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Teoria Quântica de Átomos em Moléculas

Quantum Theory of Atoms in Molecules

Resumo

A proposição de uma dimensionalidade atômica moderna consagra cientificamente o físico-matemático Richard Bader como um verdadeiro pioneiro. Considerando a variável mecânico quântica densidade eletrônica, Bader formulou um protocolo matemático para modelar os fluxos de densidade de carga nas superfícies moleculares. Para este fim, ele assumiu o ambiente atômico como sendo um espaço aberto e adequado para a troca de carga e momentum entre os átomos vizinhos. A integração da superfície molecular é governada pelo teorema virial mediante as contribuições das densidades de energia cinética e potencial, em que, ambos são representados pelo campo Laplaciano da densidade eletrônica.

Palavras-chave:
Bader; mecânica quântica; densidade eletrônica

Abstract

The proposition of a modern atomic dimensionality should be laureate to the pioneering spirit of the theoretician in physics and chemistry, Richard Bader. By taking into account the electronic-density as a pure and physical variable, Bader has formulated a mathematical protocol for modeling the charge density fluxes on the molecular surfaces. To this end, he also assumed the atomic environment as being an open space suitable for exchange charge and momentum with the neighbors around it. The integration of the molecular surface is ruled by the virial theorem embodied by the contributions of the kinetic and potential energy densities, wherein, both of them are represented by the Laplacian field of the electronic density.

Keywords:
Bader; quantum mechanics; electronic density

1. Introdução

Ao longo de anos, décadas, e até séculos, a fenomenologia concernente a interação e reação em ambiente molecular,1[1] V.L. Schramm, ACS Chemical Biology 8, 71 (2013).[2] K.S. Peters, S. Gasparrini e L.R. Heeb, Journal of the American Chemical Society 127, 13039 (2005).3[3] M. Kazemi e J. Åqvist, Nature Communications 6, 7293 (2015). especificamente na identificação de estruturas eletrônicas intermediárias e espécies radicalares,4[4] S.B. Nimse e D. Palb, RSC Advances 5, 27986 (2015).5[5] X. Qi, L. Zhu, R. Bai e Y. Lan, Scientific Reports 7, 43579 (2017). mas também, ainda mais intrinsecamente, também no dimensionamento da estrutura básica da matéria, o átomo,6[6] V. Uskokovíc, Foundations of Science 15, 303 (2010).[7] P.J. Ramberg e M.J. Nye, Annals of Science 72, 149 (2015).8[8] C.D. Hubbard, P. Illner e R. van Eldik, Chemical Society Reviews 40, 272 (2011). se mantiveram como entraves colossais que aplacavam o desenvolvimento da Física e da Química moderna.9[9] H. Nitsche, Chemical Reviews 113, 855 (2013). Notadamente, o pioneirismo de Dalton em suas experiências com absorção de gases em solução aquosa o levou a idealizar o átomo como uma entidade encorpada e rija, mas, acima de tudo, eletricamente neutra.10[10] M.I. Grossman, Notes & Records 68, 339 (2014). Em doravante, a luz das teorias propostas por Thomson,11[11] J.L. Heilbron, Physics Today 30, 23 (1977). Rutherford12[12] V. Pleitz, Revista Brasileira de Ensino de Fisica 25, 250 (2003). e Bohr,13[13] J.D. Herron, Journal of Chemical Eduaction 54, 499 (1977). a contemporaneidade da energia e dualidade onda-partícula governaram os direcionamentos dos seus modelos, deixando indefinido, a dimensionalidade do átomo. Embora as ideias outrora conhecidas sobre superfícies, como a Lei de Gauss14[14] L.N. Trefethen, SIAM Review 50, 67 (2008). e/ou a conjectura de Poincaré hajam sido amplamente difundidas,15[15] H.D. Cao e X.P. Zhu, Asian Journal of Mathematics 10, 165 (2006). a relação destes formalismos com o ambiente atômico ainda era inatingível e inconcebível. Em termos de mecânica quântica, é importante enfatizar que os postulados e os operadores já eram difundidos, seja por Schrödinger,16[16] E. Schrödinger, Nature 169, 538 (1952). Dirac,17[17] J. Mawhin e A. Ronveaux, Archive for the History of Exact Sciences 64, 429 (2010). ou anteriormente por Euler,18[18] V. RastogiI, A. Mukherjee e A. Dasgupta, Journal of the Brazilian Society of Mechanical Sciences and Engineering 33, 1 (2011). embora a maior probabilidade de ocupação orbitalar tenha sido parametrizada em termos da função de onda de Born.19[19] M. Born, Z Physiks 27, 863 (1926).

Resoluta desde o século XIX, o desenrolar da teoria de Dalton para o modelo atômico ainda inspirava muitos cientistas, tanto que, no início da década de 50, um químico canadense chamado Richard William Frederick Bader20[20] C.F. Matta, L. Massa e T.A. Keith, Journal of Physical Chemistry A 115, 12427 (2011). se graduava ao nível de treinamento de doutorado no Massachusetts Institute of Thecnology (MIT) com uma pesquisa experimental centrada na cinética química, tendo, como seu orientador, o Professor Charles Swain.21[21] R.F.W. Bader, Journal of Physical Chemistry A 115, 12432 (2011). Neste período, ao participar de um curso de mecânica quântica ministrado pelo Professor John Clarke Slater, cujo conteúdo programático versava sobre teorias para a ligação química, em particular,21[21] R.F.W. Bader, Journal of Physical Chemistry A 115, 12432 (2011). Bader ficou inclinado intensamente vislumbrado pela química e física teórica.22[22] R.F.W. Bader, Journal of Physical Chemistry A 115, 12667 (2011). Após a conclusão dos seus estudos com obtenção do Ph.D em físico-química experimental pelo MIT, Bader migrou para a Inglaterra, especificamente para a Universidade de Cambridge, e lá sob a supervisão do Professor Hugh Longuet-Higgins, conseguiu albergar suficiente conhecimento em física teórica e estrutura eletrônica que pudessem servir de arcabouço para elaborar a sua própria concepção da matéria.23[23] C.F. Matta, Foundations of Chemistry 15, 245 (2013).

