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CADÊ O BANCO QUE ESTAVA AQUI? O IMPACTO DOS BANCOS DIGITAIS NO MERCADO BRASILEIRO

WHERE IS THE BANK THAT WAS HERE? THE IMPACT OF DIGITAL BANKS ON BRAZILIAN MARKET

RESUMO

Este estudo analisa implicações da digitalização e o surgimento dos Bancos Digitais no Brasil. Para tanto, descreve a evolução dos canais de atendimento (2011-2018) e a regulamentação relacionada (2013-2019), bem como analisa implicações causadas ao mercado e as interações dos clientes do Nubank®. Este artigo utiliza abordagem qualitativa, com etapas descritiva e exploratória, dados secundários e análise documental. Como resultados, o estudo apontou: iniciativas de investimento em digitalização da relação com clientes; ampliação do uso de estratégias de comunicação dos Bancos Digitais pelos Bancos Tradicionais; 16 normativos do Banco Central Brasileiro sobre o tema; e que a maioria dos clientes Nubank® atua como promotores da marca.

Palavras-chave:
Canais; Digitalização; Mercado bancário; Bancos tradicionais; Bancos Digitais

ABSTRACT

This study analyzes the implications of digitalization and the emergence of Digital Banks in Brazil. Therefore, it describes the evolution of service channels (2011-2018) and related regulations (2013-2019). It analyzes implications caused to the market and Nubank® customer interactions. It uses a qualitative approach, descriptive and exploratory steps, secondary data and document analysis. As a result, the study pointed out: investment initiatives in the digitalization of customer relations; expansion of the use of communication strategies of Digital Banks by Traditional Banks; 16 regulations issued by the Brazilian Central Bank on the subject; and that the majority of Nubank® customers act as brand promoters.

Keywords:
Channels; Digitalization; Banking market; Traditional banks; Digital Banks

INTRODUÇÃO

Após seis planos econômicos frustrados, o Brasil conseguiu, com a implantação do Plano Real (1994), o controle da inflação e a estabilidade dos preços. No entanto, após conseguir esse feito, verificou-se uma incapacidade das instituições financeiras em promover espontaneamente os ajustes necessários para sua sobrevivência nesse novo cenário econômico: dezenas de bancos faliram, gerando custos financeiros e sociais (Banco Central do Brasil, 2019Banco Central do Brasil (2019). Arranjo de Pagamento: arranjo e instituições de pagamento autorizados pelo BCB. Brasília, DF: BACEN, 2019. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/perguntasfrequentes-respostas/faq_arranjo_ip . Acesso em: 14 abr. 2019.
https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/...
).

Nesse contexto, a modernização do sistema financeiro nacional teve início em meados da década de 1990 por meio do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (PROER). É possível destacar ainda as reformas institucionais, as mudanças legais e normativas introduzidas pelo Banco Central do Brasil (BACEN), a entrada dos bancos estrangeiros no mercado doméstico e a implantação das regras do Acordo da Basiléia (Banco Central do Brasil, 2019Banco Central do Brasil (2018). PROER: programa estimula a reestruturação de bancos. Brasília, DF: BACEN, 2019. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/legado?url=https:%2F%2Fwww.bcb.gov.br%2Fhtms%2Fproer.asp . Acesso em: 23 ago. 2018.
https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/...
).

Essas mudanças estratégicas e táticas tiveram como principais consequências uma concentração do mercado em grandes instituições, principalmente no setor privado (Paula & Marques, 2006Paula, L. F. & Marques, M. B. L. (2006). Reestruturação bancária mundial e seus impactos no setor bancário brasileiro. In: PAULA, L. F.; FERREIRA, L. R.; ASSIS, M. P. (ed.). Perspectivas para a economia brasileira: inserção internacional e políticas públicas., Rio de Janeiro: Editora da UERJ, cap. 9, 201-230.). Visando a diferenciação, os bancos têm buscado a melhoria contínua e a eficiência em processos e uma corrida pela inovação e digitalização da relação com o cliente.

Um dos exemplos dessa inovação são os Bancos Digitais, instituições criadas em 2013 em meio a um mercado tradicional, que até então investia em inovação de processos com o objetivo específico de elevar sua rentabilidade. A mudança para um relacionamento digital com os clientes passou a ser um elemento estratégico essencial para os todos os bancos.

OBJETIVOS E PERGUNTA DE PESQUISA

Este estudo foi guiado na busca por contribuir para o entendimento e na formulação da resposta ao problema de pesquisa “Como a regulamentação dos Bancos Digitais afetou o mercado bancário brasileiro?”. Dessa forma, ele objetiva analisar as implicações da transformação digital e o surgimento dos Bancos Digitais no Brasil.

Para tanto, percorre alguns objetivos específicos: Descrever a evolução dos canais de atendimento utilizados pelos clientes no setor bancário no período de 2011 até 2018; Descrever as mudanças regulamentares e a evolução dos chamados Bancos Digitais no Brasil de 2013 até 2019; Analisar as implicações causadas pelos Bancos Digitais no mercado bancário brasileiro; e Analisar as interações dos clientes do Banco Nubank® relatadas na NuCommunity.

JUSTIFICATIVA

O mercado bancário é um dos mais importantes para a atividade econômica brasileira. Ele é responsável pelo financiamento das produções agrícolas, da construção civil, da indústria e de outros setores que fazem girar a roda da economia. Além do financiamento dado à produção, esse mercado é responsável por ser o elo entre os clientes poupadores e captadores de recursos, emprestando dinheiro para a aquisição de bens, contribuindo assim de forma decisiva para o movimento da economia (Dutta & Dutta, 2009Dutta, K. & Dutta, A. (2009). Customer Expectation and Perceptions Across the Indian Banking Industry and the Resultant Financial Implications. Journal of Service Research, 9(1), 31-49.).

