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Tecnologia da Informação: commodity ou ferramenta estratégica?

Information Technology: commodity or strategical tool?

Resumos

Desde o surgimento da Tecnologia da Informação (TI), nem sempre houve consenso quanto à relação entre seu custo e benefício. Por isto, esta é uma questão que tem sido objeto de estudo no meio acadêmico e empresarial. Resultados de pesquisas apontam para duas vertentes opostas: de um lado, a idéia de que a TI é a solução estratégica para processos e serviços organizacionais; por outro lado, acredita-se que a TI é apenas uma ferramenta e não tem mais valor estratégico. Além desta dualidade, existe o desafio de justificar os altos investimentos em TI, visto que as empresas, diante da dinâmica competitiva, não podem focar em esforços não produtivos. O presente trabalho tem como objetivo lançar luz sobre a questão e descrever alguns aspectos que levam a tal dúvida. Para tal, realizou uma pesquisa bibliográfica em livros, teses, periódicos científicos e revistas técnicas. Inicialmente, apresentam-se alguns conceitos de gestão da TI. Em seguida, são discutidos assuntos sobre a análise do valor da TI, paradoxo da produtividade e como e quando a TI se comporta como commodity. Ao final, são apresentadas as limitações desta reflexão teórica e as considerações sobre a difícil aplicabilidade prática de medidas de produtividade e valor da tecnologia da informação.

Tecnologia da Informação; Valor da TI; Uso estratégico da TI; Investimento em TI; Paradoxo da TI


Since the sprouting of the informantion technology (IT) and its use for the companies the relation between cost and benefit did not stay clear. This is a question that has been studied and analyzed in depth in the academic and organizacional environments. The results of the studies point with respect to two opposing sides: first, one believes that IT does not pass of a tool without strategical value. On the order side, enterprises work with idea thar IT is strategic solution for many problems for all levels and businesses. Beyond this paradox, the challenge exists to justify the high investiments in technology, since the companies, ahead of the high competitiveness the enterprises could not focus in efforts no productives. The theoretical paper does not intend to answer the question, but to only describe the aspects that lead to such doubt. For such, it describes some concepts of IT, the IT business value, analysis of he investmensts in IT and IT as a commodity. At the final, are presented the limitations of this theoretical reflection and the expositons on the concepts and of its difficult practical applicability.

Information technology; IT business value; Strategic Use of IT; IT investments; IT paradox


Tecnologia da Informação: commodity ou ferramenta estratégica?

Information Technology: commodity or strategical tool?

Luciene Braz Ferreira; Anatália Saraiva Martins Ramos

Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN, Brasil

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Luciene Braz Ferreira Programa de Engenharia de Produção - PEP

RESUMO

Desde o surgimento da Tecnologia da Informação (TI), nem sempre houve consenso quanto à relação entre seu custo e benefício. Por isto, esta é uma questão que tem sido objeto de estudo no meio acadêmico e empresarial. Resultados de pesquisas apontam para duas vertentes opostas: de um lado, a idéia de que a TI é a solução estratégica para processos e serviços organizacionais; por outro lado, acredita-se que a TI é apenas uma ferramenta e não tem mais valor estratégico. Além desta dualidade, existe o desafio de justificar os altos investimentos em TI, visto que as empresas, diante da dinâmica competitiva, não podem focar em esforços não produtivos. O presente trabalho tem como objetivo lançar luz sobre a questão e descrever alguns aspectos que levam a tal dúvida. Para tal, realizou uma pesquisa bibliográfica em livros, teses, periódicos científicos e revistas técnicas. Inicialmente, apresentam-se alguns conceitos de gestão da TI. Em seguida, são discutidos assuntos sobre a análise do valor da TI, paradoxo da produtividade e como e quando a TI se comporta como commodity. Ao final, são apresentadas as limitações desta reflexão teórica e as considerações sobre a difícil aplicabilidade prática de medidas de produtividade e valor da tecnologia da informação.