2. Concepção mecânico-quântica

Em seus estudos iniciais, Bader deliberadamente resgatou a supracitada ideologia do modelo de Dalton,24[24] R.F.W. Bader e T.T. Nguyen-Dang, Advanced in Quantum Chemistry 14, 63 (1981). em que, a uniformidade atômica seria repaginada no ensejo de um conglomerado molecular, ou seja, descrever como as unidades atômicas poderiam formar as estruturas moleculares de uma forma cooperativa em uma entidade única. É, de fato, a descrição do comportamento dos átomos nas moléculas,25[25] R.F.W. Bader, Atoms in Molecules: A Quantum Theory (Oxford University Press, Oxford, 1990). que de certa forma, era uma ideia bem concebida, embora restasse arquitetar um formalismo matemático que a validasse. Pelo experimentalismo e observação física, Bader utilizou da concepção do espaço de Hilbert para diagramatizar ângulos e distâncias do sistema quântico que o interessava em termos vetoriais, ou seja, o átomo e o ambiente que o continha, o qual também deveria ser representado.26[26] L. Martin, D. Mardani, H.E. Kondakci, W.D. Larson, S. Shabahang, A.K. Jahromi, T. Malhotra, A.N. Vamivakas, G.K. Atia e A.F. Abouraddya, Scientific Reports 7, 44995 (2017). Para isso, Bader formalizou suas definições matemáticas iniciais com base nas teorias de Dirac, Feynman e Schwinger para o princípio da ação mínima de uma partícula em movimento.27[27] R.F.W. Bader, Chemical Reviews 91, 893 (1991). Classicamente a ação mínima estabelece uma quantidade (w) de movimento derivada de uma função de onda minimizada no espaço e tempo (t1 e t2):

(1) W 12 ( Ψ ) = t 1 t 2 L ¯ [ Ψ , Ψ ˙ , t ] d t

onde L¯ representa o operador diferencial proposto por Lagrange, o Lagrangiano, que é definido pelas contribuições das energias cinéticas (K) e potencial (V):28[28] R.F.W. Bader, Monatshefte für Chemie 136, 819 (2005).

(2) L = K V

Através da equação (1) e do espaço de Hilbert, Bader tratou de estabelecer condições matemáticas de contorno, ou seja, delimitar uma superfície com campos vetoriais que pudesse definir o átomo no espaço. Então, Bader apresentou os seguintes postulados e condições simplificadas:25[25] R.F.W. Bader, Atoms in Molecules: A Quantum Theory (Oxford University Press, Oxford, 1990).

i) O tempo de variação no ponto final de trajetória é zero;

ii) A superfície é zero quando funções são solucionadas no extremo do seu domínio.

À época,29[29] T.E. Phipps Jr., Physical Review 118, 1653 (1960). esses argumentos foram suficientes para dar o suporte necessário para à interpretação de Bader sobre a estrutura eletrônica, validando,30[30] J.J.C. Teixeira-Dias, Journal of Chemical Education 60, 963 (1983). acima de tudo, de qual forma e maneira os átomos podem formar moléculas. Ao integrar à equação (1), obtém-se a minimização da ação em uma dada superfície:

(3) δ W 12 ( Ψ ) = t 1 t 2 ( L Ψ d d t L Ψ ˙ ) δ Ψ d t = 0

Em outras palavras, o termo δW12 desaparece conforme a equação de Euler e Lagrange,31[31] M.I. Miller, A. Trouvé e L. Younes, Annual Review Biomedical Engineering 4, 375 (2002). e a equação de Schrödinger para uma função de onda normalizada poderia ser determinada.

(4) H ^ ψ E ψ =
(5) H ^ ψ E ψ = 0

Em seu artigo publicado em 1926,32[32] E. Schrödinger, Annalen der Physik 384, 361 (1926). Schrödinger concluiu que a função de estado ψ e o operador Hamiltoniano H^ para o átomo de hidrogênio podem ser representados por:33[33] A.J. Thakkar, The Hydrogen Atom, Quantum Mechanics - A Concise Introduction for Students of Physics, Chemistry, Biochemistry and Materials Science (Morgan & Claypool Publishers, Williston, 2014).

