Acessibilidade / Reportar erro

Validação de Escalas para Investigar a Gestão Financeira Pessoal

Resumo

Objetivo

– Descrever o teste empírico de escalas para mensurar os comportamentos de Gestão Financeira Pessoal, Impulsividade nas compras e Tensão Financeira, examinando a estrutura fatorial, confiabilidade e validade das escalas.

Metodologia

– A partir da tradução reversa de escalas foi feito levantamento pela internet com 195 respondentes (alunos e professores de pós-graduação de cinco estados brasileiros, vinculados a cursos de administração). Os dados foram analisados com Análises Fatoriais Exploratória e Confirmatória, além de Modelagem de Equações Estruturais. utilizando os pacotes estatísticos SPSS e AMOS da IBM.

Resultados

– As escalas são confiáveis e têm validade de construto. Na avaliação da validade nomológica das escalas, houve relação negativa entre impulsividade nas compras e gestão financeira. Gestão financeira tem efeito negativo na tensão financeira, atuando como mediadora parcial da relação positiva entre impulsividade e tensão financeira.

Contribuições

– Os resultados motivam o uso da escala de comportamento de gestão financeira para avaliar esse traço de competência pessoal na população brasileira, apoiando programas de educação financeira e o planejamento de marketing de instituições de crédito

Palavras-chave
Gestão Financeira Pessoal; Tensão Financeira; Impulsividade nas Compras; Validação de escalas

Abstract

Purpose

– The paper describes the test of preexistent scales to measure behaviors of personal financial management, buying impulsiveness and financial strain

Design/methodology/approach

– From the back translation of scales published in English, empirical research was carried out to certify the reliability and validity of these instruments. A survey through the internet was performed with 195 respondents (postgraduate students and teachers from five Brazilian states, related to business administration courses). Data were analyzed with exploratory and confirmatory factor analysis, in addition to structural equation modeling, using the statistical software IBM SPSS and AMOS.

Findings

– The scales are reliable and showed construct validity. In the examination of scales’ nomological validity, there is a negative association between buying impulsineness and financial management. Financial manegement this construct has a negative effect on financial strain, and partially mediates the positive relationship between impulsiveness and financial strain.

Originality/value

– Results motivate the use of a scales of the behavior of personal financial management in order to evaluate this trait of personal competence, supporting programs of financial education and the marketing planning of credit institutions.

Keywords
Personal Financial Management; Financial Strain; Buying Impulsiveness; Scales’ Validation

1 Introdução

Consumidores tomam decisões sobre compras, pagamentos e gestão de seus recursos financeiros. Sua qualidade de vida e dos membros de seu grupo familiar são fortemente afetadas por sua capacidade de gestão financeira. Porém, muitas vezes pessoas são mal informadas e suscetíveis de cometer erros com grandes consequências individuais e sociais, como por exemplo, poupar pouco para aposentadoria, gastar demais, não pagar contas no prazo e arrepender-se nas compras (Lynch, 2011Lynch, J. (2011) Introduction to the Journal of Marketing Research Special Interdisciplinary Issue on Consumer Financial Decision Making. Journal of Marketing Research: November 2011, Vol. 48, No. SPL, pp. Siv-Sviii.; Strömbäck, Lind, Skagerlund, Västfjäll, & Tinghög, 2017Strömbäck, C., Lind, T., Skagerlund, K., Västfjäll, D. & Tinghög, G.(2017). Does self-control predict financial behavior and financial well-being? Journal of Behavioral and Experimental Finance, 14, 30–38.).

O aumento do endividamento dos brasileiros parece ligar-se a fatores como aumento do otimismo da população e facilidade de acesso ao crédito (Campara, Vieira & Ceretta, 2016Campara, J. P., Vieira, K. M., & Ceretta, P. S. (2016). Entendendo A Atitude Ao Endividamento: Fatores Comportamentais E Variáveis Socioeconômicas O Determinam?. Revista Eletrônica de Ciência Administrativa, 15(1), 5.; Figueira & Pereira, 2014Figueira, R., F. & Pereira, R. C. F. (2014). Devo, Não Nego, Pago Quando Puder: uma Análise dos Antecedentes do Endividamento do Consumidor. Revista Brasileira de Marketing, 13(5).). Moreira e Carvalho (2013)Moreira, R.M. & Carvalho, H. L. (2013). As finanças pessoais dos professores da rede municipal de ensino de Campo Formoso-BA: Um estudo na Escola José de Anchieta. Revista de Gestão, Finanças e Contabilidade, 3:1,122-137. demonstram que contribuíram para o aumento do consumo no Brasil: o controle inflacionário, o câmbio estável e a abertura econômica, possibilitando a entrada de novos produtos no mercado nacional que, com a expansão do crédito, impulsionaram o aumento do consumo e o endividamento pessoal. Segundo pesquisa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC)Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (2017). Pesquisa Nacional de Endividamento e Inadimplência do Consumidor. Recuperado de http://cnc.org.br/sites/default/files/arquivos/analise_peic_outubro_2017.pdf
http://cnc.org.br/sites/default/files/ar...
, de outubro de 2017, mais de 60% das famílias brasileiras têm dívidas (cartão de crédito, cheques pré-datado, carnês de loja, empréstimos pessoais ou prestação de carro, etc.), tendo 26% dessas famílias contas em atraso.

Possíveis resultados da má gestão de finanças pessoais, o endividamento e a inadimplência podem causar efeitos negativos tanto no nível macroeconômico, aumentando riscos de operações e produtos financeiros, quanto individualmente, afetando relações sociais, estado psicológico e vida familiar (Falahati, Sabri, & Paim, 2012Falahati, L., Sabri, M. F., & Paim, L. H. (2012). Assessment a model of financial satisfaction predictors: Examining the mediate effect of financial behavior and financial strain. World Applied Sciences Journal, 20(2), 190-197.; Serviço de Proteção ao CréditoServiço de Proteção ao Crédito & Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (2017). Consequências da inadimplência nas emoções, relacionamentos e saúde. Recuperado de https://www.spcbrasil.org.br/wpimprensa/wp-content/uploads/2017/10/SPC-Analise-Consequ%C3%AAncias-da-Inadimpl%C3%AAncia-2017.pdf
https://www.spcbrasil.org.br/wpimprensa/...
[SPC] & Confederação Nacional de Diretores Lojistas [CNDL], 2017; Trindade, Righi, & Vieira, 2012Trindade, L. L., Righi, M. B., & Vieira, K. M. (2012). De onde vem o endividamento feminino? Construção e Validação de um modelo PLS-PM. Revista Eletrônica de Administração, 73(3), 718-746.; Zimmerman, 1995Zimmerman, S. L. (1995). Understanding family policy: Theories and applications. Sage.).

Segundo Mills, Grasmick, Morgan e Wenk (1992)Mills, R. J., Grasmick, H. G., Morgan, C. S., & Wenk, D. (1992). The effects of gender, family satisfaction, and economic strain on psychological well-being. Family Relations, 440-445., a Tensão Financeira (abreviada como TF), ou seja, a percepção pessoal de desajustes, problemas e preocupações financeiras, é importante indicador de falta de bem-estar psicológico. Realmente, alto nível de estresse financeiro é associado frequentemente a níveis aumentados de estresse físico e psicológico (Mendes-da-Silva, Nakamura, & Moraes, 2012Mendes-da-Silva, W., Nakamura, W. T. & Moraes, D. C. (2012). Credit card risk behavior on college campuses: evidence from Brazil. BAR. Brazilian administration review, 9, 351-373.), que diminuem a satisfação financeira da população (Zimmerman, 1995Zimmerman, S. L. (1995). Understanding family policy: Theories and applications. Sage.).

A gestão financeira pessoal (ou, simplesmente, Gestão Financeira ou GFP) adequada pode evitar ou diminuir o estresse financeiro. Por isso, a educação financeira para aperfeiçoar práticas de GFP deve aumentar a satisfação financeira e a qualidade de vida da população.

O emergente interesse dos acadêmicos de marketing em temáticas relacionadas com a GFP (Figueira & Pereira, 2014Figueira, R., F. & Pereira, R. C. F. (2014). Devo, Não Nego, Pago Quando Puder: uma Análise dos Antecedentes do Endividamento do Consumidor. Revista Brasileira de Marketing, 13(5).; Lynch, 2011Lynch, J. (2011) Introduction to the Journal of Marketing Research Special Interdisciplinary Issue on Consumer Financial Decision Making. Journal of Marketing Research: November 2011, Vol. 48, No. SPL, pp. Siv-Sviii.; Miotto & Parente, 2015Miotto, A. P. S., & Parente, J. (2015). Antecedentes e consequências do gerenciamento das finanças domésticas na classe média baixa brasileira. RAE-Revista de Administração de Empresas, 55(1), 50-64.) realça a importância de sua investigação. Por exemplo, Figueira e Pereira (2016) encontraram influência da atitude relativa ao cartão de crédito na propensão ao endividamento. Miotto e Parente (2015)Miotto, A. P. S., & Parente, J. (2015). Antecedentes e consequências do gerenciamento das finanças domésticas na classe média baixa brasileira. RAE-Revista de Administração de Empresas, 55(1), 50-64. investigaram como famílias paulistas gerenciam suas finanças, revelando comportamentos peculiares das consumidoras brasileiras da classe C: foco inadequado no controle, falta de atenção ao planejamento de curto e médio prazo, ausência generalizada de poupança e influência de eventos críticos em episódios de inadimplência.

