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Parametrização da equação de Hargreaves e Samani para estimativa da evapotranspiração de referência no Estado do Ceará, Brasil

Defining parameters for the Hargreaves-Samani equation for estimating reference evapotranspiration in the State of Ceará, Brazil

RESUMO

O modelo de Hargreaves e Samani é utilizado na estimativa da evapotranspiração de referência, sendo muito útil para o manejo da irrigação, sendo o mesmo considerado de uso prático, pois utiliza elementos meteorológicos de fácil obtenção como a temperatura. Entretanto, o mesmo necessita de calibração regional para estimar adequadamente a evapotranspiração. Objetivou-se calibrar o modelo de Hargreaves e Samani para o estado do Ceará, utilizando dados meteorológicos de doze cidades. Os parâmetros empíricos α (0,0023) e β (0,5) foram calibrados, considerando dois processos: primeiro, uma calibração simultânea dos dois parâmetros, e depois apenas o coeficiente α. Na calibração simultânea obteve uma variação dos seus valores extremos em três cidades, o α oscilou de 0,0004 (Campos Sales e Crateús) a 0,0019 (Guaramiranga) e o expoente β oscilou de 0,51 (Guaramiranga) a 1,1977 (Campos Sales). A correlação entre o modelo de Hargreaves e Samani calibrado com a equação de Penman-Monteith apresentou seu valor máximo na cidade de Jaguaruana, 0,934 para o ajuste com os dois parâmetros e 0,942 para a calibração feita apenas com o coeficiente α, mostrando que a calibração da equação de Hargreaves e Samani é viável e é necessário para melhorar as estimativas da evapotranspiração.

Palavras-chave:
Semiárido; Temperatura; Penman-Monteith

ABSTRACT

The Hargreaves-Samani model is used in estimating reference evapotranspiration, and is very useful for irrigation management; it is considered to be of practical use as it uses meteorological elements, which are easily obtained, such as temperature. However, the equation is in need of regional calibration in order to accurately estimate evapotranspiration. The aim of this work was to calibrate the Hargreaves-Samani model for the State of Ceará, using meteorological data from 12 cities. The empirical parameters α (0.0023) and β (0.5) were calibrated considering two processes: firstly, the simultaneous calibration of the two parameters, and then only the α coefficient. The simultaneous calibration returned a variation in the extreme values for three cities; α ranged from 0.0004 (Campos Sales and Crateús) to 0.0019 (Guaramiranga), and exponent β varied between 0.51 (Guaramiranga) to 1.1977 (Campos Sales). The correlation between the Hargreaves-Samani model calibrated with the Penman-Monteith equation, had a maximum value for the city of Jaguaruana, 0.934 when calibrated with the two parameters, and 0.942 when calibrated with the α coefficient only, demonstrating that calibration of the Hargreaves-Samani equation is viable, and is necessary for improving estimates of evapotranspiration.

Key words:
Semi-arid region; Temperature; Penman-Monteith

INTRODUÇÃO

Nos dias atuais, uma das principais preocupações é com a crescente demanda hídrica em todos os setores da sociedade. Portanto, a água na produção de alimentos deve ser utilizada da forma mais racional possível. Nesse contexto, a estimativa da evapotranspiração de referência (ETo) tem o objetivo de otimizar o uso da água na agricultura.

Muitos modelos propostos para a estimativa da ETo não podem ser aplicados em cenários diferentes daqueles em que foram originalmente desenvolvidos. A fim de resolver esse problema a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) padronizou o modelo de Penman - Monteih (PM) na estimativa da ETo (ALLEN et al., 1998ALLEN, R. G. et al. Crop evapotranspiration: guidelines for computing crop water requirements. Roma: FAO, 1998. 300 p. (FAO. Irrigation and Drainage Paper, 56)). PM é uma equação que expressa a evapotranspiração de uma cultura hipotética de referência com uma altura uniforme de 0,12 m, a resistência de superfície fixa de 70 s m-1 e um albedo de 0,23, crescendo ativamente, cobrindo completamente o solo e sem sofrer estresse hídrico. Nessas condições, os únicos fatores que afetam ETo são variáveis climáticas e, consequentemente, a ETo pode ser considerada uma variável atmosférica e pode ser calculada a partir de dados meteorológicos (SENTELHAS; GILLESPIE; SANTOS, 2010SENTELHAS, P. C.; GILLESPIE, T. J.; SANTOS, E. A. Evaluation of FAO Penman-Monteith and alternative methods for estimating reference evapotranspiration with missing data in Southern Ontario, Canada. Agricultural Water Management, v. 97, n. 5, p. 635-644, 2010.).

