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Ecoempreendedores e os estágios do ciclo de vida do empreendimento: um estudo de multicasos nos negócios ambientais

Resumo

Objetivo:

Este estudo propõe analisar a adaptação dos ecoempreendedores em cada estágio do ciclo de vida do empreendimento.

Metodologia:

Com base em uma abordagem qualitativa de natureza descritiva, um estudo de multicasos foi realizado compreendendo quatro empresários de empreendimentos ambientais. A coleta de dados foi realizada por meio de análise documental e de entrevista semiestruturada, realizada por meio da técnica de análise do conteúdo.

Resultados:

Os resultados mostraram que dois estágios demandam adaptações comuns não importando o contexto dos negócios, sendo que o outro estágio requer ajustes específicos. Sendo assim, foi proposta uma estrutura para apresentar as adaptações de que os ecoempreendedores precisam para passar por cada estágio do ciclo de vida do empreendimento.

Contribuições:

Espera-se que este estudo contribua para a literatura sobre os empreendedores e os estágios do ciclo de vida do empreendimento, bem como com os ecoempreendedores, especificamente fornecendo a eles dados empíricos em relação às possíveis adaptações que eles possam vir a enfrentar durante cada estágio do ciclo de vida do empreendimento.

Palavras-chave:
Empreendedorismo; ciclo de vida do empreendimento; oportunidade

Abstract

Purpose:

This study proposes to analyze the adaptation of ecopreneurs in each stage of the entrepreneurial life cycle.

Design/methodology/approach:

Based on a qualitative approach of a descriptive nature, a multiple case study was conducted comprising four entrepreneurs from environmental enterprises. The data collection was performed through semi-structured interviews and documental analysis, and analyzed using the content analysis technique.

Findings:

The results demonstrated that two stages demand common adaptations regardless of the context of the business, and the other one requires specific adjustments. Thus, a framework was proposed to present the adaptations ecopreneurs need to make during each stage of the entrepreneurial life cycle.

Originality/value:

This study is expected to contribute to the literature regarding entrepreneurs and the stages of the entrepreneurial life cycle, as well as to ecopreneurs, specifically, by providing them with empirical data regarding possible adaptations they may face during each stage of the entrepreneurial life cycle.

Keywords:
Ecopreneurship; Entrepreneurial life cycle; Opportunity

1 Introdução

O conceito de desenvolvimento sustentável publicado no relatório o “Nosso Futuro Comum” (WCED, 1987) consolidou-se como um marco político, econômico e social (Ayuso & Navarrete-Báez, 2017Ayuso, S., & Navarrete-Báez, F. E. (2017). How Does Entrepreneurial and International Orientation Influence SMEs’ Commitment to Sustainable Development? Empirical Evidence from Spain and Mexico. Corporate Social Responsibility and Environmental Management, 25 (1), 80-94.), principalmente porque encoraja mudanças na sociedade para manter as necessidades das gerações futuras. As organizações começaram a refletir sobre os impactos ambientais e sociais que causam e a rever seus métodos e técnicas de produção, para minimizar esses danos.

A adoção de práticas ambientais e sociais pelas organizações estimulou a oportunidade para o negócio sustentável (Boszczowski & Teixeira, 2012Boszczowski, A. K. & Teixeira, R. M. (2012). O empreendedorismo sustentável e o processo empreendedor: em busca de oportunidades de novos negócios como solução para problemas sociais e ambientais. Revista Economia e Gestão, 12(29), 141-168.). Com a intensificação da busca por soluções para esses problemas, novos empreendimentos começaram a surgir, estimulados pela ação empresarial direcionada às práticas ambientais e sociais, ou até mesmo à combinação de ambas (Cohen & Winn, 2007; Schaltegger & Wagner, 2011).

O ecoempreendedorismo aparece nesse cenário com uma preocupação visando à minimização da degradação ambiental e considerando o uso de recursos naturais na fabricação de produtos e nos serviços prestados pelas empresas. Alternativas inovadoras (Dean & McMullen, 2007Dean, T., & McMullen, J. S. (2007). ‘Toward a theory of sustainable entrepreneurship: Reducing environmental degradation through entrepreneurial action’. Journal of Business Venturing, 22, 50-76.) permitem a destruição dos métodos tradicionais de produção e contribuem para novas técnicas, estruturas e padrões de consumo que podem corresponder às necessidades e às demandas ambientais (Schaltegger, 2002Schaltegger, S. (2002). A framework for ecopreneurship. Greener Management International, 38, 45-58.).

Falhas do mercado com foco ambiental podem se tornar um fator motivador para esse tipo de empreendedorismo, possibilitando oportunidades de negócio que gerem benefícios econômicos e ecológicos (Thompson, Kiefer & York, 2011Thompson, N., Kiefer, K., & York, J. G. (2011). Distinctions not dichotomies: Exploring social, sustainable, and environmental entrepreneurship. In Social and sustainable entrepreneurship - Advances in Entrepreneurship, Firm Emergence and Growth (pp. 201-229). Bingley, UK: Emerald Group Publishing Limited.). Assim, o empreendedorismo, reconhecido como um motor da economia, um estimulador da concorrência entre mercados e da criação de empregos (Schramm, 2010), começa a estimular os empreendedores como agentes da mudança, também se aproximando das questões ambientais.

Portanto, a identificação das possibilidades resultantes do ambiente, bem como das falhas do mercado (Dean & McMullen, 2007Dean, T., & McMullen, J. S. (2007). ‘Toward a theory of sustainable entrepreneurship: Reducing environmental degradation through entrepreneurial action’. Journal of Business Venturing, 22, 50-76.), pode possibilitar aos empreendedores ambientais - ou “ecoempreendedores” - fortalecer e estabelecer seus negócios. Para fazê-lo, os empreendedores passam por estágios do ciclo de vida do empreendimento, nos quais eles têm que se adaptar, para se desenvolverem e se estabelecerem adequadamente no mercado.

Considerando o contexto e a realidade dos empreendedores no Brasil, este estudo, portanto, propõe analisar a adaptação dos ecoempreendedores em cada estágio do ciclo de vida do empreendimento. Para alcançar esse objetivo, foi realizado um estudo de caso com quatro ecoempreendedores.

Como o ecoempreendedorismo é ainda considerado um tema emergente (Hall, Daneke & Lenox, 2010Hall, J. K., Daneke, G. A., & Lenox, M. J. (2010). Sustainable development and entrepreneurship: Past contributions and future directions. Journal of Business Venturing, 25(5), 439-448.; Thompsom et al., 2011), são necessários estudos para gerar novas discussões e aprofundar a compreensão do construto. Além disso, as formas de adaptação identificadas nos resultados deste estudo podem estimular os pesquisadores ao investigar o ciclo de vida do empreendimento em outros contextos, ou até mesmo a sugerir outros temas de pesquisa que ainda não foram abordados. Por outro lado, as contribuições práticas podem mostrar aos ecoempreendedores os caminhos que eles podem percorrer em cada estágio do ciclo de vida e as possíveis adaptações necessárias em cada estágio desse ciclo de vida.

2 Revisão da literatura

2.1 Ecoempreendedorismo

O empreendedorismo, tradicionalmente entendido e relacionado a questões relativas à geração de riqueza e desenvolvimento econômico (Easterly, 2002), foi o objeto de discussões relacionadas a mudanças e oportunidades surgidas no mercado que direcionam novos tipos de empreendedorismo (Cohen & Winn, 2007). Afirmando-se que “o meio ambiente indubitavelmente influencia o empreendedorismo” (Bull & Willard, 1993Bull, I., & Willard, G. E. (1993). Towards a theory of entrepreneurship. Journal of business venturing, 8(3), 183-195., p.191), é possível destacar que novas oportunidades são buscadas pelos empreendedores com o propósito de resolver um problema ou atender uma necessidade, além de causar mudanças nos sistemas comerciais e desenvolver novas ideias (Schaper, 2002Schaper, M. (2002). The essence of ecopreneurship. Greener Management International, 38, 26-30.). Pode-se inferir que esse fenômeno também se relacionará ao contexto social no qual está inserido, para dar resposta às pressões da sociedade e às mudanças econômicas que ocorreram.

