e nota de rodapé 37). No entanto, foi Lemaître, em 1927, quem provou que o desvio para o vermelho das linhas espectrais é uma consequência natural da expansão do Universo. Um trabalho bastante divulgado a partir da tradução publicada na MNRAS, em 1931 [64[64] G. Lemaître, Monthly Notices of the Royal Astron. Soc. 91, 483 (1931).].

Seguindo Lemaître, os cosmólogos sempre mantiveram a mente aberta, considerando a existência de Λ. Essa constante universal ainda desconhecida, poderia resolver o problema da idade. Foi a primeira ressurreição de Λ dentre muitas em 100 anos de cosmologia moderna. A mais recente será vista na parte III, tendo sido causada exatamente pela descoberta da aceleração do Universo.

Agradecimentos

JASL agradece ao CNPq, CAPES (PROCAD 2013) e FAPESP (Projeto LLAMA).

Material suplementar

O seguinte material suplementar está disponível online:

Apêndice A : Fator de Escala, Redshift e a Lei de Hubble

Referências

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  • [64]
    G. Lemaître, Monthly Notices of the Royal Astron. Soc. 91, 483 (1931).
  • [65]
    M. Livio, ߢNature 479, 173 (2011).
  • 1
    A temperatura da radiação é cerca de 3K e seu pico encontra-se na banda de microondas. Na literatura inglesa é conhecida pelo acrônimo CMB (cosmic microwave background).
  • 2
    As novas idéias e descobertas, tanto quanto possível, serão apresentadas na sequência historicamente estabelecida.
  • 3
    “Eu propus a força da gravidade, mas eu ainda não atribuí uma causa à gravidade”.
  • 4
    Desde Aristóteles o Universo era considerado finito e limitado pela “esfera das estrelas”, uma visão também compartilhada por Copérnico e Kepler [21[21] E.R. Harrison, Cosmology, the Science of the Universe (Cambridge UP, Cambridge, 1995).].
  • 5
    “…But if the matter was evenly disposed throughout an infinite space, it could never convene into one mass; but some of it would convene into one mass and some into another, so as to make an infinite number of great masses, scattered at great distances from one to another throughout all that infinite space.”
  • 6
    Na tradição filosófica grega, o éter (5o. elemento) seria a substância formadora dos corpos celestes.
  • 7
    Herschel descobriu o planeta Urano e foi o maior construtor de telescópios do século XVIII. Em 1789, ele publicou um catálogo com mais de 1000 nebulosas [23[23] M.J. Crowe, Modern Theories of the Universe - From Herschel to Hubble (Dover publication, New York, 1994).]. Alguns desses objetos eram observados a olho nu. Mas todos apareciam de forma difusa mesmo quando observadas pelos maiores telescópios da época. O filósofo Imannuel Kant (1724–1804) sugeriu em 1755 que as nebulosas, tal como a Via Láctea, seriam “Universos-Ilha” formados por estrelas.
  • 8
    As idéias da microfísica e da teoria de radiação se revelariam inestimáveis a partir de 1965, com a descoberta da radiação cósmica de fundo (ver linha do tempo na Figura 1).
  • 9
    Uma descrição vívida e detalhada desse período decisivo (1912–1915), pode ser vista em [24[24] A. Pais, Sútil é o Senhor - Vida e Pensamento de Albert Einstein, trad. de F. Parente e V. Esteves (Gradiva, Lisboa, 1982).].
  • 10
    As ondas gravitacionais previstas por Einstein em 1916 foram observadas 100 anos depois [30[30] B.P. Abbott, R. Abbott, T.D. Abbott, M.R. Abernathy, F. Acernese, K. Ackley, C. Adams, T. Adams, P. Addesso, R.X. Adhikari, et al., Phys. Rev. Lett. 116, 061102 (2016).].
  • 11
    O eletromagnetismo revelou-se uma teoria relativística (sendo apenas despojado do conceito de éter luminífero), enquanto a mecânica foi imediatamente generalizada para satisfazer o critério relativístico especial de causalidade, Vc.