Palavras-chaves: Tecnologia da Informação; Valor da TI; Uso estratégico da TI; Investimento em TI; Paradoxo da TI.

ABSTRACT

Since the sprouting of the informantion technology (IT) and its use for the companies the relation between cost and benefit did not stay clear. This is a question that has been studied and analyzed in depth in the academic and organizacional environments. The results of the studies point with respect to two opposing sides: first, one believes that IT does not pass of a tool without strategical value. On the order side, enterprises work with idea thar IT is strategic solution for many problems for all levels and businesses. Beyond this paradox, the challenge exists to justify the high investiments in technology, since the companies, ahead of the high competitiveness the enterprises could not focus in efforts no productives. The theoretical paper does not intend to answer the question, but to only describe the aspects that lead to such doubt. For such, it describes some concepts of IT, the IT business value, analysis of he investmensts in IT and IT as a commodity. At the final, are presented the limitations of this theoretical reflection and the expositons on the concepts and of its difficult practical applicability.

Key-words: Information technology; IT business value; Strategic Use of IT; IT investments; IT paradox.

1 INTRODUÇAO

A Era da Informação modificou a estrutura e o ambiente organizacional de forma singular. A importância da tecnologia de informação (TI) para as organizações é fundamental, apesar de quase sempre participar como área-meio e de ser um componente relativamente novo nas organizações, principalmente se comparado a outros fenômenos ocorridos e discutidos na administração. Devido aos altos e crescentes custos, a comunidade empresarial demanda da TI uma demonstração do retorno do investimento realizado. Em razão da crescente relação da TI com o sucesso do negócio, as empresas elevaram suas expectativas quanto à contribuição dessa área. No entanto, a literatura reporta resultados mesclados em relação ao valor de negócios da TI (IT business value).

A relação entre a TI, produtividade e desempenho organizacional tem sido objeto de pesquisa entre acadêmicos estrangeiros e nacionais (WEILL; OLSON, 1989; WEILL, 1992; BRYNJOLFSSON, 1993 e 2003; HITT, BRYNJOLFSSON, 1996; STRASSMAN, 1997; GRAEML, 1998a; BRYNJOLFSSON; HITT, 2000; LUNARDI, 2001; MAÇADA, 2001; BECKER; LUNARDI; MAÇADA, 2002; CERRI; CAZARINI, 2002; LAURINDO, 2002; CARR, 2003; PISELLO; STRASSMAN, 2003). Estes estudos se dividem em três níveis: macro, setorial e da firma. Uma parte desses estudos conseguiu mostrar a relação da TI com o retorno dos investimentos, outros não comprovaram se os altos investimentos realizados em TI trazem benefícios reais para as organizações. Este aspecto dual e pouco consensual, abordado por diversos autores, é chamado paradoxo da produtividade, que diz respeito à falta de comprovação de que a TI realmente traz resultados, principalmente pelo caráter complexo desta demonstração.

O tutorial extensivo de Kohli e Sherer (2002) retoma esta questão, discutindo e provendo direções para futuras pesquisas sobre a mensuração do retorno no investimento em TI. Diante desta dificuldade de se analisar os investimentos em TI, como afirmar que a tecnologia traz diferencial competitivo ou se tornou uma commodity? É esta questão que este artigo teórico pretende contribuir, no sentido de dar prosseguimento a uma discussão acerca do assunto.

2 A GESTÃO NA TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO NAS ORGANIZAÇÕES

A área de tecnologia de informação está intimamente ligada às diversas transformações ocorridas nas empresas. Atualmente, a TI está inserida em praticamente todas as atividades empresariais, dando suporte para a melhoria na qualidade de serviços e produtos. Encontram-se exemplos do uso da TI nos níveis operacionais, de conhecimento, gerencial e estratégico, tornando os investimentos em tecnologia cada vez mais altos e mais constantes. Os funcionários dispõem de recursos computacionais cada vez mais potentes e com funcionalidades e programas diversificados, além de assistentes digitais, laptops, sistemas sem fio etc. Os sistemas das empresas se comunicam com filiais, fornecedores, clientes e todo o tipo de ligação que se fizer necessária dentro da cadeia de valor.