Analisando os movimentos ambientais que surgiram na década de 1960, percebe-se que as discussões foram desencadeadas na economia e no ambiente de negócios (Croopper & Oates, 1992), para reduzir os problemas principalmente relacionados à degradação ambiental e ao uso dos recursos naturais. Discussões posteriores e o estabelecimento do conceito de desenvolvimento sustentável intensificaram essas discussões sobre os impactos causados pelas empresas (Du Pisane, 2006; Sachs, 2007Sachs, I. (2007). Ambiente e estilos de desenvolvimento. In Vieira, P. F. (Org.), Rumo à ecossocioeconomia: teoria e prática do desenvolvimento. São Paulo: Cortez.). Tais preocupações, ao mesmo tempo que representam Limitações para certas ações corporativas, podem oferecer novas oportunidades de negócios, assim como gerar alternativas inovadoras (Dean & McMullen, 2007Dean, T., & McMullen, J. S. (2007). ‘Toward a theory of sustainable entrepreneurship: Reducing environmental degradation through entrepreneurial action’. Journal of Business Venturing, 22, 50-76.). As questões ambientais e sociais podem, portanto, levar a oportunidades de negócio sustentável (Boszczowski & Teixeira, 2012Boszczowski, A. K. & Teixeira, R. M. (2012). O empreendedorismo sustentável e o processo empreendedor: em busca de oportunidades de novos negócios como solução para problemas sociais e ambientais. Revista Economia e Gestão, 12(29), 141-168.), bem como a ter suas práticas encorajadas e/ou incorporadas por meio da ação empresarial (Cohen & Winn, 2007).

O interesse em uma estrutura de negócio sustentável e a busca por práticas comerciais ambientalmente responsáveis (Shaper, 2002) para oferecer soluções a problemas ambientais se destacaram como condições crescentes no campo dos empreendimentos desde a década de 1990 (Dixon & Clifford, 2007Dixon, S., & Clifford, A. (2007). Ecopreneurship - a new approach to managing the triple bottom line. Journal of Organizational Change Management, 20(3), 326-345.). Além disso, com a intensificação das preocupações com a degradação ambiental e com o uso dos recursos naturais (Cohen & Winn, 2007; Dean & McMullen), o foco dos negócios e dos empreendimentos na dimensão ambiental foi encorajado (Gast, Gundolf & Cesinger, 2017Gast, J., Gundolf, K., & Cesinger, B. (2017). Doing business in a green way: A systematic review of the ecological sustainability entrepreneurship literature and future research directions. Journal of Cleaner Production, 147, 44-56.). Um tipo de empreendedorismo emergiu para incluir as questões ambientais nas estratégias da empresa, sendo chamado de “ecoempreendedorismo” (Pastakia, 1998Pastakia, A. (1998). Grassroots ecopreneurs: change agents for a sustainable society. Journal of Organizational Change Management, 11(2), 157-173.; Schaltegger, 2002Schaltegger, S. (2002). A framework for ecopreneurship. Greener Management International, 38, 45-58.), empreendedorismo ambiental (Thompson et al., 2011Thompson, N., Kiefer, K., & York, J. G. (2011). Distinctions not dichotomies: Exploring social, sustainable, and environmental entrepreneurship. In Social and sustainable entrepreneurship - Advances in Entrepreneurship, Firm Emergence and Growth (pp. 201-229). Bingley, UK: Emerald Group Publishing Limited.), empreendedorismo ecológico (Berle, 1991Berle G. (1991). The Green Entrepreneur: Business Opportunities That Can Save the Earth and Make You Money. Blue Ridge. Summit, PA: Liberty Hall Press.) ou negócio ambiental (Holt, 2011Holt, D. (2011). Where are they now? Tracking the longitudinal evolution of environmental businesses from the 1990s. Business Strategy and the Environment, 20(4), 238-250.).

Vale notar que os empreendedores ambientais são orientados a desenvolver práticas que buscam tanto o crescimento econômico quanto o ambiental, também compreendendo questões éticas e sociais. As questões e preocupações éticas para as gerações futuras também podem ser fatores motivadores do empreendedorismo ambiental, já que ajudam a impulsionar, por meio de novas tecnologias, a criação de valores ambientais (Anderson & Leal, 2001Anderson, T. L., & Leal, D. R. (2001). Free market environmentalism. Stanford, CA: Hoover Institution Press.).

É possível que o ecoempreendedorismo desperte dúvidas em relação à busca de soluções ambientais para falhas do mercado ou até mesmo em relação a oportunidades surgidas do meio ambiente. Isso pode ser verificado em um estudo realizado por Thompson et al. (2011Thompson, N., Kiefer, K., & York, J. G. (2011). Distinctions not dichotomies: Exploring social, sustainable, and environmental entrepreneurship. In Social and sustainable entrepreneurship - Advances in Entrepreneurship, Firm Emergence and Growth (pp. 201-229). Bingley, UK: Emerald Group Publishing Limited.) no qual, ao examinar os conceitos e elementos da literatura que diferenciam três tipos de empreendedorismo, são destacadas questões importantes que podem ser essenciais para compreender a emergência e o estabelecimento do empreendedorismo ambiental. As questões envolvem as oportunidades ambientais e porque elas se apresentam a alguns indivíduos; isso envolve o papel desses empreendedores no combate à degradação ambiental, e se esse tipo de empreendedorismo contribui para reduzir essa degradação; outro questionamento tem o objetivo de compreender o processo envolvido nesse tipo de empreendedorismo, bem como seus métodos de identificação e aproveitamento de oportunidades; também busca compreender as consequências para o meio ambiente e para a sociedade, quando o meio ambiente é incluído em um empreendimento, como um elemento no processo do mercado.

O ciclo de vida do empreendimento apresenta, portanto, um meio relevante para melhor compreender esses questionamentos, já que compreende a identificação de oportunidades (e porque alguns indivíduos são mais capazes de identificar oportunidades do que outros), assim como o papel que os empreendimentos ecológicos desempenham nos impactos ambientais (a partir dos resultados dos empreendimentos ecológicos e dos valores gerados na fase de aproveitamento) e a necessidade de uma fase intermediária (exploração) entre a identificação da oportunidade e sua exploração.

2.2 As fases do ciclo de vida do empreendimento

2.2.1Identificação da oportunidade

Voltando ao conceito de empreendedorismo sustentável utilizado neste trabalho, isto é, que “o empreendedorismo sustentável envolve a identificação, a exploração e o aproveitamento de novos negócios que são, no desenvolvimento econômico, a solução para um problema ambiental ou social” (Boszczowski & Teixeira, 2012Boszczowski, A. K. & Teixeira, R. M. (2012). O empreendedorismo sustentável e o processo empreendedor: em busca de oportunidades de novos negócios como solução para problemas sociais e ambientais. Revista Economia e Gestão, 12(29), 141-168., p.143), as fases do ciclo de vida do empreendimento podem ser observadas nesse conceito. São elas: identificação da oportunidade, exploração da oportunidade e aproveitamento da oportunidade.

Sendo o ecoempreendedorismo um subgrupo do empreendedorismo sustentável, podemos inferir que essas fases podem ser aplicadas também a este último, já que o ciclo de vida desses negócios ambientais envolve a identificação, a exploração e o aproveitamento de oportunidades, que produzem benefícios econômicos e ecológicos para a sociedade.