Apesar do aumento das publicações brasileiras específicas, as escalas usadas na maioria dos estudos não abrangeram fatores suficientes para avaliar o comportamento de gestão financeira pessoal em sua complexidade, ou seja, comportamentos relacionados a economias e investimentos, à aquisição de seguros, à gestão de fluxo de caixa e à gestão de créditos, que podem caracterizar uma gestão adequada de recursos financeiros.

Para aumentar as pesquisas de GFP, é preciso usar instrumentos adequados. Escalas de construtos relacionadas com gestão financeira são necessárias para investigar modelos e desenvolver teorias. Porém, a validação de escalas é um tipo de pesquisa básica, que deveria envolver o exame de amostras independentes, não se limitando ao resultado secundário do teste de modelos com a mesma amostra, num estudo transversal, como normalmente se faz. Usar a mesma amostra para fins exploratórios, de avaliação e aperfeiçoamento de medidas, e para fins conclusivos, de teste de hipóteses, pode gerar resultados ilusórios, denominados de artefatos estatísticos.

Apesar de Dew e Xiao (2011)Dew, J., & Xiao, J. J. (2011). The Financial Management Behavior scale: development and validation. Journal of Financial Counseling and Planning, 22 (1), 43-87. terem criado uma escala para operacionalizar o comportamento de GFP (ver Tabela 1), novas pesquisas devem confirmar seus resultados e, para uso em português, a escala deve ser traduzida e suas propriedades psicométricas, examinadas.

Tabela 1
Análise fatorial exploratória de GFP

O objetivo central deste artigo é descrever o teste empírico da escala do Comportamento de GFP (Dew e Xiao, 2011Dew, J., & Xiao, J. J. (2011). The Financial Management Behavior scale: development and validation. Journal of Financial Counseling and Planning, 22 (1), 43-87.), examinando sua estrutura fatorial, confiabilidade e validade. Por causa do objetivo e do interesse geral em prover escalas úteis para pesquisas sobre GFP, traduzimos a escala para o português e a retrotraduzimos para o inglês, para assegurar congruência, e validamos dois construtos relacionados a esse comportamento - Impulsividade nas Compras e Tensão Financeira –, com base em escalas preexistentes, propostas, respectivamente, por Weun, Jones e Beatty (1997)Weun, S., Jones, M. A., & Beatty, S. E. (1997). A parsimonious scale to measure impulse buying tendency. AMA Educators’ Proceedings: Enhancing Knowledge Development in Marketing, 306-307. e Mills et al. (1992)Mills, R. J., Grasmick, H. G., Morgan, C. S., & Wenk, D. (1992). The effects of gender, family satisfaction, and economic strain on psychological well-being. Family Relations, 440-445.. O exame empírico de escalas utilizou procedimentos estatísticos concisamente apresentados no capítulo sobre o método de pesquisa.

Em suma, a contribuição visada neste trabalho é dupla: 1) descrever procedimentos de validação de escalas, apresentando os índices estatísticos mais comuns, para apoiar a capacitação em pesquisa; e 2) oferecer aos pesquisadores brasileiros três escalas validadas, uma delas inédita em português, com alto potencial de aplicação em estudos de gestão financeira pessoal.

Em termos sociais, investigar os antecedentes e consequentes da GFP é importante porque competência nessa área pode reduzir os efeitos negativos da falta de dinheiro. Ademais, o conhecimento das características do comportamento financeiro de um indivíduo pode auxiliar no desenvolvimento de programas de educação financeira voltados para aumentar a qualidade de vida da população. Por exemplo, tal conhecimento pode embasar programas que busquem auxiliar no uso sensato de crédito, gerenciamento de fluxo de caixa e comportamentos de poupança para melhorar a GFP, diminuindo problemas financeiros e o estresse decorrente. O conhecimento das dimensões do comportamento de GFP pode também ser útil para instituições financeiras, provendo informações para a segmentação dos consumidores, conforme seu perfil e padrão comportamental. Logo, o conhecimento do comportamento de gestão financeira de consumidores interessa tanto à academia quanto a gestores e pessoas envolvidas com políticas públicas de bem-estar (Lynch, 2011Lynch, J. (2011) Introduction to the Journal of Marketing Research Special Interdisciplinary Issue on Consumer Financial Decision Making. Journal of Marketing Research: November 2011, Vol. 48, No. SPL, pp. Siv-Sviii.).

2 Referencial Teórico

2.1 Gestão financeira pessoal

Lynch (2011)Lynch, J. (2011) Introduction to the Journal of Marketing Research Special Interdisciplinary Issue on Consumer Financial Decision Making. Journal of Marketing Research: November 2011, Vol. 48, No. SPL, pp. Siv-Sviii. explica que as decisões dos consumidores sobre suas finanças se relacionam com aspectos como: (1) padrões de gastos e de alocação de recursos para compras simples ou complexas; (2) comportamentos de uso de crédito, endividamento e pagamento de dívidas e (3) comportamentos relacionados à poupança e investimentos. Desequilíbrios entre a geração de renda e os gastos em determinado período geram economia, saldos para investimentos ou débitos.

Comportamentos de GFP envolvem decisões e práticas de compras, investimentos, gestão de empréstimos, pagamentos etc. Dew e Xiao (2011)Dew, J., & Xiao, J. J. (2011). The Financial Management Behavior scale: development and validation. Journal of Financial Counseling and Planning, 22 (1), 43-87. afirmam que as pessoas são propensas a adotar, de forma relacionada, comportamentos adequados de gestão financeira, p. ex., hábitos de gestão de fluxo de caixa e de gestão de crédito. Porém, na falta de renda suficiente, os indivíduos podem não economizar ou manter reserva financeira para emergências ou aposentadoria, nem manter seguros adequados. Ressalte-se que, além de fatores sociais, como abundância de crédito, consumismo e materialismo, características individuais de personalidade e de educação favorecem comportamentos inadequados na GFP, levando a resultados indesejados como decisões precipitadas, desperdícios e endividamento.

Várias pesquisas mostram que as decisões financeiras dos consumidores são influenciadas por fatores como: habilidades e traços pessoais, fatores situacionais e motivações sociais. Além dos citados anteriormente, estudos sobre tópicos relativos à GFP e à satisfação financeira (e.g., Amar, Ariely, Ayal, Cryder, & Rick, 2011Amar, M., Ariely, D., Ayal, S., Cryder, C. E., & Rick, S. I. (2011). Winning the battle but losing the war: The psychology of debt management. Journal of Marketing Research, 48(SPL), 38-50.; Archuleta, Britt, Tonn, & Grable, 2011Archuleta, K. L., Britt, S. L., Tonn, T. J., & Grable, J. E. (2011). Financial satisfaction and financial stressors in marital satisfaction. Psychological Reports, 108(2), 563-576.; Joo & Grable, 2004Joo, S. H., & Grable, J. E. (2004). An exploratory framework of the determinants of financial satisfaction. Journal of family and economic Issues, 25(1), 25-50.; Kamleitner, Hoelzl, & Kirchler, 2012Kamleitner, B., Hoelzl, E. & Kirchler, E. (2012). Credit use: Psychological perspectives on a multifaceted phenomenon. International Journal of Psychology, 47 (1), 1–27.; Norvilitis et al. 2006Norvilitis, J. M., Merwin, M. M., Osberg, T. M., Roehling, P. V., Young, P., & Kamas, M. M. (2006). Personality factors, money attitudes, financial knowledge and credit card debt in college students. Journal of applied social psychology, 36, 1395-1413.) têm sido publicados no exterior. O periódico Journal of Marketing Research dedicou uma edição especial sobre decisões financeiras dos consumidores em novembro de 2011.

Resultados advindos de dados representativos de adultos americanos, apresentados por Tang e Baker (2016)Tang, N. & Baker, A. (2016). Self-esteem, financial knowledge and financial behavior. Journal of Economic Psychology, 54,164–176., sugeriram que a autoestima está significativamente relacionada ao comportamento financeiro individual, após o controle do conhecimento financeiro e outros fatores socioeconômicos. Farrel, Fry e Risse (2015)Farrell, L., Fry T. & Risse, L. (2015) The significance of financial self-efficacy in explaining women’s personal finance behaviour. Journal of Economic Psychology, 54, 85–99. descobriram que a autoeficácia financeira surge como um dos preditores mais fortes do tipo e número de produtos financeiros que uma mulher australiana possui. Segundo os autores, mulheres australianas com maior autoeficácia financeira estão mais propensas a fazer investimentos financeiros e poupança e menos inclinadas a manter produtos geradores de endividamento.