Como junção de dois termos - Tecnologia e Informação, o conceito da TI engloba hardware, software, telecomunicações, automação, recursos multimídia, recursos de organização de dados, sistemas de informação, serviços, negócios, usuários e as relações complexas envolvidas na coleta, uso, análise e utilização da informação.

Na visão de Luftman (1996), a TI pode ser dividida em dois segmentos: um engloba a infra-estrutura, composta pelo hardware, software, redes, Internet e banco de dados. O outro é formado pela estratégia e informação (Figura 1).


Para Luftman (1996), a evolução da TI está dividida em três eras: era do controle de recursos, ou era da automação, onde o planejamento dos sistemas de informação era focado na automação de processos e o papel do administrador era apenas prover o controle dos recursos funcionais. Esta era foi seguida pela era da arquitetura de sistemas de informação, que diz respeito ao planejamento estendido a integração das funções. O planejamento era usado para criar arquiteturas para suportar uma larga escala de aplicações do sistema. E a última era, na qual as empresas estão inseridas até hoje, é a era do alinhamento estratégico, na qual a TI é vista como oportunidade de potencializar a integração interorganizacional do negócio, onde o papel do administrador é definir e permitir novas potencialidades.

Graeml (1998a) reforça que a TI foi uma das responsáveis pela complexidade do mercado atual e tem poder para tornar-se uma ferramenta para a atração e encantamento dos clientes pelas empresas. Através da TI, é possível um relacionamento mais estreito, em tempo real, com os clientes, o que cria um espírito de lealdade e ainda possibilita que a empresa consiga extrair informações que poderão gerar novos produtos e novos serviços, cativando novos e antigos clientes.

Segundo Porter e Millar (1997), a Tecnologia da Informação pode até mesmo afetar a maneira das empresas competirem. Isto se daria de três diferentes formas: modificando a estrutura do setor, criando vantagem competitiva e dando origem a novos negócios. Antes, o que acontecia era que se investia apenas baseando-se nos passos dos concorrentes para diminuir possíveis vantagens alcançadas pelos outros. Hoje, as organizações devem buscar investir melhor, de forma seletiva e consistente, com intuito de rever seus processos e serviços para obter ganhos quantitativos e qualitativos significativos.

Para avaliar o impacto estratégico, Cash, McFarlan e McKenney (1992) descrevem o relacionamento das forças competitivas de Porter com a tecnologia de informação:

"... a tecnologia de informação oferece valor estratégico se permitir a redução de pessoal de apoio à produção e escritório; se permitir o uso mais completo das facilidades de manufatura, ao mesmo tempo que for componente da cadeia de valor da empresa; se permitir uma redução nos custos de estoque e contas dos produtos; se permitir a melhor utilização do material com redução de desperdícios; se permitir adaptar o produto com as necessidades do consumidor, incorporando satisfação ao cliente quanto ao produto ou serviço oferecido, e se permitir identificar as necessidades não atendidas do cliente por coleta e análise do banco de dados sobre vendas, para apontar novas tendências e fortalecer a competitividade lucrativa da empresa".

Além dessas características, a TI pode ir além, influenciando internamente a cadeia de valor da empresa, criando vantagens competitivas. Applegate et al. (1996) afirmam que uma boa maneira de se saber o potencial das oportunidades de TI é exatamente por meio da análise sistemática da cadeia de valor, que é uma série de atividades interdependentes que trazem um produto ou serviço ao mercado consumidor. Conforme Porter e Montgomery (1998), a TI participa da cadeia de valor, transformando a forma como as atividades podem ser executadas e a natureza das ligações entre elas.