  • 12
    Em celebração ao centenário da primeira luz do Hooker, foi disponibilizado pelo Observatório de Monte Wilson o histórico de instalação desse importante instrumento para o pioneiro estudo das galáxias [31[31] Mount Wilson Observatory, One Hundred Years Ago, July 1st, 1917, the 100-Inch Mirror Arrived a top Mount Wilson!, https://www.mtwilson.edu/arrival-of-the-100-inch-mirror/, acessado em 17/07/2017.
    https://www.mtwilson.edu/arrival-of-the-...
    ]
  • 13
    A tabela solicitada por Eddington foi preparada por Slipher e incluia seus últimos dados. Alguns não haviam sido publicados.
  • 14
    As pulsantes Cefeídas foram calibradas por Henrietta Leavitt (1868–1921) permitindo medir distâncias extragalácticas, uma possibilidade levantada por Harlow Shapley em 1920, durante o Grande Debate.
  • 15
    Após o artigo de 1907, Einstein retornaria ao problema gravitacional somente em meados de 1911.
  • 16
    Minkowski foi professor de Einstein na graduação do Instituto Federal de Tecnologia em Zurique (ETHZ).
  • 17
    Diferente do caso pseudo-euclideano, uma métrica euclidiana 4-dimensional tem diagonal (+1, +1, +1, +1).
  • 18
    Ao ter conhecimento do artigo de Minkowski, Einstein o classificou como erudição supérflua [40[40] A. Pais, in: Sútil é o Senhor - Vida e Pensamento de Albert Einstein, trad. de F. Parente e V. Esteves (Gradiva, Lisboa, 1982), p. 192.]. Anos depois mudaria de idéia.
  • 19
    A presença da constante gravitacional de Newton (G) e da velocidade da luz (c) na constante de Einstein, significa que a Relatividade Geral é uma teoria de gravidade relativística.
  • 20
    Por que Λ ou não-Λ tornou-se a grande dúvida da cosmologia?
  • 21
    Na introdução de Λ, Einstein foi muito influenciado pelas idéias de Ernest Mach (1838–1916) na sua crítica aos fundamentos da mecânica newtoniana. Segundo Mach, a inércia de um corpo seria um efeito coletivo da presença de todas as outras massas do Universo; uma idéia que poderia ser concretizada através de um modelo cosmológico finito [44[44] A. Pais, em Sútil é o Senhor - Vida e Pensamento de Albert Einstein, op. cit. [24], p. 351.].
  • 22
    No seu artigo original [4[4] A. Einstein, in: Textos Fundamentais da Física Moderna, op. cit. [2], p. 225. Ver também op. cit. [3], p. 16.], Einstein escreveu: 2ϕ-Λϕ=4πGρ, uma equação que não coincide com o limite de campo fraco e baixas velocidades de sua teoria com o termo Λ [45[45] O. Heckman, Theorien der Kosmologie (Springer-Verlag, Berlim, 1942), p. 15; A. Trautman, Lectures on General Relativity (Prentice Hall, New Jersey, 1965), p. 230.47[47] J.D. Barrow and F.J. Tipler, The Antropic Cosmological Principle (Oxford University Press, Oxford, 1988), p. 214.].
  • 23
    ”In order to arrive to this consistent view, we admittedly had to introduce an extension of the field equations of gravitation which is not justified by our actual knowledge of gravitation.”
  • 24
    Em 1929, Howard Robertson (1903–1961) mostrou que as soluções de Einstein e de Sitter eram as únicas soluções cosmológicas estáticas das equações de Einstein [49[49] H.P. Robertson, Proc. Nat. Acad. of Sciences 15, 822 (1929). Ver também op. cit. [3], p. 68.].
  • 25
    A nova solução revelou-se também um duro golpe na relatividade da inércia que Einstein chamava de “Princípio de Mach”. Ao contrário do que pensava Einstein, Λ não proibia uma inércia relativa ao espaço.
  • 26
    A designação modelos de Big-Bang para as soluções expansionistas foi sugerida por Fred Hoyle, numa entrevista a BBC de Londres em 1949. Era uma crítica, mas revelou-se um tremendo sucesso.