(6) H ^ = ( 2 2 m ) Ψ Ψ + V ^ Ψ Ψ

onde, para o operador Hamiltoniano tem-se:

(7) H ^ = ( 2 2 m ) 2 + V ^

Existem duas formas de expressar a energia cinética, seja K ou G, as quais conjuntamente compõem, conforme estabelecido por Laplace,34[34] D.S. Grebenkov e B.T. Nguyen, SIAM Reiew 55, 601 (2013). o Laplaciano para um elétron conforme a equação (8):

(8) ( 2 2 m ) Ψ 2 Ψ ( 2 2 m ) Ψ Ψ = ( 2 4 m ) ρ 2

Novamente, ao integrar a equação (8), obtem-se uma expressão para uma região espacial SΩ:

(9) K G = ( 2 4 m ) Ω ρ 2 d τ = ( 2 4 m ) d S Ω ρ . n ( r )

em que, K e G representam as energias cinéticas de densidade equivalentes ao Laplaciano da densidade eletrônica, (2ρ). Uma vez que o fluxo de elétrons seja zero em qualquer ponto da superfície SΩ normalizada por um vetor ortogonal n(r) conforme ilustrado pela Figura 1,35[35] P. Nasertayoob e S. Shahbazian, Journal of Molecular Structure (THEOCHEM) 869, 53 (2008). há um equivalência entre as energias cinéticas K = G, e desta forma, tem-se o primeiro, e singular critério para a superfície atômico-molecular:

(10) ρ . n ( r ) = 0 ( r ) S ( Ω , r )
Figura 1
Superfície de fluxo zero.

A equação (10) define a superfície pela qua o átomo é delimitado como sendo a densidade de carga de fluxo zero. Para sistemas ordinários e pelo formalismo mecânico-quântico, Bader entendeu ser necessário impor que as funções de onda ψ e ψ* também deveriam desaparecer nas regições extremistas de contorno.25[25] R.F.W. Bader, Atoms in Molecules: A Quantum Theory (Oxford University Press, Oxford, 1990). Entrementes, os postulados de Born para a função de onda trata o produto ψ ψ*dτ como uma distribuição probabilística (equação 11),36[36] B. Falkenburg e P. Mittelstaedt, em: Probabilistic Interpretation of Quantum Mechanics, Compendium of Quantum Physics, editado por D. Greenberger, K. Hentschel e F. Weinert, (Springer, Berlin, 2009), p. 485. em que, na superfície (equação 10), também deva ser zero:37[37] B. Dikshit, Journal for Foundations and Applications of Physics 4, 24 (2017).

(11) ρ = ψ ψ d τ

Naturalmente a equação (11) pode ser aplicada, em suas condições básicas, na equação de Euler-Lagrange (equações 4) e no teorema do valor médio, mas a relação entre superfície molecular e densidade eletrônica é dada pelo teorema virial:38[38] F. Cortés-Gucmán e R.F.W. Bader, Chemial Physics Letters 379, 183 (2003).

(12) 2 G + V = ( 2 4 m ) ρ 2

Nesta equação, as contribuições das energias cinéticas e potenciais estão em consonância com a descrição das regiões moleculares com aumento e diminuição de densidade eletrônica quando os valores do Laplaciano apresentam resultados positivos (energia de densidade cinética G é sempre positivo) e negativos (energia potencial V é sempre negativa),39[39] R.F.W. Bader, Chemical Europena Journal 12, 7769 (2006). conforme apresentado pelas equações (13) e (14):

(13) V = ( 2 4 m ) ρ 2 2 G
(14) 2 G = ( 2 4 m ) ρ 2 V

3. Interpretação matemática e caminho do fluxo eletrônico

Matematicamente, o Laplaciano, em termos de concentração de carga ou simplesmente densidade eletrônica, trata-se da relação das médias dos resultados (ρi+1,j; ρi1,j; ρi,j+1 e ρi,j1) próximos a um ponto (ρi,j):39[39] R.F.W. Bader, Chemical Europena Journal 12, 7769 (2006).

(15) 1 4 ρ 2 = ρ i + 1 , j + ρ i 1 , j + ρ i , j + 1 + ρ i , j 1 4 ρ i , j

Como resultado, valores negativos do Laplaciano (2ρ) indicam que o campo neste ponto é maior do que o resultado médio entre ρi+1,j; ρi1,j; ρi,j+1 e ρi,j1, indicando que, na vizinhança, há uma redução na densidade eletrônica. Ao revés, o Laplaciano positivo (2ρ) representa redução de densidade eletrônica. A Figura 2 apresenta uam diagramatização do comportamento de 0 < 2ρ < 0:40[40] M. Kwaśnicki, Fractional Calculus and Applied Analysis 20, 7 (2017).

(16) ρ 2 ( r , x ) = j = 1 , 3 2 ρ ( r , x ) x j 2
Figura 2
Perfil do Laplaciano

Assim, a quantificação do Laplaciano como um descriptor topológico é, além de caracterizar depleções e ápices de concentração de carga, sua própria definição revela aspectos cruciais da modelagem molecular eletrônica em termos, radiais, e tridimensionais:41[41] P. Shyam, V. Kumar, V. Raghavendra e V. Subramanian, Journal of Chemical Science 128, 1527 (2016).

(17) ρ 2 ( r , x , y , z ) = 2 ρ ( r , x ) x 2 + 2 ρ ( r , y ) y 2 + 2 ρ ( r , z ) z 2

Pela equação (17), os autovalores λ1, λ2 e λ3 ilustrados pela Figura 3a representam a matriz Hessiana (H) para o Laplaciano da densidade eletrônica:42[42] F. Weinhold, Journal of Computational Chemistry 33, 2440 (2012).

(18) H = [ ρ 2 x 2 ρ 2 x y ρ 2 x z ρ 2 y x ρ 2 y 2 ρ 2 y z ρ 2 z x ρ 2 z y ρ 2 z 2 ] [ λ 1 0 0 0 λ 2 0 0 0 λ 3 ]

A contribuição destes autovalores indicam os perfis de concentração de carga na estrutura eletrônica, mesmo porque, a geração de pontos críticos configuram os extremos da função em uma dada superfície: 0 > λ1 > λ2 > λ3 são representados por (3, −3) e indicam um máximo de densidade eletrônica, em outras palavras, o núcleo atômico denominado de atrator.43[43] F. Cortés-Gucmán e R.F.W. Bader, Coordination Chemistry Reviews 249, 633 (2005).