Sendo o principal pilar de sustentação de praticamente todos os modelos econômicos adotados no Brasil, o mercado bancário vem se desenvolvendo nos últimos anos acompanhando as mudanças estruturais da economia, a evolução da sociedade e o comportamento do consumidor (Assaf Neto, 2009Assaf Neto, A. (2009). Mercado Financeiro. São Paulo: Atlas.). Principalmente após a disseminação da internet e o acirramento da concorrência entre os bancos, o desafio foi promover a digitalização da relação com o cliente, buscando a redução dos custos e a maximização dos lucros.

Como uma forma de promover a competição nesse mercado e principalmente a redução dos custos aos clientes, em 2013 o governo federal editou a Lei 12.685/13, que, entre outras providências, autorizou a criação dos chamados arranjos de pagamento no Brasil. Essa mudança regulamentar foi o marco inicial para a criação dos chamados Bancos Digitais.

A adesão de milhares de clientes a essa nova forma de relacionamento com o mercado bancário gerou uma forte pressão para que outros bancos mudassem não só o seu posicionamento, mas principalmente a forma de relacionamento com os clientes. Para a Price Waterhouse Coopers (2016Price Waterhouse Coopers. (2016). Blurred Lines: How FinTech is shaping Financial Services - Global FinTech Report. Disponível em: <Disponível em: https://www.pwc.se/sv/pdf-reports/blurred-lines-how-fintech-is-shaping-financial-services.pdf >. Acesso em 01 mai 2019.
https://www.pwc.se/sv/pdf-reports/blurre...
), o setor está sofrendo alterações de fora para dentro, modificando de forma significativa como as organizações geram valor aos seus clientes.

Considerando o impacto para milhões de usuários, pesquisar as principais implicações causadas pelos Bancos Digitais no mercado brasileiro é de grande importância, já que essas mudanças podem beneficiar os clientes, principalmente quanto à facilidade e comodidade em processos, além do aumento da concorrência.

REVISÃO DA LITERATURA

Para Freixas e Rochet (2008Freixas, X. & Rochet, J. (2018). Microeconomics of banking. Massachussets: Institute of Technology. 2.ed.), um banco é uma instituição cujas operações consistem na captação de depósitos e na concessão de crédito (empréstimos ou financiamentos) aos seus clientes, seja pessoa física ou jurídica. Já para Fortuna (2008Fortuna, E. (2008). Mercado financeiro. Rio de Janeiro: Qualitymark. 17.ed.), os bancos são instituições dedicadas a propiciar condições satisfatórias para a manutenção de um fluxo de recursos entre poupadores e investidores. Paula (1999Paula, L. F. (1999). Dinâmica da firma bancária: uma abordagem não-convencional. Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, 53(3), 323-356.) faz um contraponto quando diz que no Brasil os bancos não são apenas intermediários financeiros porque, na estruturação do sistema financeiro, essas intuições se tornaram agentes ativos de alocação e distribuição de recursos.

Até a década de 1960, a estruturação da atividade bancária era simples e baseada principalmente nas operações de conta corrente, crédito e cobrança. Devido ao número reduzido de clientes, as agências apresentavam uma área de atendimento reduzida, divididas em dois setores principais: a gerência; e serviços (Accorsi, 1990Accorsi, A. (1990). Automatização: bancos e bancários. Dissertação (Mestrado em Administração) - Universidade de São Paulo, São Paulo.).

Quanto aos instrumentos de trabalho utilizados pelos bancários, na década de 1920 o trabalho era exclusivamente manual, sem a presença de máquinas de calcular. Na década de 1930, o trabalho foi facilitado com o surgimento de máquinas copiadoras de gelatina, que ajudavam na reprodução dos trabalhos. Já a partir da década de 1940, os instrumentos de trabalho foram modernizados com o surgimento das máquinas de calcular (Accorsi, 1990Accorsi, A. (1990). Automatização: bancos e bancários. Dissertação (Mestrado em Administração) - Universidade de São Paulo, São Paulo.).

No final da década de 1950, máquinas mais sofisticadas para confecção de cartelas substituíram progressivamente os livros contábeis. A partir de 1960, junto com a modernização do sistema financeiro, há "racionalização taylorista" do trabalho bancário, com o desenvolvimento de rotinas padronizadas, fluxos de trabalho e o layout das agências foi modernizado e adaptado para possibilitar a massificação de atendimento (Accorsi, 1990Accorsi, A. (1990). Automatização: bancos e bancários. Dissertação (Mestrado em Administração) - Universidade de São Paulo, São Paulo.).

Nas décadas de 1970 e 1980, houve o início da automação das atividades e processos bancários, principalmente após a inclusão dos computadores pessoais - o trabalho bancário passou a ser significativamente mais simples e automático. Já a partir da década de 1990, foram criados os primeiros modelos de autosserviço de forma digital - nesse modelo de atendimento os clientes poderiam consultar suas contas e efetuar alguns serviços sem ir a uma agência bancária, possibilitando às instituições financeiras um incremento na base de clientes proporcionalmente maior que a expansão das dependências físicas (Mello, Stal & Queiroz, 2006Mello, R., Stal, E. & Queiroz, A. (2006). O Banco na Internet: Inovações em Tecnologia da Informação Moldam Novos Serviços Bancários. 30º Encontro ANPAD. Salvador, p.5-10.).

