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A equação de Tolman-Oppenheimer-Volkoff: dedução a partir dos trabalhos originais e a primeira determinação da massa máxima de estrelas de nêutrons

The Tolman-Oppenheimer-Volkoff equation: deduction from the original papers and the first estimate of the maximum mass of neutron stars

Resumos

A existência de estrelas de nêutrons foi conjecturada pouco tempo após a descoberta dessas partículas, e logo tornou-se claro que a física newtoniana era inadequada para se estudar tais estrelas. O problema foi inicialmente abordado por Richard C. Tolman, cujos resultados foram utilizados por J. Robert Oppenheimer e George M. Volkoff para a dedução do que se conhece como equação de Tolman-Oppenheimer-Volkoff (TOV). Esta representa o equilíbrio hidrostático de uma esfera de fluido perfeito no regime relativístico e, ao ser combinada a uma equação de estado apropriada, produz um modelo matemático para estrelas de nêutrons. Este artigo apresenta a dedução da equação TOV de forma detalhada e didática, desde a resolução das equações de Einstein da relatividade geral (RG) até a aplicação ao caso em que a estrela é composta por um gás de Fermi de nêutrons degenerados, deduzindo-se daí que há uma massa máxima possível para tais objetos. Embora atualmente se saiba que o modelo de gás de Fermi seja por si só inadequado nessa situação, a análise é interessante do ponto de vista histórico e didático, pois consiste em um exemplo relativamente simples de aplicação de uma equação de estado aos cálculos da estrutura de estrelas de nêutrons.

Palavras-chave
Relatividade Geral; Estrelas de Nêutrons; Equação TOV


The existence of neutron stars was suggested soon after the discovery of such particles, and it soon became clear that Newtonian physics was innapropriate to study such stars. The problem was initially addressed by Richard C. Tolman, whose results were used by J. Robert Oppenheimer and George M. Volkoff for the deduction of what is known as Tolman-Oppenheimer-Volkoff (TOV) equation. This equation represents the hydrostatic equilibrium of a sphere of perfect fluid in the relativistic regime and, when combined with a suitable equation of state, yields a mathematical model for neutron stars. This paper presents the deduction of the TOV equation in a detailed and didactic way, since the treatment of Einstein's equations of general relativity (GR) until the application to the case where the star is made up of a Fermi gas of degenerate neutrons, whence we can deduce that there is a maximum mass possible for such objects. Although today we know that the Fermi gas model is by itself unsuitable in this case, the analysis is interesting from the historic and didactic viewpoint, once it consists in a fairly simple example of application of an equation of state to the calculations of the structure of neutron stars.

Keywords
General Relativity; Neutron Stars; TOV Equation


1. Introdução

Logo após a descoberta do nêutron em 1932, Walter Baade e Fritz Zwicky (respectivamente um astrônomo alemão e um astrofísico suíço) conjecturaram a existência de estrelas formadas por tais partículas. Eles chegaram mesmo a supor de forma correta que supernovas (termo este, aliás, cunhado por esses próprios pesquisadores) representam eventos associados à criação de estrelas de nêutrons [1[1] B.W. Carroll e D.A. Ostlie, An introduction to modern astrophysics (Cambridge University Press, Cambridge, 2017), 2 ed., 2[2] A.S. Burrows, Proc. Natl. Acad. Sci. USA 112, 1241 (2015).].

Por outro lado, diferentemente do que ocorre com as estrelas formadas por matéria atômica ordinária, a física newtoniana é inadequada para a construção de um modelo matemático que represente a estrutura das estrelas de nêutrons. Isso fica evidente quando analisamos suas características físicas: tais objetos possuem massas e raios de ∼ 1 M e ∼ 10 km [1[1] B.W. Carroll e D.A. Ostlie, An introduction to modern astrophysics (Cambridge University Press, Cambridge, 2017), 2 ed.], e portanto velocidades de escape da ordem de 0, 5c, em que c é a velocidade da luz no vácuo. Em outras palavras, o regime newtoniano é válido apenas quando GM/Rc2 ≪ 1, em que M e R são a massa e o raio do objeto esférico em questão; caso essa condição não seja satisfeita, o uso da RG é necessário [3[3] A.K. Raychaudhuri, S. Banerji e A. Banerjee, General Relativity, Astrophysics and Cosmology (Springer-Verlag, New York, 1992).].

Esse problema, ou seja, o estudo de uma distribuição estática e esférica de matéria no regime relativístico, foi abordado por Richard C. Tolman [4[4] R.C. Tolman, Phys. Rev. 55, 364 (1939).]. O autor obteve expressões analíticas relacionando as propriedades geométricas da configuração a grandezas físicas tais como a pressão e a densidade de um fluido perfeito. Esse trabalho foi então utilizado por J. Robert Oppenheimer e George M. Volkoff, os quais deduziram uma equação de equilíbrio hidrostático para a referida distribuição de matéria [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).]. Tal resultado passou a ser conhecido como equação TOV, embora alguns textos se refiram a ela como equação de Oppenheimer-Volkoff.

Na tentativa de criar um modelo que representasse uma estrela de nêutrons, Oppenheimer e Volkoff resolveram a equação TOV usando a equação de estado de um gás de Fermi composto por nêutrons degenerados e deduziram que esses objetos deveriam ter massas de no máximo ≈0.7M, sendo tal quantidade conhecida atualmente como limite TOV. No entanto, hoje sabemos que esse valor está incorreto, pois a equação de estado utilizada não é por si só adequada ao caso em questão, em que a influência da força nuclear forte (a qual é repulsiva abaixo de determinada escala de comprimento) é determinante. De fato, estimativas recentes indicam que estrelas de nêutrons possuem massas entre ≈ 1.17M [6[6] Y. Suwa, T. Yoshida, M. Shibata, H. Umeda e K. Takahashi, Mon. Not. R. Astron. Soc. 481, 3305 (2018).] e ≈ 2.16M [7[7] L. Rezzolla, E.R. Most e L.R. Weih, Astrophys J. Lett. 852, L25 (2018).].

Embora haja outros artigos abordando a equação e o limite TOV do ponto de vista didático, como por exemplo [8[8] R.F. Santos, A.C.A. Faria Júnior e S.C. Ulhoa, Rev. Bras. Ensino Fís. 42, e20190003 (2020)., 9[9] J.E. Horvath, Rev. Bras. Ensino Fís. 42, e20200240 (2020).], a discussão apresentada aqui é interessante pois aborda de forma detalhada os cálculos desde a aplicação do formalismo da RG a uma distribuição estática e esférica de fluido, seguindo os trabalhos originais [4[4] R.C. Tolman, Phys. Rev. 55, 364 (1939)., 5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).]; além disso, por questões didáticas e históricas, analisamos analítica e numericamente a solução da equação TOV para o caso um gás de nêutrons degenerados [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).] e demonstramos como o valor de ≈0.7M foi obtido por Oppenheimer e Volkoff.