O modelo PM é a equação padrão para estimar a ETo na escala diária e mensal em todos os climas, e pode ser usado globalmente sem qualquer calibração local e até para estimativas horárias, devido a incorporação de parâmetros fisiológicos e aerodinâmicos, sendo validada em diferentes ambientes usando medidas precisas obtidas a partir de lisímetros. O processo de cálculo exige medições confiáveis de elementos meteorológicos tais como: temperatura do ar, umidade relativa, radiação solar e velocidade do vento. Porém, frequentemente nem todos esses elementos estão disponíveis, em razão do número limitado de estações meteorológicas devidamente equipadas (FERNANDES et al., 2012FERNANDES, D. S. et al. Calibração regional e local da equação de Hargreaves para estimativa da evapotranspiração de referência. Revista Ciência Agronômica, v. 43, n. 2, p. 246-255, 2012.), ou apresentam grandes falhas e/ou imprecisões nas medições. Por estas razões, este método tem o seu uso limitado pela falta de elementos climáticos.

Segundo Allen et al. (1998)ALLEN, R. G. et al. Crop evapotranspiration: guidelines for computing crop water requirements. Roma: FAO, 1998. 300 p. (FAO. Irrigation and Drainage Paper, 56) o uso da equação de Hargreaves e Samani (1985)HARGREAVES, G. H.; SAMANI, Z. A. Reference crop evapotranspiration from temperature. Applied Engineering in Agriculture, v. 01, n. 02, p. 96-99, 1985. é uma alternativa viável para a estimativa ETo quando há falta de parâmetros climáticos requeridos pelo modelo PM.

O modelo de Hargreaves e Samani (HS) necessita apenas das temperaturas mínima, máxima, média do ar. Esse modelo vem sendo utilizado amplamente devido a sua simplicidade e a potencialidade para calibração de seus parâmetros, (BAUTISTA et al., 2009BAUTISTA, F. et al. Calibration of the equations of Hargreaves and Thornthwaite to estimate the potential evapotranspiration in semi-arid and subhumid tropical climates for regional applications. Atmósfera, v. 22, n. 4, p. 331-348, 2009.) podendo fornecer dados confiáveis da ETo para o intervalo de cinco dias ou períodos mais longos (THEPADIA; MARTINEZ, 2012THEPADIA, M.; MARTINEZ, C. J. Regional calibration of solar radiation and reference evapotranspiration estimates with minimal data in Florida. Journal of Irrigation and Drainage Engineering, v. 138, n. 2, p. 111-119, 2012.; TRAJKOVIC, 2007TRAJKOVIC, S. Hargreaves versus Penman-Monteith under humid conditions. Journal of Irrigation and Drainage Engineering, v. 133, n. 1, p. 38-42, 2007.).

As adaptações no modelo de HS não foram suficientes para torná-lo independente de calibração regional de seus parâmetros. Em regiões de clima frio, o modelo de HS superestima a ETo, e em casos onde as características da região não se assemelham com a que seus parâmetros foram calibrados originalmente, a estimativa é bastante equivocada (BAUTISTA et al., 2009BAUTISTA, F. et al. Calibration of the equations of Hargreaves and Thornthwaite to estimate the potential evapotranspiration in semi-arid and subhumid tropical climates for regional applications. Atmósfera, v. 22, n. 4, p. 331-348, 2009.; FERNANDES et al., 2012FERNANDES, D. S. et al. Calibração regional e local da equação de Hargreaves para estimativa da evapotranspiração de referência. Revista Ciência Agronômica, v. 43, n. 2, p. 246-255, 2012.; SABZIPARVAR; TABARI, 2010SABZIPARVAR, A. A.; TABARI, H. Regional estimation of reference evapotranspiration in arid and semiarid regions. Journal of Irrigation and Drainage Engineering, v. 136, n. 10, p. 724-731, 2010.; SHAHIDIAN et al., 2013SHAHIDIAN, S. et al. Parametric calibration of the Hargreaves-Samani equation for use at new locations hydrological processes. Hydrological Process, v. 27, p. 605-616, 2013.; TABARI; TALAEE, 2011TABARI, H.; TALAEE, P. H. Local calibration of the Hargreaves and Priestley-Taylor equations for estimating reference evapotranspiration in arid and cold climates of Iran based on the Penman-Monteith model. Journal of Hydrologic Engineering, v. 16, n. 10, p. 837-845, 2011.). Diante do exposto o objetivo do presente trabalho foi calibrar os coeficientes da equação de HS em escala mensal para doze localidades do estado do Ceará.

