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Variabilidade do tempo de início do sono e características do sono durante a semana e o fim de semana em pacientes com DPOC

RESUMO

Objetivo:

Avaliar a variabilidade do tempo de início do sono, bem como as características do sono durante a semana e o fim de semana, em indivíduos com DPOC moderada a grave.

Métodos:

O sono foi avaliado objetivamente por meio de um monitor de atividade/sono durante sete noites consecutivas em indivíduos com DPOC. Para a análise, os indivíduos foram divididos em dois grupos, de acordo com a variabilidade do tempo de início do sono, caracterizada pelo desvio-padrão do tempo de início do sono (TISV) ≥ 60 min ou < 60 min em um mesmo indivíduo.

Resultados:

A amostra foi composta por 55 indivíduos [28 homens; média de idade = 66 ± 8 anos; mediana do VEF1 em % do previsto = 55 (38-62)]. Em comparação com o grupo TISV<60min (n = 24), o grupo TISV≥60min (n = 31) apresentou menor tempo total de sono (5,1 ± 1,3 h vs. 6,0 ± 1,3 h; p = 0,006), menor eficiência do sono (73 ± 12% vs. 65 ± 13%; p = 0,030), maior tempo de vigília após o início do sono (155 ± 66 min vs. 115 ± 52 min; p = 0,023), blocos de vigília mais longos [19 (16-28) min vs. 16 (13-22) min; p = 0,025] e maior número de passos dados à noite [143 (104-213) vs. 80 (59-135); p = 0,002]. Em geral, as características do sono foram ruins independentemente do dia da semana; a única diferença significativa foi que os participantes acordaram cerca de 30 min mais tarde nos fins de semana do que nos dias de semana (p = 0,013).

Conclusões:

O tempo de início do sono variou mais de 1 h em uma semana-padrão na maioria dos indivíduos com DPOC da amostra, e um início de sono mais irregular indicou má qualidade do sono tanto nos dias de semana como nos fins de semana. A orientação a respeito da higiene do sono pode ser benéfica se for integrada à atenção à saúde desses pacientes.

Descritores:
Doença pulmonar obstrutiva crônica; Sono; Actigrafia

ABSTRACT

Objective:

To evaluate sleep-onset time variability, as well as sleep characteristics on weekday and weekend nights, in individuals with moderate-to-severe COPD.

Methods:

Sleep was objectively assessed by an activity/sleep monitor for seven consecutive nights in individuals with COPD. For analysis, individuals were divided into two groups according to sleep-onset time variability results, characterized by intrasubject standard deviation of sleep-onset time (SOTV) ≥ 60 min or < 60 min.

Results:

The sample comprised 55 individuals (28 males; mean age = 66 ± 8 years; and median FEV1 % of predicted = 55 [38-62]). When compared with the SOTV<60min group (n = 24), the SOTV≥60min group (n = 31) presented shorter total sleep time (5.1 ± 1.3 h vs. 6.0 ± 1.3 h; p = 0.006), lower sleep efficiency (73 ± 12% vs. 65 ± 13%; p = 0.030), longer wake time after sleep onset (155 ± 66 min vs. 115 ± 52 min; p = 0.023), longer duration of wake bouts (19 [16-28] min vs. 16 [13-22] min; p = 0.025), and higher number of steps at night (143 [104-213] vs. 80 [59-135]; p = 0.002). In general, sleep characteristics were poor regardless of the day of the week, the only significant difference being that the participants woke up about 30 min later on weekends than on weekdays (p = 0.013).

Conclusions:

Sleep-onset time varied over 1 h in a standard week in the majority of individuals with COPD in this sample, and a more irregular sleep onset indicated poor sleep quality both on weekdays and weekends. Sleep hygiene guidance could benefit these individuals if it is integrated with their health care.