As deduções especificadas acima são apresentadas na seguinte forma: na Seção 2 2. A Métrica Utilizada e o Cálculo do Tensor de Einstein De acordo com [10], a métrica esfericamente simétrica e estática mais geral possível pode ser escrita em coordenadas esféricas como (1) d s 2 = e f c 2 d t 2 − e g d r 2 − r 2 d θ 2 − r 2 sen 2 θ d ϕ 2 , em que f e g são funções apenas da coordenada radial r. Agora, como o elemento de linha é dado por1 ds2 = gμνdxμdxν, o tensor métrico gμν correspondente à Eq. (1) assume a forma (2) [ g μ ν ] = e f 0 0 0 0 − e g 0 0 0 0 − r 2 0 0 0 0 − r 2 sen 2 θ , fazendo (x0, x1, x2, x3) ≡ (ct, r, θ, ϕ). Além disso, como a matriz representada na Eq. (2) é diagonal, as componentes contravariantes dessa métrica são dadas simplesmente por gμν = (gμν)–1. A partir da Eq. (2) determinamos as conexões métricas Γμνλ, as quais são calculadas em função de gμν por meio da relação [11] (3)Γμνλ=12gλρ∂gρν∂xμ+∂gμρ∂xν−∂gμν∂xρ, fornecendo (4)Γ010=Γ100=12dfdr, Γ001=12e(f−g)dfdr,Γ111=12dgdr, Γ221=−re−g,11Γ331=−rsen2θe−g,11Γ332=−senθcos⁡θ,11Γ233=Γ323=cot⁡θ,11 Γ122=Γ212=Γ133=Γ313=1r como únicas conexões não nulas. Com as quantidades dadas pelas Eqs. (4) podemos calcular o tensor de Riemann, o tensor de Ricci e o escalar de curvatura respectivamente como [11] (veja o Apêndice A para comentários sobre as convenções de sinal utilizadas) (5)Rλμρνλ=∂Γμνλ∂xρ−∂Γμρλ∂xν+ΓσρλΓμνσ−ΓσνλΓμρσ, (6)Rμν=Rλμλνλ, (7)R=gμνRμν; assim, a partir das Eqs. (4) e (5) deduzimos diretamente que as únicas componentes diferentes de zero do tensor de Riemann são (8)R01010=−12d2fdr2+14dfdrdgdr−14dfdr2,R02020=−r2e−gdfdr,R03030=−r2e−gsen2θdfdr,R02121=r2e−gdgdr,R03131=r2e−gsen2θdgdr,R03232=sen2θ(1−e−g). Por sua vez, o tensor de Ricci é calculado substituindo-se as Eqs. (8) na Eq. (6), fornecendo (9)R00=12ef−gd2fdr2+12dfdr2−12dfdrdgdr+2rdfdr,R11=12−d2fdr2−12dfdr2+12dfdrdgdr+2rdgdr,R22=r2e−gdgdr−dfdr−e−g+1,R33=sen2⁡θr2e−gdgdr−dfdr−e−g+1 como únicas componentes não nulas. Note que usamos Rλ μρν = gλλ gμμ Rμ λνρ para permutar λ com μ e ρ com ν no tensor de Riemann quando necessário. Finalmente, determinamos o escalar de curvatura substituindo as Eqs. (9) na Eq. (7) e usando as componentes contravariantes da métrica, tal que (10)R=e−gd2fdr2+12dfdr2−12dfdrdgdr+a+2rdfdr−dgdr+2r2−2r2. 2.1. Cálculo do tensor de Einstein O tensor de Einstein é definido por [11] (11)Gμν=Rμν−12gμνR, de forma que podemos imediatamente calculá-lo em função de f e g com auxílio dos resultados anteriores. Assim, substituindo as Eqs. (2), (9) e (10) na Eq. (11), obtemos (12)G00=efe−g1rdgdr−1r2+1r2,G11=ege−g1rdfdr+1r2−1r2,G22=r22e−gd2fdr2−12dfdrdgdr+12dfdr2++1rdfdr−dgdr,G33=sen2θ G22, sendo nulas as demais componentes. o tensor de Einstein é calculado para uma métrica estática esfericamente simétrica; na Seção 3 3. As Equações de Einstein e o Tensor Energia-Momento De acordo com as convenções de sinal adotadas (veja Apêndice A), as equações de Einstein da RG podem ser escritas como [11, 12] (13)Gμν=8πGc4Tμν, em que Gμν é dado pela Eq. (11), G é a constante gravitacional e Tμν é o tensor energia-momento, o qual definiremos e calcularemos a seguir. 3.1. O tensor energia-momento Em [4] o autor obteve seus resultados tratando a matéria como um fluido perfeito. Nesse caso e supondo que o fluido esteja em equilíbrio termodinâmico, Tμν é escrito na forma [13] (14)Tμν=ρ+pc2gμαgνβdxαdτdxβdτ−p gμν, em que ρ é a densidade própria, ou seja, aquela medida em um referencial comóvel ao fluido; além disso, p é a pressão, τ é o tempo próprio e dxα/dτ é a quadrivelocidade de cada ponto do fluido. A definição de dτ conduz a d2s = c2 d2 τ [11], de forma que podemos escrever (15)dτ=1cds→dτ=1cgμνdxμdxν→dτ=1cgμνdxμdtdxνdtdt. Como estamos lidando com uma configuração estática, as componentes espaciais das velocidades dx/dt na Eq. (15) são nulas, de forma que se fizermos dx0 = cdt, ficaremos simplesmente com (16)dτ=g00dt. Finalmente, a substituição das Eqs. (2) e (16) na Eq. (14) fornece (17)T00=efρc2,T11=egp,T22=r2p,T33=r2psen2⁡θ=sen2⁡θ T22, sendo nulas as demais componentes. Note que até o momento a única condição imposta às quantidades p e ρ é que estas sejam funções apenas de r. 3.2. O cálculo das equações de Einstein Os lados direito e esquerdo da Eq. (13) são dados pelas Eqs. (12) e (17), de forma que ficamos com o seguinte sistema de equações em f, g, p e ρ: (18)e−g1rdgdr−1r2+1r2=8πGc2ρ(μ=ν=0), (19)e−g1rdfdr+1r2−1r2=8πGc4p(μ=ν=1), (20)e−g2d2fdr2−12dfdrdgdr+12dfdr2++1rdfdr−dgdr=8πGc4p(μ=ν=2). A equação para μ = ν = 3 não foi mostrada pois esta, como o leitor pode constatar facilmente ao verificar as componentes G33 e T33 nas Eqs. (12) e (17), é idêntica à expressão que corresponde a μ = ν = 2. o tensor energia-momento de um fluido perfeito é combinado com os resultados da Seção 2 2. A Métrica Utilizada e o Cálculo do Tensor de Einstein De acordo com [10], a métrica esfericamente simétrica e estática mais geral possível pode ser escrita em coordenadas esféricas como (1) d s 2 = e f c 2 d t 2 − e g d r 2 − r 2 d θ 2 − r 2 sen 2 θ d ϕ 2 , em que f e g são funções apenas da coordenada radial r. Agora, como o elemento de linha é dado por1 ds2 = gμνdxμdxν, o tensor métrico gμν correspondente à Eq. (1) assume a forma (2) [ g μ ν ] = e f 0 0 0 0 − e g 0 0 0 0 − r 2 0 0 0 0 − r 2 sen 2 θ , fazendo (x0, x1, x2, x3) ≡ (ct, r, θ, ϕ). Além disso, como a matriz representada na Eq. (2) é diagonal, as componentes contravariantes dessa métrica são dadas simplesmente por gμν = (gμν)–1. A partir da Eq. (2) determinamos as conexões métricas Γμνλ, as quais são calculadas em função de gμν por meio da relação [11] (3)Γμνλ=12gλρ∂gρν∂xμ+∂gμρ∂xν−∂gμν∂xρ, fornecendo (4)Γ010=Γ100=12dfdr, Γ001=12e(f−g)dfdr,Γ111=12dgdr, Γ221=−re−g,11Γ331=−rsen2θe−g,11Γ332=−senθcos⁡θ,11Γ233=Γ323=cot⁡θ,11 Γ122=Γ212=Γ133=Γ313=1r como únicas conexões não nulas. Com as quantidades dadas pelas Eqs. (4) podemos calcular o tensor de Riemann, o tensor de Ricci e o escalar de curvatura respectivamente como [11] (veja o Apêndice A para comentários sobre as convenções de sinal utilizadas) (5)Rλμρνλ=∂Γμνλ∂xρ−∂Γμρλ∂xν+ΓσρλΓμνσ−ΓσνλΓμρσ, (6)Rμν=Rλμλνλ, (7)R=gμνRμν; assim, a partir das Eqs. (4) e (5) deduzimos diretamente que as únicas componentes diferentes de zero do tensor de Riemann são (8)R01010=−12d2fdr2+14dfdrdgdr−14dfdr2,R02020=−r2e−gdfdr,R03030=−r2e−gsen2θdfdr,R02121=r2e−gdgdr,R03131=r2e−gsen2θdgdr,R03232=sen2θ(1−e−g). Por sua vez, o tensor de Ricci é calculado substituindo-se as Eqs. (8) na Eq. (6), fornecendo (9)R00=12ef−gd2fdr2+12dfdr2−12dfdrdgdr+2rdfdr,R11=12−d2fdr2−12dfdr2+12dfdrdgdr+2rdgdr,R22=r2e−gdgdr−dfdr−e−g+1,R33=sen2⁡θr2e−gdgdr−dfdr−e−g+1 como únicas componentes não nulas. Note que usamos Rλ μρν = gλλ gμμ Rμ λνρ para permutar λ com μ e ρ com ν no tensor de Riemann quando necessário. Finalmente, determinamos o escalar de curvatura substituindo as Eqs. (9) na Eq. (7) e usando as componentes contravariantes da métrica, tal que (10)R=e−gd2fdr2+12dfdr2−12dfdrdgdr+a+2rdfdr−dgdr+2r2−2r2. 