Figura 3
BCP internuclear e os autovalores da matriz Hessiana λ1, λ2 e λ3.

No compartilhamento de densidade eletrônica, todavia, o ponto extremo da função a ser determinado é aquele com (3, −1), ou seja, ponto de sela com duas curvaturas negativas (λ1 e λ2) em um plano formado por dois eixos seguido por uma curvatura positiva (λ3) em um eixo perpendicular ao plano já formado. A convergência das contribuições dos autovalores λ1, λ2 e λ3 localizam um parâmetro topológico denominado de Ponto Crítico de Ligação ou BCP (do inglês, Bond Critical Point),27[27] R.F.W. Bader, Chemical Reviews 91, 893 (1991). descrito na Figura 3b, cuja localização e pela aplicação do teorema virial formalizado na equação (12), a densidade eletrônica e correspondentes parâmetros topológicos podem ser calculados.25[25] R.F.W. Bader, Atoms in Molecules: A Quantum Theory (Oxford University Press, Oxford, 1990). Esta é a trajetória de contato interatômico entre A e B, por exemplo, onde há compartilhamento de carga e momentum. Nunca restrito, há dinamismo nas contribuições dos autovalores hessianicos, gerando, inclusive (3,+1) e (3,+3) denominados de Ponto Críticos de Anel ou RCP (do inglês, Ring Critical Point) e Ponto Crítico de Gaiola ou CCP (do inglês, Cage Critical Point) [27][27] R.F.W. Bader, Chemical Reviews 91, 893 (1991).[28][28] R.F.W. Bader, Monatshefte für Chemie 136, 819 (2005).. Dentre BCPs, RCPs e CCPs, ao utilizer a relação de Poincaré e Hopf:44[44] S. Jenkins, Z. Liu e S.R. Kirk, Molecular Physics 111, 3104 (2013).

(19) n ( N ) n ( B C P ) + n ( R C P ) n ( C C P ) = 1

onde n(N) representa o número de núcleos da estrutura, e exemplificando, no caso do benzeno (C6H6), temos: 12 (carbonos e hidrogênios) −12 (BCPs entre as ligações carbono-carbono e carbono-hidrogênio) + 1 (no centro da estrutura) −0 (estrutura planar) = 1. Este formalismo, uma vez estendido a toda superfície molecular, sempre governado pelas equações (9) e (10), em que se trata e modela a superfície SΩ cíclica com fluxos de densidade eletrônica para sistemas de camada aberta,45[45] P. Salvador e E. Ramos-Cordoba, Journal of Chemical Physics 139, 071103 (2013). a distribuição gaussiana dimensiona todas as linhas de contornos e seus respectivos pontos de sela, conforme ilustrado na Figura 4. Correlacionar este portfólio com a estrutura molecular foi a grande contribuição teórica de Bader para o campo da física e química em termos da estrutura eletrônica da matéria.46[46] R.F.W. Bader, Foundations of Chemistry 13, 11 (2011).

Figura 4
Linhas de contorno da densidade eletrônica.

4. Átomos em moléculas

Historicamente, uma questão insolúvel que ainda se arrasta na completa caracterização de mecanismos de reação concerne nas possíveis estruturas prévias que geram os estados de transição, e por fim, aquelas que formam os produtos finais desejados.47[47] B. Gerratana, G.A. Sowa e W.W. Cleland, Journal of the American Chemical Society 122, 12615 (2000).48[48] T.L. Amyes e J.P. Richard, Biochemistry 52 2021 (2013). Tradicionalmente, este não é um entrave isolado, visto que, desde os experimentos de Dalton até a derrocada da mecânica clássica e o advento da mecânica quântica,49[49] M.C.M. Oki, Quimica Nova 32, 1072 (2009). não se conhecera o limite do átomo, ou a fronteira atômica. Considerando o princípio da incerteza de Heisenberg,50[50] H. Lustig, Physics in Perspective 12, 470 (2010). e mesmo pela concepção probabilística do quadrado orbitalar, não se conhecera o interstício entre dois átomos eletronegativamente distintos que ao se ligarem formam uma ligação química. Entretanto, pela equação (10), a normalização da superfície Ω pelo vetor ortogonal n a configure como uma bacia de densidade de carga,51[51] I.V. Ananyev, V.A. Karnoukhova, A.O. Dmitrienko e K.A. Lyssenko, Journal of Physical Chemistry A 121, 4517 (2017). côncava ou convexa, em que a população eletrônica (N), entre os átomos A e B (NAB), Figura 5, pode ser estabelecida conforme as equações (20) e (21)53[53] D. Ferro-Costas, I. Pérez-Juste e R.A. Mosquera, Journal of Computational Chemistry 35, 978 (2014).

(20) N A B = N [ V A B ( Ω 1 Ω k Ω m ) ]
(21) N A B = k = 1 m N A B k
Figura 5
Bacias moleculares e as populações eletrônicas entre dois átomos com a fronteira que os delimita.

É pela interseção entre todas as bacias moleculares de densidade de carga que se estima a população eletrônica ligante. Para os orbitais ocupados, ou Orbitais Moleculares de Mais Alta Energia ou HOMO (do inglês, Highest-Occupied Molecular Orbital), a densidade eletrônica atribuída é definida por:43[43] F. Cortés-Gucmán e R.F.W. Bader, Coordination Chemistry Reviews 249, 633 (2005).