Alguns elementos que promovem a identificação de oportunidades, a primeira fase do ciclo de vida do empreendimento, são: mudanças nas variáveis econômicas, políticas, sociais, tecnológicas e demográficas, posse de informações anteriores, bem como propriedades cognitivas que permitem ao empreendedor avaliar as informações possuídas (Shane & Venkataranam, 2000Shane, S. & Venkataramam, S. (2000). The promise of entrepreneurship as a field of research. Academy of management review, 25(1), 271-226.), mudanças nas informações que a empresa tem com relação aos recursos disponíveis (Companys & Mcmullen, 2007Companys, Y. E., & McMullen, J.S. (2007). Strategic Entrepreneurs at Work: The Nature, Discovery, and Exploitation of Entrepreneurial Opportunities. Small Business Economics, 28(4), 301-322.), novas descobertas (Kirzner, 1973Kirzner, I. (1973). Competition and Entrepreneurship. Chicago, IL: Chicago Press.), novas criações (Schumpeter, 1982Schumpeter, J. A. (1982). A teoria do desenvolvimento econômico. São Paulo: Abril Cultural, 1-169.), acesso a informações que os outros concorrentes não possuem - sejam elas técnicas ou relacionadas a possíveis consumidores e mercados nos quais os empreendedores possam querer entrar (Baron & Shane, 2007Baron, R. A. & Shane, S. A (2007). Empreendedorismo: uma visão do processo. São Paulo: Thompson Learning.; Shepherd & DeTienne, 2005Shepherd, D. A., & DeTienne, D. R. (2005). Prior knowledge, potential financial reward, and opportunity identification. Entrepreneurship theory and practice, 29(1), 91-112.); aprendizado anterior, experiências de vida, relações sociais estabelecidas pelo empreendedor, educação e motivação (Costa, Machado & Vieira, 2007Costa, C. R. F., Machado, H. V., & Vieira, F. G. D. (2007). Comportamento empreendedor na exploração de oportunidades: história oral sobre o caso de uma indústria do setor alimentício. Desenvolvimento em questão, 5, 75-95.).

Além do que esses autores destacam, Shane (2000Shane, S. & Venkataramam, S. (2000). The promise of entrepreneurship as a field of research. Academy of management review, 25(1), 271-226.) aponta que o empreendedor precisa possuir não apenas conhecimento do mercado, de suas demandas ou das necessidades existentes, mas também dos meios que devem ser utilizados para atendê-las.

Assim, observa-se que as “falhas do mercado”, que consistem em fontes potenciais para a identificação de oportunidades (Dean & McMullen, 2007Dean, T., & McMullen, J. S. (2007). ‘Toward a theory of sustainable entrepreneurship: Reducing environmental degradation through entrepreneurial action’. Journal of Business Venturing, 22, 50-76.), podem ser mais facilmente identificadas por alguns indivíduos do que por outros. Isso ocorre porque alguns indivíduos possivelmente prestam mais atenção a essas fontes potenciais de oportunidades, tendo o que pode ser chamado de um nível de “alerta empresarial” maior do que o de outros indivíduos. Esse alerta é promovido pela combinação de traços de personalidade, conhecimento prévio, experiências e participação em redes sociais que facilitam o acesso e o conhecimento do mercado que esses indivíduos desejam penetrar, bem como técnicas e conhecimento necessários para iniciar o negócio que desejam (Ardichvili, Cardozo & Ray, 2003Ardichvili, A., Cardozo, R., & Ray, S. (2003). A theory of entrepreneurial opportunity identification and development. Journal of Business Venturing, 18(1), 105-123.).

2.2.2Exploração da oportunidade

Mesmo se a oportunidade for identificada, pode transcorrer algum tempo entre essa fase e o aproveitamento da oportunidade em si. Isso acontece porque, para que a oportunidade identificada seja viável, isto é, para que o produto ou serviço que o empreendedor deseja oferecer seja efetivamente inserido no mercado, devem ser feitos ajustes no produto/serviços, para aumentar sua viabilidade comercial. Tal lapso de tempo entre o momento da identificação da oportunidade e seu aproveitamento consiste na fase do ciclo de vida do empreendimento que é chamada de “exploração da oportunidade”.

Essa fase existe porque os produtos e serviços identificados como potenciais oportunidades de mercado podem demandar tempo para serem desenvolvidos e considerados adequados para a inserção no mercado (Degen, 1989Degen, R. (1989). O empreendedor: fundamentos de iniciativa empresarial. McGram-Hill. São Paulo.), de modo que sejam comercialmente viáveis e estejam “prontos” para serem comercializados.

Para o autor, produtos que são associados a desenvolvimentos tecnológicos e sociais, por exemplo, frequentemente demandam esse período entre a identificação da oportunidade e a colocação do produto/serviço no mercado. Esse período intermediário pode compreender até mesmo décadas.

Uma vez que “o reconhecimento da oportunidade envolve o reconhecimento de que as ideias não são apenas novas e potencialmente úteis, mas que também têm o potencial para gerar valor econômico” (Baron & Shane, 2007Baron, R. A. & Shane, S. A (2007). Empreendedorismo: uma visão do processo. São Paulo: Thompson Learning., p.61), o planejamento e o aproveitamento de maneiras alternativas para criar tal valor devem também ser considerados ações do empreendedor.

Entretanto, o desenvolvimento da oportunidade identificada para torná-la comercialmente viável não é uma tarefa simples, já que pode demandar conhecimento prévio para facilitar a adaptação dos produtos e serviços ao mercado. Ainda assim, além do conhecimento técnico, as experiências anteriores com a gestão de negócios são importantes para garantir que essa adaptação resultará no sucesso da viabilidade do produto ou serviço identificado como uma oportunidade de mercado (Shane, 2003Shane, S. A. (2003). A general theory of entrepreneurship: The individual-opportunity nexus. Edward Elgar Publishing.).

2.2.3Exploração da oportunidade

Após a identificação e a exploração, as oportunidades de empreendimentos ambientais devem ser aproveitadas para criar valor ambiental a partir dos resultados do negócio ecológico em questão. Para fazê-lo, “o processo de aproveitamento da oportunidade envolve o desenvolvimento e a implantação de planos estratégicos”. (Hmieleski & Baron, 2008Hmieleski, K. M., & Baron, R. A. (2008). Regulatory focus and new venture performance: a study of entrepreneurial opportunity exploitation under conditions of risk versus uncertainty. Strategic Entrepreneurial Journal, 2(4), 285-299., p.286).

Esses planos devem, entretanto, estar alinhados à nova legislação e às mudanças no mercado, de modo que a oportunidade empresarial inclua essas demandas e modificações, mesmo após o empreendimento ter sido criado.

Portanto, o aproveitamento da oportunidade pode ser considerado um processo dinâmico e contínuo, já que consiste no ajuste dos planos estratégicos do empreendimento às necessidades do mercado e à legislação em vigor, ao mesmo tempo em que contribui para a criação de valor a partir dos resultados do empreendimento (Costa et al., 2007Costa, C. R. F., Machado, H. V., & Vieira, F. G. D. (2007). Comportamento empreendedor na exploração de oportunidades: história oral sobre o caso de uma indústria do setor alimentício. Desenvolvimento em questão, 5, 75-95.). Quanto aos empreendimentos ambientais, esses resultados consistem em soluções para um problema ambiental identificado como uma oportunidade empresarial que pode gerar não apenas valor econômico, mas também valor “ecológico” (Thompson et al., 2011Thompson, N., Kiefer, K., & York, J. G. (2011). Distinctions not dichotomies: Exploring social, sustainable, and environmental entrepreneurship. In Social and sustainable entrepreneurship - Advances in Entrepreneurship, Firm Emergence and Growth (pp. 201-229). Bingley, UK: Emerald Group Publishing Limited.).