MATERIAL E METODOS

O estudo foi realizado utilizando dados meteorológicos do estado do Ceará, que se encontra localizado na região Nordeste do Brasil, entre os paralelos 2,5º e 8º de latitude Sul e os meridianos 37º e 42º de longitude Oeste, cuja sua área total é de 146.348,6 km2. De acordo com a classificação climática de Köppen, a região apresenta três tipos de clima: BSw'h', Aw' e Cw', havendo uma predominância em aproximadamente 80% da área como BSw'h'(semiárido quente). Foram utilizados dados provenientes de estações meteorológicas convencionais de doze municípios do estado do Ceará (Tabela 1 e Figura 1). Dados estes disponibilizados pelo Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) foram: velocidade do vento (Vv), insolação (Ins), temperatura máxima (Tmax), temperatura mínima (Tmin), temperatura média (Tmed), e umidade relativa (UR).

Tabela 1
Características das estações meteorológicas utilizadas no estudo

Figura 1
Localização das estações meteorologicas utilizadas no estudo

A FAO recomenda que os métodos empíricos devem ser calibrados e validados com base na equação de Penman-Monteith FAO-56 como referência (ALLEN et al., 1998ALLEN, R. G. et al. Crop evapotranspiration: guidelines for computing crop water requirements. Roma: FAO, 1998. 300 p. (FAO. Irrigation and Drainage Paper, 56)), descrita como:

em que: ETo é a evapotranspiração de referência em mm dia-1; Rn é a radiação líquida total do gramado em MJ m-2 dia-1; G é a densidade do fluxo de calor no solo em MJ m-2 dia-1; Tmed é a temperatura média diária do ar em ºC; v2 é a velocidade do vento média diária a 2 m de altura em m s-1; es é a pressão de saturação de vapor em kPa; ea é a pressão parcial de vapor, kPa; Δ - declividade da curva de pressão de vapor em kPa C-1; γ é o coeficiente psicrométrico, kPa C-1.

Hargreaves e Samani (1982)HARGREAVES, G. H.; SAMANI, Z. A. Estimating potential evapotranspiration. Journal of Irrigation and Drainage Engeneering, v. 108, p. 225-230, 1982. recomendam uma equação simples para estimar radiação solar utilizando a diferença de temperatura:

em que: Kt é o coeficiente empírico, adimensional; Ra é a radiação solar extraterrestre em MJ m-2dia-1; Rs é a radiação solar global em MJ m-2 dia-1; Tmax é a temperatura máxima do ar em ºC; Tmim é a temperatura mínima do ar em ºC.

Hargreaves e Samani (1985)HARGREAVES, G. H.; SAMANI, Z. A. Reference crop evapotranspiration from temperature. Applied Engineering in Agriculture, v. 01, n. 02, p. 96-99, 1985. propuzeram a seguinte equação para estimativa da ETo utilizando apenas os valores das Temperaturas máxima, minima e média do ar e da radiação no topo da atmosfera:

em que: α é um parâmetro empírico, sendo utilizado o seu valor original de 0,0023; β é um parâmetro empírico exponencial, sendo seu valor original de 0,5. Sendo a temperatura média obtida através da metodologia descrita por Allen et al. (1998)ALLEN, R. G. et al. Crop evapotranspiration: guidelines for computing crop water requirements. Roma: FAO, 1998. 300 p. (FAO. Irrigation and Drainage Paper, 56), Equação (4):

As médias mensais de ETo foram calculadas em ambas as metodologias, PM e HS, para todos os locais estudados. As médias mensais de ETo dos meses ímpares foram usados para obtenção dos parâmetros empíricos (α e β) e com médias mensais de ETo dos meses pares fez-se a validação do modelo já calibrado pelos parâmetros (α e β) previamente calculados. Duas calibrações foram feitas. A primeira ajustando os parâmetros α e β simultaneamente, e uma segunda calibrando somente o parâmetro α, permanecendo o parâmetro β com seu valor original de 0,5, tendo como propósito de observar a importância que um parâmetro tem sobre o outro. A mesma quantidade de dados foram utilizados em ambas calibrações. Também foram utilizados os mesmos procedimentos.