2.1. Cálculo do tensor de Einstein O tensor de Einstein é definido por [11] (11)Gμν=Rμν−12gμνR, de forma que podemos imediatamente calculá-lo em função de f e g com auxílio dos resultados anteriores. Assim, substituindo as Eqs. (2), (9) e (10) na Eq. (11), obtemos (12)G00=efe−g1rdgdr−1r2+1r2,G11=ege−g1rdfdr+1r2−1r2,G22=r22e−gd2fdr2−12dfdrdgdr+12dfdr2++1rdfdr−dgdr,G33=sen2θ G22, sendo nulas as demais componentes. , sendo obtidas as equações da RG para a configuração da matéria em questão. A equação TOV em si é deduzida na Seção 4 4. Dedução da Equação TOV Seguindo [5], a equação TOV é deduzida a partir do sistema dado pelas Eqs. (18)–(20). As duas primeiras expressões parecem simples, contendo apenas derivadas ordinárias de primeira ordem em r das funções f e g; note também que elas têm formas semelhantes entre si. Por outro lado, a Eq. (20) é de segunda ordem em r, além de ser não linear. Felizmente esta última expressão pode ser simplificada, e isso é obtido da seguinte forma [10]: note em primeiro lugar que as Eqs. (19) e (20) têm lados direitos idênticos, de forma que podemos igualá-las. Disso resulta imediatamente (21)e−g12d2fdr2−14dfdrdgdr+14dfdr2+−12rdfdr+dgdr−1r2+1r2=0, podendo ser escrita de forma um pouco diferente como (22)e−g−12dfdrdgdr−12rdfdr+dgdr+12d2fdr2−1r2++1r2=e−g−14dfdrdgdr−14dfdr2. Por outro lado, derivando a Eq. (19) em relação a r e multiplicando ambos os lados por r/2, obtemos (23)4πGc4rdpdr=e−g−12dfdrdgdr−12rdfdr+dgdr+ +12d2fdr2−1r2+1r2, a qual é idêntica ao lado esquerdo da Eq. (22). Assim podemos escrever (24)4πGc4dpdr=−14re−gdfdr+dgdrdfdr. O lado direito da Eq. (24) pode ser ainda simplificado, uma vez que, a partir das Eqs. (18) e (19), deduzimos imediatamente que (e–g/r)(df/dr + dg/dr) = (8π G/c4)(p + c2 ρ). Com isso temos finalmente (25)dpdr=−(p+c2ρ)2dfdr. É importante ter em mente que a Eq. (25) não representa uma equação de estado. Pelo contrário: para determinarmos a configuração da matéria em equilíbrio, precisamos definir uma equação de estado ρ = ρ(p) a ser usada em conjunto com as Eqs. (18), (19) e (25), como discutido em [5]. Agora, seguindo [5], definamos uma nova variável u na forma (26)u=12r(1−e−g), tal que e–g = 1 – 2u/r. Com auxílio das Eqs. (25) e (26), podemos eliminar e–g e df/dr na Eq. (19) para obtermos (27)dpdr=−1rp+c2ρr−2u4πGr3c4p+u. A Eq. (27) já representa a equação procurada na forma como é apresentada em [5], porém com a diferença de que aqui não estamos fazendo G = c = 1. Além disso, é interessante escrever a Eq. (27) explicitamente em função da massa total da matéria no interior da região esférica de raio r. Primeiramente, rearranjemos a Eq. (18) como (28)−1rddre−g−1r2e−g+1r2=8πGc2ρ; a seguir, usando a Eq. (26) para substituir e–g na Eq. (28), chegamos a (29)dudr=4πGc2ρr2. Escrevendo as variáveis r e u como r′ e u′ e integrando a Eq. (29) no intervalo r′ ∈ [0, r], obtemos (30)∫u(0)u(r)du′=Gc24π∫0rρ[r′]2dr′→ (31)u(r)=Gc2m, em que m é a massa total na região 0 ≤ r′ ≤ r. Note que fizemos u(0) = 0 em razão da Eq. (26), uma vez que g é sempre diferente de zero [5]. Agora, tendo em mente a Eq. (31), a Eq. (27) pode ser colocada explicitamente em função de m como (32)dpdr=−Gmρr2×1−2Gmrc2−11+pρc21+4πr3pmc2. A Eq. (32) talvez seja mais familiar do que sua forma original dada pela Eq. (27) e pode ser encontrada, por exemplo, em [14]. Note que (1 – 2Gm/rc2)–1≈ 1 + 2Gm/rc2 + (2Gm/rc2)2 para 2Gm/rc2 ≪ 1, levando a (33)dpdr≈−Gmρr2−2G2m2ρr3c2−4πGpρc2r−Gmpr2c2. O termo dominante da Eq. (33) pode ser facilmente reconhecido como a equação newtoniana do equilíbrio hidrostático para estrelas [1]. 4.1. Cálculo das componentes da métrica Um problema fundamental referente à Eq. (13) é a determinação da métrica a partir de uma distribuição inicial de matéria, energia e pressão (via tensor energia-momento) e eventualmente condições geométricas iniciais tais como simetrias. Dessa forma, a Eq. (1) funciona como um ansatz a ser usado em conjunto com as quantidades dadas pelas Eqs. (17), com o objetivo de se determinar as componentes da métrica gμν no sistema de coordenadas sendo considerado. Inicialmente devemos ter mente que a solução procurada representa um objeto esférico (cujo raio denominaremos de agora em diante como R) no vácuo, ou seja, temos ρ = p = 0 para r ≥ R [5]. Portanto, qualquer que seja a solução obtida dentro do objeto, esta deve se reduzir em r ≥ R à métrica de Schwarzschild dada por [11], (34)dsSch2=1−2GMc2rc2dt2−1−2GMc2r−1dr2−r2dθ2−r2sen2θdϕ2, em que M é a massa total do corpo. A componente g00 que estamos buscando é calculada integrando-se a Eq. (25) entre r e R (com r < R): (35)∫f(r)f(R)df′=−2∫p(r)p(R)dp′p′+c2ρ, em que fizemos f → f′ e p → p′ nos integrandos. Como p(R) = 0, obtemos (36)g00=ef(r)=ef(R)exp−2∫0p(r)dp′p′+c2ρ, a qual em r = R deve se reduzir à componente g00Sch da métrica dada pela Eq. (34). Ou seja, com r = R a integral no lado direito da Eq. (36) se anula e a constante de integração assume o valor (37)ef(R)=1−2GMc2R. A componente g11 é obtida de forma imediata através das Eqs. (26) e (31), fornecendo (38)g11=eg(r)=1−2Gmc2r−1. Note que para r = R a Eq. (38) se reduz automaticamente à componente g11Sch da Eq. (34) uma vez que m(R) = M, conforme discussão a respeito das Eqs. (30) e (31). Por fim, as quantidades g22 e g33 já são dadas em suas formas finais pela Eq. (2). , enquanto sua aplicação à equação de estado mencionada anteriormente é descrita na Seção 5 5. Aplicação de Uma Equação de Estado Particular Como discutido, o cálculo das Eqs. (32) e (36) depende da definição de uma equação de estado ρ = ρ(p). Por exemplo, escolhendo ρ constante, integrando as Eqs. (32) e (36) e aplicando as deduções da Seção 4.1, obtemos a solução