Acessibilidade / Reportar erro

Versão brasileira do Paediatric Asthma Quality of Life Questionnaire: validação de campo

Resumos

OBJETIVO: Determinar as propriedades psicométricas da versão oficial em português do Brasil de Paediatric Asthma Quality of Life Questionnaire (PAQLQ) em uma amostra representativa de crianças e adolescentes brasileiros com asma. MÉTODOS: Um total de 125 participantes com asma, com idades de 8-17 e monitorados em um ambulatório pediátrico de pneumologia em Porto Alegre (RS), responderam o PAQLQ. A validade foi avaliada através de validade convergente (correlação entre os domínios do PAQLQ e os domínios do Pediatric Quality of Life Inventory 4.0 (PedsQL 4.0). A confiabilidade foi avaliada através da consistência interna (coeficiente alfa de Cronbach), reprodutibilidade (coeficiente de correlação intraclasse), sensibilidade a mudança (tamanho do efeito) e discriminação (efeitos mínimo/máximo). RESULTADOS: A idade média foi de 11 anos, e 75 (60%) eram meninos. A média do escore global do PAQLQ foi de 5.1, com efeitos mínimo/máximo < 10%. As correlações com os domínios do PedsQL 4.0 foram aceitáveis (r = 0,37-0,40). O coeficiente alfa de Cronbach do escore global foi 0,93, variando de 0,72 a 0,88 nos domínios. O tamanho do efeito global foi de 0,60 (variação: 0,45-0,60), e a correlação intraclasse global foi de 0,80 (variação: 0,66-0,79). CONCLUSÕES: A versão oficial em português do Brasil do PAQLQ demonstrou boa performance psicométrica do instrumento, confirmando sua adequação para uso no contexto cultural brasileiro.

Qualidade de vida; Asma; Estudos de validação


OBJECTIVE: To assess the psychometric properties of the official Brazilian Portuguese-language version of the Paediatric Asthma Quality of Life Questionnaire (PAQLQ) in a representative group of Brazilian children and adolescents with asthma. METHODS: A total of 125 individuals with asthma, aged 8-17 years and being monitored at a pediatric pulmonology outpatient clinic in the city of Porto Alegre, Brazil, completed the PAQLQ. Validity was assessed by means of convergent validity (correlation between PAQLQ domains and those of the Pediatric Quality of Life Inventory (PedsQL) 4.0. Reliability was assessed by determining internal consistency (Cronbach's alpha coefficient), reproducibility (intraclass correlation coefficient), sensitivity to change (effect size), and discriminatory power (floor/ceiling effects). RESULTS: The mean age was 11 years, and 75 (60%) of the participants were male. The mean PAQLQ total score was 5.1, with floor/ceiling effects < 10%. Correlations between PAQLQ domains and the PedsQL 4.0 domains were acceptable (r = 0.37-0.40). The Cronbach's alpha coefficient for the total score was 0.93, ranging from 0.72 to 0.88 for the domains. The overall effect size was 0.60 (range: 0.45-0.60), whereas the overall intraclass correlation coefficient was 0.80 (range: 0.66-0.79). CONCLUSIONS: The official Brazilian Portuguese-language version of the PAQLQ showed good psychometric performance, confirming its cultural adequacy for use in Brazil.

Quality of life; Asthma; Validation studies


ARTIGO ORIGINAL

Versão brasileira do Paediatric Asthma Quality of Life Questionnaire: validação de campo* * Trabalho realizado no Serviço de Pneumologia Pediátrica, Hospital da Criança Santo Antônio, Porto Alegre (RS) Brasil.

Edgar Enrique SarriaI; Rosana Cardoso Manique RosaII; Gilberto Bueno FischerIII; Vânia Naomi HirakataIV; Neusa Sica da RochaV; Rita MattielloVI

IPesquisador em Pneumologia Pediátrica. Indiana University, Indianapolis (IN) EUA

IIResidente em Pediatria. Hospital Nossa Senhora da Conceição, Porto Alegre (RS) Brasil

IIIProfessor de Pediatria. Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre - UFCSPA - Porto Alegre (RS) Brasil

IVBioestatístico. Grupo de Pós-Graduação e Pesquisa, Hospital de Clínicas de Porto Alegre - HCPA - Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre - UFCSPA - Porto Alegre (RS) Brasil

VPós-Doutoranda em Psiquiatria. Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre - UFCSPA - Porto Alegre (RS) Brasil

VIDoutoranda em Pediatria. Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS - Porto Alegre, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Edgar E. Sarria 8270 Bentwood E. C. Drive, apartment 3-D Indianapolis, IN, 46268, USA Tel 55 51 3214-8646 E-mail: edgarsa01@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Determinar as propriedades psicométricas da versão oficial em português do Brasil de Paediatric Asthma Quality of Life Questionnaire (PAQLQ) em uma amostra representativa de crianças e adolescentes brasileiros com asma.