(22) ρ ( r ) = i o c u p a d o N i | φ i l o c a l ( r ) | 2 = i o c u p a d o ρ ( r )

Embora não observável, a carga atômica (qi) pode ser estimada através da localização do BCP em função do número atômico, ou a própria carga atômica, e a superfície Ω circundante ao atrator:

(23) q i = Z i Ω i ρ ( r )

5. Estrutura eletrônica e molecular

Diante de todo o escopo mecânico-quântico apresentado, Bader consolidou sua proposta para a descrição da contribuição atômica em ambiente molecular como Teoria Quântica de Átomos em Moléculas ou QTAIM (do inglês, Quantum Theory of Atoms in Molecules).25[25] R.F.W. Bader, Atoms in Molecules: A Quantum Theory (Oxford University Press, Oxford, 1990)., 27[27] R.F.W. Bader, Chemical Reviews 91, 893 (1991).28[28] R.F.W. Bader, Monatshefte für Chemie 136, 819 (2005). Desde a época de Lewis e a sua teoria dos pares de elétrons da camada de valência consolidada nos estudos de equilíbrio envolvendo ácido/base, a evolução do tratamento da concentração de carga em envolto aos pares de elétrons foi governado pela imposição da equação (10), mas sendo chamada de Concentração de Carga na Camada de Valência ou VSCC (do inglês, Valence-Shell Charge Concentration).54[54] N.O.J. Malcolm e P.L.A. Popelier, Journal of Physical Chemistry A 105, 7638 (2001). Um dos maiores expoentes nesta linha de pesquisa foi o químico britânico Ronald Gillespie,55[55] R.F.W. Bader, Coordination Chemistry Reviews 197, 71 (2000). que, tornou-se referência ao difundir os estudos da geometria molecular também com identificação de concentração de carga em sítios moleculares específicos de interação. Eis que convergem dois argumentos, historicamente destoantes, concernentes à estrutura molecular e estrutura química.56[56] M.A.C. Nascimento, Journal of the Brazilian Chemical Society 19, 245 (2008). Resumidamente, estrutura molecular pode ser utilizada quando o foco é a localização/posição dos átomos, ao passo que, estrutura química trata da maneira pela qual os átomos se conectam/interagem, e é exatamente neste contexto, de forças atuantes no equilíbrio eletrônico entre os átomos que a QTAIM foi desenvolvida.57[57] R.F.W. Bader e C.F. Matta, Organometallics 23, 6253 (2004).58[58] R.F.W. Bader, Journal of Physical Chemistry A 114, 7431 (2010). A ideia foi atribuir à superfície ligante, para cada átomo (Ω) e seus vizinhos (Ω'), a força de densidade, F(Ω), estabelecida por Ehrenfest:59[59] R.F.W. Bader e D.C. Fang, Journal of Chemical Theory and Computation 1, 403 (2005).60[60] A.M. Pendás e J. Hernández-Trujillo, Journal of Chemical Physics 137, 134101 (2012).

(24) F ( Ω ) = d S ( Ω | Ω , r ) σ ( r ) . n ( r )

Semelhante à equação (9), a definição de força não utiliza o campo Laplaciano, mas a matriz de densidade de um elétron, σ(r):27[27] R.F.W. Bader, Chemical Reviews 91, 893 (1991).

(25) σ ( r ) = ( 2 4 m ) { ( + ) ( + ) } Γ ( 1 ) ( r , r ) r = r

A ação das forças de Ehrenfest para uma partícula submetida a um momentum (p^) é dada por:

(26) p ^ = i

Embora, no caso de um elétron, equação (24), as forças agindo para um sistema de camada aberta A é dada por:

(27) m A d r ( J t ) = A d r d τ Ψ ( r ^ ) Ψ + d S ( A , r s ) σ ( r ) . n ( r )

em que, J é o vetor de densidade, m a massa eletrônica, e por conseguinte, a derivada em função do tempo quando multiplicada pela massa que fornece a força, neste caso, a força agindo em uma partícula de camada aberta determinada pelo termo r^ para todos os elétrons remanescentes com os núcleos devidamente fixados em suas coordenadas. Ao executar a integração, este termo gradiente considera todas as configurações de spin em r permitindo obter outra expressão para a força:61[61] J.R. Maza, S. Jenkins, S.R. Kirk, J.S. Anderson e P.W. Ayers, Physical Chemistry Chemical Physics 15, 17823 (2013).

(28) F ( r ) = N d τ Ψ ( r ^ ) Ψ

que é a mesma condição de integração para o orbital probabilístico (equação 11). A similaridade entre o segundo termo da equação (26) está no reconhecimento do Lagrangiano, em que, se tem, para um estado estacionário, uma equivalência de forças e a aplicação do teorema virial representada na equação (12).

Estrutura molecular ou química, mas, para a geometria molecular, o formalismo QTAIM estabeleceu a condição de Função de Localização Eletrônica ou ELF (do inglês, Electronic Localization Function)62[62] P.L.A. Popelier, Coordination Chemistry Reviews 197, 169 (2000). construído a partir das contribuições das energias cinéticas K e G. Pela concentração eletrônica ser identificada pelo Laplaciano, 2ρ, atribui-se o termo L(r) =2ρ. Desde a Repulsão dos Pares de Elétrons da Camada de Valência ou VSEPR (do inglês, Valence Shell Electron Pair Repulsion)63[63] R. Hilal, S.G. Aziz, A.O. Alyoubi e S. Elroby, Procedia Computer Science 51, 1872 (2015). divulgada por Sidgwick e Powell, servindo, principalmente aos estudos de proposição de geometrias moleculares, e mais recentemente atribuindo a VSCC de Gillespie64[64] R.J. Gillespie, Coordination Chemistry Reviews 252, 1315 (2008). a principal referência na área, valores elevados de L(r) apontam altas concentrações de carga devido ao resultado negativo de 2ρ para superfície esféricas e maximamente concentradas de elétrons.