No Brasil, recentemente tem aumentado a publicação de pesquisas relacionadas à GFP. Campara et al. (2016)Campara, J. P., Vieira, K. M., & Ceretta, P. S. (2016). Entendendo A Atitude Ao Endividamento: Fatores Comportamentais E Variáveis Socioeconômicas O Determinam?. Revista Eletrônica de Ciência Administrativa, 15(1), 5. identificaram a influência de variáveis comportamentais e socioeconômicas na atitude favorável ao endividamento em residentes de municípios do Rio Grande do Sul. Conto, Faleiro, Fürh e Kronbauer (2015)Conto,S.M., Faleiro, S. N., Fürh, I.J., & Kronbauer, K. A. (2015). O comportamento de alunos do ensino médio do Vale do Taquari em relação às finanças pessoais. Revista Eletrônica de Estratégia & Negócios, 8:2, 182-206. estudaram o comportamento financeiro de estudantes do ensino médio de escolas públicas e privadas do Rio Grande do Sul. Piccoli e Silva (2015)Piccoli, M. R. & Silva, T. P. (2015). Análise do nível de educação em gestão financeira dos funcionários de uma instituição de ensino superior. Economia e Gestão, 15:41,112-134. mediram o nível de educação em gestão financeira dos funcionários de uma instituição de ensino superior de Santa Catarina. Figueira e Pereira (2014)Figueira, R., F. & Pereira, R. C. F. (2014). Devo, Não Nego, Pago Quando Puder: uma Análise dos Antecedentes do Endividamento do Consumidor. Revista Brasileira de Marketing, 13(5). analisaram os fatores condicionantes (atitude frente ao dinheiro, atitude relativa a cartão de crédito, autocontrole, compra compulsiva, compra impulsiva) do endividamento de consumidores. Norvilitis e Mendes-da-Silva (2013)Norvilitis, J. M. & Mendes-Da-Silva, W. (2013) Attitudes toward Credit and Finances among College Students in Brazil and the United States. Journal of Business Theory and Practice, 1:1, 132-151. compararam estudantes universitários brasileiros e americanos buscando explorar a utilidade da teoria do comportamento planejado para prever dívidas advindas do uso de cartão de crédito e autopercepção de bem-estar financeiro. Além dos estudos citados, merecem destaque os trabalhos correlatos à GFP, de Medeiros, Diniz, Costa e Pereira (2015)Medeiros, F. G., Diniz, I. S. F. N, Costa, F. J., & Pereira, R. D. C. F. (2015). Influência de estresse, materialismo e autoestima na compra compulsiva de adolescentes. RAC-Revista de Administração Contemporânea, 19(2), 138-155.; Medeiros e Lopes (2014)Medeiros, S.F. & Lopes, T.A. (2014). Finanças pessoais: um estudo com alunos do curso de Ciências Contábeis de uma IES privada de Santa Maria – RS. Revista Eletrônica de Estratégia & Negócios, 7:2, 221-251.; Mendes-da-Silva et al. (2012)Mendes-da-Silva, W., Nakamura, W. T. & Moraes, D. C. (2012). Credit card risk behavior on college campuses: evidence from Brazil. BAR. Brazilian administration review, 9, 351-373.; Moreira e Carvalho (2013)Moreira, R.M. & Carvalho, H. L. (2013). As finanças pessoais dos professores da rede municipal de ensino de Campo Formoso-BA: Um estudo na Escola José de Anchieta. Revista de Gestão, Finanças e Contabilidade, 3:1,122-137.; Trindade et al. (2012)Trindade, L. L., Righi, M. B., & Vieira, K. M. (2012). De onde vem o endividamento feminino? Construção e Validação de um modelo PLS-PM. Revista Eletrônica de Administração, 73(3), 718-746..

2.2 Impulsividade

Segundo Rook e Fisher (1995)Rook, D. W., & Fisher, R. J. (1995). Normative influences on impulsive buying behavior. Journal of Consumer Research, 22(3), 305-313., impulsividade é a tendência de agir espontaneamente, sem reflexão e rapidamente. Impulsividade nas Compras (abreviada doravante como IC) é a tendência de comprar por impulso, sem planejar, de forma irrefletida e automática (Weun et al., 1997Weun, S., Jones, M. A., & Beatty, S. E. (1997). A parsimonious scale to measure impulse buying tendency. AMA Educators’ Proceedings: Enhancing Knowledge Development in Marketing, 306-307.), a qual se relaciona com um padrão de GFP.

Alguns autores demonstraram relação entre IC e GFP. Por exemplo, para medir aspectos da função executiva do cérebro humano na GFP, Spinella, Yang e Lester (2007)Spinella, M., Yang, B. & Lester, D. (2007). Development of the executive personal finance scale. International Journal of Neuroscience, 117:301–313. desenvolveram uma escala com quatro fatores (controle impulsivo, organização, planejamento e motivação), sendo dois de segunda ordem (um fator cognitivo relacionado com planejamento e organização e um fator emocional relacionado com ansiedade, gastos impulsivos e prestígio).

Strömbäck et al. (2017)Strömbäck, C., Lind, T., Skagerlund, K., Västfjäll, D. & Tinghög, G.(2017). Does self-control predict financial behavior and financial well-being? Journal of Behavioral and Experimental Finance, 14, 30–38. afirmam que autocontrole é tipicamente manifestado como habilidade de interromper hábitos ruins, resistir a tentações e superar impulsos iniciais, tal que o comportamento financeiro das pessoas é determinado pela habilidade de controlar impulsos e custos relativos ao exercício do autocontrole. Os autores investigaram o efeito de diferenças individuais no autocontrole e outros fatores não cognitivos no comportamento financeiro e no bem-estar da população sueca, com os seguintes resultados: indivíduos com bom autocontrole têm maior probabilidade de poupar parte de seus ganhos, têm melhor comportamento financeiro, sentem-se menos ansiosos sobre assuntos financeiros e se sentem mais seguros acerca de sua situação financeira. Como comportamentos impulsivos indicam ausência ou falha de autocontrole, a impulsividade pode afetar a gestão de recursos financeiros.

Em estudo com mulheres da classe C de São Paulo, Miotto e Parente (2015)Miotto, A. P. S., & Parente, J. (2015). Antecedentes e consequências do gerenciamento das finanças domésticas na classe média baixa brasileira. RAE-Revista de Administração de Empresas, 55(1), 50-64. mostraram que mulheres com maior autocontrole e como maior tendência a planejar são mais capacitadas para gerir suas finanças; se estão endividadas, isso se deve principalmente a descontrole financeiro ou a eventos críticos como perda de emprego ou divórcio.

Segundo revisão de literatura a respeito do uso de cartão de crédito, Kamleitner et al. (2012)Kamleitner, B., Hoelzl, E. & Kirchler, E. (2012). Credit use: Psychological perspectives on a multifaceted phenomenon. International Journal of Psychology, 47 (1), 1–27. mostram que os traços comportamentais de Autocontrole e Dificuldades de Postergar Gratificações, típicos da Impulsividade, servem para prever o uso de crédito.

Esses resultados empíricos sobre a relação entre impulsividade e comportamento financeiro levaram à formulação da primeira hipótese de pesquisa, usada na validação nomológica da escala de GFP, proposta por Dew e Xiao (2011)Dew, J., & Xiao, J. J. (2011). The Financial Management Behavior scale: development and validation. Journal of Financial Counseling and Planning, 22 (1), 43-87.:

  • H1: Existe um efeito negativo de IC (Impulsividade nas Compras) em GFP.

2.3 Tensão Financeira

A satisfação com a situação financeira pessoal fortalece a qualidade de vida. Por isso, é meta importante de política familiar (Zimmerman, 1995Zimmerman, S. L. (1995). Understanding family policy: Theories and applications. Sage.). Pessoas com comportamento financeiro adequado têm menos estresse financeiro e maiores níveis de satisfação financeira e bem-estar financeiro (Joo & Grable, 2004Joo, S. H., & Grable, J. E. (2004). An exploratory framework of the determinants of financial satisfaction. Journal of family and economic Issues, 25(1), 25-50., Norvilitis et al., 2006Norvilitis, J. M., Merwin, M. M., Osberg, T. M., Roehling, P. V., Young, P., & Kamas, M. M. (2006). Personality factors, money attitudes, financial knowledge and credit card debt in college students. Journal of applied social psychology, 36, 1395-1413.).

No país, estudos sobre crédito e endividamento têm investigado a relação entre comportamentos de GFP e problemas pessoais decorrentes da má gestão financeira. Resultados de pesquisa nacional, em junho de 2017, mostraram que pessoas endividadas apresentam sérios problemas psicológicos e sociais, que vão de reações de insegurança e irritabilidade a quadros de ansiedade, angústia, perda de apetite, depressão e infelicidade (CNC, 2017; SPC & CNDL, 2017), ou seja, têm maior estresse financeiro.