Keywords:
Pulmonary disease, chronic obstructive; Sleep; Actigraphy

INTRODUÇÃO

Uma pessoa passa aproximadamente um terço de sua vida dormindo, e a boa qualidade do sono é importante tanto para a saúde física como para a saúde mental, especialmente em pacientes com doenças crônicas.11 Vanfleteren LE, Beghe B, Andersson A, Hansson D, Fabbri LM, Grote L. Multimorbidity in COPD, does sleep matter?. Eur J Intern Med. 2020;73:7-15. https://doi.org/10.1016/j.ejim.2019.12.032
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A perturbação do sono é comum em indivíduos com DPOC22 Agusti A, Hedner J, Marin JM, Barbé F, Cazzola M, Rennard S. Night-time symptoms: a forgotten dimension of COPD. Eur Respir Rev. 2011;20(121):183-194. https://doi.org/10.1183/09059180.00004311
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,33 McNicholas WT, Verbraecken J, Marin JM. Sleep disorders in COPD: the forgotten dimension. Eur Respir Rev. 2013;22(129):365-375. https://doi.org/10.1183/09059180.00003213
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e é uma das principais queixas desses pacientes, atrás apenas de dispneia e fadiga.44 Kinsman RA, Yaroush RA, Fernandez E, Dirks JF, Schocket M, Fukuhara J. Symptoms and experiences in chronic bronchitis and emphysema. Chest. 1983;83(5):755-761. https://doi.org/10.1378/chest.83.5.755
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As queixas mais comuns a respeito do sono são a dificuldade em adormecer, despertares noturnos e sono não reparador.55 Budhiraja R, Parthasarathy S, Budhiraja P, Habib MP, Wendel C, Quan SF. Insomnia in patients with COPD. Sleep. 2012;35(3):369-375. https://doi.org/10.5665/sleep.1698
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,66 Price D, Small M, Milligan G, Higgins V, Gil EG, Estruch J. Impact of night-time symptoms in COPD: a real-world study in five European countries. Int J Chron Obstruct Pulmon Dis. 2013;8:595-603. https://doi.org/10.2147/COPD.S48570
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Muitos indivíduos com DPOC apresentam problemas relacionados à qualidade do sono, tais como diminuição da eficiência do sono, aumento da latência do sono e fragmentação da arquitetura do sono, independentemente da gravidade da limitação do fluxo aéreo.77 Mulloy E, McNicholas WT. Ventilation and gas exchange during sleep and exercise in severe COPD. Chest. 1996;109(2):387-394. https://doi.org/10.1378/chest.109.2.387
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Apesar da alta frequência desses distúrbios do sono e de sua possível influência nos desfechos clínicos, há poucos dados na literatura sobre a caracterização objetiva do sono em indivíduos com DPOC.

Estudos anteriores investigaram a relação entre regularidade do sono e anormalidades metabólicas,88 Spruyt K, Molfese DL, Gozal D. Sleep duration, sleep regularity, body weight, and metabolic homeostasis in school-aged children. Pediatrics. 2011;127(2):e345-e352. https://doi.org/10.1542/peds.2010-0497
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obesidade99 He F, Bixler EO, Berg A, Imamura Kawasawa Y, Vgontzas AN, Fernandez-Mendoza J, et al. Habitual sleep variability, not sleep duration, is associated with caloric intake in adolescents. Sleep Med. 2015;16(7):856-861. https://doi.org/10.1016/j.sleep.2015.03.004
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e risco de doenças cardiovasculares.1010 Huang T, Mariani S, Redline S. Sleep Irregularity and Risk of Cardiovascular Events: The Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis. J Am Coll Cardiol. 2020;75(9):991-999. https://doi.org/10.1016/j.jacc.2019.12.054
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,1111 Huang T, Redline S. Cross-sectional and Prospective Associations of Actigraphy-Assessed Sleep Regularity With Metabolic Abnormalities: The Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis. Diabetes Care. 2019;42(8):1422-1429. https://doi.org/10.2337/dc19-0596
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Em crianças, há evidências de que a baixa regularidade do sono (ou alta variabilidade) esteja relacionada a níveis plasmáticos alterados de insulina, lipoproteína de baixa densidade e proteína C reativa.88 Spruyt K, Molfese DL, Gozal D. Sleep duration, sleep regularity, body weight, and metabolic homeostasis in school-aged children. Pediatrics. 2011;127(2):e345-e352. https://doi.org/10.1542/peds.2010-0497
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Em adolescentes, a alta variabilidade do sono está relacionada ao aumento do consumo de gorduras e carboidratos, bem como ao aumento do consumo de lanches após o jantar, ambos os quais estão diretamente relacionados à obesidade.99 He F, Bixler EO, Berg A, Imamura Kawasawa Y, Vgontzas AN, Fernandez-Mendoza J, et al. Habitual sleep variability, not sleep duration, is associated with caloric intake in adolescents. Sleep Med. 2015;16(7):856-861. https://doi.org/10.1016/j.sleep.2015.03.004
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Além disso, nos idosos, a alta variabilidade do sono está relacionada ao aumento tanto do risco de doenças cardiovasculares1010 Huang T, Mariani S, Redline S. Sleep Irregularity and Risk of Cardiovascular Events: The Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis. J Am Coll Cardiol. 2020;75(9):991-999. https://doi.org/10.1016/j.jacc.2019.12.054
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como da prevalência e incidência de anormalidades metabólicas.1111 Huang T, Redline S. Cross-sectional and Prospective Associations of Actigraphy-Assessed Sleep Regularity With Metabolic Abnormalities: The Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis. Diabetes Care. 2019;42(8):1422-1429. https://doi.org/10.2337/dc19-0596
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Há também evidências de que a irregularidade do sono esteja relacionada a um risco maior de problemas neurológicos, respiratórios e gastrointestinais, além de dor e depressão.1212 Slavish DC, Taylor DJ, Lichstein KL. Intraindividual variability in sleep and comorbid medical and mental health conditions. Sleep. 2019;42(6):zsz052. https://doi.org/10.1093/sleep/zsz052
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A irregularidade do sono pode ser medida pela variabilidade do tempo de início do sono (isto é, o desvio-padrão do tempo de início do sono em um mesmo indivíduo). Embora o interesse a respeito desse tema em diferentes populações tenha aumentado, parece-nos que não há estudos nos quais se tenha descrito e explorado a variabilidade do tempo de início do sono em indivíduos com DPOC. Além disso, apenas um estudo investigou as diferenças entre os dias de semana e os fins de semana quanto às características do sono,1313 Spina G, Spruit MA, Alison J, Benzo RP, Calverley PMA, Clarenbach CF, et al. Analysis of nocturnal actigraphic sleep measures in patients with COPD and their association with daytime physical activity. Thorax. 2017;72(8):694-701. https://doi.org/10.1136/thoraxjnl-2016-208900
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o que significa que é preciso investigar o tema a fundo. Portanto, os objetivos deste estudo foram analisar o impacto da variabilidade do tempo de início do sono na quantidade e qualidade do sono em indivíduos com DPOC moderada a grave e descrever as características do sono durante a semana e o fim de semana nessa população.