MÉTODOS: Um total de 125 participantes com asma, com idades de 8-17 e monitorados em um ambulatório pediátrico de pneumologia em Porto Alegre (RS), responderam o PAQLQ. A validade foi avaliada através de validade convergente (correlação entre os domínios do PAQLQ e os domínios do Pediatric Quality of Life Inventory 4.0 (PedsQL 4.0). A confiabilidade foi avaliada através da consistência interna (coeficiente alfa de Cronbach), reprodutibilidade (coeficiente de correlação intraclasse), sensibilidade a mudança (tamanho do efeito) e discriminação (efeitos mínimo/máximo).

RESULTADOS: A idade média foi de 11 anos, e 75 (60%) eram meninos. A média do escore global do PAQLQ foi de 5.1, com efeitos mínimo/máximo < 10%. As correlações com os domínios do PedsQL 4.0 foram aceitáveis (r = 0,37-0,40). O coeficiente alfa de Cronbach do escore global foi 0,93, variando de 0,72 a 0,88 nos domínios. O tamanho do efeito global foi de 0,60 (variação: 0,45-0,60), e a correlação intraclasse global foi de 0,80 (variação: 0,66-0,79).

CONCLUSÕES: A versão oficial em português do Brasil do PAQLQ demonstrou boa performance psicométrica do instrumento, confirmando sua adequação para uso no contexto cultural brasileiro.

Descritores: Qualidade de vida; Asma; Estudos de validação.

Introdução

O uso progressivo de instrumentos para medir a qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS), associado a resultados clínicos mais tradicionais em medicina, tem demonstrado grande potencial para melhorar a assistência à saúde, particularmente em pacientes com doenças crônicas.(1,2) Quando tais instrumentos são desenvolvidos em outros países que não o país onde serão aplicados, a adequação do processo de validação (tradução para o idioma local e a adaptação para uso no contexto cultural do país em questão) é tão importante quanto a seleção do instrumento.(3)

Há cerca de onze questionários específicos para avaliar QVRS em crianças com asma.(4,5) Desses, o mais conhecido e utilizado é o Paediatric Asthma Quality of Life Questionnaire (PAQLQ).(6) Em 2001, o PAQLQ foi supostamente validado para uso no Brasil feita sob a orientação do MAPI Research Institute, um centro especializado na validação de instrumentos para avaliar QVRS. No entanto, nenhum estudo relatou os resultados desse processo de validação. Quando questionados, a equipe do MAPI Institute relatou que foi responsável apenas pelo componente linguístico, testando-o em uma pequena amostra composta de 11 crianças (7-17 anos de idade).

Testes de campo são fundamentais no processo de validação de um questionário. Esses permitem que pesquisadores determinem as propriedades psicométricas, a aceitabilidade do instrumento e a sua aplicabilidade geral para outros grupos ou subgrupos culturais.(7) Para atender à necessidade da validação completa desse importante questionário no contexto cultural brasileiro, o objetivo do presente estudo foi avaliar as propriedades psicométricas do PAQLQ em um grupo representativo de crianças e adolescentes brasileiros com asma.

Métodos

Entre janeiro e setembro de 2007, selecionamos uma amostra de conveniência composta por 125 crianças e adolescentes com asma, com idades entre 8 e 17 anos. Os indivíduos estavam sendo monitorados, através do Programa de Asma de Porto Alegre, no ambulatório pediátrico de pneumologia do Hospital da Criança Santo Antônio em Porto Alegre, RS, Brasil. Os participantes haviam sido diagnosticados com asma com base em sinais, sintomas, curso clínico e resposta ao tratamento. A classificação de severidade utilizada foi aquela publicada em 2002 pelo National Asthma Council Australia, a qual inclui as seguintes categorias: asma episódica não frequente, asma episódica frequente e asma crônica.(8) Para efeitos deste estudo, incluímos apenas indivíduos classificados com asma episódica frequente, os quais, dessa forma, faziam uso regular de corticosteroides inalatórios. Os pacientes com exacerbações no momento da seleção não foram selecionados para o estudo.