Para avaliar as validades preditiva e nomológica do construto GFP, elaboramos hipóteses de sua inter-relação com os construtos IC e TF, levando em conta esses resultados empíricos:

  • H2: Há um efeito positivo de IC na Tensão Financeira (TF).

  • H3: Há um efeito negativo da GFP na Tensão Financeira (TF).

Observe que nosso objetivo foi validar escalas, em português, para aplicação em futuras pesquisas, com ênfase na escala de GFP. O uso de um antecedente e outro consequente desse construto visa auxiliar na sua validação nomológica e preditiva, baseando-se na expectativa de suporte a efeitos já evidenciados na literatura.

3 Método

Apesar da importância da validação de medidas em ciência, pesquisas sobre personalidade e outros construtos psicológicos muitas vezes não seguem as melhores práticas, limitando-se os autores a relatarem o coeficiente de confiabilidade das medidas (Flake, Pek, & Hehman, 2017Flake, J. K.; Pek, J., & Hehman, E. (2017). Construct validation in social and personality research: Current practice and recommendations. Social Psychological and Personality Science, 8(4), 370-378.).

A validação de construto envolve simultaneamente o processo de medida e de validação de teoria, porque testes de validade de construto baseados em relações hipotéticas refletem tanto sua validade quanto a teoria subjacente (Strauss & Smith, 2009Strauss, M. E., & Smith, G. T. (2009). Construct validity: Advances in theory and methodology. Annual review of clinical psychology, 5, 1-25.).

Pelo menos três passos são essenciais para a validação de construtos: 1) a especificação teórica dos construtos e de sua inter-relação, 2) a elaboração de métodos para operacionalização dos construtos e 3) o teste empírico de quão bem indicadores dos construtos refletem sua identidade e as relações teóricas (Cronbach & Meehl, 1955Cronbach, L. J., & Meehl, P. E. (1995). Construct validity in psychological tests. Psychological Bulletin, 52(4), 281.).

Segundo Netemeyer, Bearden e Sharma (2003)Netemeyer, R. G., Bearden, W. O., & Sharma, S. (2003). Scaling procedures: Issues and applications. Sage Publications., dimensionalidade, confiabilidade e validade são propriedades inter-relacionadas de mensuração. Dimensionalidade é o número de fatores representados pelos itens ou indicadores de uma escala. Um construto é uni ou multidimensional. A operacionalização do construto deve representar corretamente sua estrutura fatorial. Unidimensionalidade é requisito para confiabilidade e validade de um construto de um fator, por isso deve ser verificada com análise fatorial exploratória (Netemeyer et al., 2003Netemeyer, R. G., Bearden, W. O., & Sharma, S. (2003). Scaling procedures: Issues and applications. Sage Publications.). Os autores explicam que confiabilidade é a consistência ou estabilidade das medidas. Ou seja, quanto mais confiável é uma medida, menos erro aleatório tem. Para certificar a confiabilidade de uma medida pode-se usar o teste-reteste ou medidas de consistência interna, como o alfa de Cronbach (Netemeyer et al., 2003Netemeyer, R. G., Bearden, W. O., & Sharma, S. (2003). Scaling procedures: Issues and applications. Sage Publications.). Por fim, validade de construto reflete quão bem um construto mede o que com ele se pretende medir. Testes de validade de construto incluem testes de validade de face, convergente, discriminante e nomológica.

No caso de construtos previamente existentes e validados, novos estudos empíricos são necessários para confirmar resultados e para verificar adaptações ou traduções de medidas para outras línguas.

Em 2016, realizamos levantamento pela internet para validar as escalas de GFP, IC e TF, baseando-nos nas hipóteses sobre sua inter-relação. Obtivemos respostas de 195 alunos e professores de pós-graduação, dos estados do Amazonas, Espírito Santo, Minas Gerais, Paraná e São Paulo. O projeto obedeceu a diretrizes éticas (Academia Brasileira de CiênciasAcademia Brasileira de Ciências (2013). Rigor e integridade na condução da pesquisa científica – guia de recomendações de práticas responsáveis, 2013. Recuperado de https://www.abc.org.br/IMG/pdf/doc-4311.pdf
https://www.abc.org.br/IMG/pdf/doc-4311....
[ABC], 2013) e os respondentes qualificados eram adultos, com salário ou rendimento financeiro equivalente.

Na coleta de dados, para evitar fadiga dos participantes e reduzir a probabilidade de viés de resposta pelo uso do mesmo método de medida, usamos diferentes formatos de escalas de sete pontos na operacionalização dos construtos (Podsakoff, MacKenzie, Lee, & Podsakoff, 2003Podsakoff, P. M., MacKenzie, S. B., Lee, J. Y., & Podsakoff, N. P. (2003). Common method biases in behavioral research: A critical review of the literature and recommended remedies. Journal of applied psychology, 88(5), 879.). Apenas no caso das questões do construto GFP, incluímos a opção “Não se aplica” nas respostas.

Para medir a IC, utilizamos a escala de Weun et al. (1997)Weun, S., Jones, M. A., & Beatty, S. E. (1997). A parsimonious scale to measure impulse buying tendency. AMA Educators’ Proceedings: Enhancing Knowledge Development in Marketing, 306-307.. Os autores realizaram três estudos para desenvolver sua escala, obtendo evidências de sua unidimensionalidade, consistência interna, validade convergente e discriminante. Devido a essas qualidades psicométricas, traduzimos seus cinco itens para o português e os retrotraduzimos para o inglês para assegurar consistência:

  • P1: Quando faço compras, compro coisas que não tinha intenção de comprar.

  • P2: É divertido comprar espontaneamente.

  • P3: Sou uma pessoa que faz compras não planejadas.

  • P4: Quando vejo algo que realmente me interessa, compro sem pensar nas consequências.

  • P5 (item reverso): Evito comprar coisas que não estão na minha lista de compras.

A operacionalização da GFP foi feita utilizando-se uma escala com 15 itens (veja itens traduzidos na Tabela 1), criada por Dew e Xiao (2011)Dew, J., & Xiao, J. J. (2011). The Financial Management Behavior scale: development and validation. Journal of Financial Counseling and Planning, 22 (1), 43-87., supostamente formando uma estrutura fatorial de um construto de segunda ordem com quatro dimensões. Os autores utilizaram uma amostra representativa de 1.011 americanos para avaliar as propriedades psicométricas da escala, atestando sua confiabilidade (alfa = 0,81) e validade, encontrando forte correlação com medidas preditivas de comportamento financeiro, tais como níveis de poupança e de endividamento. Em nossa pesquisa, também retrotraduzimos para o inglês nossa versão da escala de GFP.

No estudo original de Dew e Xiao (2011)Dew, J., & Xiao, J. J. (2011). The Financial Management Behavior scale: development and validation. Journal of Financial Counseling and Planning, 22 (1), 43-87., a análise fatorial da escala proposta de GFP produziu uma solução com quatro fatores, que explicaram 59% da variância dos dados. Após rotação oblíqua Promax da solução original, os fatores identificados, com seus correspondentes itens no questionário de pesquisa, são reproduzidos na Tabela 1. Os autores denominaram os fatores como F1 (economias e investimentos), F2 (seguros), F3 (gestão de caixa) e F4 (gestão de crédito).

Incluímos a TF, como construto consequente à GFP, para testar sua validade preditiva e, conjuntamente com a IC, sua validade nomológica.

O construto TF foi operacionalizado por Mills et al., (1992)Mills, R. J., Grasmick, H. G., Morgan, C. S., & Wenk, D. (1992). The effects of gender, family satisfaction, and economic strain on psychological well-being. Family Relations, 440-445. através de escala Likert. Com evidência de unidimensionalidade e confiabilidade (alfa = 0,81), é uma escala curta, servindo para examinar o efeito da GFP. Os quatro itens da escala de TF foram traduzidos para:

  • T1: Frequentemente tenho problemas com dinheiro.

  • T2: Gasto bastante tempo me preocupando com assuntos financeiros.

  • T3: Problemas financeiros frequentemente interferem no meu trabalho ou rotina diária.

  • T4: Problemas financeiros interferem em meus relacionamentos com outras pessoas.

Para avaliar a qualidade da operacionalização dos construtos do modelo de pesquisa, seguimos dois procedimentos. Construtos presumidamente unidimensionais – IC e TF – tiveram sua dimensionalidade avaliada por análise fatorial exploratória (AFE) e sua confiabilidade estimada pelo alfa de Cronbach, antes de ter sua validade examinada. Sua análise fatorial confirmatória (AFC) foi realizada de modo integrativo na avaliação do modelo de mensuração da pesquisa (Figura 1).