O ajuste dos parâmetros da equação de Hargreaves e Samani (1985)HARGREAVES, G. H.; SAMANI, Z. A. Reference crop evapotranspiration from temperature. Applied Engineering in Agriculture, v. 01, n. 02, p. 96-99, 1985. foi realizado a partir do Microsoft Excel®, utilizando a metodologia descrita por Wraith e Or (1998)WRAITH, J. M.; OR, D. Nonlinear parameter estimation using spreadsheet software. Journal of Natural Resources and Life Sciences Education, v. 27, p. 13-19, 1998. para ajuste de equação não linear usando o aplicativo Solver.

A análise dos dados foi realizada de acordo com os índices estatísticos sugeridos por Legates e Mccabe Júnior (1999)LEGATES, D. R.; MCCABE JÚNIOR, G. J. Evaluating the use of "goodness-of-fit" measures in hydrologic and hydro climatic model validation. Water Resources Research. v. 35, n. 1, p. 233-241, 1999.: índice de Willmontt (id), coeficiente de Nash-Sutcliffe (E), raiz quadrada do erro médio (RMSE), erro máximo absoluto (EMAX).

em que: Oi é o valor estimado pelo modelo padrão; Pi é o valor estimado pelos modelos propostos; X é a média dos valores estimados em ambos os modelos; Yi é o valor médios obtidos pelos modelos propostos; O é o valor da media obtido pelo modelo padrão.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Na calibração simultânea dos parâmetros da equação de Hargreaves e Samani, a variação atingiu seus maiores e menores valores em três cidades, o coeficiente α oscilou de 0,0004 (Campos Sales e Crateús) a 0,0019 (Guaramiranga) e o expoente β oscilou de 0,51, novamente na cidade de Guaramiranga a 1,1977 em Campos Sales (Tabela 2). De acordo com Fooladmand e Haghighat (2007)FOOLADMAND, H. R.; HAGHIGHAT, M. Spatial and temporal calibration of Hargreaves equation for calculating monthly ETo based on Penman-Monteith method. Irrigation and Drainage, v. 56, p. 439-444, 2007., locais com valores de velocidade do vento maiores que dois metros por segundo necessitam do uso de coeficientes ajustados em vez do original, o que explica a alta disparidade dos valores corrigidos na calibração simultânea para as cidades de Campos Sales, Crateús e Acaraú, com velocidades de 4,44; 2,91 e 3,0 m s-1 respectivamente (Tabela 1), segundo Hargreaves e Samani (1985)HARGREAVES, G. H.; SAMANI, Z. A. Reference crop evapotranspiration from temperature. Applied Engineering in Agriculture, v. 01, n. 02, p. 96-99, 1985. o modelo estudado e calibrado não se adapta bem a regiões litorâneas, o que possivelmente justificou ainda mais tamanha disparidade na cidade de Acaraú, comportmento semelhante ao que Maestre-Valero, Martínez-Alvarez e González-Real (2013)MAESTRE-VALERO, J. F.; MARTÍNEZ-ALVAREZ, V.; GONZÁLEZ-REAL, M. M. . Regionalization of the Hargreaves coefficient to estimate long-term reference evapotranspiration series in SE Spain. Spanish Journal of Agricultural Research, v. 11, n. 4, p. 1137-1152 2013. observaram calibrando a equação de Hargreaves e Samani (1985)HARGREAVES, G. H.; SAMANI, Z. A. Reference crop evapotranspiration from temperature. Applied Engineering in Agriculture, v. 01, n. 02, p. 96-99, 1985. em uma região semiárida da Espanha, utilizando dados de 12 estações automáticas, no litoral o coeficiente ajustado chegou a 0,0034, enquanto em regiões mais interioranas não ultrapassou 0,0025. Já no México observou-se comportamento também semelhante no litoral, sendo que dessa vez a maior diferença não ultrapassou 0,0026 para os meses de abril, maio, outubro e dezembro, visto que foram feitas calibrações mensais (BAUTISTA et al., 2009BAUTISTA, F. et al. Calibration of the equations of Hargreaves and Thornthwaite to estimate the potential evapotranspiration in semi-arid and subhumid tropical climates for regional applications. Atmósfera, v. 22, n. 4, p. 331-348, 2009.).