Coletamos dados sobre as seguintes variáveis demográficas: nível socioeconômico; escore da escala de controle de asma de Fischer(9); VEF1, em percentual dos valores previstos, de acordo com os valores de referência estabelecidos por Knudson et al.(10); e funcionamento familiar, de acordo com o Family Adaptability and Cohesion Evaluation Scale III (FACES III).(11)

Para avaliar o nível socioeconômico, usamos critérios brasileiros, baseados na escala da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa, de 1997.(12) Usando os escores obtidos através da combinação de informações educacionais e econômicas, essa escala identifica cinco categorias socioeconômicas, ordenadas em forma decrescente. A escala de controle de asma de Fischer avalia o controle da doença entre as consultas de acompanhamento.(9) Utilizamos uma versão modificada dessa escala durante a consulta para reteste. Os escores variam entre 1 (uso regular de corticosteroides inalatórios, sem exacerbações) e 4 (hospitalização devido a exacerbação). Os testes espirométricos foram feitos com o uso de um espirômetro SpiroDoc® (Medical International Research, Roma, Itália), de acordo com as recomendações de American Thoracic Society/European Respiratory Society.(13) A função pulmonar foi classificada de acordo com o VEF1 (% do previsto) da seguinte forma: normal (80-100%), obstrução leve (60-79%) ou obstrução moderada (41-59%). A escala do FACES III é composta por 20 itens que avaliam o funcionamento familiar através da combinação de dois domínios, coesão e adaptabilidade, o que permite que as famílias sejam classificadas com risco alto, médio ou baixo para distúrbios psíquicos. Utilizamos a versão em português do Brasil do FACES III, que foi validada para uso no Brasil.(14)

As propriedades psicométricas que estudamos foram validade e confiabilidade. A validade foi determinada através de validade convergente, avaliando se os domínios medidos no PAQLQ correlacionavam bem com os domínios equivalentes em um instrumento genérico, o Pediatric Quality of Life Inventory 4.0 (PedsQL 4.0).(15) Os dois instrumentos foram aplicados duas vezes (teste-reteste) através de entrevistas padronizadas, com um intervalo de 4-5 semanas entre os dois testes para evitar um viés de memória.

A confiabilidade do PAQLQ foi avaliada através de: consistência interna (correlações específicas entre itens, de forma total e por domínio), sensibilidade a mudanças (se o instrumento é capaz de identificar diferenças na QVRS entre as entrevistas) e reprodutibilidade (se o instrumento produz resultados semelhantes em momentos diferentes, assumindo-se que as condições sejam as mesmas).(16) Também estimamos a proporção de participantes com os escores mais baixos e mais altos (efeitos mínimo/máximo), para avaliar o poder discriminatório do instrumento.(7) Os efeitos mínimo/máximo, que deve ser < 15%, contribui para avaliar aspectos de validade e confiabilidade.

O PAQLQ é um instrumento específico para avaliar a QVRS em indivíduos portadores de asma, com idades entre 7 e 17 anos.(6) Pode ser autoaplicável ou respondido durante uma entrevista. Para fins deste estudo, adotamos a segunda opção. Originalmente desenvolvido em inglês canadense, o PAQLQ foi traduzido para mais de vinte idiomas e parcialmente ou completamente validado para uso nas culturas correspondentes.(17) É composto por 23 itens distribuídos em três domínios: limitações de atividade (5 itens), sintomas (10 itens) e função emocional (8 itens). Três itens do domínio limitações de atividade são individualizados, sendo que o paciente escolhe em uma lista de atividades/esportes comuns. Todos os itens do PAQLQ são respondidos da mesma forma, através uma escala Likert de 7 pontos, que varia de 1 (gravemente afetado) a 7 (não afetado). Os itens são então somados, e suas médias representam os escores (total e por domínio). A mínima diferença significativa (MDS) estabelecida para esse instrumento é de 0,5 ponto.(18)

O PedsQL 4.0 é um questionário genérico originalmente desenvolvido em inglês americano.(15) A versão para a faixa etária que estudamos é composta por 23 itens, divididos em quatro domínios: funcionamento físico (8 itens), funcionamento emocional (5 itens), funcionamento social (5 itens) e funcionamento escolar (5 itens). Um quinto domínio, funcionamento psicossocial, abrange os escores dos três últimos domínios primários. Cada item tem cinco respostas possíveis em uma escala Likert, que varia de 0 (nunca) a 4 (sempre). Os pontos obtidos são depois transformados em uma escala linear inversa de 0-100, na qual valores maiores indicam uma melhor condição. Usamos a versão em português do Brasil, adaptada e fornecida pelo MAPI Institute a nosso pedido.