interior de Schwarzschild2. Essa solução não será mostrada e analisada aqui, mas o leitor interessado pode consultar, por exemplo, [12, 13]. Por outro lado, em [5] os autores empregaram a equação de estado de um gás degenerado de nêutrons. A partir de [15] eles deduziram a seguinte forma paramétrica para tal equação: (39)ρε=πmn4c54h3[senh⁡(t)−t], (40)p=πmn4c512h3senh⁡(t)−8senh12t+3t, em que mn é a massa do nêutron, ρε é a densidade de energia, h é a constante de Planck e (41)t=4lnpFmnc+1+pFmnc21/2. A quantidade pF na Eq. (41) é o momento de Fermi da distribuição de partículas e, por simplicidade, não será discutido e calculado aqui, uma vez que apenas t é necessário para as deduções a seguir. Substituindo a Eq. (39) na Eq. (29) e levando em conta que ρ = ρε/c2, chegamos a (42)dudr=Kr2[senh(t)−t], com K=π2cmn4G/h3. Agora, usando dt/dr = (dp/dr)(dp/dt)–1, em que (dp/dt)–1 é calculado a partir da Eq. (40) e dp/dr é dado pela Eq. (27), obtemos (43)dtdr=−4r(r−2u)senh⁡(t)−2senh⁡(t/2)cosh⁡(t)−4cosh⁡(t/2)+3×K3r3senh⁡(t)−8senht2+3t+u. As Eqs. (42) e (43) constituem um sistema de equações diferenciais nas variáveis u(r), t(r) e r e, caso seja resolvido no intervalo 0 ≤ r ≤ R, permite que obtenhamos a massa da distribuição de matéria, já que u(R) = (G/c2)M conforme a Eq. (31). Inicialmente, a partir da Eq. (26) temos u(0) = 0; por outro lado, seguindo [5] faremos t(0) = t0, em que t0 assumirá a priori diversos valores positivos correspondendo a cada solução do sistema. Assim, definindo u(0), t(0) e o intervalo de r seria possível resolver as Eqs. (42) e (43) ao menos numericamente. Porém aqui nos deparamos com um problema: o valor de R não é conhecido de antemão. Dessa forma, para a solução das equações devemos buscar outra estratégia, a qual é discutida a seguir. Em primeiro lugar sabemos que p(R) = 0, e isso leva a t(R) = 0 [5], como pode ser constatado a partir da Eq. (40). A Tabela 1 esquematiza os valores iniciais usados na solução do sistema. Tabela 1 Valores considerados como pontos de partida para a solução do sistema dado pelas Eqs. (42) e (43). r 0 R u(r) 0 t(r) 1, 2, 3, … 0 Implementamos então o código para a solução numérica do sistema na seguinte forma: a execução se inicia com r = 0, u(0) e t(0); em seguida são calculadas iterações até que tenhamos t – 0 ≤ε para um ε ≪ 1 definido a priori; por fim, são registrados os valores de u e r correspondentes a esta situação, ou seja, essas quantidades são os u(R) e R procurados. Os detalhes numéricos referentes a esses processos são discutidos no Apêndice B. A Fig. 1 mostra M = (c2/G)u(R) (ou seja, a massa total) e R em função de diversos valores de t0, em que os pontos representam os dados da Tabela B.1. O gráfico foi traçado na escala de tan–1 t0 de forma a ficar semelhante à Fig. 1 de [5], com a diferença de que aqui mostramos também a curva de R. Figura 1: A massa total M = (c2/G)u(R) (à esquerda) e o raio R (à direita) mostrados em função de t0 (acima) e tan–1 t0 (abaixo); M e R são dados em unidades de massa solar (M⊙) e km, respectivamente. As curvas foram traçadas a partir dos pontos da Tabela B.1 e com o uso da função spline do sofware Gnuplot. Assim como [5], obtivemos uma massa máxima de 0, 71M⊙ para t0 = 3; podemos observar também que R decresce com t0 até atingir um valor mínimo de ≈ 5km em t0 = 6. Além disso M → 0 e R → ∞ para t0 → 0, enquanto M = 0, 43M⊙ e R = 6, 2km para t0 → ∞ (veja o Apêndice B para as deduções.) Note que a densidade em t0 = 3 é de 4, 2 × 1017 kg m–3, tendo portanto a mesma ordem de grandeza da densidade de um núcleo atômico. É interessante mencionar que os autores em [5] desconsideraram as soluções nas quais M < 0, 1M⊙, já que, de acordo com o que se acreditava, 0, 1M⊙ seria a massa mínima que um núcleo estelar formado por nêutrons deveria ter para se manter estável [16]. . Por fim, a Seção 6 6. Discussões Finais e Conclusões O tratamento matemático da estrutura de uma estrela de nêutrons requer o emprego da RG em virtude das grandes densidades, pressões e energias envolvidas. O problema de uma massa esférica estática de fluido perfeito foi tratado de forma analítica por R. C. Tolman [4], sendo esses resultados usados por R. Oppenheimer e G. Volkoff [5] para a dedução de sua equação do equilíbrio hidrostático relativística. Convém notar que a equação TOV não descreve em si a estrutura de uma estrela específica e, para que um modelo estelar seja construído, a equação de estado da matéria que forma o objeto é um ingrediente fundamental. No presente artigo consideramos a equação de estado utilizada em [5], válida para um gás de Fermi degenerado formado por nêutrons, e com isso mostramos que nessa situação as massas das estrelas de nêutrons têm um valor máximo de 0, 71M⊙. Hoje sabemos que tal valor não está correto pois essa equação de estado não é adequada, uma vez que aqui a interação nuclear forte desempenha papel fundamental. Apesar de a massa máxima encontrada por Oppenheimer e Volkoff não ser realista, os autores têm o mérito de demonstrar que há um limite máximo de massa permitido para tais objetos. De fato, um estudo teórico posterior [14] envolvendo equações de estado mais apropriadas estabeleceu esse limite entre 2, 2M⊙ e 2, 9M⊙; por outro lado, [7] deduziu por meio da análise de ondas gravitacionais e observações de pulsares que tal valor situa-se entre 2, 01M⊙ e 2, 16M⊙. Entretanto, a massa máxima das estrelas de nêutrons é um assunto ainda muito discutido em razão da nossa falta de compreensão a respeito do comportamento da matéria hadrônica a altas densidades [17]. Por fim, convém fazer mais alguns comentários a respeito das Eqs. (39) e (40). Como mencionado, elas foram obtidas de [15] e, de fato, pode-se demonstrar por meio de algumas relações algébricas das funções hiperbólicas que a expressão para p em tal referência se reduz à Eq. (40). Por outro lado, a Eq. (39) e a expressão para ρ em [15] são essencialmente distintas: elas apenas tornam-se aproximadamente iguais para t ≪ 1. Embora não fique clara em [5] a razão para os autores terem usado a Eq. (39) nessa forma, é possível que se trate de uma simplificação matemática. Ou seja, o uso da expressão exata para ρ tornaria os cálculos consideravelmente mais complexos sem no entanto provocar mudanças radicais sobre os resultados obtidos. traz a conclusão e os comentários finais.