Figura 1
Estimativas padronizadas do modelo de mensuração (n = 195)

Gestão Financeira Pessoal, foco da pesquisa, supostamente construto de segunda ordem e com quatro dimensões, foi avaliado por AFC. Sua confiabilidade composta, validade convergente, discriminante e preditiva foram examinadas testando-se a relação de GFP com os construtos IC e TF (validade nomológica).

A dimensionalidade de uma medida refere-se à homogeneidade de seus indicadores. Nas medidas unidimensionais, um único fator ou variável latente explica a maior parte da variação associada à inter-relação entre os itens.

Gerbing e Anderson (1988)Gerbing, D. W., & Anderson, J. C. (1988). An updated paradigm for scale development incorporating unidimensionality and its assessment. Journal of Marketing Research, 186-192. recomendam usar análise fatorial exploratória (AFE) para avaliar a unidimensionalidade da escala de um construto, verificando-se se o número de fatores retidos na análise fatorial com extração por análise de componentes principais é um, ao adotar-se o critério de Kaiser (autovalores maiores do que 1), para definir a quantidade de fatores.

Para avaliar a adequação das soluções fatoriais aos dados, alguns autores sugerem ser necessário que a matriz de correlação inversa R-1(p x p) seja próxima da matriz diagonal (Rencher, 2002; apud Mingoti, 2005Mingoti, S. A. (2005). Análise de dados através de métodos de estatística multivariada: uma abordagem aplicada. Editora UFMG.). Consequentemente, são usadas heurísticas recomendadas por Hair et al. (2009)Hair, J. F., Black, W. C., Babin, B. J., & Anderson, R. E. (2009). Multivariate Data Analysis. Upper Saddle River, NJ: Prentice hall. – medida KMO (Kaiser-Meyer-Olkin) > 0,6 e teste de esfericidade de Bartlett significativo - para atestar que as correlações lineares entre as variáveis possibilitam a extração de fatores consistentes na AFE (Mingoti, 2005Mingoti, S. A. (2005). Análise de dados através de métodos de estatística multivariada: uma abordagem aplicada. Editora UFMG.).

Na AFE de escalas unidimensionais, ao se reter apenas um fator (aplicando-se a regra de Kaiser: autovalor > 1) na extração de fatores com componentes principais, espera-se que a porcentagem de variância explicada pelo fator retido seja de, pelo menos, 60%. Unidimensionalidade de uma (sub)escala para medir um construto é um requisito para avaliar sua confiabilidade ou consistência interna utilizando-se o alfa de Cronbach, com valor mínimo de 0,6 em estudos exploratórios e 0,70 em estudos confirmatórios (Netemeyer et al., 2003Netemeyer, R. G., Bearden, W. O., & Sharma, S. (2003). Scaling procedures: Issues and applications. Sage Publications.).

Para avaliar a confiabilidade de construtos multidimensionais, vários autores (e.g. Hair et al., 009; Netemeyer et al., 2003Netemeyer, R. G., Bearden, W. O., & Sharma, S. (2003). Scaling procedures: Issues and applications. Sage Publications.) recomendam o cálculo de confiabilidade composta e da variância média extraída (VME). Analogamente ao alfa de Cronbach, a confiabilidade composta é um índice de consistência interna dos itens de uma escala, que deve ser de pelo menos 0,60 para escalas pequenas (Netemeyer et al., 2003Netemeyer, R. G., Bearden, W. O., & Sharma, S. (2003). Scaling procedures: Issues and applications. Sage Publications.). Segundo Fornell e Larcker (1981)Fornell, C., & Larcker, D. F. (1981). Evaluating structural equation models with unobservable variables and measurement error. Journal of Marketing Research, 39-50., a fórmula para calcular a confiabilidade composta é a seguinte:

C o n f . C o m p . = i = 1 p λ i 2 i = 1 p λ i 2 + i p V ( δ ) (1)

Em que:

λi = carga padronizada para i-ésimo indicador

V(δi) = variância do termo erro para i-ésimo indicador

p = número de indicadores

No cálculo da confiabilidade composta (CC), Hair et al. (2009)Hair, J. F., Black, W. C., Babin, B. J., & Anderson, R. E. (2009). Multivariate Data Analysis. Upper Saddle River, NJ: Prentice hall. explicam que se deve desconsiderar o sinal de cargas negativas ao totalizar as cargas padronizadas. Além disso, lembram que V(δ) é o erro de mensuração para cada indicador, obtido como 1 – Confiabilidade = 1 - λi2.

Outra medida para estimar a consistência interna de um construto, usada também para avaliar a validade convergente, é a estimativa da variância média extraída (VME) (fórmula 2), que mede a quantidade de variância capturada por um conjunto de itens, relativamente ao erro de mensuração. Fornell e Larcker (1981)Fornell, C., & Larcker, D. F. (1981). Evaluating structural equation models with unobservable variables and measurement error. Journal of Marketing Research, 39-50. advogam que VME deveria ser > 0,50.

V M E = i = 1 p λ i 2 p (2)

Em que:

λi = carga padronizada para i-ésimo indicador

p = número de indicadores

Validade de construto é a congruência entre o atributo mensurado (indicador) e o construto que se deseja operacionalizar (Netemeyer et al., 2003Netemeyer, R. G., Bearden, W. O., & Sharma, S. (2003). Scaling procedures: Issues and applications. Sage Publications.). Os dois tipos mais comuns de validade de construto são a validade convergente e a validade discriminante.

Validade convergente corresponde ao grau em que diferentes métodos de medir os atributos de um mesmo construto levam a resultados suficientemente correlacionados (Bagozzi & Yi, 1993Bagozzi, R. P., & Yi, Y. (1993). Multitrait–multimethod matrices in consumer research: critique and new developments. Journal of Consumer Psychology, 2(2), 143-170.). É possível testar a validade convergente usando o CFA, segundo Gerbing e Anderson (1998). Em dois estágios, os autores recomendam um procedimento para avaliar o modelo estrutural. Primeiramente, utilizamos o CFA para testar o modelo de mensuração, ou seja, estimamos um modelo com apenas as relações entre os construtos e seus respectivos indicadores, permitindo apenas covariâncias entre as variáveis latentes. Nesta etapa, também verificamos a dimensionalidade dos construtos, confiabilidade, validade convergente, discriminante e preditiva. Se considerarmos o modelo estrutural válido, então, no segundo estágio, usando a modelagem de equações estruturais (SEM), avaliamos as relações estruturais entre variáveis latentes. Observe que devemos fazer a análise no contexto do modelo ou rede nomológica examinada.

Para avaliar se os construtos apresentavam validade convergente, empregamos a AFC no modelo de mensuração da rede envolvendo IC, GFP e TF, ou seja, um modelo com os construtos e seus respectivos indicadores, permitindo-se covariâncias apenas entre as variáveis latentes (Figura 1). Verificamos a significância das cargas fatoriais e o percentual de variância dos indicadores explicada pelos construtos correspondentes, a qual deveria ser superior a 50%, conforme Hair et al. (2009)Hair, J. F., Black, W. C., Babin, B. J., & Anderson, R. E. (2009). Multivariate Data Analysis. Upper Saddle River, NJ: Prentice hall.. A justificativa desse procedimento de análise de validade convergente é a suposição de que indicadores do mesmo construto podem ser interpretados como medições diferentes dele e, portanto, devem convergir.

A validade discriminante avalia se as medidas de construções conceitualmente distintas não se confundem, de tal forma que, se for significativa, sua correlação não é tão grande a ponto de não as distinguir. Para testar a validade discriminante, utilizamos o procedimento recomendado por Fornell e Larcker (1981)Fornell, C., & Larcker, D. F. (1981). Evaluating structural equation models with unobservable variables and measurement error. Journal of Marketing Research, 39-50.: calculamos as correlações entre os construtos e as raízes quadradas de suas respectivas variâncias médias extraídas (VMEs). Dois construtos têm validade discriminante se o valor absoluto de sua correlação for menor que a raiz quadrada do VME de cada um.

4 Resultados

Na amostra, houve equilíbrio entre homens (48,5%) e mulheres (51,5%) e predomínio de indivíduos (76%) com renda familiar superior a cinco salários mínimos, ou seja, renda mensal superior a R $ 4.400 (quatro mil e quatrocentos reais).

Para análise de resultados foram utilizados o software Microsoft Excel 2010® e os pacotes estatísticos IBM SPSS 21® e AMOS 21®.

Na análise de outliers univariados detectamos valores extremos inferiores (abaixo de Q1 – 1,5 IQR) e superiores (acima de Q3 + 1.5 IQR), em que IQR é a amplitude interquartil, entre Q3 e Q1, onde se concentram 50% dos dados de qualquer distribuição.

Nenhuma variável apresentou ao mesmo tempo valores extremos superiores e inferiores. Presumida como estimador de variabilidade mais robusto para distribuições não normais, a amplitude interquartil (IQR) como referência para detecção de outliers univariados é sugerido por Tukey (1977)Tukey, J. (1977). Exploratory data analysis. Addison-Wesley., que considera outliers valores fora do intervalo (Q1 – 1,5 IQR, Q3 – 1,5 IQR). Esse critério é adotado nos gráficos do tipo “boxplot” de softwares como o SPSS®, quando se assinalam os valores extremos univariados detectados.