Depois que os participantes preencheram os questionários sobre QVRS na consulta de reteste, também aplicamos uma versão modificada do questionário Global Index of Change (GIC) para avaliar a mudança geral entre as duas consultas.(6) O questionário GIC é composto por uma única pergunta sobre a asma em comparação com aquele apresentado na consulta anterior (teste). Havia sete respostas possíveis em uma escala de Likert, variando entre 1 ("muito melhor"), 4 ("mais ou menos igual") e 7 ("muito pior"). Para a análise, os indivíduos foram divididos em dois subgrupos: "com mudanças" (indivíduos que indicaram melhora ou piora entre as duas consultas) e "sem mudanças" (indivíduos que não perceberam mudanças). Isso possibilitou a verificação da sensibilidade a mudanças e da reprodutibilidade do PAQLQ.

O processamento de dados foi feito com o programa Statistical Package for the Social Sciences, versão 13 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA). Para obter uma MDS de 0,5 ponto nos escores totais do PAQLQ entre as duas consultas, o tamanho estimado da amostra foi de 36 indivíduos, com erros alfa e beta de 5% e 20%, respectivamente.

Para cada questionário, as duas entrevistas foram comparadas através de testes t pareados. Usamos o coeficiente de correlação de Pearson (r) para medir a força da associação entre os instrumentos (escores totais e domínios similares). Valores de r > 0,3 foram considerados aceitáveis. Também foram avaliadas as correlações entre os escores do PAQLQ e as diferentes variáveis demográficas.

A consistência interna foi estimada através do cálculo do coeficiente alfa de Cronbach para o PAQLQ durante o teste. A sensibilidade a mudança foi estimada calculando o tamanho do efeito das diferenças entre as duas entrevistas no subgrupo "com mudanças" no GIC. A reprodutibilidade foi estimada através da determinação do coeficiente de correlação intraclasse (CCI) entre as entrevistas no subgrupo "sem mudanças". Os valores do coeficiente alfa de Cronbach e do CCI foram considerados adequados se > 0,7. Para o cálculo do tamanho do efeito, usamos o método que inclui os desvios-padrão do teste e reteste. A interpretação convencional dos valores do tamanho do efeito é a seguinte: 0,2 = pequeno; 0,5 = médio; e 0,8 = grande.

O estudo foi aprovado pela junta institucional de revisão. Os pais dos pacientes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido, e os participantes concordaram verbalmente em participar do estudo. A permissão para o uso dos questionários foi concedida pelos detentores dos direitos dos questionários ou por seus agentes.

Resultados

Participaram do estudo 125 crianças e adolescentes, com idade média de 11 anos. Mais da metade dos participantes era do sexo masculino, e 82% dos participantes apresentavam função pulmonar normal. A maioria das famílias (67,9%) apresentou risco médio ou alto para distúrbios psíquicos, e, em 40% dos casos, o nível socioeconômico foi baixo ou muito baixo. A Tabela 1 apresenta resumidamente as características da amostra de nosso estudo.

A Tabela 2 mostra como os escores do PAQLQ correlacionaram-se com os escores do PedsQL e com as diferentes variáveis demográficas. A correlação entre os instrumentos foi razoavelmente boa em termos de escores totais e de escores para domínios equivalentes, sugerindo uma validade convergente aceitável.(16) As variáveis relacionadas ao nível socioeconômico ou ao risco familiar correlacionaram-se fracamente com os escores do PAQLQ.

A confiabilidade geral e os efeitos mínimo/máximo para o PAQLQ são apresentados na Tabela 3. A média do escore total do PAQLQ foi de 5,18; a média dos escores dos domínios foi mais baixa para o domínio limitações de atividade (4,99) e mais alta para o domínio sintomas de asma (5,20). Embora nenhum dos participantes tenha obtido o menor escore possível para o domínio função emocional, alguns participantes (8,8%) obtiveram o maior escore possível para esse domínio. O coeficiente alfa de Cronbach foi de 0,65 para o domínio limitações de atividade. No entanto, esse foi > 0,7 para todos os outros domínios e para a homogeneidade em cada domínio. Para os dois subgrupos ("com mudanças" e "sem mudanças"), as mudanças ocorridas com o tempo foram consideradas em níveis aceitáveis (Tabela 4). No subgrupo "com mudança", o tamanho do efeito foi de 0,6; no subgrupo "sem mudança", o CCI foi de 0,8. Os valores mais baixos foram observados para a reprodutibilidade no domínio limitações de atividade (0,66) e para a sensibilidade a mudança no domínio sintomas de asma (0,45). As diferenças entre os escores do teste e reteste foram maiores do que a MDS no subgrupo "com mudança".