2. A Métrica Utilizada e o Cálculo do Tensor de Einstein

De acordo com [10[10] R.C. Tolman, Relativity, Thermodynamics and Cosmology (Dover, New York, 2011).], a métrica esfericamente simétrica e estática mais geral possível pode ser escrita em coordenadas esféricas como

(1) d s 2 = e f c 2 d t 2 e g d r 2 r 2 d θ 2 r 2 sen 2 θ d ϕ 2 ,

em que f e g são funções apenas da coordenada radial r. Agora, como o elemento de linha é dado por1 1 Usamos a convenção do somatório de Einstein neste artigo. ds2 = gμνdxμdxν, o tensor métrico gμν correspondente à Eq. (1) assume a forma

(2) [ g μ ν ] = e f 0 0 0 0 e g 0 0 0 0 r 2 0 0 0 0 r 2 sen 2 θ ,

fazendo (x0, x1, x2, x3) ≡ (ct, r, θ, ϕ). Além disso, como a matriz representada na Eq. (2) é diagonal, as componentes contravariantes dessa métrica são dadas simplesmente por gμν = (gμν)–1.

A partir da Eq. (2) determinamos as conexões métricas Γμνλ, as quais são calculadas em função de gμν por meio da relação [11[11] R. d'Inverno, Introducing Einstein's relativity (Oxford University Press, New York, 1995).]

(3)Γμνλ=12gλρgρνxμ+gμρxνgμνxρ,
fornecendo
(4)Γ010=Γ100=12dfdr, Γ001=12e(fg)dfdr,Γ111=12dgdr, Γ221=reg,11Γ331=rsen2θeg,11Γ332=senθcosθ,11Γ233=Γ323=cotθ,11 Γ122=Γ212=Γ133=Γ313=1r
como únicas conexões não nulas.

Com as quantidades dadas pelas Eqs. (4) podemos calcular o tensor de Riemann, o tensor de Ricci e o escalar de curvatura respectivamente como [11[11] R. d'Inverno, Introducing Einstein's relativity (Oxford University Press, New York, 1995).] (veja o Apêndice A para comentários sobre as convenções de sinal utilizadas)

(5)Rλμρνλ=ΓμνλxρΓμρλxν+ΓσρλΓμνσΓσνλΓμρσ,
(6)Rμν=Rλμλνλ,
(7)R=gμνRμν;
assim, a partir das Eqs. (4) e (5) deduzimos diretamente que as únicas componentes diferentes de zero do tensor de Riemann são
(8)R01010=12d2fdr2+14dfdrdgdr14dfdr2,R02020=r2egdfdr,R03030=r2egsen2θdfdr,R02121=r2egdgdr,R03131=r2egsen2θdgdr,R03232=sen2θ(1eg).

Por sua vez, o tensor de Ricci é calculado substituindo-se as Eqs. (8) na Eq. (6), fornecendo

(9)R00=12efgd2fdr2+12dfdr212dfdrdgdr+2rdfdr,R11=12d2fdr212dfdr2+12dfdrdgdr+2rdgdr,R22=r2egdgdrdfdreg+1,R33=sen2θr2egdgdrdfdreg+1
como únicas componentes não nulas. Note que usamos Rλ μρν = gλλ gμμ Rμ λνρ para permutar λ com μ e ρ com ν no tensor de Riemann quando necessário.

Finalmente, determinamos o escalar de curvatura substituindo as Eqs. (9) na Eq. (7) e usando as componentes contravariantes da métrica, tal que

(10)R=egd2fdr2+12dfdr212dfdrdgdr+a+2rdfdrdgdr+2r22r2.

2.1. Cálculo do tensor de Einstein

O tensor de Einstein é definido por [11[11] R. d'Inverno, Introducing Einstein's relativity (Oxford University Press, New York, 1995).]

(11)Gμν=Rμν12gμνR,
de forma que podemos imediatamente calculá-lo em função de f e g com auxílio dos resultados anteriores. Assim, substituindo as Eqs. (2), (9) e (10) na Eq. (11), obtemos
(12)G00=efeg1rdgdr1r2+1r2,G11=egeg1rdfdr+1r21r2,G22=r22egd2fdr212dfdrdgdr+12dfdr2++1rdfdrdgdr,G33=sen2θ G22,
sendo nulas as demais componentes.

3. As Equações de Einstein e o Tensor Energia-Momento

De acordo com as convenções de sinal adotadas (veja Apêndice A), as equações de Einstein da RG podem ser escritas como [11[11] R. d'Inverno, Introducing Einstein's relativity (Oxford University Press, New York, 1995)., 12[12] C.W. Misner, K.S. Thorne e J.A. Wheeler, Gravitation (W. H. Freeman, San Francisco, 1973).]

(13)Gμν=8πGc4Tμν,
em que Gμν é dado pela Eq. (11), G é a constante gravitacional e Tμν é o tensor energia-momento, o qual definiremos e calcularemos a seguir.

3.1. O tensor energia-momento

Em [4[4] R.C. Tolman, Phys. Rev. 55, 364 (1939).] o autor obteve seus resultados tratando a matéria como um fluido perfeito. Nesse caso e supondo que o fluido esteja em equilíbrio termodinâmico, Tμν é escrito na forma [13[13] B.F. Schutz, A first course in general relativity (Cambridge University Press, Cambridge, 1992).]

(14)Tμν=ρ+pc2gμαgνβdxαdτdxβdτp gμν,
em que ρ é a densidade própria, ou seja, aquela medida em um referencial comóvel ao fluido; além disso, p é a pressão, τ é o tempo próprio e dxα/ é a quadrivelocidade de cada ponto do fluido.

A definição de conduz a d2s = c2 d2 τ [11[11] R. d'Inverno, Introducing Einstein's relativity (Oxford University Press, New York, 1995).], de forma que podemos escrever

(15)dτ=1cdsdτ=1cgμνdxμdxνdτ=1cgμνdxμdtdxνdtdt.

Como estamos lidando com uma configuração estática, as componentes espaciais das velocidades dx/dt na Eq. (15) são nulas, de forma que se fizermos dx0 = cdt, ficaremos simplesmente com

(16)dτ=g00dt.