Não houve evidência de que os outliers detectados fossem observações anômalas. Para evitar uma redução considerável da amostra, pela eliminação de questionários, foram realizadas análises, mantendo-se os outliers univariados detectados. No entanto, para mitigar seu efeito, todos os valores extremos inferiores foram substituídos em uma única rodada por medidas em uma posição acima da escala e os valores extremos superiores por medidas em uma posição abaixo da escala, como sugerido por Tabachnick e Fidell (1996)Tabachnick, B. G., & Fidell, L. S. (1996). Using Multivariate Statistics, 3rd ed, HarperCollins. New York.. Após a atenuação dos efeitos dos valores extremos, novas análises detectaram o surgimento de outros dados como outliers, embora em um número muito baixo. Após o tratamento dos valores extremos univariados, foram detectados valores discrepantes multivariados, utilizando a distância de Mahalanobis, que leva em conta as covariâncias, presumindo a correlação entre as variáveis e as diferenças de dispersão (Mingoti, 2005Mingoti, S. A. (2005). Análise de dados através de métodos de estatística multivariada: uma abordagem aplicada. Editora UFMG.). Devido ao número extremamente baixo de outliers multivariados, os dois casos identificados foram retidos para análise posterior.

Devido à coleta eletrônica de dados, não tivemos problemas de ausência de dados, exceto no caso de respostas relativas à opção NA (“não se aplica”) em dois itens da escala de GFP, descritos mais adiante.

Inicialmente, fizemos a análise fatorial exploratória (AFE) das escalas de Impulsividade nas Compras (IC) e Tensão Financeira (TF), para verificar sua dimensionalidade (Netemeyer et al. 2003Netemeyer, R. G., Bearden, W. O., & Sharma, S. (2003). Scaling procedures: Issues and applications. Sage Publications.). No caso da IC (Weun et al., 1997Weun, S., Jones, M. A., & Beatty, S. E. (1997). A parsimonious scale to measure impulse buying tendency. AMA Educators’ Proceedings: Enhancing Knowledge Development in Marketing, 306-307.) e TF (Mills et al., 1992Mills, R. J., Grasmick, H. G., Morgan, C. S., & Wenk, D. (1992). The effects of gender, family satisfaction, and economic strain on psychological well-being. Family Relations, 440-445.), segundo as fontes originais das escalas, a expectativa era a obtenção de soluções unidimensionais e internamente consistentes. No caso da GFP, o pressuposto era o de uma escala com quatro fatores, com estrutura similar àquela revelada por Dew e Xiao (2011)Dew, J., & Xiao, J. J. (2011). The Financial Management Behavior scale: development and validation. Journal of Financial Counseling and Planning, 22 (1), 43-87..

Na AFE da Impulsividade, extraindo fatores usando análise de componentes principais, obtivemos uma solução adequada (KMO = 0,81, teste de esfericidade de Bartlett significativo, p < 0,01). O primeiro fator explicou o percentual de 56% de variância. Para garantir unidimensionalidade, excluímos o item de menor carga no primeiro fator extraído, o item reverso P5 (“Evito comprar coisas que não estão em minha lista de compras”). Consequentemente, o percentual da variância explicada pelo primeiro fator (66,3%) ultrapassou 60%. A solução fatorial também era aceitável (KMO = 0,80 e teste de esfericidade de Bartlett significativo).

Com a exclusão de um item, o alfa de Cronbach para a escala de IC foi para 0,82 superando o patamar mínimo de consistência interna de uma escala unidimensional (Netemeyer et al., 2003Netemeyer, R. G., Bearden, W. O., & Sharma, S. (2003). Scaling procedures: Issues and applications. Sage Publications.).

Na AFE da Tensão Financeira, também extraímos fatores usando análise de componentes principais. A solução fatorial foi adequada (KMO = 0,74, teste de esfericidade de Bartlett significativo, p < 0,01), e o primeiro fator apresentou variância explicada de 59%. Para ter unidimensionalidade, excluímos um dos itens da escala: T2 (“Gasto bastante tempo me preocupando com assuntos financeiros”). Com os três itens restantes, a escala de TF apresentou unidimensionalidade, pois a variância explicada pelo primeiro fator era de 70%. Essa solução fatorial também era aceitável (KMO = 0,67 e teste de Bartlett significativo). O alfa de Cronbach de 0,78 para a escala de TF também superou o patamar mínimo de 0,60.

De acordo com os resultados da AFE e do alfa de Cronbach, concluímos que, após a exclusão de um item em cada uma delas, as escalas de IC e TF tornaram-se unidimensionais e tinham consistência interna.

Nesta pesquisa, excluímos dois itens da escala de Gestão Financeira Pessoal de análises posteriores (R4 = “Fiquei dentro do orçamento ou plano de despesas” e R13 = “Fiz apenas pagamentos mínimos de empréstimos”), devido a respostas “Não se aplica”, consideradas casos legítimos de dados ausentes.

Supondo correta a solução fatorial encontrada por Dew e Xiao (2011)Dew, J., & Xiao, J. J. (2011). The Financial Management Behavior scale: development and validation. Journal of Financial Counseling and Planning, 22 (1), 43-87., ou seja, interpretando PFM como um construto de segunda ordem e quatro fatores, avaliamos sua confiabilidade e validade no contexto do modelo que relaciona Gestão Financeira à Impulsividade de Compra e Tensão financeira: IC → GFP → TF.

Utilizando-se o método de máxima verossimilhança, estimamos os índices de ajuste e coeficientes do modelo de mensuração, com resultados da análise fatorial confirmatória dos três construtos mostrados na Figura 1.

O modelo de mensuração apresentou ajuste satisfatório (χ2 = 275,83, g.l. =162, p < 0,01, χ2 / g.l. = 1,70, CFI = 0,91, TLI = 0,90, RMSEA = 0,06, PCLOSE = 0,09). Segundo Hu e Bentler (1999)Hu, L. T., & Bentler, P. M. (1999). Cutoff criteria for fit indexes in covariance structure analysis: Conventional criteria versus new alternatives. Structural equation modeling: a multidisciplinary journal, 6(1), 1-55., valores do índice CFI (Índice de Ajuste Comparativo) acima de 0,90 são satisfatórios, embora valores acima de 0,95 sejam recomendáveis. Valores do qui-quadrado normalizado (χ2 / g.l.) devem ser inferiores a 2 ou 3 (Schreiber, Nora, Stage, Barlow, & King 2006Schreiber, J. B., Nora, A., Stage, F. K., Barlow, E. A., & King, J. (2006). Reporting structural equation modeling and confirmatory factor analysis results: A review. The Journal of educational research, 99(6), 323-338.). Em função de sua sensibilidade ao número de parâmetros estimados no modelo, o índice RMSEA (Raiz do Erro Quadrático Médio de Aproximação) tem sido considerado com um dos mais informativos, sendo recomendado por Hu e Bentler (1999)Hu, L. T., & Bentler, P. M. (1999). Cutoff criteria for fit indexes in covariance structure analysis: Conventional criteria versus new alternatives. Structural equation modeling: a multidisciplinary journal, 6(1), 1-55. que seu valor seja igual ou inferior a 0,06. No modelo de mensuração, construtos e subconstrutos apresentaram cargas significativas (p < 0,05) em todos os seus respectivos indicadores, e detectaram-se covariâncias significativas esperadas entre construtos.

Esses resultados reforçam evidências de plausibilidade do modelo proposto e, consequentemente, evidências de confiabilidade e validade dos construtos associados. Com base nas estimativas do modelo, índices relatados na Tabela 2 atestam confiabilidade e validade de construto (validades convergente e discriminante).

Tabela 2
Confiabilidade e validade dos construtos (n =195)

Confiabilidade Composta (CC ≥ .60 mostra confiabilidade, embora alguns autores afirmem que .60 é aceitável apenas em estudos exploratórios (por exemplo, Ab Hamid, Sami & Sidek, 2017Ab Hamid, M. R., Sami, W., & Sidek, M. M. (2017). Discriminant Validity Assessment: Use of Fornell & Larcker criterion versus HTMT Criterion. In Journal of Physics: Conference Series, 890(1), p. 012163. IOP Publishing.). CC maior que .60 e VME ≥ .50 evidenciam validade convergente (Netemeyer et al., 2003Netemeyer, R. G., Bearden, W. O., & Sharma, S. (2003). Scaling procedures: Issues and applications. Sage Publications.). As correlações entre os construtos estão abaixo da diagonal na parte cinza da tabela. Além disso, na diagonal, em negrito, a raiz quadrada dos AVEs deve ser maior que o módulo das correspondentes correlações de Pearson para indicar a validade discriminante de cada construto de um par considerado.

