Ao Editor:
A reconstrução da parede torácica se torna necessária quando
há defeitos de parede com diâmetro maior que 5 cm que comprometam a
dinâmica respiratória. Seu objetivo é restaurar a integridade da
parede, assim como manter a impermeabilização pleural, o padrão
estético do contorno do tórax e a dinâmica respiratória.
Além disso, objetiva-se proteger os órgãos vitais intratorácicos,
evitando a herniação pulmonar e a respiração paradoxal e
preservando a complacência pulmonar.(
11. de Carvalho MV, Rebeis EB, Marchi E. Reconstrução da parede
torácica nos defeitos adquiridos. Rev Col Bras Cir.
2010;37(1):64-9.
https://doi.org/10.1590/S0100-6991201000...
,
22. Fernandez A. Técnicas de reconstrução da parede
torácica. In: Camargo JJ, Pinto Filho DR, editors. Tópicos de
atualização em cirurgia torácica. São Paulo: SBCT; 2011. p.
520-7.
)
A indicação para a reconstrução óssea da parede
torácica tem relação com o tamanho e a localização do
defeito. Em defeitos na parede anterior, lateral e esternal, torna-se necessária
a reconstrução, enquanto defeitos na parede posterior podem ser recobertos
pelos músculos posteriores ou escápula, sendo desnecessária a
utilização de próteses.(
11. de Carvalho MV, Rebeis EB, Marchi E. Reconstrução da parede
torácica nos defeitos adquiridos. Rev Col Bras Cir.
2010;37(1):64-9.
https://doi.org/10.1590/S0100-6991201000...
)
Ainda não há consenso quanto ao material ideal a ser utilizado em reconstrução de arcos costais. A literatura sugere a utilização da prótese de placas de titânio (STRATOSTM, Strasbourg Thoracic Osteosynthesis System; Diagnostic Medical Systems, Pérols, França) para essa finalidade e, por tal motivo, relatamos o caso de uma paciente do sexo feminino, 25 anos, com queixa de dor torácica e dispneia discreta há cerca de um ano, relatando um aumento de volume do rebordo costal esquerdo.
Ao exame físico, foi observada uma tumoração em terço inferior da parede torácica anterior, com comprometimento da transição toracoabdominal à esquerda. A TC axial do tórax demonstrou uma tumoração de partes moles comprometendo a região do rebordo costal anterior esquerdo, com extensão para região abdominal e compressão do lobo hepático esquerdo, pericárdio anterior e parênquima pulmonar do lobo inferior esquerdo; entretanto, sem sinais de invasão das estruturas. A tumoração media 12,0 × 11,0 × 7,5 cm.
A paciente foi submetida à ressecção da parede torácica, que incluiu tecidos moles e a porção anterior dos 6º, 7º e 8º arcos costais e o rebordo costal (Figura 1A). A análise histopatológica do tumor demonstrou ser um tumor desmoide - neoplasia benigna rara, não encapsulada, com alto poder infiltrativo local e alta taxa de recidiva após ressecção cirúrgica.( 33. Oliveira AF, Vieira LJ, Almeida EP, Nascimento AC, Guimarães RG, Costa RR. Tumor desmóide de parede torácica recidivado. HU Rev. 2010;36(4):344-7. ) A reconstrução da parede torácica foi realizada com tela PHYSIOMESHTM (ETHICON(r); Johnson & Johnson, Somerville, NJ, EUA) e três placas de titânio, o STRATOSTM (Figura 1B).
Imagens da ressecção de tumor desmoide e reconstrução de parede torácica. Em A, tumoração do rebordo costal esquerdo exposta durante o ato operatório, incluindo arcos costais, músculos, porção distal do esterno e diafragma. Em B, reconstrução da parede com tela de duas camadas e barras de titânio.
O material ideal para a reconstrução deve apresentar as seguintes
características: adaptabilidade, durabilidade, transparência ao raio X,
mínima reação inflamatória e resistência à
infecção. Os materiais geralmente utilizados são nylon, silicone,
acrílico, Silastic(r) (Dow Corning Corp., Midland, MI, EUA), tela de
Prolene(r), tela de Vicryl(r) (poligalactina;
ETHICON(r)), Gore-Tex(r) (politetrafluoretileno; Gore
Company, Flagstaff, AZ, EUA) e tela de Marlex (polipropileno).(
11. de Carvalho MV, Rebeis EB, Marchi E. Reconstrução da parede
torácica nos defeitos adquiridos. Rev Col Bras Cir.
2010;37(1):64-9.
https://doi.org/10.1590/S0100-6991201000...
,
22. Fernandez A. Técnicas de reconstrução da parede
torácica. In: Camargo JJ, Pinto Filho DR, editors. Tópicos de
atualização em cirurgia torácica. São Paulo: SBCT; 2011. p.
520-7.