Nos anos 2000, principalmente após a crise financeira de 2008, que afetou os mercados financeiros em geral e aumentou o descrédito da população em relação ao sistema financeiro, houve a criação de uma série de iniciativas para gerar novas opções ao mercado bancário previamente estabelecido. Esse movimento ficou conhecimento como a Revolução Fintech (Fintechlab, 2018Fintechlab. (2018). Novo Radar FintechLab mapeia mais de 400 iniciativas. Disponível em: <Disponível em: http://fintechlab.com.br/index.php/2018/08/13/novo-radar-fintechlab-mapeia-mais-de-400-iniciativas/ >. Acesso em: 21 abr. 2019
http://fintechlab.com.br/index.php/2018/...
).

Apesar da popularização nos últimos anos e do expressivo crescimento, o termo Fintech não pode considerado um conceito novo. Para Schueffel (2016Schueffel, P. (2016). Taming the Beast: A Scientific Definition of Fintech. Journal of Innovation Management, 4(4), 32-54. ), esse termo foi criado em 1972, contudo com um significado um pouco diferente do empregado atualmente.

O termo Fintech foi inicialmente utilizado como a aplicação da tecnologia da informação para a modernização dos sistemas e processos do setor bancário (Bettinger, 1972 como citado em Schueffel, 2016Schueffel, P. (2016). Taming the Beast: A Scientific Definition of Fintech. Journal of Innovation Management, 4(4), 32-54. , p.33-54). No princípio, a modernização tinha como foco os processos de retaguarda, visando à melhoria dos processos internos e apoio às vendas. Com o passar tempo e com os resultados positivos, a estratégia foi direcionada a todas as áreas das instituições financeiras.

A partir de 2008, em meio a uma das mais graves crises financeiras do mundo, instituições com novos modelos de negócio surgiram no setor financeiro, passando a ser chamadas de Fintechs (Arner, Barberis & Buckley, 2016Arner, D. W., Barberis, J. & Buckley, B. P. (2016). The Evolution of Fintech: A New PostCrisis Paradigm? Georgetown Journal of International Law, 47, 1271-1319. https://doi.org/10.2139/ssrn.2676553
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). Essas instituições foram criadas visando fomentar a competitividade e atender aos clientes insatisfeitos com as instituições financeiras tradicionais, mas que não tinham opções (Pinheiro, 2017Pinheiro, V. (2017). Bancos deixam de ver ‘Fintechs’ como ameaça ao negócio. Valor Econômico. 02 mai. 2017. Disponível em: https://valor.globo.com/financas/noticia/2017/05/02/bancos-deixam-de-ver-fintechs-como-ameaca-ao-negocio.ghtml . Acesso em 03 ago.2020
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). Neste artigo, o termo Fintechs é utilizado como sinônimo de Banco Digital.

Ao explorar um segmento de mercado de clientes insatisfeitos com as instituições financeiras tradicionais, as Fintechs cresceram exponencialmente e em pouco tempo. Devido ao sucesso apresentado por esse modelo de negócio, o número de Fintechs multiplicou no país e até 2018 foram mapeadas mais de 400 iniciativas desse modelo (FintechLab, 2018Fintechlab. (2018). Novo Radar FintechLab mapeia mais de 400 iniciativas. Disponível em: <Disponível em: http://fintechlab.com.br/index.php/2018/08/13/novo-radar-fintechlab-mapeia-mais-de-400-iniciativas/ >. Acesso em: 21 abr. 2019
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).

METODOLOGIA

Quanto à abordagem, esta pesquisa é qualitativa, pois objetiva compreender um fenômeno específico, por meio de coleta de dados secundários, estudando as particularidades e experiências individuais do setor bancário brasileiro.

Este estudo tem caráter aplicado e é classificado como descritivo e exploratório. Descritivo, pois tem como premissa básica o não envolvimento do pesquisador no objeto pesquisado e exploratória porque busca entender as implicações causadas pelos Bancos Digitais no mercado bancário brasileiro (Vieira, 2002Vieira, V. A. (2002). As tipologias, variações e características da pesquisa de marketing. Revista da FAE, Curitiba, 51(2), 61-70.).

Na etapa descritiva do estudo, a partir do desenvolvimento do referencial teórico, a proposta foi entender o mercado bancário brasileiro e seus indicadores, conhecer as principais regulamentações dos Bancos Digitais e avaliar as interações dos clientes do Nubank® em sua comunidade no Facebook®. Na parte exploratória, foram avaliados os principais impactos causados pelos bancos digitais no mercado bancário brasileiro, principalmente em relação ao investimento em tecnologia e abordagem comercial de relacionamento com o cliente.

Na etapa descritiva, foi realizado um levantamento no Banco Central do Brasil (BACEN) e na Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN) sobre o comportamento dos clientes na utilização dos canais de relacionamento com os bancos. Foi realizada também uma análise documental no site do BACEN para descrever as mudanças regulamentares e a evolução dos Bancos Digitais no Brasil a partir de 2013, definido como o início da pesquisa por ser o ano da promulgação da Lei 12.685/13, que regulamentou a criação dos arranjos de pagamento no Brasil.