Em um artigo da IBM Business Consulting Services (2003), foi revelado o resultado de uma pesquisa sobre os principais desafios do administrador da área de TI, realizada com executivos da área de TI e também com seus clientes internos. Para 33% dos usuários e 44% dos executivos de TI, a área não planeja suas estratégias de modo integrado e simultâneo com a definição das estratégias de usa empresa e, sim, posteriormente ou em reação ao dia-a-dia dos negócios. O artigo conclui que os executivos devem sair da etapa da gestão de TI para a gestão em TI.

Na pesquisa de Lunardi (2001), realizada com executivos de bancos argentinos, uruguaios, chilenos, norte-americanos e brasileiros, identificou-se que há interação e compartilhamento de visões sobre o uso efetivo de TI nas organizações tanto entre os altos executivos como entre executivos da área de TI. Esse dado mostra que, cada vez mais, a percepção sobre o impacto que tem a TI para a competitividade do negócio avança no sentido de se tornar similar em todas as áreas organizacionais, não só para quem gerencia a Tecnologia de Informação.

3 ANÁLISE DO VALOR DA TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO

Medir o desempenho e o valor da TI tem sido uma ciência muito imprecisa. Nenhuma métrica ou grupo de métricas poder ser aplicada apropriadamente em todas as circunstâncias onde a TI é necessária. Alguns autores apontam que existem três medidas distintas: produtividade, valor ao consumidor e desempenho dos negócios (HITT, BRYNJOLFSSON, 1996). Para os autores, a mensuração e comprovação dos benefícios da TI são complexas. Graeml (1998b) relata que a produtividade é apenas um dos possíveis indicadores de sucesso do investimento em tecnologia.

Apesar de haver diversas metodologias de análise de investimentos em Tecnologia da Informação, em muitos casos, os investimentos em TI são induzidos por uma necessidade de acompanhar a concorrência ou têm como base o feeling do executivo (WEILL; OLSON, 1989). Na percepção de executivos da TI, quanto mais se investir em TI, maiores serão a rentabilidade, o desempenho no mercado e a satisfação dos clientes.

Um fator importante a ser revisto é referente à como os executivos consideram a TI, como gasto ou como investimento. Despesas estão normalmente associadas a gastos recorrentes e os benefícios são imediatos e de vida curta. Investimentos são gastos menos freqüentes, cujos benefícios estão usualmente associados à estratégia da empresa e não ocorrem tão rapidamente (GRAEML, 1998b). O que se observa é que muitas empresas ainda enxergam a TI como custo, não como investimento. Muito desta visão é conseqüência do histórico da TI. As compras de computadores e softwares eram vistas como despesa, isto é, apenas como um meio de se garantir mais agilidade no processo. Uma comprovação deste fato se dá em momentos de corte de custos: a área de TI é uma das que mais sofrem com a redução de orçamentos.

Na pesquisa "Gestão de TI nas Empresas" da IBM (2003), uma das questões mais relevantes da aferição do valor da TI, na opinião dos executivos, é que a TI tem de demonstrar seus resultados em termos entendidos pelos gestores do negócio. Isso exige sistemas de avaliação que transcendam as métricas tradicionais de disponibilidade, tempo de resposta ou níveis de serviço, ou seja, que se baseiem em métricas financeiras e não-financeiras, internas e externas, que avaliem o passado e as perspectivas para o futuro, quantificando os benefícios - não só os custos da atividade de TI.

Isso corrobora com o que pesquisadores e praticantes têm sugerido: que as medidas tradicionais focalizadas somente em aspectos financeiros ou tecnológicos da decisão não são completas, devendo incorporar outros métodos de análise (BRYNJOLFSSON, 1993).