MÉTODOS

Trata-se de uma análise transversal de dados retrospectivos referentes a uma amostra de conveniência composta por pacientes avaliados no Laboratório de Pesquisa em Fisioterapia Pulmonar da Universidade Estadual de Londrina, em Londrina (PR). Os indivíduos incluídos nessas análises exclusivamente basais participaram posteriormente de um estudo observacional longitudinal maior sem relação com este.1414 Rodrigues A, Camillo CA, Furlanetto KC, Paes T, Morita AA, Spositon T, et al. Cluster analysis identifying patients with COPD at high risk of 2-year all-cause mortality. Chron Respir Dis. 2019;16:1479972318809452. https://doi.org/10.1177/1479972318809452
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O estudo maior foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da instituição (Protocolo n. 123/09), e todos os participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido.

Os critérios de inclusão foram diagnóstico de DPOC em conformidade com os critérios da GOLD,1515 Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease [homepage on the Internet]. Bethesda: GOLD [cited 2021 Oct 1]. Global strategy for the diagnosis, management, and prevention of chronic obstructive pulmonary disease 2021 report. Available from: https://goldcopd.org
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ausência de infecções ou exacerbações nos últimos três meses e ausência de comorbidades graves que interferissem nas avaliações. O critério de exclusão foi não ter alcançado o tempo mínimo de uso diário do monitor de atividade/sono, conforme descrito a seguir.

Avaliações

A função pulmonar foi avaliada por meio de um espirômetro portátil (Spirobank G; MIR, Roma, Itália), em conformidade com as diretrizes da American Thoracic Society1616 Miller MR, Crapo R, Hankinson J, Brusasco V, Burgos F, Casaburi R, et al. General considerations for lung function testing. Eur Respir J. 2005;26(1):153-161. https://doi.org/10.1183/09031936.05.00034505
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e os valores de referência para a população brasileira.1717 Pereira CA, Sato T, Rodrigues SC. New reference values for forced spirometry in white adults in Brazil. J Bras Pneumol. 2007;33(4):397-406. https://doi.org/10.1590/S1806-37132007000400008
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Para a caracterização, a capacidade de exercício foi avaliada por meio do teste de caminhada de seis minutos. O teste foi realizado em conformidade com as normas internacionais1818 Holland AE, Spruit MA, Troosters T, Puhan MA, Pepin V, Saey D, et al. An official European Respiratory Society/American Thoracic Society technical standard: field walking tests in chronic respiratory disease. Eur Respir J. 2014;44(6):1428-1446. https://doi.org/10.1183/09031936.00150314
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e os valores de referência para a população brasileira.1919 Britto RR, Probst VS, de Andrade AF, Samora GA, Hernandes NA, Marinho PE, et al. Reference equations for the six-minute walk distance based on a Brazilian multicenter study. Braz J Phys Ther. 2013;17(6):556-563. https://doi.org/10.1590/S1413-35552012005000122
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O sono foi avaliado objetivamente pelo monitor de atividade/sono SenseWear ® Pro2 Armband (BodyMedia, Pittsburgh, PA, EUA). Os indivíduos foram orientados a usar o monitor 24 horas por dia durante sete dias e noites consecutivos; entretanto, os dados referentes à atividade física diurna não foram analisados neste estudo. O dispositivo é um monitor pequeno e leve, com múltiplos sensores, para ser usado na região superior do braço direito (no tríceps braquial).2020 Hill K, Dolmage TE, Woon L, Goldstein R, Brooks D. Measurement properties of the SenseWear armband in adults with chronic obstructive pulmonary disease. Thorax. 2010;65(6):486-491. https://doi.org/10.1136/thx.2009.128702
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O uso do monitor no corpo durante no mínimo 22 h caracterizou um dia válido de avaliação, e o monitor de sono deveria ser usado durante pelo menos quatro dias válidos de avaliação, inclusive sábado e domingo.