Tabela 2
Valores dos coeficientes empíricos para os processos de calibração simultânea e de somente um parâmetro

Ainda na calibração feita com os dois parâmetros o valor que menos diferiu do valor original para a foi encontrado em Guaramiranga (0,0019), inferiores até a 0,0022, que foram encontrados por Bautista et al. (2009)BAUTISTA, F. et al. Calibration of the equations of Hargreaves and Thornthwaite to estimate the potential evapotranspiration in semi-arid and subhumid tropical climates for regional applications. Atmósfera, v. 22, n. 4, p. 331-348, 2009. no México, para os meses de junho e julho. Já para o coeficiente β, na cidade de Guaramiranga a alteração foi praticamente nula (0,51). No município de Barbalha os ajustes atingiram os valores de 0,0013 para α e 0,68 para β, valores bem próximos aos encontrados em calibrações locais e regionais feitas por Fernandes et al. (2012)FERNANDES, D. S. et al. Calibração regional e local da equação de Hargreaves para estimativa da evapotranspiração de referência. Revista Ciência Agronômica, v. 43, n. 2, p. 246-255, 2012., para o estado do Goiás, utilizando dados provenientes de dez estações meteorológicas com intervalo de tempo diferentes entre as estações, obtendo 0,00141 como coeficiente α e 0,68 como expoente empírico β, calibrados regionalmente.

A calibração realizada com apenas o parâmetro α (Tabela 2), variou de 0,0019 a 0,0026 para as cidades de Guaramiranga e Quixeramobim respectivamente, o menor valor encontrado já era esperado em função do primeiro ajuste feito, visto que o expoente β praticamente não diferiu do original. Valores encontrados em estudos realizados utilizando dados de províncias do Sul do Irã se assemelham com os resultados obtidos nesse estudo, as calibrações anuais feitas por Fooladmand e Haghighat (2007)FOOLADMAND, H. R.; HAGHIGHAT, M. Spatial and temporal calibration of Hargreaves equation for calculating monthly ETo based on Penman-Monteith method. Irrigation and Drainage, v. 56, p. 439-444, 2007., variaram de 0,0018 a 0,0032 para o coeficiente original da equação de Hargreaves e Samani (1985)HARGREAVES, G. H.; SAMANI, Z. A. Reference crop evapotranspiration from temperature. Applied Engineering in Agriculture, v. 01, n. 02, p. 96-99, 1985..

Ainda de acordo com a Tabela 2 o ajuste com apenas um só parâmetro a calibração que menos diferiu do valor original foi calculada para as cidades de Acaraú, Iguatu e Morada Nova, permanecendo com sua constante original (0,0023), já em Jacupiranga - SP, Borges e Mendiondo (2007)BORGES, A. C.; MENDIONDO, E. M. Comparação entre equações empíricas para estimativa da evapotranspiração de referência na Bacia do Rio Jacupiranga. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v. 11, n. 3, p. 293-300, 2007., utilizaram oito métodos distintos de estimativa de ETo, com a correlação feita entre os modelos Hargreaves e Samani (1985)HARGREAVES, G. H.; SAMANI, Z. A. Reference crop evapotranspiration from temperature. Applied Engineering in Agriculture, v. 01, n. 02, p. 96-99, 1985. e PM, o coeficiente empírico encontrado para HS foi de 0,00224 para os meses de setembro a abril, e de 0,00202 para os meses de maio até agosto.