4 A RELAÇÃO ENTRE OS INVESTIMENTOS EM TECNOLOGIA DE INFORMAÇÃO E A PRODUTIVIDADE E O DESEMPENHO ORGANIZACIONAL

O uso da TI e os efeitos sobre a produtividade e o desempenho organizacional é uma área de grande interesse acadêmico e profissional. Segundo Maçada (2001), "embora haja uma quantidade significativa de pesquisas realizadas na área de Sistema de Informação, muito da literatura falha em explicar, conclusivamente, o impacto estratégico e econômico que os investimentos em TI têm sobre a produtividade e desempenho organizacional".

Algumas correntes demonstravam que a TI resultava em ganhos de produtividade, como a defendida por Weitzen (1991). No Brasil, algumas pesquisas no setor bancário têm demonstrado uma relação positiva entre investimentos em TI e produtividade. No estudo de Becker et al (2002), constatou-se que os bancos que mais investiram em TI foram os mais eficientes globalmente.

Posicionando-se em direção oposta, outros autores questionaram esta proposição de que o uso das tecnologias de informação proporcione realmente um alto ganho de produtividade nas organizações. Tendo por base uma revisão de literatura, Weill (1989) afirmava de que o investimento isolado em TI não estava garantindo retornos para as organizações.

Strassman (1997), um pesquisador que também tem um histórico de estudos sobre esta questão, sustentava que "não é de todo evidente que os investimentos em TI melhoram as posições competitivas das organizações nos mais variados setores da economia". Para Strassman (1997), não havia correspondência à altura do ganho de produtividade, apesar do aumento crescente dos gastos em tecnologias da informação. Esse é o paradoxo da produtividade, o qual mostra que o desempenho econômico da empresa nem sempre pode estar diretamente associado ao seu nível de gastos com tecnologia de informação.

Contrabalançando as duas visões, Brynjolfsson (1993) vê a relação entre tecnologia de informação (TI) e produtividade como sendo pouco compreendida, apesar de muito debatida. O trabalho deste autor sugere que o retorno dos gastos em TI pode ser, na verdade, muito maior que o estimado previamente. A diferença na estimativa de produtividade da TI se deve muito mais a deficiências de mensuração e do conjunto de ferramentas metodológicas do que devido a problemas de gerenciamento dos usuários e desenvolvedores de TI.

Uma outra justificativa para a questão deste paradoxo é que o problema não seria o potencial da TI, o qual é dado como certo, mas que sua utilização só será produtiva se houver reestruturação do trabalho permitido pela nova tecnologia (HAMMER; CHAMPY, 1993). Davenport (1993) também trouxe à tona esta questão e apontou a possível falha desta abordagem: uma falta de atenção maior com as pessoas que gerenciam e lidam com a TI.

No entender de Smith e McKeen (1993), há duas formas básicas de saber se o uso da TI afeta o desempenho e a produtividade organizacionais:

pela redução dos custos do trabalho ou por fazer o trabalho mais eficiente;

através de geração de receitas devido à criação de novos produtos ou serviços.

Identificar como a TI afeta a produtividade em algumas aplicações orientadas a processos empresariais, especialmente onde há um sistema manual similar para comparação, não é tão difícil quanto perceber como a TI afeta a produtividade em outros tipos de sistemas, como aqueles orientados para atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D), por exemplo.

O paradoxo da produtividade ou da eficiência da TI então comprova que não existe ainda uma maneira ideal de se medir essa tecnologia. Resultados empíricos mostram que a TI está correlacionada positivamente com a produtividade, mas há variações significativas entre organizações. Assim, alguns tipos de negócios terão maiores e mais visíveis benefícios organizacionais e retornos financeiros mais rápidos do que outros. Variações entre as empresas também existem, pois enquanto grandes somas de dinheiro têm sido gastas em TI obtendo-se pequeno retorno, outras gastaram quantias similares com grande benefício (BRYNJOLFSSON; HITT, 2003).