Já na etapa exploratória foi avaliada a quantidade de agências bancárias, a evolução das transações bancárias, observando números consolidados e separados pelo tipo de canal utilizado pelo cliente (tradicionais ou digitais), o percentual de transação por tipo de canal e o montante financeiro investido pelo setor bancário no desenvolvimento de novas tecnologias e sistemas. Nessa etapa da pesquisa foi considerado o intervalo de 2011 até 2018, acompanhando o estudo realizado pela FEBRABAN (Federação Brasileira de Bancos, 2019Federação Brasileira de Bancos (2019). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2018. São Paulo: FEBRABAN, 2019. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 06 abr. 2020
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), que eram os dados já disponíveis.

Também foi analisada a interação de 526 clientes que realizaram comentários na comunidade do Nubank® no Facebook® (NuCommunity) de 16/04/2019 a 31/05/2019. Para a formação da amostra estatística válida para o estudo, foi considerado como tamanho da população os 1.900.000 (um milhão e novecentos mil) de usuários inscritos na NuCommunity em 31/05/2019. O nível de confiança para a construção da amostra foi de 95%, com 5% de erro amostral, sendo a amostra mínima estatisticamente válida de 385 interações.

Para a avaliação da percepção dos clientes foi escolhido o Nubank® por ser o Banco Digital com maior número de contas digitais de acordo com o levantamento realizado neste estudo, com oito milhões de contas abertas, número aproximadamente quatro vezes maior que o segundo colocado.

Para a análise de dados secundários foi empregada a técnica de análise documental. Já na análise dos dados obtidos na NuCommunity foram analisadas as interações realizadas pelos usuários e agrupados de forma a identificar o perfil desses usuários.

RESULTADOS

Dados do setor bancário brasileiro de 2011 a 2018

Apesar de apresentar queda em 2017 e 2018, a quantidade de agências no Brasil vem se mantendo estável, mesmo com movimentos de crescimento e queda, comuns aos efeitos de estabilidade residual (Figura 1). Esse canal passa por uma importante fase de readequação e redefinição de seu papel, incorporando mais sua vocação consultiva (Federação Brasileira de Bancos, 2018Federação Brasileira de Bancos (2018). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2017. São Paulo: FEBRABAN, 2018. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 23 out. 2018.
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).

Figura 1.
Quantidade de Agências pelo Território Nacional

Em 2018, a região Sudeste concentrava o maior número de agências bancárias com 11.200 unidades (52%), seguida pela região Sul com 4.000 unidades (19%). A região Nordeste possui 3.500 agências (16%), na quarta posição está a região Centro-Oeste com 1.800 agências (8%), por fim, a região Norte com 1.100 unidades (5%) (Federação Brasileira de Bancos, 2019Federação Brasileira de Bancos (2019). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2018. São Paulo: FEBRABAN, 2019. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 06 abr. 2020
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).

No período, o mercado bancário brasileiro cresceu a índices significativos, alavancados principalmente pela inclusão de novos clientes (conhecida como bancarização) e pela facilidade proporcionada pelos meios digitais de atendimento (Federação Brasileira de Bancos, 2018Banco Central do Brasil (2018). PROER: programa estimula a reestruturação de bancos. Brasília, DF: BACEN, 2019. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/legado?url=https:%2F%2Fwww.bcb.gov.br%2Fhtms%2Fproer.asp . Acesso em: 23 ago. 2018.
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).

Segundo a Federação Brasileira de Bancos (2018Federação Brasileira de Bancos (2018). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2017. São Paulo: FEBRABAN, 2018. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 23 out. 2018.
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), a bancarização da sociedade brasileira saiu de 72% em 2008 para mais de 90% em 2017, isso corresponde a aproximadamente 50 milhões de novos brasileiros com conta bancária e/ou utilizando produtos e serviços bancários. São poucos os setores econômicos com crescimento de demanda tão acentuada nas últimas décadas. Como consequência, segundo o Banco Central do Brasil (2019Banco Central do Brasil (2019). Arranjo de Pagamento: arranjo e instituições de pagamento autorizados pelo BCB. Brasília, DF: BACEN, 2019. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/perguntasfrequentes-respostas/faq_arranjo_ip . Acesso em: 14 abr. 2019.
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) e a Federação Brasileira de Bancos (2019Federação Brasileira de Bancos (2019). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2018. São Paulo: FEBRABAN, 2019. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 06 abr. 2020
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), as transações bancárias no Brasil saltaram de 32,2 bilhões em 2011, para 78,9 bilhões em 2018 (crescimento superior a 245%), o que proporcionou ao setor uma proteção às intempéries políticas e econômicas ocorridas no Brasil no período (Figura 2).

Figura 2.
Evolução das Transações Bancárias no Brasil

Associado ao aumento da quantidade de clientes, o mercado bancário brasileiro tem passado nos últimos anos por um processo de digitalização, com a migração dos pontos tradicionais de atendimento (como agências, correspondentes bancários e autoatendimento) para as operações digitais no internet banking e principalmente no mobile banking. Essa migração contribuiu para a quantidade crescente de transações, uma vez que facilita o contato do cliente com operações que antes só poderiam ser realizadas de maneira presencial (Federação Brasileira de Bancos, 2019Federação Brasileira de Bancos (2019). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2018. São Paulo: FEBRABAN, 2019. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 06 abr. 2020
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).

Em 2011, os postos tradicionais de atendimento eram responsáveis por 62% de todas as transações bancárias realizadas no Brasil. Conforme pode ser visualizado na Figura 3, a partir de 2015 há uma inversão nesse padrão, com as transações online representado 60% do volume total em 2018 (Banco Central do Brasil, 2019Banco Central do Brasil (2019). Arranjo de Pagamento: arranjo e instituições de pagamento autorizados pelo BCB. Brasília, DF: BACEN, 2019. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/perguntasfrequentes-respostas/faq_arranjo_ip . Acesso em: 14 abr. 2019.
https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/...
; Federação Brasileira de Bancos, 2019Federação Brasileira de Bancos (2019). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2018. São Paulo: FEBRABAN, 2019. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 06 abr. 2020
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).