3 Procedimentos metodológicos

Com base em uma abordagem qualitativa (Merriam, 2009Merriam, S. B. (2009). Qualitative Research: a guide to design and implementation. San Francisco: Jossey-Bass.), este estudo busca compreender como os indivíduos devem se adaptar, durante os estágios do ciclo de vida do empreendimento, com base na interpretação da realidade pelos participantes. Além disso, este artigo tem uma natureza descritiva, já que os pesquisadores não interferiram nos fatos, já que apenas registraram, analisaram, classificaram e interpretaram os mesmos (Raupp & Beuren, 2003).

A intenção deste estudo é, por meio de um estudo de vários casos, já que essa estratégia se mostrou adequada, explorar os relacionamentos complexos abordando o fenômeno investigado (as adaptações dos empreendedores durante os estágios do ciclo de vida do empreendimento), a partir da interpretação da pesquisa pelos participantes (Yin, 2015). O uso dessa estratégia de pesquisa se justifica porque, embora a literatura tenha vários estudos nessa área (Hall et al., 2010Hall, J. K., Daneke, G. A., & Lenox, M. J. (2010). Sustainable development and entrepreneurship: Past contributions and future directions. Journal of Business Venturing, 25(5), 439-448.; Thompsom et al., 2011), é ainda possível que os fatores e as questões relacionadas ao ecoempreendedorismo e às ações dos ecoempreendedores sejam aprofundadas (Gast et al., 2017Gast, J., Gundolf, K., & Cesinger, B. (2017). Doing business in a green way: A systematic review of the ecological sustainability entrepreneurship literature and future research directions. Journal of Cleaner Production, 147, 44-56.).

Os critérios utilizados para selecionar os empreendedores que participaram da pesquisa foram os seguintes: (i) empreendedores de pequenas empresas; (ii) empreendedores que passaram por todas as três fases do ciclo de vida do empreendimento e (iii) empreendedores com o objetivo de gerar não apenas valores econômicos, mas também valores ecológicos, como resultados de seus empreendimentos.

Assim, quatro empreendimentos “ecológicos” no Brasil foram selecionados pela amostragem teórica (Eisenhardt, 1989), considerando suas características em relação aos valores em que acreditam e buscam disseminar, produtos e/ou serviços que desenvolvem, bem como os processos e métodos de produção e gestão que utilizam. Dois empreendimentos estão estabelecidos na fabricação e comercialização de produtos de vestuário sustentável, e os restantes dois oferecem serviços sustentáveis e ecoeficientes.

A coleta de dados foi realizada através da análise documental, a partir das informações disponíveis nos sites institucionais das empresas selecionadas e de entrevistas semiestruturadas com um dos proprietários de cada empresa selecionada para este estudo. Duas entrevistas foram realizadas com cada empreendedor (totalizando oito entrevistas). As entrevistas ocorreram de outubro de 2017 a janeiro de 2018. Após a coleta de dados, buscamos analisá-los através da técnica da análise do conteúdo, como proposto por Bardin (2010Bardin, L. (2010). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70.).

Todas as categorias foram definidas à priori, consistindo em cada estágio do ciclo de vida do empreendimento, isto é, identificação da oportunidade, exploração da oportunidade e aproveitamento da oportunidade.

A triangulação dos dados contribuiu para garantir a validade interna do construto bem como a confiabilidade do estudo, já que várias fontes de dados foram utilizadas. A validade externa do estudo se baseou na lógica da replicação, já que se espera que os resultados obtidos no estudo sejam coerentes com estudos similares já realizados, com relação ao fenômeno aqui estudado.

4 Apresentação e análise dos casos

4.1 Apresentação dos ecoempreendedores e de seus empreendimentos

Para preservar a identidade dos ecoempreendedores e de seus empreendimentos analisados neste estudo, decidimos utilizar os códigos A, B, C e D para cada empreendimento e ecoempreendedor. Sendo assim, os ecoempreendedores estudados assim como seus empreendimentos são os seguintes:

Empreendedor A: a empreendedora é a única dona da empresa, criada em 2014, e está localizada na região sul do Brasil. A idade da empreendedora está entre 26 e 35 anos e ela se graduou em Design e em Moda e Design. Os principais produtos de sua empresa são peças de roupa feitas pela técnica do upcycling, que corresponde à técnica na qual as sobras de roupas são utilizadas para criar novas peças de roupa e, consequentemente, reduzem a quantidade de roupas sem uso descartadas no meio ambiente. Esporadicamente, quando o volume da demanda fica maior do que o normal, a proprietária contrata duas outras pessoas para ajudá-la a produzir suas peças de roupa. A ideia da criação do Empreendimento A surgiu quando a empreendedora conheceu a técnica do upcycling e que não era muito utilizada no Brasil. Essa foi uma oportunidade identificada pelo ecoempreendedor, já que envolvia uma questão que estava se tornando uma tendência de mercado no segmento de moda: sustentabilidade e reuso de materiais.

Empreendedor B: o empreendedor é um dos dois donos da Empresa B, criado em 2016 e localizado no sudeste do Brasil. A idade do empreendedor está entre 26 e 35 anos também e ele se graduou em Sistema de Informações. O principal serviço prestado pelo Empreendimento B consiste na coleta e disposição de lixo eletrônico. O Empreendedor B criou sua empresa porque identificou que não havia ninguém prestando esse tipo de serviço em sua região. O ecoempreendedor observou que havia uma enorme quantidade de lixo eletrônico, no entanto não havia empresas que oferecessem serviços para a disposição correta. Os impactos ambientais do empreendimento são positivos, já que os serviços prestados contribuem para a correta disposição do material eletrônico.

Empreendedor C: o empreendedor é um dos três donos da Empresa C, que foi criada em 2012 e está localizada na região sul do Brasil. A idade do empreendedor está entre 26 e 35 anos também e ela se graduou em Design. Os principais produtos da empresa são calçados feitos de matéria-prima (couro e tecido) que não são mais utilizados por indústrias desativadas ou por indivíduos que querem doar essa matéria-prima. A empresa foi criada porque o pai de um dos donos havia trabalhado anteriormente como sapateiro e os ecoempreendedores aprenderam tudo sobre o processo industrial da confecção de calçados com ele. Assim, combinado com o know-how que desenvolveram através do aprendizado com o pai do dono, o desejo de ter uma empresa que compreendesse práticas sustentáveis foi o elemento motivador para o início do empreendimento. Os impactos ambientais promovidos pelos resultados do Empreendimento C são positivos, já que o material que iria ser disposto é reutilizado para fazer novos produtos.

Empreendedor D: o empreendedor é um dos dois donos da Empresa D, que foi criada em 2010 e está localizada na região sudeste do Brasil. A idade do empreendedor está entre 36 e 45 anos e ele se graduou em Publicidade, tendo um MBA em administração de empresas. O principal serviço da empresa é um sistema de construção sustentável industrializado (Light Framing). Assim, o setor no qual o Empreendimento D está inserido é o de projetos de arquitetura sustentável. O empreendimento surgiu com a ideia de utilizar o sistema de construção racionalizado. O impacto ambiental dos resultados do empreendimento é positivo, uma vez que o sistema de construção é baseado na geração de pequenas quantidades de resíduos (de 2 a 3% de todo o material utilizado) e menor consumo de água.

4.2 Análise das fases do ciclo de vida do empreendimento

4.2.1Estágio da identificação da oportunidade

A partir da entrevista com o Empreendedor A, observa-se que ela identificou uma oportunidade de mercado através do uso de um método não muito utilizado no Brasil, a técnica do upcycling. A empreendedora aprendeu a técnica sozinha, procurando mais detalhes em sites na Internet. A técnica de upcycling foi um “conhecimento técnico” que outros concorrentes brasileiros não tinham. O ecoempreendedor também destacou que aqueles que estavam tendo sucesso na indústria da moda eram aqueles que estavam trabalhando com sustentabilidade.