Na avaliação dos ajustes da equação de HS, a calibração feita com os dois parâmetros (Tabela 3), apresentou comportamento discretamente mais próximo do modelo padrão do que o ajuste feito somente com o coeficiente α (Tabela 4). A concordância do modelo proposto em relação à equação de PM foi maior do que 0,9 em quase todas as cidades para a calibração com os dois parâmetros, exceto nas estações localizadas nos municípios de Acaraú, Campos Sales e Tauá, onde o índice de Willmontt foi de 0,833; 0,882 e 0,837, respectivamente (Tabela 3). Valores semelhantes com os encontrados por Bautista et al. (2009)BAUTISTA, F. et al. Calibration of the equations of Hargreaves and Thornthwaite to estimate the potential evapotranspiration in semi-arid and subhumid tropical climates for regional applications. Atmósfera, v. 22, n. 4, p. 331-348, 2009., no México. Na calibração com apenas o coeficiente α os municípios que apresentaram os maiores índices de Willmontt foram Guaramiranga (0,936), Jaguaruana (0,905) e Morada Nova (0,926). Os demais valores são maiores do que os encontrados para a cidade de Uberaba - MG, cujo Id foi de apenas 0,7 (MELO et al., 2012MELO, G. L. de; FERNANDES, A. L. T. Evaluation of empirical methods to estimate reference evapotranspiration in Uberaba, State of Minas Gerais, Brazil. Engenharia Agrícola, Jaboticabal, v.32, n.5, p.875-888. 2012.).

Tabela 3
Avaliação do desepenho da calibração feita com dois parâmetros
Tabela 4
Avaliação do desepenho da calibração feita com um parâmetro

Na analise da raiz quadrada do erro médio para a calibração feita com os dois parâmetros (RMSE), os valores encontrados oscilaram de 0,289 mm dia-1 (Guaramiranga) a 0,805 mm dia-1 em Campos Sales; Acaraú por sua vez apresentou valor superior ao encontrado por Bautista et al. (2009)BAUTISTA, F. et al. Calibration of the equations of Hargreaves and Thornthwaite to estimate the potential evapotranspiration in semi-arid and subhumid tropical climates for regional applications. Atmósfera, v. 22, n. 4, p. 331-348, 2009., em ajustes feitos com dados de regiões costeiras e continentais no México, RMSE igual a 0,43 e 0,42 mm dia-1 respectivamente (Tabela 3).

O ajuste feito somente com o coeficiente α (Tabela 4) mostrou a importância do expoente β no modelo HS; em relação ao ajuste feito com os dois parâmetros (Tabela 3), os índices de concordância e eficiência foram menores, e os erros calculados foram maiores; a correlação entre o modelo ajustado e a equação padrão (PM) foi boa (r > 0,80) em quase todas as localidades, exceto em Acaraú, Barbalha, Jaguaruana, Sobral e Tauá. Ainda de acordo com as Tabelas 3 e 4 Guaramiranga apresentou um comportamento singular, no ajuste feito com os dois parâmetros o expoente β praticamente não diferiu do seu valor original; em função disso as duas calibrações tiveram o mesmo comportamento e apresentaram os mesmos dados estatísticos.

As comparações entre os modelos ajustados com o padrão (PM) e a equação original de Hargreaves e Samani (1985)HARGREAVES, G. H.; SAMANI, Z. A. Reference crop evapotranspiration from temperature. Applied Engineering in Agriculture, v. 01, n. 02, p. 96-99, 1985. (Figura 2) mostram claramente a variabilidade na estimativa de ETo de uma região para a outra. Em praticamente todas as estações a equação original HS superestimou a ETo calculada por PM nos primeiros meses do ano, periodo esse que apresenta maiores quantidades de chuvas e menores amplitudes térmicas. O modelo de Hargreaves e Samani (1985)HARGREAVES, G. H.; SAMANI, Z. A. Reference crop evapotranspiration from temperature. Applied Engineering in Agriculture, v. 01, n. 02, p. 96-99, 1985. tende a superstimar a ETo em regiões úmidas e subestimá-lo em regiões muitos secas e em regiões de velocidade de vento superiores a 4 m s-1 (TEMESGEN; ALLEN; JENSEN, 1999TEMESGEN, B.; ALLEN, R.; JENSEN, D. et al. Adjusting temperature parameters to reflect well-water conditions. Journal of Irrigation and Drainage Engineering, v. 125, n. 1, p. 26-33, 1999.; XU; SINGH, 2002XU, C. Y.; SINGH, V. P. Cross comparison of empirical equations for calculating potential evapotranspiration with data from Switzerland. Water Research Management, v. 16, n. 3, p. 197-219, 2002.). Portanto, o modelo de Hargreaves e Samani (1985)HARGREAVES, G. H.; SAMANI, Z. A. Reference crop evapotranspiration from temperature. Applied Engineering in Agriculture, v. 01, n. 02, p. 96-99, 1985. requer a calibração local antes ser aplicada para estimar ETo em qualquer região específica (BAUTISTA et al., 2009BAUTISTA, F. et al. Calibration of the equations of Hargreaves and Thornthwaite to estimate the potential evapotranspiration in semi-arid and subhumid tropical climates for regional applications. Atmósfera, v. 22, n. 4, p. 331-348, 2009.; FOOLADMAND; HAGHIGHAT, 2007FOOLADMAND, H. R.; HAGHIGHAT, M. Spatial and temporal calibration of Hargreaves equation for calculating monthly ETo based on Penman-Monteith method. Irrigation and Drainage, v. 56, p. 439-444, 2007.; GAVILÁN et al., 2006GAVILÁN, P. et al. Regional calibration of Hargreaves equation for estimating reference ET in a semi-arid environment. Agricultural Water Management, v. 81, n. 3, p. 257-281, 2006.).