  • 27
    Na literatura moderna, o elemento de linha (11) é bastante referido como métrica de Friedmann-Robertson-Walker (FRW). Em meados dos anos 30, Robertson [52[52] H.P. Robertson, Proc. of the Nat. Acad. of Sciences 15, 822 (1935).] e e Walker [53[53] A.G. Walker, Proc. London Math. Soc. 42, 90 (1936).] mostraram que a métrica é independente da relatividade geral.
  • 28
    Note que no caso estático os valores k=0,-1 não permitem soluções fisicamente consistentes (ρ0). Algo impossível de se perceber da leitura do artigo de Einstein!
  • 29
    Daqui em diante, o valor de uma quantidade qualquer com sub-índice zero, X0, denotará o valor da quantidade X(t) em t=t0, seu valor atual.
  • 30
    “I am convinced that Mr. Friedmann’s results are both correct and claryfying. They show that in addition to the static solutions to the field equations there are time varying solutions with a spatially symmetric structure” (Einstein [55[55] A. Einstein, in: Cosmological Constants - Papers in Modern Cosmology, op. cit. [3], p. 67.]).
  • 31
    Einstein e de Sitter seguiram explicitamente a sugestão do astrofísico Otto Heckmann (1901–1983).
  • 32
    A primeira negação ocorreu no cartão postal de 23/05/1923 enviado para o matemático e cosmólogo Herman Weyl (1885–1955). Os autores acreditam que o abandono foi uma decorrência natural do conhecimento de Einstein do modelo de Friedmann (1922), sem o qual não faria sentido eliminar Λ. Einstein escreveu: ”Se não existe um mundo quase estático, então mandemos embora o termo cosmológico” [57[57] A. Pais, in: Sútil é o Senhor - Vida e Pensamento de Albert Einstein, op. cit. [24], p. 354.].
  • 33
    Friedmann faleceu em 1925 na cidade de Kiev, vítima de um surto de febre tifo que grassou na Rússia pós-revolucionária. Provavelmente, foi esse trágico acontecimento que lhe impediu de obter a solução mais simples (k=0), derivada por Einstein e de Sitter 7 anos depois.
  • 34
    As galáxias efetivamente não aumentam de tamanho, pois são inomogeneidades locais de matéria cuja densidade é várias ordens de grandeza maior do que a densidade média do Universo.
  • 35
    Como a gravidade é atrativa, a crença de que a expansão seria desacelerada era tão forte que os astrônomos introduziram o sinal negativo na definição do parâmetro de desaceleração, de forma que a¨<0 implicaria q>0.
  • 36
    “…It may be emphasized that the linear relation found in the present discussion is a first approximation representing a restricted range in distance” [6[6] E. Hubble, Proceedings of the National Academy of Sciences 15, 168 (1929).].
  • 37
    “The outstanding feature, however, is the possibility that the velocity-distance relation may represent the de Sitter effect, and hence that numerical data may be introduced into discussions of the general curvature of space”.
  • 38
    No entanto, diferente do resultado de Hubble, o seu valor foi obtido como uma distância média estimada das nebulosas para exibir o valor de H0.
  • 39
    Este fato foi recentemente esclarecido pelo astrônomo Mario Lívio [65[65] M. Livio, ߢNature 479, 173 (2011).], ao consultar os arquivos da MNRAS.
  • 40
    Como veremos na Parte II, o modelo de Einstein-de Sitter (k=0) foi aos poucos se estabelecendo como modelo cosmológico padrão desacelerado para as idades média e moderna da cosmologia relativística (ver Figura 1)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2018

Histórico

  • Recebido
    17 Jun 2017
  • Revisado
    20 Jul 2017
  • Aceito
    20 Jul 2017
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