6. QTAIM para ciência básica

A modelagem da estrutura eletrônica, e também molecular, mediante a topologia, descritores, argumentos e parâmetros da QTAIM tem sido vastamente difundida entre os químicos e físicos.65[65] I.S. Bushmarinov, K.A. Lyssenko e M.Y. Antipi, Russian Chemical Reviews 78, 283 (2009). Pela teoria ácido/base para o estudo de caso, consideremos a formação do íon hidrônio e da base conjugada mediante dissociação ácida:

(29) H A + H 2 O H 3 O + + A

no equilíbrio, a força deste ácido é descrito pelas equações (28) e (29):

(30) p K a = Δ G o 2 , 303 R T
(31) l n K a = Δ G o R T

A relação entre a força de dissociação de ácido e a energia atômica QTAIM foi parametrizada por Adam66[66] K.R. Adam, Journal of Physical Chemistry A 106, 11963 (2002). através da energia de dissociação molar (Ujo), que é sempre representada pela diferença entre a energia vibracional mais baixa de uma molécula A e a soma das energias do estado fundamental, que somadas as funções de partição molares (q), resulta na seguinte expressão:

(32) l n K a = [ ( U H A o ) + ( U H 2 O o ) ( U A o ) ( U H 3 O + o ) ] R T + l n ( q H 3 O + . o q A o q H A o . q H 2 O o )

cujo valor do pKa é dado por:

(33) p K a = [ ( U A o ) ( U H A o ) ] 2 , 303 R T l o g ( q A o q H A o ) + ( U H 3 O + o U H 2 O o ) 2 , 303 R T l o g ( q H 3 O + o q H 2 O o )

O termo logaritmo para o equilíbrio ácido/base-conjugada é zero devido ao equilíbrio químico, e seguido pela constância (C) dos termos de dissociação molar e logarítmico entre à água e o íon hidrônio, obtém-se:

(34) p K a = [ ( U A o ) ( U H A o ) ] 2 , 303 R T + C

Para demonstrar que Ujo é a energia de dissociação na forma de Ej, consideremos as contribuições da energia eletrônica bem como da Energia vibracional no Ponto Zero ou ZPE (do inglês, Zero-Point Energy):67[67] S.A. Rivera, D.G. Allis e B.S. Hudson, Crystal Growth & Design 8, 3905 (2008).

(35) E J = U j o E j Z P E + i = 1 n j E i

Assim, temos que, os temos ZPE e eletrônicos associados fornecem a equação (34):

(36) U A o U H A o = E A E H A + E H + E A Z P E E H A Z P E

Tem-se que, as contribuições das variações nas energias do ponto zero são ínfimas e invariantes, assim com a energia do átomo de hidrogênio para o estado fundamental. Desta forma, a equação (34) se reduz à:

(37) U A o U H A o = E A E H A

e, consequentemente, o pKa apresentado pela equação (32) pode ser determinado pela equação (36):

(38) p K a = [ E A E H A ] 2 , 303 R T + C

A constante C, de fato, atribui-se o valor de 150,486. É neste contexto que a contribuição QTAIM para a energia de dissociação de um ácido na forma do mecanismo descrito na equação (35) se sedimenta, e a diferença entre EA e EHA é exatamente a energia do hidrogênio dissociado, EH. Para ácidos com estruturas de grande porte, esta aproximação é válida, resultando, ao final, em uma expressão que permite utilizar a energia atômica QTAIM para predição de acidez:

(39) p K a = [ E ( H ) ] 2 , 303 R T + 150 , 486

Com relação à energia do átomo, neste caso do hidrogênio, a equação de Schrödinger relativística pode ser descrita por:68[68] R.R. Parwani, Brazilian Journal of Physics 35, 494 (2005).

(40) d ρ P ( r ) d t = ( i ) ψ [ H ^ , p ^ ] ψ j P ( r )

onde jP(r) representa uma quantidade que descreve o fluxo de densidade de P em um ponto r, em que, P é uma propriedade resultante do fluxo de massa e momentum através da superfície de um átomo. Pela força eletrônica exercida, equação (24), e utilizando da equação de Schrödinger para um número N de elétrons, tem-se:69[69] R.F.W. Bader e T.T. Nguyen-Dang, Advanced in Quantum Chemistry 14, 63 (1981).

(41) ( N 2 ) { ( i ) < ψ [ H ^ , r ^ , p ^ ] ψ > Ω + c c } = 2 N Ω d r d r ( 2 4 m ) { ψ 2 ψ + ( 2 ψ ) ψ } + N Ω d r d r ψ ( V ^ ) ψ

No primeiro termo dentre chaves, ψ2ψ representa a energia cinética dos elétrons (G) obtida pelo formalismo da equação secular, enquanto que, (2ψ)ψ considera a contribuição do movimento Lagrangiano (Lo) [27][27] R.F.W. Bader, Chemical Reviews 91, 893 (1991).:

(42) L o = ( 2 4 m ) i i 2 ( ψ ψ )

Em uma superfície delimitada pelo fluxo zero, a contribuição da energia cinética de Lagrange L desaparece (equação 43), a qual é similar as forças de Ehrenfest (equação 24).28[28] R.F.W. Bader, Monatshefte für Chemie 136, 819 (2005).