Para tornar a oportunidade identificada realidade, entretanto, o Empreendedor A teve que se adaptar, através da busca na Internet por empresas estrangeiras que utilizavam a técnica, visando aprofundar seu conhecimento sobre o upcycling, já que o método ainda não estava muito disseminado e utilizado no Brasil.

Da entrevista com o Empreendedor C, nota-se que o “conhecimento técnico” que ele e seus colegas de trabalho obtiveram foi o elemento-chave que contribuiu para a identificação da oportunidade para criar um novo empreendimento. O ecoempreendedor e os outros donos aprenderam do pai de seu colega, que havia anteriormente trabalhado como sapateiro e que ensinou aos ecoempreendedores tudo o que ele sabia sobre o processo industrial da confecção de calçados. Isso os ajudou a desenvolver o know-how que eles precisavam para iniciar o empreendimento.

O Empreendedor C e seus colegas de trabalho, porém, tiveram que se adaptar para conciliar as agendas da faculdade ao desenvolvimento do novo empreendimento. Assim, o entrevistado destacou que eles utilizaram seu tempo livre da faculdade para aprender, do pai de um dos colegas, tudo sobre o processo de fabricação de calçados.

Em relação à coleta de dados do Empreendedor B, observa-se que a principal fonte da identificação da oportunidade, da perspectiva do empreendedor, foi uma falha no mercado, combinada à sua experiência anterior trabalhando como empregado de uma empresa privada que o estava deixando insatisfeito.

O empreendimento visa coletar lixo eletrônico, certo? E ele surgiu porque eu era gerente na AlgarSegurança (empresa no Brasil) e nós sempre tivemos a necessidade de dispor os equipamentos eletrônicos. E eu não sabia o que fazer com aquilo (equipamentos) (Empreendedor B, 2018).

Além das falhas do mercado identificadas pelo Empreendedor B (Dean & McMullen, 2007Dean, T., & McMullen, J. S. (2007). ‘Toward a theory of sustainable entrepreneurship: Reducing environmental degradation through entrepreneurial action’. Journal of Business Venturing, 22, 50-76.) e sua experiência gerencial anterior em uma empresa privada (Ardichvili et al., 2003Ardichvili, A., Cardozo, R., & Ray, S. (2003). A theory of entrepreneurial opportunity identification and development. Journal of Business Venturing, 18(1), 105-123.), observa-se outro elemento que contribuiu para que o ecoempreendedor identificasse essa oportunidade: ele teve acesso a informações relevantes sobre um potencial mercado para a correta disposição do lixo eletrônico. O entrevistado destaca que ele teve acesso a essas informações procurando na Internet empresas que ofereciam esse tipo de serviço. Fazendo isso, o Empreendedor B se familiarizou mais com o serviço de coleta e disposição de material eletrônico.

Em relação ao Empreendedor D, ele também identificou uma oportunidade de mercado em um serviço que não era oferecido em sua região, até então. O ecoempreendedor notou que o serviço de construção civil que utiliza o método Light Framing era comum em países europeus, nos Estados Unidos e no Japão, mas não era utilizado no Brasil.

Consequentemente, o conhecimento sobre a existência de uma “tendência de mercado” direcionada à sustentabilidade, bem como o conhecimento técnico sobre o sistema Light Framing, foram os elementos-chave para a identificação do uso desse sistema construtivo industrializado como uma oportunidade de mercado.

O Empreendedor D, no entanto, teve que aprender mais sobre o novo serviço que ele queria oferecer, já que não tinha conhecimento técnico aprofundado sobre o sistema.

Para aprofundar seu conhecimento e suas habilidades com relação ao sistema, o Empreendedor D também entrou em contato com outros empreendedores que estavam mais familiarizados com o sistema, para melhor desenvolver seu know-how sobre o método Light Framing.

Assim, os dados empíricos do Empreendedor D, assim como os dados empíricos dos Empreendedores A e C, corroboram Casson (2005Casson, M. (2005). Opportunity nexus: A review of Scott Shane: A general theory of individual entrepreneurship. Small business economies, 24(5), 423-430.), Costa et al., (2007Costa, C. R. F., Machado, H. V., & Vieira, F. G. D. (2007). Comportamento empreendedor na exploração de oportunidades: história oral sobre o caso de uma indústria do setor alimentício. Desenvolvimento em questão, 5, 75-95.); Sheperd e Detinne (2005), Baron e Shane (2007Baron, R. A. & Shane, S. A (2007). Empreendedorismo: uma visão do processo. São Paulo: Thompson Learning.), que apontam que o acesso a informações sobre tendências técnicas e de mercado é um elemento que contribui para a identificação da oportunidade empresarial.

De qualquer modo, a partir dos dados coletados e analisados, pode-se notar que todos os empreendedores tiveram que se adaptar - mesmo que de modos diferentes -, durante essa fase do ciclo de vida do empreendimento, para ter sucesso em seus novos empreendimentos.

Além disso, das entrevistas com os entrevistados A, B e D, observa-se que todos eles estão mais propensos a dar atenção a essas fontes potenciais de oportunidade, tendo um nível de “alerta comercial” maior que os outros, em concordância com Ardichvili et al. (2003Ardichvili, A., Cardozo, R., & Ray, S. (2003). A theory of entrepreneurial opportunity identification and development. Journal of Business Venturing, 18(1), 105-123.).

Isso ocorre porque, como os empreendedores A, B e C, outros indivíduos (tais como os colegas de faculdade do Empreendedor A, outros funcionários da empresa na qual o Empreendedor B trabalhou) poderiam ter identificado oportunidades de mercado (tal como a tendência de utilizar produtos sustentáveis, no caso do Empreendedor A) e esses outros indivíduos também poderiam ter identificado a falta de empresas que fizessem a disposição de material eletrônico ou utilizassem o sistema Light Framing (no caso dos Empreendedores B e D, respectivamente). Apenas esses empreendedores, contudo, vislumbraram essas oportunidades como potencial para a criação de novos negócios, especialmente devido a seus traços de personalidade (o Empreendedor A possui valores orientados ao reuso de materiais) e conhecimento anterior (o Empreendedor A conhecia a técnica do upcycling, o Empreendedor B tinha conhecimento da falta da existência de empresas que fizessem a disposição de material eletrônico em sua área e o Empreendedor D tinha conhecimento sobre um sistema de construção sustentável utilizado em outros países).

Esses dados empíricos corroboram Ardichvili et al. (2003Ardichvili, A., Cardozo, R., & Ray, S. (2003). A theory of entrepreneurial opportunity identification and development. Journal of Business Venturing, 18(1), 105-123.), que destaca que esses elementos (traços de personalidade e conhecimento sobre tendências técnicas ou de mercado) são impulsionadores da identificação de oportunidade para novos empreendimentos.

4.2.2Estágio da exploração da oportunidade

Mesmo após identificar a oportunidade de utilizar a técnica do upcycling em produtos de vestuário, o Empreendedor A teve a preocupação de testar o mercado antes de comercializar adequadamente seus produtos. Esse período de teste consistiu no estágio de exploração da oportunidade do ciclo de vida do empreendimento. Assim, antes de criar seu próprio empreendimento, para comercializar sua própria marca, o Empreendedor A aceitou uma proposta feita por um amigo de faculdade sugerindo que ela poderia comercializar seus produtos em sua loja de usados. Para se adaptar à situação, durante o período de teste, o ecoempreendedor teve que utilizar resíduos e peças de roupa que tinham problemas de qualidade, oferecidos por seu colega, para que ela pudesse transformar essas peças em novas peças, através da técnica do upcycling. Já que nesse período de teste o empreendedor ainda não tinha seu próprio material a ser reutilizado ou seus próprios recursos para desenvolver seus produtos, a melhor opção para testar o mercado potencial para seus produtos foi essa (usar os recursos de seu colega e a loja dele para comercializar suas peças de roupa).