Discussão

Os resultados psicométricos de nosso teste de campo corroboram a adequação cultural da versão oficial em português do Brasil do PAQLQ, o qual, consequentemente, pode agora ser considerado como validado para uso no Brasil.

Uma versão brasileira diferente e independente do PAQLQ foi validada em 2005.(19) Apesar de algumas objeções metodológicas,(20) os autores certamente investiram bastante tempo e recursos para desenvolver um processo de validação completo a partir do zero. No entanto, a versão resultante não está disponível e não seria aplicável, uma vez que o autor original do PAQLQ apenas permite o uso de versões do MAPI Institute.(17) Isso aumentou a confusão já existente sobre a disponibilidade de uma versão brasileira do questionário, uma vez que, no único estudo de validação do instrumento então publicado, não se utilizou a versão oficial, e, portanto, o questionário resultante não foi disponibilizado por não haver sido autorizado. Além disso, o teste de campo da versão oficial não foi feito desde 2001, e sua adequação psicométrica não pode, portanto, ser confirmada. Esperamos que nossos achados possam dirimir tais discrepâncias.

Há similaridades entre nossos achados psicométricos e aqueles da versão original em inglês, bem como entre nossos resultados e aqueles obtidos com versões em outros idiomas. Uma busca no banco de dados PubMed (março de 2009) por estudos de validação do PAQLQ resultou em 13 artigos, 8 dos quais foram estudos de validação cultural.(19,21-27) Desses, houve dois diferentes relatos de validação da versão em espanhol e um relato sobre a versão brasileira independente mencionada anteriormente. No entanto, diferentes metodologias foram utilizadas nesses estudos para avaliar as propriedades. Embora todas pertençam à ampla teoria clássica dos testes, a lógica de seu uso (ou a sua falta) nem sempre foi explicitada ou detalhada nos estudos. Em um estudo conduzido em Cingapura, por exemplo, apenas a o CCI foi calculado(21); em um dos estudos conduzidos na Espanha,(24) a sensibilidade a mudança foi avaliada através da MDS, de forma semelhante ao que foi feito no estudo original pelo autor original do PAQLQ, não associando o tamanho do efeito. Outro grupo de autores apresentou apenas os intervalos de consistência interna.(23) Em dois outros estudos, apenas a validade convergente do PAQLQ foi relatada(23,27); em apenas um estudo os efeitos mínimo/máximo foram avaliados(23); e ficamos surpresos ao descobrir que, em outro estudo, não houve avaliação psicométrica, uma omissão que, segundo os autores, é justificável, pois haviam encontrado escores similares àqueles relatados no estudo original do PAQLQ e que isso seria suficiente para considerar apropriada a validação por eles feita.(22) Em um estudo de validação, o número de componentes de validade e confiabilidade incluídos devem ser suficientes para fornecer uma visão geral de seu desempenho psicométrico.(7)

As correlações entre os escores do PAQLQ e VEF1 foram similares às relatadas anteriormente,(24-26) e a falta de fortes correlaçãos não é surpresa. Com a melhor compreensão dos diferentes espectros abrangidos pelo tipo e medidas de saúde, correlações da ordem de 0,3-0,4 entre os escores totais de instrumentos de QVRS e VEF1 são hoje consideradas adequadas.(2) No entanto, ao contrário do esperado,(28) o nível socioeconômico correlacionou-se fracamente com os escores do PAQLQ. Embora 40% dos participantes pertencessem aos dois níveis socioeconômicos mais baixos, o escore médio para nossa amostra como um todo foi de 5,1, de um total máximo de 7, o que sugere que o grupo tinha uma QVRS aceitável. O funcionamento apropriado de microsistemas de saúde pode ter sido responsável por esses resultados específicos, uma vez que tais sistemas podem afetar positivamente a qualidade de vida do paciente, como sugerido em diversos estudos, inclusive por um estudo conduzido na cidade de Porto Alegre (RS).(29)

Nosso estudo tem algumas limitações. Tivemos menor número de participantes no subgrupo de pacientes "sem mudanças". Isso pode ter limitado a avaliação da reprodutibilidade. No entanto, a reprodutibilidade dos resultados do PAQLQ desses pacientes estava de acordo com o estado de não mudança por eles relatado. O tamanho de nossa amostra, no entanto, foi maior que o tamanho estimado como necessário para a nossa análise central, além de ser maior que o tamanho das amostras avaliadas em outros estudos de validação do PAQLQ. A decisão de não incluir casos mais graves de asma pode ser considerada outra limitação do estudo. A asma grave é certamente um grande desafio para os médicos e para programas de controle de asma, mas preferimos incluir apenas a categoria mais importante em termos epidemiológicos, a asma episódica frequente, que é equivalente à soma das categorias de asma persistente leve e asma persistente moderada, descritas nas Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma.(30)

Em conclusão, com base em nosso teste de campo, a versão em português do Brasil do PAQLQ, desenvolvida pelo MAPI Institute em 2001, demonstrou boa validade convergente, consistência interna, sensibilidade a mudança, reprodutibilidade e poder discriminatório. Consequentemente, podemos afirmar que o desempenho psicométrico dessa versão do PAQLQ é adequado.