A validade preditiva e a nomológica da GFP foram examinadas, testando-se as hipóteses de efeito negativo de IC em GFP (H1), efeito positivo de IC em TF (H2) e efeito negativo de GFP em TF (H3).

Foram comparados dois modelos aninhados, usando-se a diferença de qui-quadrados. O primeiro deles, menos restrito, presumia que GFP mediava parcialmente a relação entre IC e TF, ou seja, as três hipóteses de efeitos seriam verdadeiras. O segundo modelo, aninhado no anterior e mais restrito, supunha que GFP exerce um papel de mediação total entre IC e TF, isto é, não há efeito direto significativo de IC em TF (somente a primeira e terceira hipóteses seriam verdadeiras). Resultados da estimação do primeiro modelo (mediação parcial) são mostrados na Figura 2.

Figura 2
Estimativas padronizadas do modelo de mediação parcial (n = 195)

Os índices de ajuste do modelo 1 - em que GF é mediadora parcial - são os mesmos do modelo de mensuração anteriormente comentado e, portanto, são satisfatórios (χ2= 275,83, g.l. =162, p < 0,01, χ2 / g.l. = 1,70, CFI = 0,91, TLI = 0,90, RMSEA = 0,06, PCLOSE = 0,09), conforme explicado anteriormente na análise do modelo de mensuração.

Taking the model 1 as valid, we also estimate the results of the model 2 (PFM is the total mediator between Buying Impulsiveness and Financial Strain and, as a consequence, the direct effect of BI on FS is null), nested in the model 1.

Partindo-se do pressuposto de validade do modelo 1, estimamos também os resultados do modelo 2 (GFP é mediador total entre Impulsividade nas Compras e Tensão Financeira e, consequentemente, é nulo o efeito direto de IC em TF), aninhado no modelo 1.

A diferença de qui-quadrados dos modelos (∆χ2 = 9,223 com ∆G.L.=1) é significativa (p < 0,01). Logo, o modelo 1 (parcialmente mediado) é preferível ao modelo 2 (totalmente mediado).

Com base nos efeitos estimados no modelo 1, a Tabela 3 mostra que as três hipóteses de pesquisa foram sustentadas. Valores padronizados desses efeitos são, respectivamente, -0,28, 0,26 e -0,59 (ver Figura 2).

Tabela 3
Resultados dos testes de hipóteses

5 Implicações dos Resultados e Considerações Finais

O exame empírico, em língua portuguesa, das escalas do comportamento de Gestão Financeira Pessoal, Impulsividade nas Compras e Tensão Financeira, apresentou evidências de boas propriedades psicométricas, em termos de dimensionalidade, confiabilidade e validade de construto, baseando-se num levantamento com respondentes brasileiros pela internet.

O modelo usado para averiguar a validade preditiva e nomológica do construto focal – GFP – envolveu, além do teste da escala, o exame de sua relação com um construto antecedente (IC) e um construto consequente (TF), para analisar sua consistência e utilidade prática.

Como contribuição teórica, a sustentação empírica das hipóteses de pesquisa - GFP tem efeito negativo em TF e media parcialmente o efeito da IC em TF - motivam o uso da escala de GFP para avaliações de competência financeira pessoal e construtos com ela relacionados.

Na prática, a análise do construto multidimensional de GFP traz informações importantes tanto para programas de educação financeira quanto para a segmentação de consumidores. Das quatro dimensões – Economias e Investimentos, Seguros, Gestão de Fluxo de Caixa e Gestão de Créditos – aparentemente a GFP se manifesta mais fortemente na Gestão de Fluxo de Caixa (R2Créd. = 80%; R2Fluxo. = 94%; R2Econ. = 46%; R2Segur. = 13%), sendo seus comportamentos provavelmente imediatamente reveladores de um padrão de Gestão Financeira Pessoal. Tal resultado sugere que comportamentos como comparar preços, pagar contas em dia, manter um registro de despesas, ficar dentro de um orçamento ou plano de despesas e não fazer dívidas exageradas caracterizam mais claramente a GFP adequada do que investir a longo prazo e manter seguros. Assim, uma boa educação financeira pode começar pela instrução na boa gestão de fundos e conta corrente, caso esse resultado se confirme em outros estudos.

Evidência de validade preditiva do construto GFP foi obtida verificando-se sua relação negativa com a Tensão Financeira no contexto brasileiro, corroborando resultados anteriores, que mostram que indivíduos com comportamentos inadequados de gestão de recursos tendem a ser mais estressados e ter mais preocupações financeiras. Uma gestão financeira pessoal competente pode contribuir efetivamente para reduzir dificuldades financeiras, anulando condições geradoras de insatisfação e estresse.

O efeito da Impulsividade nas Compras na Tensão Financeira requer maior investigação. Os resultados mostraram que o modelo parcialmente mediado é preferível ao modelo totalmente mediado, ou seja, IC exerce tanto efeito direto positivo quanto um efeito negativo indireto na Tensão Financeira, via GFP. Talvez quanto mais os indivíduos comprem impulsivamente, mais inseguros fiquem quanto à sua capacidade de arcar com os gastos e com o endividamento potencial, aumentando suas preocupações financeiras, mas esse efeito pode ser mitigado por uma boa gestão pessoal de recursos financeiros.

Os resultados sugerem que consumidores educados para reduzir sua impulsividade, com aumento do autocontrole, podem diminuir suas compras impulsivas, reduzindo consequentemente seu impacto no aumento do seu estresse ou tensão financeira.

Metodologicamente, acreditamos que o presente trabalho contribui para a consolidação de boas práticas de avaliação, adaptação e uso de escalas de marketing e gestão, contribuindo para o desenvolvimento teórico e aplicações gerenciais.

Apesar dos resultados consistentes e promissores, o estudo apresenta limitações relacionadas ao método de pesquisa, amostragem, presença atenuada de outliers nos dados e eliminação de alguns itens das escalas. Relações causais inferidas são especulativas, não obstante sua plausibilidade. A amostra de pessoas de alta escolaridade não é representativa da população brasileira adulta. Por isso, estudos posteriores com amostras maiores e diversificadas poderão descrever melhor os padrões de comportamento de gestão financeira dos brasileiros adultos.

Como pesquisa mais avançada, recomendamos usar as escalas validadas na investigação dos traços de personalidade explicativos dos comportamentos de impulsividade nas compras, gestão financeira pessoal e tensão financeira. A descoberta desses traços de personalidade pode ser usada na segmentação de consumidores, escolha de apelos específicos para uso na comunicação, associada a programas de educação financeira, e desenvolvimento de serviços financeiros mais adequados, levando em conta as características da população-alvo e a relação dessas características com a gestão das finanças pessoais, seus antecedentes e consequentes.

Contribuição dos autores:

Contribuição Ricardo Teixeira Veiga Cátia Fabíola Parreira de Avelar Luiz Rodrigo Cunha Moura Agnaldo Keiti Higuchi
1. Definição do problema de pesquisa
2. Desenvolvimento das hipóteses ou questões de pesquisa (trabalhos empíricos)
3. Desenvolvimento das proposições teóricas
(ensaios teóricos)
4. Fundamentação teórica/Revisão de Literatura
5. Definição dos procedimentos metodológicos
6. Coleta de Dados
7. Análise Estatística
8. Análise e interpretação dos dados
9. Revisão crítica do manuscrito
10. Redação do manuscrito
11. Outra (favor especificar)
  • Avaliado pelo sistema:Double Blind Review
  • Agências de Fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPQ
  • “Somos muito gratos ao CNPq pelo financiamento da pesquisa e aos respondentes por sua colaboração”