O ecoempreendedor destacou que houve um feedback positivo em relação à demanda e à aceitação do consumidor dos produtos que ela comercializava na loja de usados de seu amigo, o que a compeliu a criar sua própria loja e marca.

O Empreendedor A, no entanto, mencionou que não tinha matéria-prima suficiente para desenvolver seus produtos, então teve que se adaptar, procurando material no “banco de tecidos” de Curitiba (cidade na região Sul do Brasil, na qual a empresa está localizada) como uma fonte alternativa de tecidos, para assegurar que sua produção não seria interrompida por falta de material.

O ecoempreendedor conheceu o banco de tecidos de Curitiba na Internet e ali encontrou os tecidos com estampas que a interessavam, o que a tornou a maior consumidora do “banco” e, finalmente, ela encontrou ali uma fonte constante e confiável de matéria-prima para produzir suas peças de roupa.

Quanto ao Empreendedor B, as principais ações relacionadas a esse estágio do ciclo de vida do empreendimento dizem respeito ao aprendizado do ecoempreendedor. O empreendedor era gerente de um departamento de uma empresa onde trabalhou anteriormente, o que o ajudou a desenvolver o conhecimento gerencial. Isso está de acordo com Shane (2003Shane, S. A. (2003). A general theory of entrepreneurship: The individual-opportunity nexus. Edward Elgar Publishing.), que afirma que experiências anteriores com a gestão de negócios podem contribuir para que essa adaptação resulte no sucesso da viabilidade do produto ou serviço identificado como uma oportunidade de mercado. Além disso, o Empreendedor B foi até uma associação de empreendedores amadores, buscando aprofundar seus conhecimentos sobre empreendedorismo. Esse treinamento permitiu ao empreendedor avaliar a viabilidade do negócio que ele queria criar, bem como preparar-se para administrá-lo.

O Empreendedor C também teve que passar por uma fase intermediária antes de aproveitar adequadamente a oportunidade identificada. O ecoempreendedor e seus colegas de trabalho aprenderam o processo industrial da confecção de calçados por aproximadamente um ano, com a ajuda do pai de um dos colegas. De modo similar ao que o Empreendedor A fez, o Empreendedor C e seus colegas também queriam testar o mercado para ver se os calçados que queriam comercializar tinham um mercado potencial. Para fazer isso, eles venderiam um par de sapatos para um amigo e utilizariam o lucro para produzir mais calçados. Então, eles fariam outro par e o venderiam a outro amigo. Foi assim que o Empreendedor C e seus colegas de trabalho testaram o mercado para ver se haveria demanda para os produtos que estavam fazendo.

Similar ao que ocorreu no teste de mercado do Empreendedor A, o feedback sobre a aceitação do consumidor dos produtos que o Empreendedor C oferecia foi positivo. Isso foi a centelha que os fez decidir iniciar apropriadamente sua própria marca.

O Empreendedor C, porém, destaca que eles tiveram que se adaptar às restrições financeiras que tinham, para encontrar um local para produzir e vender seus produtos, assim como encontrar fontes constantes da matéria-prima de que precisavam para produzir os calçados. Conforme ele disse:

Durante os primeiros dois anos, permanecemos em um local que o pai de nosso colega construiu, perto de sua casa. Estabelecemos nossa “indústria” lá. (Empreendedor C, 2018).

Por cerca de um ano, trabalhamos assim [...]comprando matéria-prima, desenvolvendo calçados e, de repente, começamos a conseguir matéria-prima grátis. [...] Pegamos essas sobras e começamos a utilizá-los em nossos produtos. Foi assim que a ideia apareceu, como uma possibilidade de economizar dinheiro comprando matéria-prima mais barata (restos) que iriam para o lixo (Empreendedor C, 2018).

Assim, o Empreendedor C e seus colegas começaram a ver nas sobras uma possível fonte de matéria-prima para fabricar seus produtos. Nota-se que esse período foi importante para que os empreendedores identificassem possíveis fontes de matéria-prima que poderiam utilizar no processo de fabricação de calçados.

As principais ações realizadas pelo Empreendedor D nesse estágio referem-se à identificação de como poderiam implementar a ideia identificada no estágio anterior, bem como à identificação e aderência de potenciais consumidores. Para tanto, o ecoempreendedor fez uma prospecção de clientes, assim como identificou as demandas de seus clientes. Ele também visitou escritórios de arquitetura, para divulgar seus serviços e tornar-se conhecido na região. Essas ações foram realizadas durante nove meses (de janeiro de 2012 a outubro de 2012), antes do apropriado aproveitamento da oportunidade identificada.

Como o Empreendedor D teve experiências anteriores com empreendedorismo e gestão de negócios, concordando com Shane (2003Shane, S. A. (2003). A general theory of entrepreneurship: The individual-opportunity nexus. Edward Elgar Publishing.), tais experiências mostraram-se importantes para ajustar os serviços prestados pela Empresa D às reais necessidades de seus clientes, ajudando o serviço prestado a tornar-se comercialmente viável.

Sendo assim, a partir da coleta de dados, pode-se observar que esse período de teste foi necessário para que os empreendedores identificassem o mercado potencial dos produtos feitos por upcycling (no caso do Empreendedor A), ajudar o empreendedor a ser capaz de criar e gerenciar sua nova empresa através do aprendizado de como lidar com um novo negócio (no caso do Empreendedor B), os empreendedores aprenderem o processo industrial e testarem o mercado (no caso do Empreendedor C), encontrarem fontes constantes de matéria-prima (no caso dos Empreendedores A e C) e prospectar consumidores (no caso do Empreendedor D). Esses dados empíricos corroboram Degen (1989Degen, R. (1989). O empreendedor: fundamentos de iniciativa empresarial. McGram-Hill. São Paulo.), já que essa fase demandou tempo para ser desenvolvida, para todos os empreendedores aqui analisados. Os produtos feitos por upcycling foram comercializados na loja de usados por dois anos (de 2012 a 2014) antes de serem considerados viáveis para serem introduzidos no mercado. A Empresa B só foi criada depois que o empreendedor fez cursos sobre empreendedorismo para aprimorar seu conhecimento sobre a criação e práticas de gestão de novos empreendimentos, o Empreendedor C e seus colegas melhoraram seu conhecimento sobre o processo industrial por aproximadamente um ano e utilizaram um local temporário para produzir os calçados; e o Empreendedor D levou cerca de nove meses da identificação da oportunidade até seu aproveitamento.

Observa-se, portanto que essa fase intermediária foi importante para garantir que os produtos eram comercialmente viáveis e estavam prontos para serem introduzidos no mercado, assim como, em concordância com o que Baron e (Shane 2007Baron, R. A. & Shane, S. A (2007). Empreendedorismo: uma visão do processo. São Paulo: Thompson Learning.) apontaram, que eles tinham o potencial para a geração de valor econômico.

4.2.3 Estágio do aproveitamento da oportunidade

Após a exploração da oportunidade, o próximo estágio do ciclo de vida do empreendimento consistiu no aproveitamento da oportunidade. Durante esse estágio, os empreendedores devem ajustar os planos estratégicos do empreendimento às necessidades do mercado e à legislação em vigor, ao mesmo tempo em que os produtos comercializados contribuem para a criação de valor a partir dos resultados da empresa (Costa et al., 2007Costa, C. R. F., Machado, H. V., & Vieira, F. G. D. (2007). Comportamento empreendedor na exploração de oportunidades: história oral sobre o caso de uma indústria do setor alimentício. Desenvolvimento em questão, 5, 75-95.).

As principais ações estratégias do Empreendedor A consistiram em elaborar um plano de negócios que compreendesse, entre outros elementos do empreendimento, a disseminação de sua marca e produto. Apesar de ter participado de um projeto, onde houve um curso sobre desenvolvimento de planos de negócio, o empreendedor concluiu que ela teria que adaptar o plano proposto pelos professores do curso à sua própria realidade, já que sua produção era diferente do processo de produção abordado no curso (produção em série). Assim, o empreendedor A afirmou: “Então eu decidi não seguir o plano e fazer o meu próprio (...), compreendendo partes únicas e exclusivas” (Empreendedor A, 2018).