Ao realizar a estratificação das transações bancárias por canal de atendimento, é possível observar a ampliação da utilização dos canais digitais, demonstrando que os clientes têm utilizado mais o atendimento virtual.

Figura 3.
Evolução das Transações Bancárias por tipo de Canal

Conforme a Figura 4, em 2011 o canal caixas eletrônicos (ATM) representavam 26% do total de transações, caindo para 12% em 2018 (Federação Brasileira de Bancos, 2019Federação Brasileira de Bancos (2019). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2018. São Paulo: FEBRABAN, 2019. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 06 abr. 2020
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), demonstrando que, apesar desse canal representar uma possibilidade mais simples do que a agência bancária, os clientes querem evitar o deslocamento até um terminal para realizar uma transação. Outro ponto que pode ser considerado é que, devido à grande quantidade de roubos e explosões de caixas eletrônicos no Brasil, muitos bancos têm limitado o acesso a eles, podendo ter contribuído para a queda de representatividade do canal.

Já o canal Correspondentes Bancários e Postos de Serviços, que em 2011 representavam 20% das transações, manteve a estabilidade durante todo o tempo analisado, chegando em 2018 como responsáveis por 21% do total. O canal call center apresentou uma queda considerável no período estudado, mantendo, porém, a sua baixa representatividade (Federação Brasileira de Bancos, 2018Federação Brasileira de Bancos (2018). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2017. São Paulo: FEBRABAN, 2018. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 23 out. 2018.
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; 2019Federação Brasileira de Bancos (2019). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2018. São Paulo: FEBRABAN, 2019. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 06 abr. 2020
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).

O canal internet banking pode ser considerado destoante, pois teve uma redução significativa na representatividade das transações bancárias, apesar de ser um canal digital: em 2011, era responsável por 38%, chegando em 2018 com apenas 20%. Para a Federação Brasileira de Bancos (2018Federação Brasileira de Bancos (2018). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2017. São Paulo: FEBRABAN, 2018. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 23 out. 2018.
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), o cliente passou a utilizar prioritariamente o seu aparelho de telefone celular (mobile banking).

Figura 4.
Percentual de transação por canal

É perceptível a evolução do mobile banking a partir do desenvolvimento tecnológico e de requisitos de segurança, bem como com a intensiva divulgação pelos bancos, buscando não apenas proporcionar maior comodidade ao cliente, mas também considerando que os consumidores brasileiros preferem utilizar o celular ao computador. O mobile banking apresentou um crescimento expressivo em relação aos demais canais, representando 40% de todas as transações realizadas no Brasil em 2018 (Federação Brasileira de Bancos, 2019Federação Brasileira de Bancos (2019). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2018. São Paulo: FEBRABAN, 2019. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 06 abr. 2020
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).

A evolução regulamentar e a criação dos Bancos Digitais no Brasil

Para fomentar a inclusão financeira no Brasil e incentivar a concorrência, o Governo Federal promulgou a Lei nº 12.865 de 09 de outubro de 2013, que cria os Arranjos de Pagamento no Brasil, possibilitando a inclusão de setores não bancários na oferta de serviços de pagamento (Banco Central do Brasil, 2019Banco Central do Brasil (2019). Arranjo de Pagamento: arranjo e instituições de pagamento autorizados pelo BCB. Brasília, DF: BACEN, 2019. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/perguntasfrequentes-respostas/faq_arranjo_ip . Acesso em: 14 abr. 2019.
https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/...
). Um arranjo de pagamento “é o conjunto de regras e procedimentos que disciplina a prestação de determinado serviço de pagamento ao público” (Planalto, 2013Planalto. (2013). Lei 12865. Brasilia: Presidência. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Lei/L12865.htm . Acesso em: 14 abr. 2019.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_At...
).

Já o serviço de pagamento criado como o processo para a operacionalização dos arranjos é definido como sendo “o conjunto de atividades que pode envolver aporte e saque de recursos, emissão de instrumento de pagamento, gestão de uma conta que sirva para realizar pagamento, credenciamento para aceitação de um instrumento de pagamento, remessa de fundos, dentre outras listadas no inciso III do art. 6º da Lei 12.865, de 2013” (Banco Central do Brasil, 2019Banco Central do Brasil (2019). Arranjo de Pagamento: arranjo e instituições de pagamento autorizados pelo BCB. Brasília, DF: BACEN, 2019. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/perguntasfrequentes-respostas/faq_arranjo_ip . Acesso em: 14 abr. 2019.
https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/...
).

Outra criação da lei 12.865/2013 são as instituições de pagamento, que “são as pessoas jurídicas não financeiras que executam os serviços de pagamento no âmbito do arranjo e que são responsáveis pelo relacionamento com os usuários finais do serviço de pagamento” (Banco Central do Brasil, 2019Federação Brasileira de Bancos (2019). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2018. São Paulo: FEBRABAN, 2019. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 06 abr. 2020
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).

Como consequência prática, a lei 12.865/2013 criou as condições para que o BACEN pudesse iniciar todo o processo de regulamentação das chamadas contas de pagamento (contas digitais), produto base para o desenvolvimento dos Bancos Digitais.