As seguintes variáveis foram usadas para avaliar o sono: tempo total na cama, tempo total de sono (TTS), eficiência do sono, wake after sleep onset (WASO, tempo de vigília após o início do sono), número de blocos de sono, duração dos blocos de sono, número de blocos de vigília, duração dos blocos de vigília, hora de dormir, hora de acordar e passos à noite (Quadro 1). O desvio-padrão de sete dias do tempo de início do sono foi calculado para quantificar a regularidade do sono. Os registros actigráficos foram computados como vigília ou sono a cada um minuto com base no aumento ou diminuição da contagem de atividade.

Quadro 1
Medidas de sono noturno derivadas de dados actigráficos.

Analisamos as características do sono como a média de todas as avaliações válidas para cada indivíduo, bem como a comparação dos dias de semana e fins de semana. Além disso, os indivíduos foram divididos em dois grupos, de acordo com a variabilidade do tempo de início do sono: o grupo com maior variabilidade do tempo de início do sono em cada noite, caracterizada por um desvio-padrão do tempo de início do sono (TISv) maior ou igual a 60 min (TISv ≥ 60 min) e o grupo com menor variabilidade do tempo de início do sono em cada noite (TISv < 60 min). Esse ponto de corte já foi usado na literatura para avaliar a variabilidade do tempo de início do sono em adultos e idosos.1010 Huang T, Mariani S, Redline S. Sleep Irregularity and Risk of Cardiovascular Events: The Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis. J Am Coll Cardiol. 2020;75(9):991-999. https://doi.org/10.1016/j.jacc.2019.12.054
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,1111 Huang T, Redline S. Cross-sectional and Prospective Associations of Actigraphy-Assessed Sleep Regularity With Metabolic Abnormalities: The Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis. Diabetes Care. 2019;42(8):1422-1429. https://doi.org/10.2337/dc19-0596
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Análise estatística

A análise da distribuição dos dados foi realizada por meio do teste de Shapiro-Wilk. Os dados numéricos com distribuição normal foram descritos em forma de média ± desvio-padrão e comparados por meio do teste t, ao passo que os dados sem distribuição normal foram descritos em forma de mediana [IIQ] e comparados por meio do teste de Mann-Whitney. As variáveis categóricas foram comparadas por meio do teste do qui-quadrado. As correlações entre a variabilidade do sono e os desfechos clínicos foram investigadas por meio dos coeficientes de Pearson ou Spearman, de acordo com a normalidade dos dados. As análises estatísticas foram realizadas com os programas IBM SPSS Statistics, versão 21.0 (IBM Corporation, Armonk, NY, EUA) e GraphPad Prism, versão 6.0 (GraphPad Software, Inc., San Diego, CA). O nível de significância adotado foi de p < 0,05.

RESULTADOS

A amostra original foi composta por 58 indivíduos, 3 dos quais foram excluídos porque não alcançaram o número mínimo de dias válidos para a avaliação do sono. Portanto, a amostra final foi composta por 55 indivíduos com DPOC moderada a grave conforme a definição da GOLD.1515 Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease [homepage on the Internet]. Bethesda: GOLD [cited 2021 Oct 1]. Global strategy for the diagnosis, management, and prevention of chronic obstructive pulmonary disease 2021 report. Available from: https://goldcopd.org
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A média do número de dias e do tempo em que os participantes usaram o monitor foi de 6,78 ± 0,6 dias e 23,3 ± 0,4 h/dia. A mediana da variabilidade do tempo de início do sono na amostra geral foi de 65 [47-96] min. Em geral, a amostra caracterizou-se por idosos com média de IMC = 26 ± 5 kg/m2 e capacidade de exercício relativamente preservada (Tabela 1).

Tabela 1
Características demográficas e clínicas dos participantes (N = 55).a

Características do sono

A Tabela 2 mostra que, em geral, os indivíduos passaram uma mediana de aproximadamente 8 h deitados na cama para dormir à noite, com eficiência do sono e TTS de aproximadamente 69% e 5,6 h, respectivamente. A comparação das características do sono mostrou que os pacientes acordaram aproximadamente meia hora mais tarde nos fins de semana do que nos dias de semana. Não houve diferenças estatisticamente significativas entre os dias de semana e os fins de semana quanto ao tempo total na cama, TTS, eficiência do sono, WASO, latência do sono, número e duração dos blocos de sono e vigília, hora de dormir e passos dados à noite (Tabela 2).