Agradecimentos

Agradecemos ao Prof. José Moreira e ao Sr. Marco A. da Silva (Programa de Pós-Graduação em Pneumologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul) o apoio no decorrer do estudo.

Referências

1. Varni JW, Burwinkle TM, Lane MM. Health-related quality of life measurement in pediatric clinical practice: an appraisal and precept for future research and application. Health Qual Life Outcomes. 2005;3:34.

2. Hahn EA, Cella D, Chassany O, Fairclough DL, Wong GY, Hays RD, et al. Precision of health-related quality-of-life data compared with other clinical measures. Mayo Clin Proc. 2007;82(10):1244-54.

3. Herdman M, Fox-Rushby J, Badia X. 'Equivalence' and the translation and adaptation of health-related quality of life questionnaires. Qual Life Res. 1997;6(3):237-47.

4. Solans M, Pane S, Estrada MD, Serra-Sutton V, Berra S, Herdman M, et al. Health-related quality of life measurement in children and adolescents: a systematic review of generic and disease-specific instruments. Value Health. 2008;11(4):742-64.

5. Varni JW, Burwinkle TM, Rapoff MA, Kamps JL, Olson N. The PedsQL in pediatric asthma: reliability and validity of the Pediatric Quality of Life Inventory generic core scales and asthma module. J Behav Med. 2004;27(3):297-318.

6. Juniper EF, Guyatt GH, Feeny DH, Ferrie PJ, Griffith LE, Townsend M. Measuring quality of life in children with asthma. Qual Life Res. 1996;5(1):35-46.

7. Fayers P, Machin D. Quality of life: the assessment, analysis and interpretation of patient-reporte outcomes. West Suxxes: Wiley; 2007.

8. National Asthma Council. Asthma Management Handbook 2002. South Melbourne: National Asthma Council Australia; 2002.

9. Knudson RJ, Lebowitz MD, Holberg CJ, Burrows B. Changes in the normal maximal expiratory flow-volume curve with growth and aging. Am Rev Respir Dis. 1983;127(6):725-34.

10. Olson DH. Circumplex Model VII: validation studies and FACES III. Fam Process. 1986;25(3):337-51.

11. Mattar FN. Porque os estudos de classificação socioeconômicos não funcionam no Brasil. Anais do XX ENANPAD - Encontro Nacional dos Programas de Pós-graduação em Administração; 9 de outubro de 1996 Sep 23-25; Angra dos Reis, Brasil. Revista Mercado Global. 1997;23(3)8-11.

12. Fischer GB, Halpern R. Acompanhamento ambulatorial e crianças asmáticas: utilização de um escore simplificado. Pesquisa Médicas. 2001;35(1):5

13. Miller MR, Hankinson J, Brusasco V, Burgos F, Casaburi R, Coates A, et al. Standardisation of spirometry. Eur Respir J. 2005;26(2):319-38.

14. Falceto OG, Busnello ED, Bozzetti MC. Validation of diagnostic scales of family functioning for use in primary health care services [Article in Portuguese]. Rev Panam Salud Publica. 2000;7(4):255-63.

15. Varni JW, Seid M, Kurtin PS. PedsQL 4.0: reliability and validity of the Pediatric Quality of Life Inventory version 4.0 generic core scales in healthy and patient populations. Med Care. 2001;39(8):800-12.

16. Streiner DL, Norman GR. Health Measurement Scales: A Practical Guide to Their Development and Use. New York: Oxford University Press; 2003.

17. Juniper EF. Medical questionnaires are copyrighted to ensure that validity is maintained. Chest. 2009;136(4):951-2.

18. Juniper EF, Guyatt GH, Willan A, Griffith LE. Determining a minimal important change in a disease-specific Quality of Life Questionnaire. J Clin Epidemiol. 1994;47(1):81-7.

19. La Scala CS, Naspitz CK, Solé D. Adaptation and validation of the Pediatric Asthma Quality of Life Questionnaire (PAQLQ) in Brazilian asthmatic children and adolescents [Article in Portuguese]. J Pediatr (Rio J). 2005;81(1):54-60.