Finalmente, a substituição das Eqs. (2) e (16) na Eq. (14) fornece

(17)T00=efρc2,T11=egp,T22=r2p,T33=r2psen2θ=sen2θ T22,
sendo nulas as demais componentes. Note que até o momento a única condição imposta às quantidades p e ρ é que estas sejam funções apenas de r.

3.2. O cálculo das equações de Einstein

Os lados direito e esquerdo da Eq. (13) são dados pelas Eqs. (12) e (17), de forma que ficamos com o seguinte sistema de equações em f, g, p e ρ:

(18)eg1rdgdr1r2+1r2=8πGc2ρ(μ=ν=0),
(19)eg1rdfdr+1r21r2=8πGc4p(μ=ν=1),
(20)eg2d2fdr212dfdrdgdr+12dfdr2++1rdfdrdgdr=8πGc4p(μ=ν=2).

A equação para μ = ν = 3 não foi mostrada pois esta, como o leitor pode constatar facilmente ao verificar as componentes G33 e T33 nas Eqs. (12) e (17), é idêntica à expressão que corresponde a μ = ν = 2.

4. Dedução da Equação TOV

Seguindo [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).], a equação TOV é deduzida a partir do sistema dado pelas Eqs. (18)–(20). As duas primeiras expressões parecem simples, contendo apenas derivadas ordinárias de primeira ordem em r das funções f e g; note também que elas têm formas semelhantes entre si. Por outro lado, a Eq. (20) é de segunda ordem em r, além de ser não linear.

Felizmente esta última expressão pode ser simplificada, e isso é obtido da seguinte forma [10[10] R.C. Tolman, Relativity, Thermodynamics and Cosmology (Dover, New York, 2011).]: note em primeiro lugar que as Eqs. (19) e (20) têm lados direitos idênticos, de forma que podemos igualá-las. Disso resulta imediatamente

(21)eg12d2fdr214dfdrdgdr+14dfdr2+12rdfdr+dgdr1r2+1r2=0,
podendo ser escrita de forma um pouco diferente como
(22)eg12dfdrdgdr12rdfdr+dgdr+12d2fdr21r2++1r2=eg14dfdrdgdr14dfdr2.

Por outro lado, derivando a Eq. (19) em relação a r e multiplicando ambos os lados por r/2, obtemos

(23)4πGc4rdpdr=eg12dfdrdgdr12rdfdr+dgdr+ +12d2fdr21r2+1r2,
a qual é idêntica ao lado esquerdo da Eq. (22). Assim podemos escrever
(24)4πGc4dpdr=14regdfdr+dgdrdfdr.

O lado direito da Eq. (24) pode ser ainda simplificado, uma vez que, a partir das Eqs. (18) e (19), deduzimos imediatamente que (eg/r)(df/dr + dg/dr) = (8π G/c4)(p + c2 ρ). Com isso temos finalmente

(25)dpdr=(p+c2ρ)2dfdr.

É importante ter em mente que a Eq. (25) não representa uma equação de estado. Pelo contrário: para determinarmos a configuração da matéria em equilíbrio, precisamos definir uma equação de estado ρ = ρ(p) a ser usada em conjunto com as Eqs. (18), (19) e (25), como discutido em [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).].

Agora, seguindo [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).], definamos uma nova variável u na forma

(26)u=12r(1eg),
tal que eg = 1 – 2u/r. Com auxílio das Eqs. (25) e (26), podemos eliminar eg e df/dr na Eq. (19) para obtermos
(27)dpdr=1rp+c2ρr2u4πGr3c4p+u.

A Eq. (27) já representa a equação procurada na forma como é apresentada em [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).], porém com a diferença de que aqui não estamos fazendo G = c = 1. Além disso, é interessante escrever a Eq. (27) explicitamente em função da massa total da matéria no interior da região esférica de raio r. Primeiramente, rearranjemos a Eq. (18) como

(28)1rddreg1r2eg+1r2=8πGc2ρ;
a seguir, usando a Eq. (26) para substituir eg na Eq. (28), chegamos a
(29)dudr=4πGc2ρr2.

Escrevendo as variáveis r e u como r e u e integrando a Eq. (29) no intervalo r ∈ [0, r], obtemos

(30)u(0)u(r)du=Gc24π0rρ[r]2dr
(31)u(r)=Gc2m,
em que m é a massa total na região 0 ≤ rr. Note que fizemos u(0) = 0 em razão da Eq. (26), uma vez que g é sempre diferente de zero [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).]. Agora, tendo em mente a Eq. (31), a Eq. (27) pode ser colocada explicitamente em função de m como
(32)dpdr=Gmρr2×12Gmrc211+pρc21+4πr3pmc2.

A Eq. (32) talvez seja mais familiar do que sua forma original dada pela Eq. (27) e pode ser encontrada, por exemplo, em [14[14] V. Kalogera e G. Baym, Astrophys J. 470, L61 (1996).]. Note que (1 – 2Gm/rc2)–1≈ 1 + 2Gm/rc2 + (2Gm/rc2)2 para 2Gm/rc2 ≪ 1, levando a

(33)dpdrGmρr22G2m2ρr3c24πGpρc2rGmpr2c2.

O termo dominante da Eq. (33) pode ser facilmente reconhecido como a equação newtoniana do equilíbrio hidrostático para estrelas [1[1] B.W. Carroll e D.A. Ostlie, An introduction to modern astrophysics (Cambridge University Press, Cambridge, 2017), 2 ed.].

4.1. Cálculo das componentes da métrica

Um problema fundamental referente à Eq. (13) é a determinação da métrica a partir de uma distribuição inicial de matéria, energia e pressão (via tensor energia-momento) e eventualmente condições geométricas iniciais tais como simetrias. Dessa forma, a Eq. (1) funciona como um ansatz a ser usado em conjunto com as quantidades dadas pelas Eqs. (17), com o objetivo de se determinar as componentes da métrica gμν no sistema de coordenadas sendo considerado.

Inicialmente devemos ter mente que a solução procurada representa um objeto esférico (cujo raio denominaremos de agora em diante como R) no vácuo, ou seja, temos ρ = p = 0 para rR [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).]. Portanto, qualquer que seja a solução obtida dentro do objeto, esta deve se reduzir em rR à métrica de Schwarzschild dada por [11[11] R. d'Inverno, Introducing Einstein's relativity (Oxford University Press, New York, 1995).],

(34)dsSch2=12GMc2rc2dt212GMc2r1dr2r2dθ2r2sen2θdϕ2,
em que M é a massa total do corpo.

A componente g00 que estamos buscando é calculada integrando-se a Eq. (25) entre r e R (com r < R):

(35)f(r)f(R)df=2p(r)p(R)dpp+c2ρ,
em que fizemos ff e pp nos integrandos. Como p(R) = 0, obtemos
(36)g00=ef(r)=ef(R)exp20p(r)dpp+c2ρ,
a qual em r = R deve se reduzir à componente g00Sch da métrica dada pela Eq. (34). Ou seja, com r = R a integral no lado direito da Eq. (36) se anula e a constante de integração assume o valor
(37)ef(R)=12GMc2R.

A componente g11 é obtida de forma imediata através das Eqs. (26) e (31), fornecendo

(38)g11=eg(r)=12Gmc2r1.

Note que para r = R a Eq. (38) se reduz automaticamente à componente g11Sch da Eq. (34) uma vez que m(R) = M, conforme discussão a respeito das Eqs. (30) e (31).

Por fim, as quantidades g22 e g33 já são dadas em suas formas finais pela Eq. (2).