Tabela 2
Características do sono descritas em forma de média por noite nos dias de semana (segunda a sexta; N = 310 noites) e fins de semana (sábado e domingo; N = 113).a

Variabilidade do tempo de início do sono

Os grupos TISV≥60min e TISV<60min foram compostos por 31 indivíduos (56% da amostra total) e 24 indivíduos (44% da amostra total), respectivamente. A Tabela 3 mostra que não houve diferenças significativas entre os grupos quanto às características clínicas, parâmetros de função pulmonar e comorbidades. Além disso, a Tabela 4 mostra que o grupo TISV≥60min apresentou piores indicadores de quantidade e qualidade do sono, tais como menor TTS, menor eficiência do sono, maior WASO, blocos mais longos de vigília e maior número de passos dados à noite em comparação com o grupo TISV<60min. A Figura 1 mostra um exemplo de dois pacientes representativos, um de cada grupo. Não houve correlações significativas entre a variabilidade do sono e os seguintes desfechos: IMC, história de hospitalização e presença de hipertensão ou diabetes mellitus.

Tabela 3
Características demográficas e clínicas dos indivíduos com DPOC, pelo ponto de corte de variabilidade do tempo de início do sono = 60 min.a
Tabela 4
Comparação das características do sono dos participantes, pelo ponto de corte de variabilidade do tempo de início do sono = 60 min.a

Figura 1
Representação dos padrões de sono ao longo de sete dias em dois indivíduos com DPOC. Em A, indivíduo do grupo TISv≥60min (sexo masculino; 76 anos; VEF1 = 57% do previsto; TISv = 131 min). Em B, indivíduo do grupo TISv<60min (sexo masculino; 75 anos; VEF1 = 40% do previsto; TISv = 18 min). Cada barra representa o tempo total na cama em cada dia da semana; a barra cinza-claro representa a proporção de tempo gasto acordado durante o tempo total na cama, e a barra cinza-escuro representa a proporção de tempo gasto dormindo durante o tempo total na cama. Nota-se que em A há uma variação substancial do tempo de início do sono ao longo da semana, ao passo que em B o horário de sono mantém-se regular. Além disso, a proporção de sono parece ser menor em A do que em B. TISV: variabilidade do tempo de início do sono.

DISCUSSÃO

Até onde sabemos, este é o primeiro estudo a avaliar objetivamente as características do sono de indivíduos com DPOC por meio da comparação dos dias de semana e fins de semana e da medição da variabilidade do tempo de início do sono. Em geral, os indivíduos avaliados mantiveram seus padrões de sono ao longo de toda a semana; a única diferença estatisticamente significativa foi o fato de que acordaram meia hora mais tarde nos fins de semana. Além disso, demonstrou-se que indivíduos com maior variabilidade do tempo de início do sono (isto é, uma variação de mais de 60 min do tempo em que vão para a cama em cada noite) apresentaram indicadores consideravelmente piores de quantidade e qualidade do sono.