20. Sarria E. Quality of life in children with asthma [Article in Portuguese]. J Pediatr (Rio J). 2005;81(3):268-9; author reply 269-70.

21. Elizabeth C, Suzanna S, Tim CF, Chi SL, Mital R, Bee-Wah L. Pediatric asthma quality of life questionnaire: validation in children from Singapore. Asian Pac J Allergy Immunol. 1999;17(3):155-61.

22. Reichenberg K, Broberg AG. Quality of life in childhood asthma: use of the Paediatric Asthma Quality of Life Questionnaire in a Swedish sample of children 7 to 9 years old. Acta Paediatr. 2000;89(8):989-95.

23. Badia X, García-Hernández G, Cobos N, López-David C, Nocea G, Roset M, et al. Validity of the Spanish version of the Pediatric Quality of Life Questionnaire for evaluating quality of life in asthmatic children [Article in Spanish]. Med Clin (Barc). 2001;116(15):565-72.

24. Tauler E, Vilagut G, Grau G, González A, Sánchez E, Figueras G, et al. The Spanish version of the paediatric asthma quality of life questionnaire (PAQLQ): metric characteristics and equivalence with the original version. Qual Life Res. 2001;10(1):81-91.

25. Poachanukoon O, Visitsunthorn N, Leurmarnkul W, Vichyanond P. Pediatric Asthma Quality of Life Questionnaire (PAQLQ): validation among asthmatic children in Thailand. Pediatr Allergy Immunol. 2006;17(3):207-12.

26. Raat H, Bueving HJ, de Jongste JC, Grol MH, Juniper EF, van der Wouden JC. Responsiveness, longitudinal- and cross-sectional construct validity of the Pediatric Asthma Quality of Life Questionnaire (PAQLQ) in Dutch children with asthma. Qual Life Res. 2005;14(1):265-72.

27. Yüksel H, Yilmaz O, Kirmaz C, Eser E. Validity and reliability of the Turkish translation of the Pediatric Asthma Quality of Life Questionnaire. Turk J Pediatr. 2009;51(2):154-60.

28. von Rueden U, Gosch A, Rajmil L, Bisegger C, Ravens-Sieberer U. Socioeconomic determinants of health related quality of life in childhood and adolescence: results from a European study. J Epidemiol Community Health. 2006;60(2):130-5.

29. Santos-Rosa M. Rede de apoio social da família da criança asmática e a percepção do grau de satisfação [dissertation]. Porto Alegre: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; 2003.

30. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma. J Bras Pneumol. 2006;32(Suppl 7):S447-S74.

Recebido para publicação em 11/12/2009.

Aprovado, após revisão, em 30/3/2010.

Apoio financeiro: Edgar E. Sarria é bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