5. Aplicação de Uma Equação de Estado Particular

Como discutido, o cálculo das Eqs. (32) e (36) depende da definição de uma equação de estado ρ = ρ(p). Por exemplo, escolhendo ρ constante, integrando as Eqs. (32) e (36) e aplicando as deduções da Seção 4.1, obtemos a solução interior de Schwarzschild2 2 Tal solução contrasta com a Eq. (34), a qual é válida na superfície e no exterior de uma esfera de massa M. . Essa solução não será mostrada e analisada aqui, mas o leitor interessado pode consultar, por exemplo, [12[12] C.W. Misner, K.S. Thorne e J.A. Wheeler, Gravitation (W. H. Freeman, San Francisco, 1973)., 13[13] B.F. Schutz, A first course in general relativity (Cambridge University Press, Cambridge, 1992).].

Por outro lado, em [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).] os autores empregaram a equação de estado de um gás degenerado de nêutrons. A partir de [15[15] S. Chandrasekhar, Mon. Not. R. Astron. Soc. 95, 207 (1935).] eles deduziram a seguinte forma paramétrica para tal equação:

(39)ρε=πmn4c54h3[senh(t)t],
(40)p=πmn4c512h3senh(t)8senh12t+3t,
em que mn é a massa do nêutron, ρε é a densidade de energia, h é a constante de Planck e
(41)t=4lnpFmnc+1+pFmnc21/2.

A quantidade pF na Eq. (41) é o momento de Fermi da distribuição de partículas e, por simplicidade, não será discutido e calculado aqui, uma vez que apenas t é necessário para as deduções a seguir.

Substituindo a Eq. (39) na Eq. (29) e levando em conta que ρ = ρε/c2, chegamos a

(42)dudr=Kr2[senh(t)t],
com K=π2cmn4G/h3. Agora, usando dt/dr = (dp/dr)(dp/dt)–1, em que (dp/dt)–1 é calculado a partir da Eq. (40) e dp/dr é dado pela Eq. (27), obtemos
(43)dtdr=4r(r2u)senh(t)2senh(t/2)cosh(t)4cosh(t/2)+3×K3r3senh(t)8senht2+3t+u.

As Eqs. (42) e (43) constituem um sistema de equações diferenciais nas variáveis u(r), t(r) e r e, caso seja resolvido no intervalo 0 ≤ rR, permite que obtenhamos a massa da distribuição de matéria, já que u(R) = (G/c2)M conforme a Eq. (31).

Inicialmente, a partir da Eq. (26) temos u(0) = 0; por outro lado, seguindo [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).] faremos t(0) = t0, em que t0 assumirá a priori diversos valores positivos correspondendo a cada solução do sistema. Assim, definindo u(0), t(0) e o intervalo de r seria possível resolver as Eqs. (42) e (43) ao menos numericamente. Porém aqui nos deparamos com um problema: o valor de R não é conhecido de antemão. Dessa forma, para a solução das equações devemos buscar outra estratégia, a qual é discutida a seguir.

Em primeiro lugar sabemos que p(R) = 0, e isso leva a t(R) = 0 [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).], como pode ser constatado a partir da Eq. (40). A Tabela 1 esquematiza os valores iniciais usados na solução do sistema.

Tabela 1
Valores considerados como pontos de partida para a solução do sistema dado pelas Eqs. (42) e (43).

Implementamos então o código para a solução numérica do sistema na seguinte forma: a execução se inicia com r = 0, u(0) e t(0); em seguida são calculadas iterações até que tenhamos t – 0 ≤ε para um ε ≪ 1 definido a priori; por fim, são registrados os valores de u e r correspondentes a esta situação, ou seja, essas quantidades são os u(R) e R procurados. Os detalhes numéricos referentes a esses processos são discutidos no Apêndice B.

A Fig. 1 mostra M = (c2/G)u(R) (ou seja, a massa total) e R em função de diversos valores de t0, em que os pontos representam os dados da Tabela B.1. O gráfico foi traçado na escala de tan–1 t0 de forma a ficar semelhante à Fig. 1 de [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).], com a diferença de que aqui mostramos também a curva de R.

Figura 1:
A massa total M = (c2/G)u(R) (à esquerda) e o raio R (à direita) mostrados em função de t0 (acima) e tan–1 t0 (abaixo); M e R são dados em unidades de massa solar (M) e km, respectivamente. As curvas foram traçadas a partir dos pontos da Tabela B.1 e com o uso da função spline do sofware Gnuplot.

Assim como [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).], obtivemos uma massa máxima de 0, 71M para t0 = 3; podemos observar também que R decresce com t0 até atingir um valor mínimo de ≈ 5km em t0 = 6. Além disso M → 0 e R → ∞ para t0 → 0, enquanto M = 0, 43M e R = 6, 2km para t0 → ∞ (veja o Apêndice B para as deduções.) Note que a densidade em t0 = 3 é de 4, 2 × 1017 kg m–3, tendo portanto a mesma ordem de grandeza da densidade de um núcleo atômico.

É interessante mencionar que os autores em [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).] desconsideraram as soluções nas quais M < 0, 1M, já que, de acordo com o que se acreditava, 0, 1M seria a massa mínima que um núcleo estelar formado por nêutrons deveria ter para se manter estável [16[16] J.R. Oppenheimer e R. Serber, Phys. Rev. 54, 540 (1938).].

6. Discussões Finais e Conclusões

O tratamento matemático da estrutura de uma estrela de nêutrons requer o emprego da RG em virtude das grandes densidades, pressões e energias envolvidas. O problema de uma massa esférica estática de fluido perfeito foi tratado de forma analítica por R. C. Tolman [4[4] R.C. Tolman, Phys. Rev. 55, 364 (1939).], sendo esses resultados usados por R. Oppenheimer e G. Volkoff [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).] para a dedução de sua equação do equilíbrio hidrostático relativística.

Convém notar que a equação TOV não descreve em si a estrutura de uma estrela específica e, para que um modelo estelar seja construído, a equação de estado da matéria que forma o objeto é um ingrediente fundamental. No presente artigo consideramos a equação de estado utilizada em [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).], válida para um gás de Fermi degenerado formado por nêutrons, e com isso mostramos que nessa situação as massas das estrelas de nêutrons têm um valor máximo de 0, 71M. Hoje sabemos que tal valor não está correto pois essa equação de estado não é adequada, uma vez que aqui a interação nuclear forte desempenha papel fundamental.

Apesar de a massa máxima encontrada por Oppenheimer e Volkoff não ser realista, os autores têm o mérito de demonstrar que há um limite máximo de massa permitido para tais objetos. De fato, um estudo teórico posterior [14[14] V. Kalogera e G. Baym, Astrophys J. 470, L61 (1996).] envolvendo equações de estado mais apropriadas estabeleceu esse limite entre 2, 2M e 2, 9M; por outro lado, [7[7] L. Rezzolla, E.R. Most e L.R. Weih, Astrophys J. Lett. 852, L25 (2018).] deduziu por meio da análise de ondas gravitacionais e observações de pulsares que tal valor situa-se entre 2, 01M e 2, 16M. Entretanto, a massa máxima das estrelas de nêutrons é um assunto ainda muito discutido em razão da nossa falta de compreensão a respeito do comportamento da matéria hadrônica a altas densidades [17[17] I. Bombaci, Astron. Astrophys. 305, 871 (1996).].