Após a Lei 12.865 em 2013, coube ao Conselho Monetário Nacional (CMN) e ao BACEN elaborar as regras e procedimentos para a criação e a supervisão dos arranjos de pagamento: entre 2013 e 2018, o BACEN emitiu 16 normativos; em 2019, nenhum normativo com vistas à regulamentação dos arranjos de pagamento foi promulgado (Banco Central do Brasil, 2019Banco Central do Brasil (2019). Arranjo de Pagamento: arranjo e instituições de pagamento autorizados pelo BCB. Brasília, DF: BACEN, 2019. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/perguntasfrequentes-respostas/faq_arranjo_ip . Acesso em: 14 abr. 2019.
https://www.bcb.gov.br/acessoinformacao/...
). O Quadro 1 apresenta a evolução temporal dos normativos emitidos pelos órgãos competentes.

Quadro 1.
A Evolução Temporal da regulamentação sobre Arranjos de Pagamentos

Dentre os normativos divulgados pelo BACEN, é possível destacar alguns que permitiram às instituições de pagamento o acesso ao mercado de domicílio bancário e antecipação de recebíveis: Circular 3.680/13; Circular 3.682/13; Circular 3.721/14; e Circular 3.765/15.

A Circular 3.680/13 regulamentou as informações cadastrais necessárias para a abertura da Conta de Pagamento, item essencial para o desenvolvimento dos Bancos Digitais. A Lei 12.685/2013 possibilitou a criação das “instituições de pagamento”, que, associadas aos bancos ou outras instituições com acesso à operacionalização de pagamentos, criaram as contas digitais. Com vistas à base normativa, a abertura de uma conta corrente bancária comum estava descrita na Resolução 2.025 de 1993. Já a conta digital tem como base regulamentar a Circular 3.680 de 2013, sendo mais simples, exigindo menos informações e documentos do que uma conta corrente comum (Banco Central do Brasil, 2019Federação Brasileira de Bancos (2019). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2018. São Paulo: FEBRABAN, 2019. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 06 abr. 2020
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).

Já a Circular 3.682/13 delimitou o funcionamento dos arranjos de pagamento na forma “Aberta”, ou seja, com a adesão de uma instituição financeira participante do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB) para a operacionalização dos pagamentos; e na forma “Fechada”, onde o instituidor do arranjo usa o próprio acesso ao SPB para efetivar os seus pagamentos.

A Circular 3.721/14 padronizou as informações necessárias para transações da agenda de cartões para instituições financeiras e instituições de pagamento, centralizando os arquivos em um layout único, definido pela Câmera Interbancária de Pagamentos (CIP). Em complemento, a Circular 3.765/15 padronizou a forma de liquidação da agenda de cartões, padronizando a forma e layout definidos pela CIP.

Como instituição de pagamento que não está enquadrada em algumas das regras que regulamentam as instituições financeiras no Brasil, elas puderam oferecer aos seus clientes processos mais ágeis, com interações digitais (por meio de aplicativos), sem documentação física e, portanto, com custo significativamente menor do que uma instituição financeira comum. Com essa vantagem competitiva as instituições de pagamento foram renomeadas comercialmente e passaram a ser conhecidas pelos consumidores como Bancos Digitais, ocupando uma lacuna de mercado, composta por clientes insatisfeitos com as instituições financeiras tradicionais e que não tinham outras opções (Pinheiro, 2017Pinheiro, V. (2017). Bancos deixam de ver ‘Fintechs’ como ameaça ao negócio. Valor Econômico. 02 mai. 2017. Disponível em: https://valor.globo.com/financas/noticia/2017/05/02/bancos-deixam-de-ver-fintechs-como-ameaca-ao-negocio.ghtml . Acesso em 03 ago.2020
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).

Com o sucesso alcançado com as contas digitais, essas instituições conquistaram milhares de clientes e passaram a desenvolver mais produtos e serviços, agregando valor às suas marcas e concorrendo frontalmente com os bancos tradicionais na conquista de clientes e na imagem de efetividade e custo x benefício das instituições financeiras. Segundo estimativas, o Brasil possui 20 bancos digitais, com 28 milhões de usuários, com projeção que termine 2020 com 44 milhões de clientes e 2021, com 73 milhões (Lopes, 2020Lopes, F. A. (2020). Bancos digitais: número de usuários pode chegar a 44 milhões em 2020. Eu quero investir. Disponível em: https://www.euqueroinvestir.com/bancos-digitais-numero-de-usuarios-pode-chegar-a-44-milhoes-em-2020/#:~:text=Atualmente%2C%20s%C3%A3o%2020%20bancos%20digitais,45%20milh%C3%B5es%20de%20novos%20usu%C3%A1rios . Acesso em: 10 jul. 2020.
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).

Na visão do consumidor, os Bancos Digitais e os bancos tradicionais são instituições com um mesmo propósito: promover a relação dos clientes com o seu dinheiro seja na abertura de conta corrente, aplicações ou empréstimo. Essa percepção, somada à vantagem de que os Bancos Digitais não possuem a mesma regulamentação que os demais, fizeram com que a imagem dos bancos tradicionais fosse prejudicada, sendo vistos como ultrapassados, lentos, burocráticos e caros. Essa percepção está alinhada ao conceito de Arner, Barberis e Buckley (2016Arner, D. W., Barberis, J. & Buckley, B. P. (2016). The Evolution of Fintech: A New PostCrisis Paradigm? Georgetown Journal of International Law, 47, 1271-1319. https://doi.org/10.2139/ssrn.2676553
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) de que as Fintechs estão associadas à inovação e disrupção dos pensamentos existentes no mercado.