  • 1. Varni JW, Burwinkle TM, Lane MM. Health-related quality of life measurement in pediatric clinical practice: an appraisal and precept for future research and application. Health Qual Life Outcomes. 2005;3:34.
  • 2. Hahn EA, Cella D, Chassany O, Fairclough DL, Wong GY, Hays RD, et al. Precision of health-related quality-of-life data compared with other clinical measures. Mayo Clin Proc. 2007;82(10):1244-54.
  • 3. Herdman M, Fox-Rushby J, Badia X. 'Equivalence' and the translation and adaptation of health-related quality of life questionnaires. Qual Life Res. 1997;6(3):237-47.
  • 4. Solans M, Pane S, Estrada MD, Serra-Sutton V, Berra S, Herdman M, et al. Health-related quality of life measurement in children and adolescents: a systematic review of generic and disease-specific instruments. Value Health. 2008;11(4):742-64.
  • 5. Varni JW, Burwinkle TM, Rapoff MA, Kamps JL, Olson N. The PedsQL in pediatric asthma: reliability and validity of the Pediatric Quality of Life Inventory generic core scales and asthma module. J Behav Med. 2004;27(3):297-318.
  • 6. Juniper EF, Guyatt GH, Feeny DH, Ferrie PJ, Griffith LE, Townsend M. Measuring quality of life in children with asthma. Qual Life Res. 1996;5(1):35-46.
  • 7. Fayers P, Machin D. Quality of life: the assessment, analysis and interpretation of patient-reporte outcomes. West Suxxes: Wiley; 2007.
  • 8. National Asthma Council. Asthma Management Handbook 2002. South Melbourne: National Asthma Council Australia; 2002.
  • 9. Knudson RJ, Lebowitz MD, Holberg CJ, Burrows B. Changes in the normal maximal expiratory flow-volume curve with growth and aging. Am Rev Respir Dis. 1983;127(6):725-34.
  • 10. Olson DH. Circumplex Model VII: validation studies and FACES III. Fam Process. 1986;25(3):337-51.
  • 11. Mattar FN. Porque os estudos de classificação socioeconômicos não funcionam no Brasil. Anais do XX ENANPAD - Encontro Nacional dos Programas de Pós-graduação em Administração; 9 de outubro de 1996 Sep 23-25; Angra dos Reis, Brasil. Revista Mercado Global. 1997;23(3)8-11.
  • 12. Fischer GB, Halpern R. Acompanhamento ambulatorial e crianças asmáticas: utilização de um escore simplificado. Pesquisa Médicas. 2001;35(1):5
  • 13. Miller MR, Hankinson J, Brusasco V, Burgos F, Casaburi R, Coates A, et al. Standardisation of spirometry. Eur Respir J. 2005;26(2):319-38.
  • 15. Varni JW, Seid M, Kurtin PS. PedsQL 4.0: reliability and validity of the Pediatric Quality of Life Inventory version 4.0 generic core scales in healthy and patient populations. Med Care. 2001;39(8):800-12.
  • 16. Streiner DL, Norman GR. Health Measurement Scales: A Practical Guide to Their Development and Use. New York: Oxford University Press; 2003.
  • 17. Juniper EF. Medical questionnaires are copyrighted to ensure that validity is maintained. Chest. 2009;136(4):951-2.
  • 18. Juniper EF, Guyatt GH, Willan A, Griffith LE. Determining a minimal important change in a disease-specific Quality of Life Questionnaire. J Clin Epidemiol. 1994;47(1):81-7.
  • 21. Elizabeth C, Suzanna S, Tim CF, Chi SL, Mital R, Bee-Wah L. Pediatric asthma quality of life questionnaire: validation in children from Singapore. Asian Pac J Allergy Immunol. 1999;17(3):155-61.
  • 22. Reichenberg K, Broberg AG. Quality of life in childhood asthma: use of the Paediatric Asthma Quality of Life Questionnaire in a Swedish sample of children 7 to 9 years old. Acta Paediatr. 2000;89(8):989-95.
  • 24. Tauler E, Vilagut G, Grau G, González A, Sánchez E, Figueras G, et al. The Spanish version of the paediatric asthma quality of life questionnaire (PAQLQ): metric characteristics and equivalence with the original version. Qual Life Res. 2001;10(1):81-91.
  • 25. Poachanukoon O, Visitsunthorn N, Leurmarnkul W, Vichyanond P. Pediatric Asthma Quality of Life Questionnaire (PAQLQ): validation among asthmatic children in Thailand. Pediatr Allergy Immunol. 2006;17(3):207-12.
  • 26. Raat H, Bueving HJ, de Jongste JC, Grol MH, Juniper EF, van der Wouden JC. Responsiveness, longitudinal- and cross-sectional construct validity of the Pediatric Asthma Quality of Life Questionnaire (PAQLQ) in Dutch children with asthma. Qual Life Res. 2005;14(1):265-72.
  • 27. Yüksel H, Yilmaz O, Kirmaz C, Eser E. Validity and reliability of the Turkish translation of the Pediatric Asthma Quality of Life Questionnaire. Turk J Pediatr. 2009;51(2):154-60.
  • 28. von Rueden U, Gosch A, Rajmil L, Bisegger C, Ravens-Sieberer U. Socioeconomic determinants of health related quality of life in childhood and adolescence: results from a European study. J Epidemiol Community Health. 2006;60(2):130-5.
  • 29. Santos-Rosa M. Rede de apoio social da família da criança asmática e a percepção do grau de satisfação [dissertation]. Porto Alegre: Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; 2003.
  • 30. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma. J Bras Pneumol. 2006;32(Suppl 7):S447-S74.
  • Endereço para correspondência:
    Edgar E. Sarria
    8270 Bentwood E. C. Drive, apartment 3-D
    Indianapolis, IN, 46268, USA
    Tel 55 51 3214-8646
    E-mail:
  • *
    Trabalho realizado no Serviço de Pneumologia Pediátrica, Hospital da Criança Santo Antônio, Porto Alegre (RS) Brasil.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      01 Set 2010
    • Data do Fascículo
      Ago 2010

    Histórico

    • Recebido
      11 Dez 2009
    • Aceito
      30 Mar 2010
    Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia SCS Quadra 1, Bl. K salas 203/204, 70398-900 - Brasília - DF - Brasil, Fone/Fax: 0800 61 6218 ramal 211, (55 61)3245-1030/6218 ramal 211 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: jbp@sbpt.org.br