Referências

  • Ab Hamid, M. R., Sami, W., & Sidek, M. M. (2017). Discriminant Validity Assessment: Use of Fornell & Larcker criterion versus HTMT Criterion. In Journal of Physics: Conference Series, 890(1), p. 012163. IOP Publishing.
  • Academia Brasileira de Ciências (2013). Rigor e integridade na condução da pesquisa científica – guia de recomendações de práticas responsáveis, 2013. Recuperado de https://www.abc.org.br/IMG/pdf/doc-4311.pdf
    » https://www.abc.org.br/IMG/pdf/doc-4311.pdf
  • Amar, M., Ariely, D., Ayal, S., Cryder, C. E., & Rick, S. I. (2011). Winning the battle but losing the war: The psychology of debt management. Journal of Marketing Research, 48(SPL), 38-50.
  • Archuleta, K. L., Britt, S. L., Tonn, T. J., & Grable, J. E. (2011). Financial satisfaction and financial stressors in marital satisfaction. Psychological Reports, 108(2), 563-576.
  • Bagozzi, R. P., & Yi, Y. (1993). Multitrait–multimethod matrices in consumer research: critique and new developments. Journal of Consumer Psychology, 2(2), 143-170.
  • Campara, J. P., Vieira, K. M., & Ceretta, P. S. (2016). Entendendo A Atitude Ao Endividamento: Fatores Comportamentais E Variáveis Socioeconômicas O Determinam?. Revista Eletrônica de Ciência Administrativa, 15(1), 5.
  • Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (2017). Pesquisa Nacional de Endividamento e Inadimplência do Consumidor. Recuperado de http://cnc.org.br/sites/default/files/arquivos/analise_peic_outubro_2017.pdf
    » http://cnc.org.br/sites/default/files/arquivos/analise_peic_outubro_2017.pdf
  • Conto,S.M., Faleiro, S. N., Fürh, I.J., & Kronbauer, K. A. (2015). O comportamento de alunos do ensino médio do Vale do Taquari em relação às finanças pessoais. Revista Eletrônica de Estratégia & Negócios, 8:2, 182-206.
  • Cronbach, L. J., & Meehl, P. E. (1995). Construct validity in psychological tests. Psychological Bulletin, 52(4), 281.
  • Dew, J., & Xiao, J. J. (2011). The Financial Management Behavior scale: development and validation. Journal of Financial Counseling and Planning, 22 (1), 43-87.
  • Falahati, L., Sabri, M. F., & Paim, L. H. (2012). Assessment a model of financial satisfaction predictors: Examining the mediate effect of financial behavior and financial strain. World Applied Sciences Journal, 20(2), 190-197.
  • Farrell, L., Fry T. & Risse, L. (2015) The significance of financial self-efficacy in explaining women’s personal finance behaviour. Journal of Economic Psychology, 54, 85–99.
  • Figueira, R., F. & Pereira, R. C. F. (2014). Devo, Não Nego, Pago Quando Puder: uma Análise dos Antecedentes do Endividamento do Consumidor. Revista Brasileira de Marketing, 13(5).
  • Flake, J. K.; Pek, J., & Hehman, E. (2017). Construct validation in social and personality research: Current practice and recommendations. Social Psychological and Personality Science, 8(4), 370-378.
  • Fornell, C., & Larcker, D. F. (1981). Evaluating structural equation models with unobservable variables and measurement error. Journal of Marketing Research, 39-50.
  • Gerbing, D. W., & Anderson, J. C. (1988). An updated paradigm for scale development incorporating unidimensionality and its assessment. Journal of Marketing Research, 186-192.
  • Hair, J. F., Black, W. C., Babin, B. J., & Anderson, R. E. (2009). Multivariate Data Analysis. Upper Saddle River, NJ: Prentice hall.
  • Hu, L. T., & Bentler, P. M. (1999). Cutoff criteria for fit indexes in covariance structure analysis: Conventional criteria versus new alternatives. Structural equation modeling: a multidisciplinary journal, 6(1), 1-55.
  • Joo, S. (2008). Personal financial wellness. In Handbook of consumer finance research (pp. 21-33). Springer New York.
  • Joo, S. H., & Grable, J. E. (2004). An exploratory framework of the determinants of financial satisfaction. Journal of family and economic Issues, 25(1), 25-50.
  • Kamleitner, B., Hoelzl, E. & Kirchler, E. (2012). Credit use: Psychological perspectives on a multifaceted phenomenon. International Journal of Psychology, 47 (1), 1–27.
  • Lynch, J. (2011) Introduction to the Journal of Marketing Research Special Interdisciplinary Issue on Consumer Financial Decision Making. Journal of Marketing Research: November 2011, Vol. 48, No. SPL, pp. Siv-Sviii.
  • Medeiros, F. G., Diniz, I. S. F. N, Costa, F. J., & Pereira, R. D. C. F. (2015). Influência de estresse, materialismo e autoestima na compra compulsiva de adolescentes. RAC-Revista de Administração Contemporânea, 19(2), 138-155.
  • Medeiros, S.F. & Lopes, T.A. (2014). Finanças pessoais: um estudo com alunos do curso de Ciências Contábeis de uma IES privada de Santa Maria – RS. Revista Eletrônica de Estratégia & Negócios, 7:2, 221-251.
  • Mendes-da-Silva, W., Nakamura, W. T. & Moraes, D. C. (2012). Credit card risk behavior on college campuses: evidence from Brazil. BAR. Brazilian administration review, 9, 351-373.
  • Mills, R. J., Grasmick, H. G., Morgan, C. S., & Wenk, D. (1992). The effects of gender, family satisfaction, and economic strain on psychological well-being. Family Relations, 440-445.
  • Mingoti, S. A. (2005). Análise de dados através de métodos de estatística multivariada: uma abordagem aplicada. Editora UFMG.
  • Miotto, A. P. S., & Parente, J. (2015). Antecedentes e consequências do gerenciamento das finanças domésticas na classe média baixa brasileira. RAE-Revista de Administração de Empresas, 55(1), 50-64.
  • Moreira, R.M. & Carvalho, H. L. (2013). As finanças pessoais dos professores da rede municipal de ensino de Campo Formoso-BA: Um estudo na Escola José de Anchieta. Revista de Gestão, Finanças e Contabilidade, 3:1,122-137.
  • Netemeyer, R. G., Bearden, W. O., & Sharma, S. (2003). Scaling procedures: Issues and applications. Sage Publications.
  • Norvilitis, J. M. & Mendes-Da-Silva, W. (2013) Attitudes toward Credit and Finances among College Students in Brazil and the United States. Journal of Business Theory and Practice, 1:1, 132-151.
  • Norvilitis, J. M., Merwin, M. M., Osberg, T. M., Roehling, P. V., Young, P., & Kamas, M. M. (2006). Personality factors, money attitudes, financial knowledge and credit card debt in college students. Journal of applied social psychology, 36, 1395-1413.
  • Piccoli, M. R. & Silva, T. P. (2015). Análise do nível de educação em gestão financeira dos funcionários de uma instituição de ensino superior. Economia e Gestão, 15:41,112-134.
  • Pirog S.F. & Roberts J.A. (2007) Personality and Credit Card Misuse Among College Students: The Mediating Role of Impulsiveness, Journal of Marketing Theory and Practice, 15:1, 65-77.
  • Podsakoff, P. M., MacKenzie, S. B., Lee, J. Y., & Podsakoff, N. P. (2003). Common method biases in behavioral research: A critical review of the literature and recommended remedies. Journal of applied psychology, 88(5), 879.
  • Rook, D. W., & Fisher, R. J. (1995). Normative influences on impulsive buying behavior. Journal of Consumer Research, 22(3), 305-313.
  • Serviço de Proteção ao Crédito & Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (2017). Consequências da inadimplência nas emoções, relacionamentos e saúde Recuperado de https://www.spcbrasil.org.br/wpimprensa/wp-content/uploads/2017/10/SPC-Analise-Consequ%C3%AAncias-da-Inadimpl%C3%AAncia-2017.pdf
    » https://www.spcbrasil.org.br/wpimprensa/wp-content/uploads/2017/10/SPC-Analise-Consequ%C3%AAncias-da-Inadimpl%C3%AAncia-2017.pdf
  • Schreiber, J. B., Nora, A., Stage, F. K., Barlow, E. A., & King, J. (2006). Reporting structural equation modeling and confirmatory factor analysis results: A review. The Journal of educational research, 99(6), 323-338.
  • Spinella, M., Yang, B. & Lester, D. (2007). Development of the executive personal finance scale. International Journal of Neuroscience, 117:301–313.
  • Strauss, M. E., & Smith, G. T. (2009). Construct validity: Advances in theory and methodology. Annual review of clinical psychology, 5, 1-25.
  • Strömbäck, C., Lind, T., Skagerlund, K., Västfjäll, D. & Tinghög, G.(2017). Does self-control predict financial behavior and financial well-being? Journal of Behavioral and Experimental Finance, 14, 30–38.
  • Tabachnick, B. G., & Fidell, L. S. (1996). Using Multivariate Statistics, 3rd ed, HarperCollins. New York.
  • Tang, N. & Baker, A. (2016). Self-esteem, financial knowledge and financial behavior. Journal of Economic Psychology, 54,164–176.
  • Trindade, L. L., Righi, M. B., & Vieira, K. M. (2012). De onde vem o endividamento feminino? Construção e Validação de um modelo PLS-PM. Revista Eletrônica de Administração, 73(3), 718-746.
  • Tukey, J. (1977). Exploratory data analysis. Addison-Wesley.
  • Weun, S., Jones, M. A., & Beatty, S. E. (1997). A parsimonious scale to measure impulse buying tendency. AMA Educators’ Proceedings: Enhancing Knowledge Development in Marketing, 306-307.
  • Zimmerman, S. L. (1995). Understanding family policy: Theories and applications Sage.
Editor responsável:Prof. Dr. Javier Montoya

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Ago 2019
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2019

Histórico

  • Recebido
    12 Mar 2018
  • Aceito
    30 Nov 2018
Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado, Av. da Liberdade, 532, 01.502-001 , São Paulo, SP, Brasil , (+55 11) 3272-2340 , (+55 11) 3272-2302, (+55 11) 3272-2302 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbgn@fecap.br