Essa realidade provocou a necessidade de investimento em produtos, processos e tecnologia. Muitos bancos tradicionais criaram arranjos de pagamentos apartados para oferecer contas digitais, abertas por meio de aplicativos, de forma ágil e fácil, assim como os Bancos Digitais. Somada a essa decisão estratégica, o mercado bancário reforçou o investimento na digitalização da relação com o cliente, assim proporcionando uma visão de modernidade e reduzindo custos operacionais (Federação Brasileira de Bancos, 2018Federação Brasileira de Bancos (2018). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2017. São Paulo: FEBRABAN, 2018. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 23 out. 2018.
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).

Corroborando essa informação, em 2014 (após a criação dos arranjos de pagamento em 2013), os investimentos em tecnologia no setor subiram 13% quando comparado ao ano anterior, em números absolutos foram aproximadamente um bilhão de reais de incremento de investimento do setor. Porém, a partir de 2015 houve uma queda significativa no investimento em tecnologia - entre 2014 e 2015 houve queda de 32% (Federação Brasileira de Bancos, 2018Federação Brasileira de Bancos (2018). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2017. São Paulo: FEBRABAN, 2018. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 23 out. 2018.
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).

Esse dado não deve ser entendido como um desinvestimento, podendo ser explicado por duas principais causas. O primeiro ponto é que em 2015 houve uma desaceleração dos investimentos em praticamente todos os setores da economia devido a cenários macroeconômicos e políticos, dado um processo eleitoral conturbado e perspectivas políticas e econômicas pessimistas para o período (Federação Brasileira de Bancos, 2018Federação Brasileira de Bancos (2018). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2017. São Paulo: FEBRABAN, 2018. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 23 out. 2018.
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).

Além disso, para subsidiar o desenvolvimento de tecnologias inovadoras e a aquisição/desenvolvimento de softwares, é preciso um investimento na infraestrutura de tecnologia, como hardwares e data centers. Ao analisar mais profundamente os investimentos realizados, é possível observar que em 2014 houve um crescimento de 21% no investimento em infraestrutura de tecnologia, chegando a R$ 3,9 bilhões. Após o investimento de 2014, em 2015 essa linha teve uma queda de 44% chegando a R$ 2,2 bilhões, porque com a infraestrutura pronta o foco voltou a ser o desenvolvimento de soluções digitais, como mostra a Figura 5 (Federação Brasileira de Bancos, 2018Federação Brasileira de Bancos (2018). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2017. São Paulo: FEBRABAN, 2018. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 23 out. 2018.
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).

Figura 5.
Distribuição por tipo de investimento

De maneira geral, com exceção de 2014, o maior investimento em tecnologia é no desenvolvimento de softwares, corroborando a afirmação de que o setor bancário investiu na digitalização de seus processos.

Além do impacto financeiro devido ao grande investimento realizado pelo setor em tecnologia, outra implicação significativa identificada após a criação dos Bancos Digitais foi o alinhamento dos conceitos de marketing e comunicação ao cliente. Nesse sentido, é possível identificar que tanto os bancos tradicionais quanto os digitais têm adotado linhas mercadológicas e de comunicação com ênfase na relação digital, com imagens de pessoas com smartphones e aplicativos, com destaque aos processos fáceis e ágeis de abertura de conta e custo reduzido.

Para exemplificar esse alinhamento na comunicação com o cliente, a Figura 6 apresenta a imagem dos sites dos quatro maiores bancos brasileiros tradicionais (Banco do Brasil, Itaú, Bradesco e Santander) e os quatro maiores Bancos Digitais (Nubank®, Inter, Neon e Original) em quantidade de clientes (Banco Central do Brasil, 2019Federação Brasileira de Bancos (2019). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2018. São Paulo: FEBRABAN, 2019. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 06 abr. 2020
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).

Figura 6.
Abordagem de marketing e promoção da marca de Bancos Digitais e tradicionais

Ao comparar os sites dos bancos tradicionais e dos bancos digitais é possível visualizar o alinhamento das ações de marketing e comunicação ao cliente. Os quatro maiores Bancos Tradicionais e os quatro maiores Bancos Digitais do Brasil realizam abordagem muito semelhante, divulgando a abertura de contas por meio de aparelhos celulares, reforçando os aspectos de agilidade, facilidade e sem custos (ou menor custo).

Análise das Interações dos clientes do Nubank® em sua comunidade no Facebook®

Ao acessar a NuCommunity, a comunidade do Banco Digital Nubank® no Facebook® (@Nubankbrasil), foram identificadas inúmeras interações de usuários com a instituição, que é muito ativa nas redes sociais, respondendo dúvidas, reclamações, questionamentos e comentários de seus usuários.

Para a classificação do perfil dos clientes com base nas 526 postagens analisadas foram considerados clientes “Promotores” aqueles que apresentaram interações positivas com a marca. Os considerados “Neutros” são os clientes que não apresentaram interações positivas ou negativas em relação à marca. Por fim, “Detratores” são aqueles que apresentaram interações negativas com a marca no período analisado. Os quadros 2, 3 e 4 trazem exemplos de interações de clientes de cada perfil.