Por fim, convém fazer mais alguns comentários a respeito das Eqs. (39) e (40). Como mencionado, elas foram obtidas de [15[15] S. Chandrasekhar, Mon. Not. R. Astron. Soc. 95, 207 (1935).] e, de fato, pode-se demonstrar por meio de algumas relações algébricas das funções hiperbólicas que a expressão para p em tal referência se reduz à Eq. (40). Por outro lado, a Eq. (39) e a expressão para ρ em [15[15] S. Chandrasekhar, Mon. Not. R. Astron. Soc. 95, 207 (1935).] são essencialmente distintas: elas apenas tornam-se aproximadamente iguais para t ≪ 1. Embora não fique clara em [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).] a razão para os autores terem usado a Eq. (39) nessa forma, é possível que se trate de uma simplificação matemática. Ou seja, o uso da expressão exata para ρ tornaria os cálculos consideravelmente mais complexos sem no entanto provocar mudanças radicais sobre os resultados obtidos.

Agradecimentos

O autor agradece ao CNPq pelo apoio financeiro (processo 301229/2023-6). O autor agradece também ao INPE por toda a infraestrutura colocada à disposição.

A. Notas sobre a convenção de sinais adotada neste artigo

Segundo [12[12] C.W. Misner, K.S. Thorne e J.A. Wheeler, Gravitation (W. H. Freeman, San Francisco, 1973).], as convenções de sinal utilizadas em relatividade geral podem ser classificadas com base nas relações a seguir, envolvendo respectivamente a métrica, o tensor de Riemann e a equação de Einstein:

(A.1)ds2=σ1{ω02+ω12+ω22+ω32},Rλμγνα=σ2ΓμναxγΓμγαxν+ΓσγαΓμνσΓσναΓμγσ,Rμν12gμνR=σ38πGc4Tμν.

Nas Eqs. (A.1) as constantes σi (i = 1, 2, 3) podem assumir apenas os valores – 1 ou + 1; além disso, por simplicidade escrevemos ωμgμμdxμ.

Nesse esquema uma dada convenção de sinais é criada pela escolha dos coeficientes σi. Note que, embora tais coeficientes possam ser determinados livremente, há um vínculo a ser respeitado em relação à definição do tensor de Ricci, na forma

(A.2)Rμν=σ2σ3Rμγνγ.

Ou seja, se σ2σ3 = – 1, os índices covariantes γ e ν no lado direito da Eq. (A.2) devem ter suas posições trocadas.

No presente artigo seguimos, por exemplo, [11[11] R. d'Inverno, Introducing Einstein's relativity (Oxford University Press, New York, 1995).] e a convenção temporal de [18[18] L.D. Landau e E.M. Lifshitz, The Classical theory of fields (Pergamon Press, Oxford, 1971), 3 ed.] e usamos (σ1, σ2, σ3) = (-1, 1, 1).

B. Dados da Figura 1

O sistema dado pelas Eqs. (42) e (43) foi tratado numericamente com o uso do algoritmo de Runge-Kutta de terceira ordem, o qual foi executado para cada valor de t0. O parâmetro ε foi definido para cada caso, tendo em vista um equilíbrio entre precisão e tempo de execução. As situações correspondendo a t0 = 0 e t0 → ∞ foram tratadas por meio de argumentos analíticos [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).] e são discutidas a seguir.

Tabela B.1
Valores de M e R para cada t0 obtidos via solução das Eqs. (42) e (43). A coluna mais à esquerda mostra cada um dos valores de t0 considerados a priori; a coluna mais à direita traz os respectivos parâmetros ε. Para a primeira e última linhas, veja a discussão no texto.

Para valores de t muito pequenos, podemos expandir as Eqs. (39) e (40) em séries de Taylor e obter ρεat3 e pbt5, em que a e b são constantes. Com isso, a Eq. (29) se reduz a

(B.1)dudr=4πGac2r2t3;
por outro lado, temos dt/dr = (dt/dp)(dp/dr), em que dt/dp = (5bt4)–1 e dp/dr = – Gmρ/r2 (a qual representa a equação newtoniana do equilíbrio hidrostático para esferas de gás [1[1] B.W. Carroll e D.A. Ostlie, An introduction to modern astrophysics (Cambridge University Press, Cambridge, 2017), 2 ed.]), de forma que
(B.2)dtdr=c2a5butr2.

É fácil verificar que o sistema formado pelas Eqs. (B.1) e (B.2) fornece ur–3 e tr–2 como solução, de onde deduzimos que ut3/2. Como um via Eq. (31), chegamos à conclusão que m → 0 para t → 0; por outro lado, podemos deduzir também que r → ∞ para t → 0.

Para valores de t muito grandes, as Eqs. (42) e (43) possuem as formas assintóticas

(B.3)dudr12Kr2et
(B.4)dtdr4r(r2u)16Kr3et+u,
já que nesse regime podemos fazer senh(t) ≈ cosh(t) ≈ et/2, etet/2 e ett. A única solução [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).] do sistema dado pelas Eqs. (B.3) e (B.4) pode ser escrita como
(B.5)u=314r
(B.6)et=37Kr2,
em que u(0) = 0 e t(0) → ∞.

De acordo com [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).], as Eqs. (B.3) e (B.4) são satisfatórias para t ≳ 6, de forma que seguimos o seguinte procedimento: calculamos r e u correspondendo a t = 6 por meio das Eqs. (B.5) e (B.6); e a seguir usamos tais valores como parâmetros iniciais para a solução numérica do sistema dado pelas Eqs. (42) e (43). Tal processo fornece 0, 43M e 6, 2] km para a massa total e o raio3 3 Há um fato digno de nota em relação à última linha da Tabela I de [5]: o valor do raio mostrado nessa tabela (3, 1 km) é exatamente a metade do calculado aqui, enquanto a massa (0, 34M⊙) possui valor 25 % menor do que o apresentado neste Apêndice. De qualquer forma, fica demonstrado que M e R convergem a valores finitos em t → ∞ e que 0, 71M⊙ é de fato o valor máximo da massa para a equação de estado em questão. no regime t → ∞.

Referências

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    B.W. Carroll e D.A. Ostlie, An introduction to modern astrophysics (Cambridge University Press, Cambridge, 2017), 2 ed.
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    R. d'Inverno, Introducing Einstein's relativity (Oxford University Press, New York, 1995).
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    B.F. Schutz, A first course in general relativity (Cambridge University Press, Cambridge, 1992).
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    V. Kalogera e G. Baym, Astrophys J. 470, L61 (1996).
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    S. Chandrasekhar, Mon. Not. R. Astron. Soc. 95, 207 (1935).
  • [16]
    J.R. Oppenheimer e R. Serber, Phys. Rev. 54, 540 (1938).
  • [17]
    I. Bombaci, Astron. Astrophys. 305, 871 (1996).
  • [18]
    L.D. Landau e E.M. Lifshitz, The Classical theory of fields (Pergamon Press, Oxford, 1971), 3 ed.
  • 1
    Usamos a convenção do somatório de Einstein neste artigo.
  • 2
    Tal solução contrasta com a Eq. (34), a qual é válida na superfície e no exterior de uma esfera de massa M.
  • 3
    Há um fato digno de nota em relação à última linha da Tabela I de [5[5] J.R. Oppenheimer e G.M. Volkoff, Phys. Rev. 55, 374 (1939).]: o valor do raio mostrado nessa tabela (3, 1 km) é exatamente a metade do calculado aqui, enquanto a massa (0, 34M) possui valor 25 % menor do que o apresentado neste Apêndice. De qualquer forma, fica demonstrado que M e R convergem a valores finitos em t → ∞ e que 0, 71M é de fato o valor máximo da massa para a equação de estado em questão.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Out 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    03 Out 2023
  • Aceito
    06 Out 2023
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