Vários métodos estão disponíveis para a investigação de transtornos do sono. A polissonografia é um método diagnóstico completo considerado padrão ouro para a avaliação do sono2121 Rundo JV, Downey R 3rd. Polysomnography. Handb Clin Neurol. 2019;160:381-392. https://doi.org/10.1016/B978-0-444-64032-1.00025-4
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; entretanto, pode ser considerado caro em certos contextos e não reflete o ambiente natural dos indivíduos. O monitoramento do sono-vigília por meio de acelerometria é um método mais barato de avaliação do sono, que apresenta boa correlação com a polissonografia2222 Ancoli-Israel S, Cole R, Alessi C, Chambers M, Moorcroft W, Pollak CP. The role of actigraphy in the study of sleep and circadian rhythms. Sleep. 2003;26(3):342-392. https://doi.org/10.1093/sleep/26.3.342
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e pode fornecer informações úteis sobre as características do sono no ambiente natural. Além de avaliar o sono, a acelerometria pode ser usada para avaliar a presença de transtornos do sono como insônia,55 Budhiraja R, Parthasarathy S, Budhiraja P, Habib MP, Wendel C, Quan SF. Insomnia in patients with COPD. Sleep. 2012;35(3):369-375. https://doi.org/10.5665/sleep.1698
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síndrome das pernas inquietas2323 Kohnen R, Allen RP, Benes H, Garcia-Borreguero D, Hening WA, Stiasny-Kolster K, et al. Assessment of restless legs syndrome--methodological approaches for use in practice and clinical trials [published correction appears in Mov Disord. 2008 Jun;23(8):1200-2]. Mov Disord. 2007;22 Suppl 18:S485-S494. https://doi.org/10.1002/mds.21588
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e hipoxemia durante o sono.2424 Cormick W, Olson LG, Hensley MJ, Saunders NA. Nocturnal hypoxaemia and quality of sleep in patients with chronic obstructive lung disease. Thorax. 1986;41(11):846-854. https://doi.org/10.1136/thx.41.11.846
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A hipoxemia durante o sono é muito comum em indivíduos com DPOC; é observada em até 70% dos pacientes com saturações diurnas entre 90% e 95%.2525 Lewis CA, Fergusson W, Eaton T, Zeng I, Kolbe J. Isolated nocturnal desaturation in COPD: prevalence and impact on quality of life and sleep. Thorax. 2009;64(2):133-138. https://doi.org/10.1136/thx.2007.088930
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O oxigênio suplementar pode melhorar o sono em indivíduos com DPOC e hipoxemia noturna,2626 Calverley PM, Brezinova V, Douglas NJ, Catterall JR, Flenley DC. The effect of oxygenation on sleep quality in chronic bronchitis and emphysema. Am Rev Respir Dis. 1982;126(2):206-210. e já se demonstrou que o tratamento com broncodilatadores também pode melhorar a qualidade do sono.2727 McNicholas WT, Calverley PM, Lee A, Edwards JC; Tiotropium Sleep Study in COPD Investigators. Long-acting inhaled anticholinergic therapy improves sleeping oxygen saturation in COPD. Eur Respir J. 2004;23(6):825-831. https://doi.org/10.1183/09031936.04.00085804
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A actigrafia não registra a oximetria durante a noite, mas a hipoxemia noturna pode estar associada a um maior número de despertares noturnos e levar à fragmentação do sono, sendo estes facilmente identificados pelo instrumento.2424 Cormick W, Olson LG, Hensley MJ, Saunders NA. Nocturnal hypoxaemia and quality of sleep in patients with chronic obstructive lung disease. Thorax. 1986;41(11):846-854. https://doi.org/10.1136/thx.41.11.846
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Além de registros objetivos, existem instrumentos autoaplicáveis para a investigação de queixas clínicas a respeito do sono; o Índice de Qualidade do Sono de Pittsburgh (IQSP) é um deles.2828 Buysse DJ, Reynolds CF 3rd, Monk TH, Berman SR, Kupfer DJ. The Pittsburgh Sleep Quality Index: a new instrument for psychiatric practice and research. Psychiatry Res. 1989;28(2):193-213. https://doi.org/10.1016/0165-1781(89)90047-4
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O IQSP é amplamente usado na prática clínica e já se mostrou eficaz e capaz de fornecer informações úteis sobre a qualidade do sono. O IQSP já revelou pior qualidade de sono em pacientes com DPOC.2929 Akinci B, Aslan GK, Kiyan E. Sleep quality and quality of life in patients with moderate to very severe chronic obstructive pulmonary disease. Clin Respir J. 2018;12(4):1739-1746. https://doi.org/10.1111/crj.12738
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Uma avaliação com métodos objetivos e subjetivos poderia fornecer uma visão mais ampla dos distúrbios do sono em indivíduos com DPOC. Infelizmente, os dados obtidos por meio do IQSP não estavam disponíveis para uso no presente estudo.

O sono em indivíduos com DPOC tem características distintas do sono na população geral. Nunes et al.3030 Nunes DM, de Bruin VM, Louzada FM, Peixoto CA, Cavalcante AG, Castro-Silva C, et al. Actigraphic assessment of sleep in chronic obstructive pulmonary disease. Sleep Breath. 2013;17(1):125-132. https://doi.org/10.1007/s11325-012-0660-z
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usaram a acelerometria como método de avaliação do sono e observaram que a qualidade do sono foi pior em indivíduos com DPOC do que no grupo controle.3030 Nunes DM, de Bruin VM, Louzada FM, Peixoto CA, Cavalcante AG, Castro-Silva C, et al. Actigraphic assessment of sleep in chronic obstructive pulmonary disease. Sleep Breath. 2013;17(1):125-132. https://doi.org/10.1007/s11325-012-0660-z
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O presente estudo fornece uma caracterização mais detalhada dos padrões de sono de indivíduos com DPOC e revela que a qualidade do sono está gravemente prejudicada nessa população. Além disso, nossos dados revelam que o despertar nos fins de semana ocorre 30 min mais tarde do que nos dias de semana. Spina et al.1313 Spina G, Spruit MA, Alison J, Benzo RP, Calverley PMA, Clarenbach CF, et al. Analysis of nocturnal actigraphic sleep measures in patients with COPD and their association with daytime physical activity. Thorax. 2017;72(8):694-701. https://doi.org/10.1136/thoraxjnl-2016-208900
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avaliaram o sono de indivíduos com DPOC quanto à gravidade da doença, dispneia, sexo e sono nos fins de semana. Nos fins de semana, os participantes apresentaram sono mais fragmentado e passaram mais tempo acordados após o início do sono do que nos dias de semana; entretanto, a variável hora de acordar não foi analisada.1313 Spina G, Spruit MA, Alison J, Benzo RP, Calverley PMA, Clarenbach CF, et al. Analysis of nocturnal actigraphic sleep measures in patients with COPD and their association with daytime physical activity. Thorax. 2017;72(8):694-701. https://doi.org/10.1136/thoraxjnl-2016-208900
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Embora o jet lag social (desalinhamento entre os horários sociais e biológicos) leve em consideração as diferenças entre os dias de semana e os fins de semana quanto ao tempo de sono, acreditamos que esse fenômeno não esteve presente em nosso estudo, pois nossa amostra foi composta essencialmente por idosos e aposentados.