)
As telas de Marlex são os materiais mais utilizados atualmente, pois são fáceis de manipular, permeáveis e possuem alta resistência, durabilidade e baixo custo; além disso, são pouco suscetíveis à infecção. Porém, em contato com o pulmão, promovem aderências e intensa reação fibrótica que dificulta possíveis reoperações torácicas, além de não propiciarem uma adequada sustentação da parede torácica.( 22. Fernandez A. Técnicas de reconstrução da parede torácica. In: Camargo JJ, Pinto Filho DR, editors. Tópicos de atualização em cirurgia torácica. São Paulo: SBCT; 2011. p. 520-7. )
A tela utilizada em nossa paciente (PHYSIOMESHTM) é composta por duas camadas: uma película de Monocryl(r) (poliglecaprone 25), que é parcialmente absorvível e reduz a aderência aos órgãos viscerais (no presente caso, o pulmão, o diafragma e o pericárdio), facilitando uma nova intervenção cirúrgica caso seja necessária; e uma película de Prolene(r) (polipropileno), compatível com a resistência necessária para a parede torácica, proporcionando uma cicatrização confortável. Essa tela é colocada entre o pulmão e as próteses de titânio, evitando a herniação pulmonar e protegendo o pulmão do contato com as placas.
O STRATOSTM é composto por grampos e barras de titânio, que
formam um sistema protético vertical expansível. Tem sido utilizado
recentemente para a fixação de fraturas de costela e na
reconstrução torácica após a ressecção de
tumores.(
44. Billè A, Okiror L, Karenovics W, Routledge T. Experience with
titanium devices for rib fixation and coverage of chest wall defects. Interact
Cardiovasc Thorac Surg. 2012;15(4):588-95.
https://doi.org/10.1093/icvts/ivs327...
)
As placas de titânio, quando integradas à parede torácica, formam uma
camada do óxido altamente resistente à corrosão. Possuem a maior
relação força-peso dentre os metais, ou seja, têm menor peso, mas
mantêm uma rigidez semelhante à dos arcos costais. Apresentam a facilidade
de integrar-se com os ossos, impedindo o desprendimento das costelas ao longo do
tempo, e possuem maior resistência a infecções. Não causam
interferência em exames de imagem e não impedem a realização de
ressonância nuclear magnética.(
55. Connar AS, Qureshi N, Smith I, Wells FC, Reisberg E, Wihlm JM. A
novel titanium rib bridge system for chest wall reconstruction. Ann Thorac Surg.
2009;87(5):e46-8.
https://doi.org/10.1016/j.athoracsur.200...
)
Os casos já publicados de pacientes que foram operados e receberam o
STRATOSTM demonstraram que seu material não interfere na chance de
recorrência de neoplasias no local. Alguns autores utilizaram o
STRATOSTM em um paciente com sarcoma de Ewing de proporções
semelhantes ao tumor em nossa paciente e, após 21 meses de acompanhamento, o
paciente não apresentou recorrência da neoplasia.(
66. Billè A, Gisabella M, Errico L, Borasio P. A suitable system of
reconstruction with titanium rib prosthesis after chest wall resection for Ewing
sarcoma. Interact Cardiovasc Thorac Surg. 2011;12(2):293-6.
https://doi.org/10.1510/icvts.2010.24590...
)
Não há estudos que definam o STRATOSTM como o método ideal na reconstrução de parede torácica; porém, esse é tecnicamente simples e bem tolerado. Além disso, outros relatos de caso descritos e artigos que comparam esse sistema com as técnicas mais antigas relatam uma melhor restauração do contorno dos arcos costais (Figura 2), preservação da mecânica da respiração e maior conforto. A manutenção da simetria da parede torácica evita a deformidade torácica local, assim como a escoliose observada em longo prazo em pacientes com colapso de uma das porções do tórax.(4,6)
Aspecto da paciente no sexto mês de pós-operatório. Observa-se contorno do rebordo costal mantido, estável e simétrico.
Salientamos a importância do presente relato, visto que é o primeiro descrito na literatura nacional pelo que sabemos. A opção de um substituto para os arcos costais amplia as chances de ressecções maiores da parede torácica, fato importante para o tratamento de tumores com margens oncológicas.
References
-
1de Carvalho MV, Rebeis EB, Marchi E. Reconstrução da parede torácica nos defeitos adquiridos. Rev Col Bras Cir. 2010;37(1):64-9.
» https://doi.org/10.1590/S0100-69912010000100013 -
2Fernandez A. Técnicas de reconstrução da parede torácica. In: Camargo JJ, Pinto Filho DR, editors. Tópicos de atualização em cirurgia torácica. São Paulo: SBCT; 2011. p. 520-7.
-
3Oliveira AF, Vieira LJ, Almeida EP, Nascimento AC, Guimarães RG, Costa RR. Tumor desmóide de parede torácica recidivado. HU Rev. 2010;36(4):344-7.
-
4Billè A, Okiror L, Karenovics W, Routledge T. Experience with titanium devices for rib fixation and coverage of chest wall defects. Interact Cardiovasc Thorac Surg. 2012;15(4):588-95.
» https://doi.org/10.1093/icvts/ivs327 -
5Connar AS, Qureshi N, Smith I, Wells FC, Reisberg E, Wihlm JM. A novel titanium rib bridge system for chest wall reconstruction. Ann Thorac Surg. 2009;87(5):e46-8.
» https://doi.org/10.1016/j.athoracsur.2009.01.069 -
6Billè A, Gisabella M, Errico L, Borasio P. A suitable system of reconstruction with titanium rib prosthesis after chest wall resection for Ewing sarcoma. Interact Cardiovasc Thorac Surg. 2011;12(2):293-6.
» https://doi.org/10.1510/icvts.2010.245902
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Mar-Apr 2014
Histórico
-
Recebido
10 Out 2013 -
Aceito
15 Out 2013