Quadro 2 -
Exemplo das interações NuCommunity (Clientes Detratores)
Quadro 3 -
Exemplo das interações NuCommunity (Clientes Neutros)
Quadro 4 -
Exemplo das interações NuCommunity (Clientes Promotores)

Como resultado da análise das 526 interações, foi identificado que 65 ou 12% foram consideradas “Detratoras” em relação à marca, 211 (40%) “Neutros” e 250 (48%) “Promotores”. Na conclusão dessa análise, é possível considerar que a interação dos clientes do Nubank® na NuCommunity é em geral positiva para a instituição, visto que a maioria dos clientes faz elogios à inovação e ações mercadológicas do banco e são mínimos os casos de clientes que informam a intenção de deixar a instituição devido a algum problema enfrentado. Nessa avaliação não foram consideradas as respostas da instituição aos comentários apresentados, pois o foco do estudo é a análise da percepção dos clientes quanto à marca.

CONCLUSÃO, RECOMENDAÇÕES E LIMITAÇÕES

A revisão da literatura trouxe a descrição cronológica da inovação tecnológica no setor bancário brasileiro, iniciada na década de 1920. Foi realizada ainda a conceituação de Bancos Digitais e constatação do crescimento na quantidade de Fintechs no Brasil de acordo com o publicado pelo FintechLab (2018Fintechlab. (2018). Novo Radar FintechLab mapeia mais de 400 iniciativas. Disponível em: <Disponível em: http://fintechlab.com.br/index.php/2018/08/13/novo-radar-fintechlab-mapeia-mais-de-400-iniciativas/ >. Acesso em: 21 abr. 2019
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).

Nos resultados, é possível identificar por meio da pesquisa de tecnologia bancária da Federação Brasileira de Bancos (2019Federação Brasileira de Bancos (2019). Pesquisa Febraban de Tecnologia Bancária 2018. São Paulo: FEBRABAN, 2019. Disponível em: http://www.ciab.org.br/download/researches/research-2018.pdf . Acesso em: 06 abr. 2020
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) que, após a criação dos Bancos Digitais em 2013, houve a aceleração do processo de digitalização da relação com os clientes. Fica evidente o crescimento das transações por meio dos canais digitais, principalmente o canal mobile banking. Corroborando essa afirmação identifica-se 2015 como um marco para este mercado, por ser o ano em que as transações realizadas de forma digital (internet banking e mobile banking) superaram as transações realizadas por meios tradicionais (presencial, ATM ou telefone).

Outro resultado relevante encontrado foi a identificação do crescimento do investimento do setor bancário em tecnologia da informação. Nesse cenário, 2014 foi uma referência, sendo o ano com maior investimento do setor, totalizando R$ 7,9 bilhões, principalmente no desenvolvimento de estruturas de sistemas e segurança. É possível inferir que esse investimento foi o motor que possibilitou que em 2015 as transações realizadas por meio dos canais digitais fossem superiores às realizadas por meio dos canais tradicionais.

Outro impacto causado pelos Bancos Digitais no mercado bancário brasileiro foi que, na medida em que esses novos atores ganharam espaço, houve uma atuação do órgão regulador do setor financeiro (BACEN) na regulamentação deste processo, principalmente buscando garantir segurança aos usuários e incentivando a competitividade. Desde a criação dos Bancos Digitais em 2013 o BACEN publicou 16 atos normativos (resoluções, circulares ou comunicados) para adequar as regras e garantir segurança (jurídica, processual ou de fraudes) ao processo.

O foco no relacionamento digital e no baixo custo foi mais um dos impactos causados pelos Bancos Digitais no mercado financeiro brasileiro. É possível identificar esse impacto na mudança da estratégia mercadológica das instituições tradicionais, se aproximando da estratégia dos Bancos Digitais. Nesse sentido é possível identificar estratégias similares de promoção da marca e de comunicação. Ambos os grupos estão focados em passar aos seus clientes a visão digital, incentivando o relacionamento principalmente por meio de aplicativos e ressaltando processos fáceis, ágeis e com menor custo.

Dentre os aspectos positivos identificados com essa pesquisa está a elevação da concorrência no setor a partir da entrada dos Bancos Digitais. Como praticamente não havia produto substituto no mercado, as instituições financeiras sempre estavam focadas em melhorar a sua rentabilidade, reduzindo custos e elevando receitas, deixando a experiência do cliente em segundo plano. Contudo, após o desenvolvimento dos Bancos Digitais e o seu crescimento vertiginoso nos últimos anos, as instituições tradicionais do setor financeiro passaram a colocar a experiência do cliente em primeiro lugar, buscando facilidade, comodidade e segurança, reduzindo tarifas e focados no relacionamento digital. Essa mudança de estratégia pode ser considerada o principal impacto causado pelos Bancos Digitais no mercado financeiro brasileiro.

Esta pesquisa contribui academicamente para a construção do conhecimento sobre o setor financeiro brasileiro e sobre um tema atual e estratégico: os impactos causados pelos Bancos Digitais. No campo prático, contribui para o setor bancário no desenvolvimento de produtos e processos direcionados à experiência dos clientes.

Os resultados da pesquisa atendem os objetivos propostos para o artigo, mas é importante destacar as limitações do estudo, como a coleta de dados somente via postagens em rede social e dados secundários; a análise de somente um dos bancos digitais atuantes no mercado brasileiro; e o recorte temporal da pesquisa. Considerando as limitações do estudo, para estudos futuros é sugerida a realização de entrevistas com consumidores e gestores de bancos digitais, visando ampliar o conhecimento no setor. Outra oportunidade é a realização de pesquisas sobre os impactos do surgimento dos Bancos Digitais nas instituições financeiras.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    2022

Histórico

  • Recebido
    10 Jan 2021
  • Aceito
    01 Out 2021
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