No presente estudo, os pacientes com maior variabilidade do tempo de início do sono apresentaram piores indicadores de qualidade do sono e um maior número de passos dados à noite. A maioria das evidências científicas tem se concentrado em associações quanto à duração ou qualidade do sono,3131 Hirshkowitz M, Whiton K, Albert SM, Alessi C, Bruni O, DonCarlos L, et al. National Sleep Foundation's updated sleep duration recommendations: final report. Sleep Health. 2015;1(4):233-243. https://doi.org/10.1016/j.sleh.2015.10.004
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deixando uma lacuna na literatura a respeito de outras características do sono, tais como a regularidade. Uma revisão sistemática recente analisou as associações entre o tempo e a regularidade do sono e desfechos de saúde, e demonstrou uma associação entre maior variabilidade do sono e desfechos negativos de saúde.3232 Chaput JP, Dutil C, Featherstone R, Ross R, Giangregorio L, Saunders TJ, et al. Sleep timing, sleep consistency, and health in adults: a systematic review. Appl Physiol Nutr Metab. 2020;45(10 (Suppl. 2)):S232-S247. https://doi.org/10.1139/apnm-2020-0032
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Outro estudo recente na população latina mostrou que a regularidade do tempo de sono-vigília é tão importante como a duração do sono, pois a irregularidade do sono relacionou-se com maior prevalência de hipertensão e pressão arterial sistólica aumentada em adultos e idosos.3333 Abbott SM, Weng J, Reid KJ, Daviglus ML, Gallo LC, Loredo JS, et al. Sleep Timing, Stability, and BP in the Sueño Ancillary Study of the Hispanic Community Health Study/Study of Latinos. Chest. 2019;155(1):60-68. https://doi.org/10.1016/j.chest.2018.09.018
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Huang & Redline1111 Huang T, Redline S. Cross-sectional and Prospective Associations of Actigraphy-Assessed Sleep Regularity With Metabolic Abnormalities: The Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis. Diabetes Care. 2019;42(8):1422-1429. https://doi.org/10.2337/dc19-0596
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mostraram que, para cada aumento de uma hora na variabilidade do tempo de início do sono, houve um aumento de 1,23 da razão de chances de síndrome metabólica prevalente em comparação com a variabilidade do tempo de início do sono ≤ 30 min (IC95%: 1,96-1,42; p = 0,005) em adultos participantes de um estudo multiétnico sobre a aterosclerose. O mesmo grupo investigou a variabilidade do sono no contexto de doenças cardiovasculares e concluiu que irregularidades no tempo de início do sono e na duração do sono podem ser consideradas fatores de risco de doenças cardiovasculares, independentemente dos fatores de risco tradicionais e da quantidade e/ou qualidade do sono.1010 Huang T, Mariani S, Redline S. Sleep Irregularity and Risk of Cardiovascular Events: The Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis. J Am Coll Cardiol. 2020;75(9):991-999. https://doi.org/10.1016/j.jacc.2019.12.054
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Há evidências de que indivíduos mais velhos com maior variabilidade da hora de dormir, hora de acordar e tempo de permanência na cama apresentam níveis mais elevados de IL-6 e TNF-α.3434 Okun ML, Reynolds CF 3rd, Buysse DJ, Monk TH, Mazumdar S, Begley A, et al. Sleep variability, health-related practices, and inflammatory markers in a community dwelling sample of older adults. Psychosom Med. 2011;73(2):142-150. https://doi.org/10.1097/PSY.0b013e3182020d08
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Indivíduos com DPOC também apresentam níveis ainda mais elevados de marcadores inflamatórios do que idosos saudáveis.3535 Eagan TM, Ueland T, Wagner PD, Hardie JA, Mollnes TE, Damås JK, et al. Systemic inflammatory markers in COPD: results from the Bergen COPD Cohort Study. Eur Respir J. 2010;35(3):540-548. https://doi.org/10.1183/09031936.00088209
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É possível que, em indivíduos com DPOC e maior variabilidade do tempo de início do sono, o quadro inflamatório seja ainda pior, com impacto negativo no nível de atividade física na vida diária,3636 Fitzgibbons CM, Goldstein RL, Gottlieb DJ, Moy ML. Physical Activity in Overlap Syndrome of COPD and Obstructive Sleep Apnea: Relationship With Markers of Systemic Inflammation. J Clin Sleep Med. 2019;15(7):973-978. https://doi.org/10.5664/jcsm.7874
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sensação de fadiga e sintomas de depressão.3737 Al-shair K, Kolsum U, Dockry R, Morris J, Singh D, Vestbo J. Biomarkers of systemic inflammation and depression and fatigue in moderate clinically stable COPD. Respir Res. 2011;12(1):3. https://doi.org/10.1186/1465-9921-12-3
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No entanto, mais pesquisas são necessárias para sustentar a hipótese de uma possível relação entre a variabilidade do sono e marcadores inflamatórios em indivíduos com DPOC. Sabe-se também que a associação da DPOC com outras doenças respiratórias, tais como a apneia obstrutiva do sono, pode aumentar as queixas de pior qualidade do sono nesses pacientes.33 McNicholas WT, Verbraecken J, Marin JM. Sleep disorders in COPD: the forgotten dimension. Eur Respir Rev. 2013;22(129):365-375. https://doi.org/10.1183/09059180.00003213
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Parece haver uma lacuna na literatura científica no que tange aos possíveis mecanismos envolvidos na variabilidade do sono ou que para ela contribuem na DPOC isoladamente ou na DPOC associada à apneia obstrutiva do sono. Trata-se de um amplo campo de pesquisa que ainda pode ser explorado no futuro. O objetivo do presente estudo, cujo desenho foi transversal e retrospectivo, não foi o de estabelecer qualquer relação causal, mas sim o de caracterizar a variabilidade do sono em indivíduos com DPOC.