(43) L o = ( 2 4 m ) d S ( r , t ) ρ ( r , t ) . n ( r , t )

Temos, portanto, duas contribuições de energia cinética, G e L, resumida em K(r) = G(r) + L(r), para a energia cinética total T(Ω), a qual, na superfície de fluxo zero onde a equação (41) é zero, a energia cinética total não é pontualmente em r, mas para todo o espaço Ω:28[28] R.F.W. Bader, Monatshefte für Chemie 136, 819 (2005).

(44) K ( Ω ) = G ( Ω ) = T ( Ω )

Por fim, a equação (39) ainda apresenta um termo potencial em gradiente (V^), cuja incumbência é determinar a média das forças de Ehrenfest que agem em um elétron (νb(Ω)):

(45) 2 T ( Ω ) = V ( Ω )

e, finalmente, a energia do átomo (Ec) a ser utilizada na equação (37) é obtida como segue:70[70] R.F.W. Bader, Atoms in Molecules, Encyclopedia of Computational Chemistry (Wiley Online Library, New Jersey, 2002).

(46) E C = T ( Ω ) + V ( Ω )
(47) E c = Ω n j E c ( Ω )

Estes argumentos têm sido utilizados por Matta e Arabi71[71] C.F. Matta e A.A. Arabi, Future Medicinal Chemistry 3, 969 (2011). na forma de uma perspectiva futurística para predição de novas entidades químicas com atividade biológica, sendo, especificamente, aprimorando modelos de Relação entre Estrutura e Atividade Biológica ou QSAR (do inglês, Quantitative Structure-Activity Relationship) decorrente do pioneirismo de Hansch na análise das contribuições orto, meta e para na dissociação do ácido benzoico.72[72] L.C. Tavares, Quimica Nova 27, 631 (2004). Na dissociação do ácido acético com formação da base conjugada acetato apresentada na Figura 6, por exemplo, o valor experimental da potência de acidez é pKaexp=4,757. Pelos cálculos QTAIM, o valor para E(H) de −902,94 KJ.mol−1, e mediante uso da equação (37), pôde ser obtido o resultado teórico de acidez pKateor igual à 4,747.

Figura 6
Equilíbrio da dissociação do ácido acético com sua base conjugada, o íon acetato.

Na química básica e fundamental, uma das maiores e mais difundidas aplicações da QTAIM de Bader está na caracterização das interações intramoleculares e intermoleculares, sempre, em geral, ao desconsiderar o caráter eletronegativo das espécies envolvidas.73[73] B.G. Oliveira, R.C.M.U. Araújo e M.N. Ramos, Quimica Nova 33, 1155 (2010). Conforme disponibilizado pela literatura especializada,74[74] B.G. Oliveira, Computational and Theoretical Chemistry 998, 173 (2012). das interações químicas conhecidas, as ligações de hidrogênio e ligações de di-hidrogênio foram revisitadas.75[75] B.G. Oliveira, Physical Chemistry Chemical Physics 15, 37 (2013). O grande entrave e desafio não apenas para os métodos de estrutura eletrônica, mas também para as técnicas experimentais, está na caracterização de complexos intermoleculares fracamente ligados, sendo, em geral, formados por moléculas apolares.76[76] S.J. Grabowski. Chemical Reviews 111, 2597 (2011).

É digno de nota destacar que tais supermoléculas possuem uma característica latente das forças de dispersão de London, tendo contribuições elevadas de forças de repulsão,77[77] B.G. Oliveira, Quimica Nova 38, 1313 (2015). mas principalmente, por não terem um centro de alta densidade eletrônica apto a interagir com ácidos de Lewis e/ou Brønsted.78[78] R.F.W. Bader, J. Hernández-Trujillo e F. Cortés-Guzmán, Journal of Computational Chemistry 28, 4 (2007). Um caso clássico de molécula apolar de complexos fracamente ligados, é o benzeno, Figura 7b, e o correspondente dímero, Figura 7c. Considerado um hidrocarboneto aromático icônico, a estrutura eletrônica do benzeno é munida de efeitos de ressonância que intercalem as ligações entre os átomos de carbono nas formas σ ou π, conforme ilustra a Figura 7a, resultando em estruturas ressonantes degeneradas. Todavia, o mapeamento de toda a sua superfície de densidade eletrônica do benzeno é apresentado na Figura 8. Observamos os máximos de densidade eletrônica nos atratores, em que os autovalores das Hessianas são todos positivos com (3,-3). Nos pontos de sela, porém, há a localização (3,-1) onde são localizados os BCPs nas ligações C-H e também C-C/C=C. Pela QTAIM, a descrição do efeito de ressonância (C-C/C=C) pode ser realizada pelas densidades eletrônicas computadas nos BCPs (3,-1) das ligações carbono-carbono. Por exemplo, para etano (C2H6), eteno (C2H4), benzeno (C6H6) e acetileno (C2H2), os valores de ordem de ligação obtidos a partir das densidades eletrônicas para as ligações CC são 1,0; 1,6; 2,0 e 3,028[28] R.F.W. Bader, Monatshefte für Chemie 136, 819 (2005). respectivamente.

Figura 7
Ressonância do benzeno e o dímero C6H6⋅ ⋅ ⋅ C6H6.
Figura 8
Mapa de relevo da densidade eletrônica do benzeno.