Figura 2
Comparação dos valores calculados de ETo por PM, HS e modelos ajustados

É observado também que o modelo o qual foi ajustado, somente um paramêtro superestima PM nos primeiros meses do ano tornando-se menor a partir do meio do ano, apresentendo diferenças maiores do que o modelo com dois paramêtros ajustados, e às vezes até mesmo com erro maior do que o modelo original (Figura 2). A maioria das estações apresentaram resultados satisfatórios ao longo do ano com valores próximos entre os modelos ajustados e a equação original. Talaee (2014)TALAEE, P. H. Performance evaluation of modified versions of Hargreaves equation across a wide range of Iranian climates. Meteorology and Atmospheric Physics, v. 126, n. 1-2, p. 65-70, 2014. comparando seis versões de ajustes da equação de HS notou que o modelo que melhor se comportou no clima semiárido foi o calibrado em Davis na Califórnia, cidade de clima quente e seco, que se adequa bem ao modelo original.

Os valores que mais diferiram na comparação da equação original de HS com o modelo padrão de PM foram nas cidades de Acaraú, Campos Sales e Crateús; o que motivou tal discrepância foi a localização litorânea, no caso da estação de Acaraú (Figura 1) e o valor da velocidade do vento, no caso das estações de Campos Sales e Crateús (Tabela 2), confirmando os resultados obtidos por Fooladmand e Haghighat (2007)FOOLADMAND, H. R.; HAGHIGHAT, M. Spatial and temporal calibration of Hargreaves equation for calculating monthly ETo based on Penman-Monteith method. Irrigation and Drainage, v. 56, p. 439-444, 2007..

CONCLUSÕES

  1. A calibração dos coeficientes da equação de Hargreaves e Samani para o estado do Ceará se mostrou como uma alternativa para uma melhor estimativa da evapotranspiração de referência em locais com disponibilidade de dados limitada;

  2. O modelo de HS superestima a equação Penman-Monteith nos primeiros meses do ano, independente se calibrado ou não. Para a cidade de Guaramiranga ambas as calibrações apresentam resultados semelhantes quando comparadas entre si, já para a cidade de Fortaleza o ajuste do modelo de HS não se faz necessário;

  3. O ajuste que apresentou os resultados mais próximos do modelo padrão foi a calibração simultânea do coeficiente α e do expoente β.

  • Parte da Monografia do primeiro autor apresentada ao curso de Irrigação e Drenagem, IFCE - Campus Iguatu

REFERÊNCIAS

  • ALLEN, R. G. et al Crop evapotranspiration: guidelines for computing crop water requirements. Roma: FAO, 1998. 300 p. (FAO. Irrigation and Drainage Paper, 56)
  • BAUTISTA, F. et al Calibration of the equations of Hargreaves and Thornthwaite to estimate the potential evapotranspiration in semi-arid and subhumid tropical climates for regional applications. Atmósfera, v. 22, n. 4, p. 331-348, 2009.
  • BORGES, A. C.; MENDIONDO, E. M. Comparação entre equações empíricas para estimativa da evapotranspiração de referência na Bacia do Rio Jacupiranga. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v. 11, n. 3, p. 293-300, 2007.
  • FERNANDES, D. S. et al Calibração regional e local da equação de Hargreaves para estimativa da evapotranspiração de referência. Revista Ciência Agronômica, v. 43, n. 2, p. 246-255, 2012.
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2016

Histórico

  • Recebido
    24 Set 2014
  • Aceito
    29 Out 2015
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