Os distúrbios do sono em indivíduos com DPOC também podem ocorrer em virtude de controle farmacológico subótimo da doença primária ou de efeitos colaterais da farmacoterapia. O primeiro princípio do manejo de distúrbios respiratórios do sono na DPOC deve ser a otimização da doença de base, pois isso pode ter efeitos benéficos na respiração.3838 McNicholas WT. Impact of sleep in COPD. Chest. 2000;117(2 Suppl):48S-53S. https://doi.org/10.1378/chest.117.2_suppl.48S
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Além disso, apesar dos avanços da otimização farmacológica, o papel das terapias não farmacológicas permanece incontestado. Dentre elas estão a cessação do tabagismo, o manejo da doença, o uso de oxigenoterapia, a reabilitação pulmonar e medidas de higiene do sono.3939 Mulhall P, Criner G. Non-pharmacological treatments for COPD. Respirology. 2016;21(5):791-809. https://doi.org/10.1111/resp.12782
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Como os indivíduos com DPOC com maior variabilidade do tempo de início do sono apresentaram características de baixa quantidade e qualidade do sono no presente estudo, eles devem ser incentivados e instruídos a adotar hábitos de sono mais saudáveis, especialmente para manter um horário regular de início do sono. Mais pesquisas prospectivas são necessárias para avaliar a influência de tais intervenções em aspectos clínicos em indivíduos com DPOC.

O presente estudo tem alguns pontos fortes e algumas limitações. Estudos mostram que a regularidade do sono é um aspecto importante relacionado com piores desfechos clínicos. Até onde sabemos, este é o primeiro estudo a avaliar a variabilidade do tempo de início do sono em indivíduos com DPOC. Outro ponto forte deste estudo é o uso da actigrafia, que é um método bastante útil e acessível para avaliar as características do sono-vigília. No que tange às limitações, os pacientes não foram avaliados quanto à presença de distúrbios respiratórios do sono, pois nem a polissonografia nem a poligrafia estavam disponíveis para este projeto de pesquisa; além disso, o estudo não incluiu um grupo de controle. Outra limitação é que infelizmente não estavam disponíveis informações sobre queixas clínicas dos pacientes a respeito do sono. Portanto, esses dados devem ser interpretados com cautela em virtude da ausência de um grupo de controle e de queixas subjetivas a respeito do sono.

Em suma, o tempo de início do sono na maioria dos indivíduos com DPOC moderada a grave variou em mais de uma hora em uma semana-padrão, e um início de sono mais irregular indicou pior qualidade do sono. A má qualidade do sono nessa população ocorreu tanto nos dias de semana como nos fins de semana. A orientação a respeito da higiene do sono é uma estratégia simples que pode ser benéfica se for integrada à atenção à saúde desses pacientes.

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  • Apoio financeiro:

    Karina Couto Furlanetto é bolsista da Fundação Nacional de Desenvolvimento do Ensino Superior Particular (FUNADESP; Processo n. 5301164). Fabio Pitta é bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq; Processo n. 303131/2017- 9).
  • 2
    Trabalho realizado no Laboratório de Pesquisa em Fisioterapia Pulmonar - LFIP - Departamento de Fisioterapia, Universidade Estadual de Londrina - UEL - Londrina (PR) Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Set 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    07 Out 2011
  • Aceito
    29 Maio 2022
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