Portanto, o empreendedor adaptou as ações estratégicas relacionadas a seus consumidores potenciais e a seu processo de produção, divulgando, na Internet, a marca e o processo de produção sustentável que eles utilizam para produzir as linhas de roupas. Essa forma de disseminação é diferenciada, já que não é feita desse modo pelos concorrentes diretos do empreendedor, também localizados em pequenas lojas. Assim, o empreendedor acredita que tais ações contribuem para a criação de valor sustentável para os produtos que oferece, e não apenas para a criação de valor puramente econômico.

Como essas ações foram adaptadas às necessidades de consumidores potenciais das linhas de roupas produzidas pelo empreendedor, bem como contribuíram para os resultados do empreendimento para criar valor (valor sustentável é criado porque o tecido utilizado para produzir as peças de roupas é reutilizado e o valor econômico é gerado pelas vendas), essas evidências estão alinhadas com Costa et al. (2007Costa, C. R. F., Machado, H. V., & Vieira, F. G. D. (2007). Comportamento empreendedor na exploração de oportunidades: história oral sobre o caso de uma indústria do setor alimentício. Desenvolvimento em questão, 5, 75-95.).

No caso do Empreendedor B, as principais ações estratégicas desenvolvidas e implementadas estão relacionadas ao marketing do serviço oferecido, ao desenvolvimento das atividades logísticas necessárias para o manuseio e o armazenamento dos produtos coletados e ao desenvolvimento de parcerias com recicladores na área na qual a empresa está localizada.

A principal dificuldade destacada pelo Empreendedor B diz respeito à conscientização de consumidores potenciais, quanto à disposição adequada do lixo eletrônico. Como esse público não tem consciência sobre a disposição adequada desses materiais, o empreendedor teve que “ajustar” esse público, ajudando-os a desenvolver a consciência, para ser capaz de coletar o lixo eletrônico e, posteriormente, descartá-lo corretamente.

Tal ação, relacionada à parte comercial, foi necessária para garantir que os consumidores-alvo estivessem preparados para utilizar os serviços oferecidos pela Empresa B. Assim, o empreendedor teve que se adaptar à realidade da região onde se encontrava, já que em outras regiões e países essa conscientização talvez não fosse tão necessária. Tal ação está de acordo com Costa et al. (2007Costa, C. R. F., Machado, H. V., & Vieira, F. G. D. (2007). Comportamento empreendedor na exploração de oportunidades: história oral sobre o caso de uma indústria do setor alimentício. Desenvolvimento em questão, 5, 75-95.), que afirmam que o aproveitamento da oportunidade consiste em um processo dinâmico e contínuo, já que diz respeito ao ajuste dos planos estratégicos do empreendimento às reais necessidades do mercado.

Além do desenvolvimento da conscientização, outra adaptação do Empreendedor B está relacionada às atividades logísticas. Atualmente, na área na qual o empreendimento está localizado, não há a disposição adequada dos materiais coletados. Esses materiais são, portanto, dispostos fora do estado, o que significa que o planejamento logístico realizado pelo ecoempreendedor se torna complexo por lidar com essas peculiaridades.

O desenvolvimento de parcerias consistiu em outra ação estratégica do Empreendedor B, já que ele se associou a associações de empreendedores com a intenção de unir os recicladores de cooperativas na área, para que trabalhassem em conjunto.

No caso do Empreendedor C, as principais ações estratégicas dos ecoempreendedores foram relacionadas a (i) o desenvolvimento de um plano de negócio, (ii) o desenvolvimento de um plano de design, (iii) a implementação de um plano de desenvolvimento de produto e (iv) o desenvolvimento de um plano de comunicação.

O empreendedor também mencionou que, para ser capaz de fazer todo esse planejamento, foi essencial o conhecimento prévio adquirido na faculdade.

O desenvolvimento do plano de design demandou alguns ajustes em relação ao plano inicial. O Empreendedor C e os coproprietários do empreendimento decidiram dar algum destino às suas próprias sobras, originadas do processo de confecção de calçados. Eles decidiram acrescentar acessórios e carteiras a seu portfólio, para reutilizar as sobras de couro do processo de confecção de calçados, que de outro modo iriam para o lixo.

Quanto ao plano de comunicação, para revelar a marca, o Empreendedor C mencionou que eles participaram de eventos (por 2 anos) todos os finais de semana, em feiras, semanas da moda, para construir uma rede de consumidores. Tais ações foram essenciais para a disseminação da marca de maneira barata, já que os empreendedores não tinham recursos financeiros para divulgações de porte e também porque os principais consumidores dos calçados comercializados no Empreendimento C iriam a esses eventos. Isso ajudou a garantir que a marca e o processo de produção sustentável utilizado para a fabricação dos calçados vendidos pelos empreendedores ser tornassem conhecidos.

Vale notar que o Empreendedor C fez parceria com o Empreendedor A, oferecendo sobras do processo de produção de calçados, e eles também se reuniam de vez em quando para discutir e compartilhar novas ideias com relação a seu portfólio e processo de produção. Os Empreendedores A e C também doavam sobras de tecido e couro para outros ecoempreendedores, que utilizam essas matérias primas em seus sistemas de produção.

Com relação ao Empreendedor D, é possível observar que, durante a fase do aproveitamento, a principal ação que teve que realizar foi trabalhar com um processo de gestão para manter a operação sustentável. Além disso, o ecoempreendedor também lida com questões relacionadas ao transporte dos materiais de construção, já que não tem um local específico para armazenar todos os materiais que serão utilizados nas construções, e isso acabou tornando seu sistema de transporte muito caro e demorado. O Empreendedor D também busca trabalhar com um sistema eficiente e utilizar essa característica como um diferencial para convencer seus clientes potenciais a adquirir seus serviços, e não o dos concorrentes. Isso demandou uma adaptação do ecoempreendedor às características do mercado consumidor, que consiste em um mercado que ainda não tem uma cultura de ver os benefícios de longo prazo dos serviços, porém apenas apreciar os preços baixos. Assim, o empreendedor, em face à necessidade de convencer seus consumidores potenciais com relação às vantagens dos serviços que ele fornecia, teve que incluir tais ações em seu plano estratégico e de disseminação.

Das respostas dos entrevistados, é possível se observar que, mesmo que de naturezas diferentes, a evidência empírica oferecida por todos os entrevistados corrobora Hmieleski e Baron (2008Hmieleski, K. M., & Baron, R. A. (2008). Regulatory focus and new venture performance: a study of entrepreneurial opportunity exploitation under conditions of risk versus uncertainty. Strategic Entrepreneurial Journal, 2(4), 285-299.), já que ilustram a fase do aproveitamento da oportunidade como a fase que inclui as atividades para a execução das ações e planos estratégicos.

Mesmo que de maneiras diferentes, todos os empreendedores aqui analisados tiveram que se adaptar às suas realidades e contextos sociais, seja através da adaptação de seus planos de negócio, para contemplar a natureza de seus processos de produção (Empreendedor A), ou através da adaptação de seus próprios consumidores potenciais, para alinhar o serviço oferecido à demanda real dos consumidores (Empreendedor B), ou através da disseminação dos produtos que tinham como alvo as necessidades específicas dos consumidores (Empreendedor C), ou até mesmo através da necessidade de convencer os consumidores potenciais, por conta de seus aspectos culturais (Empreendedor D).

A partir das evidências obtidas dos quatro empreendedores aqui estudados, é proposta uma estrutura que apresenta as principais adaptações necessárias, em cada estágio do ciclo de vida do empreendimento (Figura 1).