Brynjolfsson (1993) lembra que "muitas das pesquisas sobre o valor da TI para as empresas baseadas puramente em modelos econômicos apresentaram resultados desfavoráveis e contraditórios", mas o autor pondera que "a falta de evidência não é evidência da falta de contribuição positiva da tecnologia da informação para a produtividade". Brynjolfsson e Hitt (2000) sugerem que o retorno no investimento em TI pode, de fato, ser muito mais alto do que previamente estimado. Levando em conta sua metodologia de medição do valor da TI, os autores mostram que a introdução da TI tem sido associada com o crescimento na produtividade, diminuição de hierarquias nas empresas e alguma descentralização na tomada de decisão.

É necessário pensar em uma medida do desempenho geral que considere as perspectivas da produtividade e da geração de subprodutos ou benefícios gerados pelo uso da TI. Desta forma, poder-se-ia capturar as formas de impacto da TI com relação à produtividade. Outro passo importante a ser dado para saber se houve aumento ou não da produtividade, quando da implementação de tecnologias da informação, é situar o retorno no investimento baseando-se em critérios não tradicionais (RAMOS, 1994).

Graeml (1998a) percebeu a falta de indicadores que analisem de forma correta e consigam demonstrar o que realmente se pode esperar de ganho com a TI. Cerri; Cazarini (2002) relatam que os retornos esperados pelos executivos, quando investem em TI, são qualidade, eficiência, eficácia, integração de processos da empresa, agilidade, compreensão, permitindo melhor entendimento com clientes, fornecedores e processos operacionais, produtividade e eliminação ou redução de custos. Por se tratarem de retornos intangíveis, os indicadores tradicionais como o retorno sobre investimento (ROI), taxa interna de retorno (TIR), valor presente líquido (VPL) e outros indicadores financeiros não estão de todo qualificados para demonstrarem o melhor resultado.

Segundo Laurindo (2002), existem alguns problemas na avaliação de TI por meio unicamente de indicadores ou medidas. Por isso, os indicadores tendem a perder força, além de divulgar a idéia de que só o que pode ser medido é que pode ser administrado. O autor conclui que uma possível conclusão geral pode ser tirada: não é possível concluir acerca do desempenho da TI em relação à sua eficácia usando unicamente indicadores financeiros e de investimentos.

Portanto, para cada projeto, é preciso observar e escolher o método mais adequado, sem deixar que uma parcela da decisão seja tomada pelo feeling do executivo à frente do projeto ou decisor da empresa.

5 A TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO COMO UMA COMMODITY

A TI, vista como commodity, não é uma visão inédita na literatura. No entanto, nenhum estudo causou tanta repercussão quanto o artigo de Nicholas Carr, intitulado IT doesn't matter, publicado na Harvard Business Review, em 2003.

A polêmica, tanto no meio acadêmico quanto no meio empresarial, reacendeu a discussão sobre o tema. Carr utilizou a pesquisa da empresa de consultoria americana Alinean, onde foram comparados os resultados financeiros com os gastos em TI de 7.500 grandes empresas americanas. Das 25 empresas com maior retorno financeiro, foram investidos apenas 0,8% do seu faturamento em TI, contra 3,7% das outras companhias. A conclusão que se chega é que a TI havia se transformado em mais uma ferramenta sem diferencial competitivo, um recurso de infra-estrutura necessário, mas com o qual as organizações não mais conseguiam criar vantagens sustentáveis.

A seguir, alguns aspectos abordados nesse artigo são debatidos. Os resultados da pesquisa reportada por Carr (2003) provam que investir em valores em TI pode não resultar no retorno esperado. Entretanto, isso não deveria ter sido encarado como novidade para a comunidade acadêmica de Sistemas de Informação. Desde o início da década de noventa se sabia que nem tudo o que se atribui como benefício da TI é ou pode ser comprovado como verdadeiro. Ou seja, nem sempre o investimento feito em sistemas de informação apresentam uma relação direta com os resultados. Há vários fatores que podem afetar a aferição do valor da tecnologia.