Observa-se que, o valor de 1,6 para o benzeno é balizado pelos resultados de 1,0 e 2,0 para etano e eteno respectivamente, embora, a ressonância deva ser mais apropriadamente descrita em termos dos autovalores do Laplaciano (equação 17). Para o complexo C6H6⋅ ⋅ ⋅ C6H6 estudado à luz da Teoria do Funcional de Densidade DFT (do inglês, Density Functional Theory)79[79] N. Mardirossian e M. Head-Gordon, Molecular Physics 115, 2315 (2017). pelo uso do nível de estrutura eletrônica B3LYP/6-311++G(d,p), a geometria otimizada é apresentada na Figura 9d.

Figura 9
Estrutura otimizada (d) do dímero C6H6⋅ ⋅ ⋅ C6H6 e os BPs, BCPs e RCPs (e).

Desta geometria, cálculos single-points QTAIM são processados para a obtenção dos BPs, BCPs e RCPs, tal como ilustra a Figura 9e. Pode-se estabelecer como sendo doadores e receptores de carga as unidades equatorial e axial do benzeno. Estruturalmente, a ligação de hidrogênio C-H C6H6 ocorreria no centro do anel aromático equatorial, direcionada,80[80] R.A. DiStasio Jr., G. Helden, R.P. Steele e M. Head-Gordon, Chemical Physics Letters 437, 277 (2007). topologicamente, no RCP. Pela análise QTAIM, porém, a ligação de hidrogênio assume a forma de C-HC bifurcada aos atratores (3,-3). Em se tratando da ressonância, há uma leve alteração nas densidades eletrônicas das ligações carbono-carbono com ρCCequat=0,3083 e ρCCaxial=0,3084 e.ao3. Esta diferença tênue, sendo mais concentrada na unidade axial, se dá pelo fato desta receber quantidade de densidade eletrônica, reconhecida como transferência de carga, do benzeno equatorial. Pelos valores de λ1, λ2 e λ3 (equação 18), em termos vetoriais de campo e determinando valores para as curvaturas que remete a concentração de densidade eletrônica em um determinado plano, ou seja, a elipicidade (ε) direciona para o formato de um lóbulo de orbital p em uma ligação π conforme a equação (46):27[27] R.F.W. Bader, Chemical Reviews 91, 893 (1991).

(48) ε = λ 1 λ 2 1

Para a condição λ1=λ2, o caminho de ligação é cilindricamente simétrico, reconhecendo-o como pertencente à ligação σ carbono-carbono no etano. Para o conjunto de hidrocarbonetos C2H6, C6H6 e C2H4, os valores de ε para a ligação carbono-carbono são 0,0; 0,23; e 0,45.52[52] R.F.W. Bader, Encyclopedia of Computational Chemistry (Wiley, New Jersey, 2002) Pela geometria B3LYP/6-311++G(d,p) para o monômero C6H6, ε assume o valor de 0,198(5), embora, na formação do dímero, haja uma redução para 0,198(0) no receptor de próton equatorial seguindo por um aumento significativo para 0,199(9) no doador de próton axial. Desta forma, corroborando com o aumento de densidade eletrônica nas ligações carbono-carbono, se observa a caracterização de um sistema intermolecular fracamente ligado. Além destes valores corroborarem com os montantes de densidade eletrônica, há, categoricamente, o reconhecimento entre ligações simples e duplas no benzeno. Importante ressaltar que, esses valores indicam um escalar perpendicular ao fluxo de elétrons no BCP até um ponto externo a superfície molecular, ou de fluxo zero (equação 10). Pelo portfólio da ligação de hidrogênio, entretanto, a ressonância no benzeno, em particular as ligações duplas, poderia ser a fonte de elétrons apta a interagir com doadores de prótons, tal como, semelhante monômero, mas contrariamente a interação ocorre no centro da estrutura cíclica, em que, é localizado um RCP.

7. Conclusões

O físico-matemático e “verdadeiro pioneiro”20[20] C.F. Matta, L. Massa e T.A. Keith, Journal of Physical Chemistry A 115, 12427 (2011). Richard Bader construiu ao longo de mais de meio século uma biografia focada no desbravamento da estrutura eletrônica e no fenômeno de compartilhamento de densidade eletrônica.81[81] R.F.W. Bader, Journal of Physical Chemistry A 115, 12438 (2011). Partindo do empirismo de Dalton para o modelo atômico, e validando-o sob o aspecto mecânico quântico de Schrödinger, Dirac, Feyman, Slater, Schwinger, Hilbert, Ehrenfest, e tendo o aporte matemático de Euler, Laplace, Lagrange e Gauss, Bader conseguiu idealizar, introduzir, implementar e desenvolver a QTAIM em épocas contemporâneas aos métodos de estrutura eletrônica ab initio e dos funcionais híbridos de densidade,82[82] V. Tognetti e L. Joubert, Physical Chemistry Chemical Physics 16, 14539 (2014). mas, acima de tudo, proporcionando respostas outrora inexistentes à questões notórias da química, em particular, a determinação da energia atômica em sua fronteira e a localização do overlap. Não obstante, a QTAIM se consagrou com contribuições únicas no campo da geometria molecular, e demais aplicações em ciência básica, tal como a teoria ácido/base e interações intermoleculares, por exemplo.

Agradecimentos

FAPESB, CAPES e CNPq.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    19 Jun 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    20 Mar 2019
  • Aceito
    25 Mar 2020
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