Figura 1
Estrutura com as principais adaptações necessárias para os ecoempreendedores durante os estágios do ciclo de vida do empreendimento.

A estrutura proposta apresenta as adaptações de que os ecoempreendedores precisam para passar por cada estágio do ciclo de vida do empreendimento.

5 Conclusões

para analisar as adaptações dos ecoempreendedores nos estágios do ciclo de vida, um estudo de caso foi realizado para quatro ecoempreendedores brasileiros. As evidências oferecem insights relacionados às adaptações relevantes para cada um dos estágios do ciclo de vida do empreendimento, de acordo com os casos investigados:

  • (i) Estágio 1 - Estágio da Identificação da Oportunidade - As adaptações desse estágio estão nas oportunidades de mercado, e o principal insight em relação às adaptações desse estágio é que todas as adaptações de todos os ecoempreendedores aqui estudados estão relacionadas à busca de conhecimento e habilidades, independente do setor industrial; Assim, para identificar a oportunidade, o empreendedor precisa se adaptar e, conforme enfatizado por Costa et al. (2007Costa, C. R. F., Machado, H. V., & Vieira, F. G. D. (2007). Comportamento empreendedor na exploração de oportunidades: história oral sobre o caso de uma indústria do setor alimentício. Desenvolvimento em questão, 5, 75-95.), precisa utilizar sua formação e motivação para aperfeiçoar a ideia e então fazer o aproveitamento dela.

  • (ii) Estágio 2 - Estágio da Exploração da Oportunidade - As adaptações desse estágio são baseadas na análise das reais necessidades do mercado e dos recursos disponíveis, bem como na avaliação da viabilidade do empreendimento. Os ajustes foram similares para os empreendedores no campo da moda e diferentes para os outros ecoempreendedores analisados; Durante esse estágio, cada empreendedor objetivou desenvolver seus pontos fracos, sendo eles: limitações de recursos, melhoria do aprendizado, restrições financeiras e prospecção dos potenciais clientes (Empreendedores A, B, C e D, respectivamente). Nesse estágio, os ecoempreendedores buscaram melhorar seus pontos fracos para, como indicado por Degen (1989Degen, R. (1989). O empreendedor: fundamentos de iniciativa empresarial. McGram-Hill. São Paulo.), tornar os produtos e serviços desenvolvidos comercialmente viáveis e “prontos” para serem comercializados.

  • (iii) Estágio 3 - Estágio do Aproveitamento da Oportunidade - Para criar valor ambiental e econômico, essa adaptação surge da identificação das necessidades e perfis dos consumidores potenciais. Ela também envolve o ajuste do plano de negócio à realidade observada, ou até mesmo mudanças no portfólio dos produtos resultantes de novas oportunidades. Nesse caso, apesar de alguns empreendedores tiverem também que se adaptar em outros aspectos, todos eles apresentaram adaptações em relação às reais demandas de seus consumidores (através da instalação de suas lojas em locais mais acessíveis a seus clientes ou através do alinhamento do fornecimento e da demanda). Como Hmieleski e Baron (2008Hmieleski, K. M., & Baron, R. A. (2008). Regulatory focus and new venture performance: a study of entrepreneurial opportunity exploitation under conditions of risk versus uncertainty. Strategic Entrepreneurial Journal, 2(4), 285-299.) e Costa et al. (2007Costa, C. R. F., Machado, H. V., & Vieira, F. G. D. (2007). Comportamento empreendedor na exploração de oportunidades: história oral sobre o caso de uma indústria do setor alimentício. Desenvolvimento em questão, 5, 75-95.) afirma, o objetivo dessa fase é desenvolver e adaptar os planos estratégicos do empreendimento, às demandas e exigências do mercado.

Portanto, o estágio de “identificação de oportunidade” e o estágio de “aproveitamento da oportunidade” foram comuns a todos os empreendedores aqui analisados, apesar de seus contextos de negócio. Por outro lado, as ações e adaptações necessárias no segundo estágio (exploração da oportunidade) foram diferentes para cada empreendedor, porque eles tiveram que melhorar seus pontos fracos específicos para desenvolver e fazer o aproveitamento de seus empreendimentos para que os produtos e serviços que ofereciam fossem atraentes para os consumidores potenciais.

É também importante notar que a estrutura proposta, ao apresentar as adaptações pelas quais os ecoempreendedores têm que passar durante cada estágio do ciclo de vida do empreendimento, contribui teoricamente para o domínio relacionado a este estudo, oferecendo os principais elementos que cada estágio compreende, no contexto do ecoempreendedorismo. De maneira prática, este estudo pode fornecer informações aos ecoempreendedores, melhorando seu conhecimento em relação aos caminhos que podem empreender no ciclo de vida, destacando as formas de adaptação que podem ser necessárias em cada estágio do ciclo.

Embora este estudo tenha alcançado seu objetivo, pode-se apontar uma limitação relacionada ao número de casos analisados. Uma vez que apenas quatro empreendedores foram estudados, não é possível fazer uma generalização com os resultados obtidos (Yin, 2014Yin, R. K. (2014). Case Study Research: Design and Methods. 5th edition. Sage Publications, Thousand Oaks CA.). Portanto, para a pesquisa futura, sugerimos que mais empreendedores sejam analisados, para a validação da estrutura proposta e para a obtenção de evidências suficientes para a generalização dos resultados aqui obtidos. Sugerimos também que a pesquisa futura seja realizada com o objetivo de estudar clusters de empreendimentos, para verificar se os empreendimentos de clusters similares têm as mesmas necessidades de adaptação, em cada estágio do ciclo de vida do empreendimento ou se, dependendo dos contextos nos quais os negócios estão inseridos, as adaptações são diferentes.

Espera-se que este estudo contribua para a literatura sobre os empreendedores e os estágios do ciclo de vida do empreendimento, bem como com os ecoempreendedores, mais especificamente fornecendo a eles dados empíricos com relação às possíveis adaptações que eles possam vir a enfrentar durante cada estágio do ciclo de vida do empreendimento.

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  • Yin, R. K. (2014). Case Study Research: Design and Methods. 5th edition. Sage Publications, Thousand Oaks CA.
  • WCED (World Commission on Environment and Development). (1987). Our Common Future. Oxford University Press: Oxford, UK.
  • Agências de fomento:

    Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
  • Avaliado pelo sistema:

    Double Blind Review

Apêndice A - Roteiro da entrevista

Observação: Todas as entrevistas devem ser gravadas com o consentimento dos entrevistados e, posteriormente, transcritas para facilitar a análise das evidências.

  1. Perfil do entrevistado
    • 1.1 Você é graduado em que curso?

    • 1.2 Em que faixa etária você está?

  2. Informações básicas sobre o empreendimento
    • 2.1 Quando e como começou seu empreendimento?

    • 2.2 Quantos funcionários trabalham no empreendimento?

    • 2.3. Descreva suscintamente como o empreendimento surgiu e quais foram as principais motivações?

  3. Desenvolvimento do empreendedor e do empreendimento
    • 3.1 Por que você decidiu começar um empreendimento sustentável em vez de um “tradicional”?

    • 3.2 Você fez algum tipo de plano de negócio antes de criar a empresa?

    • 3.3 Como você aprendeu a ser um empreendedor? Você tinha algum conhecimento prévio em relação ao empreendedorismo ou gestão de empresarial?

    • 3.4 Quais foram as principais adaptações que você teve que fazer durante a identificação da oportunidade?

    • 3.5 Quais foram as principais adaptações que você teve que fazer durante a exploração da oportunidade?

    • 3.6 Quais foram as principais adaptações que você teve que fazer durante o aproveitamento da oportunidade?

Editado por

Editor responsável:

Prof. Dr. João Maurício Gama Boaventura

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Set 2019
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2019

Histórico

  • Recebido
    20 Set 2018
  • Aceito
    07 Mar 2019
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