Segundo Carr (2003), para a tecnologia de informação possuir valor estratégico, é preciso permitir que as companhias usem a TI de uma forma diferenciada. Por isto, à medida que a tecnologia está acessível a todos, este uso diferenciado tende a desaparecer. Esta afirmação leva a outras questões: se a tecnologia não traz diferencial competitivo, como e quais valores a organização deve investir em TI? Como garantir que estes investimentos podem e irão trazer as vantagens inicialmente prometidas? Será que tudo o que restou para fazer é controlar riscos e custos?

Carr (2003) também assegura que a TI é essencialmente um mecanismo de transporte, isto é, "ela carrega informação digital da mesma forma que os cabos elétricos transportam eletricidade. E é mais valiosa quando compartilhada do que usada isoladamente". Seu conceito de TI diz respeito somente a hardware e software, os quais se tornaram fatores de produção como qualquer outro. Representam apenas mais um investimento obrigatório para a continuidade do processo administrativo e que não garantem nenhuma vantagem competitiva.

Também é pertinente ressaltar que Carr considera a tecnologia da informação apenas como hardware e software. que se refere tão somente à base da pirâmide da Figura 1, apresentada anteriormente. Portanto, se a TI for definida somente como infra-estrutura e no enfoque transacional, é até possível concordar com a sua tese de que a TI é commodity.

Mas esta é uma visão estreita. Weill (1992) alertava de que os estudos focalizando a relação entre os investimentos em TI e o desempenho empresarial deveriam adotar uma definição mais ampla de TI, o qual incluísse todo o hardware, software, comunicações, telefone, bem como todas as pessoas e recursos dedicados à TI, sejam centralizados ou descentralizados. Todos os estudos analisado por Weill (1992) de certa forma mostravam resultados limitados e contraditórios que surgiam como conseqüência de definições inconsistentes da TI, diferentes unidades de análise, diferentes medidas de desempenho, fundamentação teórica limitada e crença em estudos transversais. Esta crítica também se ajusta ao caso da pesquisa de Carr.

Pisello e Strassmann (2003) acham que a TI importa sim, desde que a infra-estrutura de computação se moveu para a comoditização, claramente o ambiente inteiro da tecnologia de informação não se comoditizou. Desta forma, quando se pensa no conjunto, torna-se complexo e de difícil aceitação afirmação de que a TI não importa mais.

Respaldados por uma pesquisa com mais de 10.000 empresas em todo o mundo, Pisello e Strassmann (2003) sentenciam que as empresas que tem investido na TI de forma inteligente e controlam estes investimentos para o máximo retorno têm certamente obtido as recompensas que a tecnologia pode entregar. Este resultado pontua que é o grau de sapiência no uso e a eficácia da gestão da TI que de fato importa quanto se mede o valor da TI.

Carr (2003) assevera que "o potencial da tecnologia para diferenciar uma empresa das outras, ou seja, seu potencial estratégico, inexoravelmente diminui à medida que se torna acessível a todos". Neste aspecto, essa sua afirmação também não é novidade, mas antes um "revival". Bem antes que Carr, o estudo de Weill (1992) concluía que os primeiros adotantes de uma TI estratégica poderiam ter um sucesso extraordinário, mas, uma vez que a tecnologia se tornasse comum, a vantagem competitiva estava perdida.

Porter e Montgomery (1998) também defendem que o diferencial competitivo só existe à medida que uma empresa consegue inventar algo que não possa ser copiado pelos concorrentes. À medida que esta invenção se dissemina, ela deixa de gerar diferencial e passa a ser uma obrigação para se manter no mercado. Isso também vale para a TI.

Nesta mesma linha de raciocínio, Lucas Jr (1990) afirmava que, uma vez que a empresa ganhou uma vantagem, a mesma encontrará concorrentes para desenvolver sistemas de informação similares. A empresa deve criar uma vantagem difícil de ser copiada para manter esta vantagem ou estar sempre criando novas vantagens, não dando tempo dos concorrentes a alcançarem, e isto se torna difícil quando se fala em infra-estrutura de TI, visto que os softwares e hardwares costumam estar disponíveis a todos.

Embora seja possível afirmar que grande parte da TI que é utilizada atualmente tenha se tornado commodity, dizer que TI não gera diferencial tecnológico é ignorar o fato de que a indústria da TI está em constante e rápida evolução. Daí, novas tecnologias sempre surgirão, muitas vezes criando novos paradigmas que substituem os anteriores (PINTO, 2005).

Tecnologia de informação não significa somente hardware e software. A TI vai além disso. Através da TI estão à informação e o conhecimento - sobre clientes, processos, operações e mercados. É o no "I" da TI que pode residir o verdadeiro diferencial - o uso inteligente e eficaz da informação. É o processo de uso estratégico da informação que pode vir a gerar o diferencial competitivo: a maneira como estas informações serão utilizadas nos processos e serviços das empresas e no ambiente de negócios. Na síntese de Graeml (1998b), "a tecnologia por si só não vale nada para o negócio".

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo procurou buscar embasamento na literatura para dissertar acerca da problemática da interpretação da TI como commodity. Como apresentado, ainda não existem estudos conclusivos que mostrem qual o impacto da TI na produtividade das organizações, ou que mensurem seus retornos tangíveis e intangíveis com segurança. As mensurações dos investimentos tangíveis são mais evidentes que os intangíveis, mas mesmo assim ainda necessitam de mais estudos e modelos de análise de retorno sobre estes investimentos.

Sem uma conclusão definitiva de como a TI é conceituada e entendida e de como avaliar todas as vertentes de impacto desses projetos, como garantir que a mesma se tornou commodity ou se ainda possui diferencial competitivo? Champy (2003) dá o seguinte conselho: gerencia a TI inteligentemente e aproveite cada oportunidade de usá-la para inovar.

Isto implica na particularidade de cada organização e como a mesma definirá, pelo menos internamente, como pretende utilizar as tecnologias existentes e as informações delas provenientes. Setores como o bancário, financeiro e aéreo já mostraram como a TI pode proporcionar toda uma mudança no estilo do mercado e na saúde das organizações.

A vantagem competitiva tem sido alcançada não só pelas empresas que sabem como implementar a tecnologia da informação, mas sobretudo que sabem como aplicá-la para melhorar processos do negócio e sabem como usá-la para compartilhar, gerenciar e gerar conhecimento (PISELLO; STRASSMANN, 2003). Concordando com os autores, hoje o que importa e o que conta não é o quanto se gasta em TI, mas o que se investe nela e quão bem essa TI é gerenciada.

Um novo ciclo de pesquisas e discussões se abre com relação à gestão da tecnologia de informação. Por isto este estudo não tem a pretensão de responder esta questão, apenas de elucidar alguns conceitos e trazer à tona as contradições e dualidades de conceitos da tecnologia da informação e seu uso pelas organizações. Informações conclusivas dependerão de estudos exploratórios em diversas áreas organizacionais, avaliando impactos financeiros, mercadológicos e comportamentais.

7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Anatália Saraiva Martins Ramos

Programa de Pós-graduação em Administração - PPGA

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Campus Universitário Natal-RN 59072-970 Brasil

Telefone: (84) 211-9239

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Recebido em: 29/10/2004

Aprovado em: 15/03/2005

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  • Endereço para correspondência:

    Luciene Braz Ferreira
    Programa de Engenharia de Produção - PEP
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Fev 2011
    • Data do Fascículo
      2005

    Histórico

    • Recebido
      29 Out 2004
    • Aceito
      15 Mar 2005
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